segunda-feira, 21 de dezembro de 2020

LIÇÃO 13 - QUANDO DEUS RESTAURA O JUSTO

               


                  LIÇÃO 13 - QUANDO DEUS RESTAURA O JUSTO

TEXTO ÁUREO 

E o SENHOR virou o cativeiro de Jó, quando orava pelos seus amigos; e o SENHOR acrescentou a Jó outro tanto em dobro a tudo quanto dantes possuía” (Jó 42.10). 

VERDADE PRÁTICA 

A restauração do ser humano acontece em razão do amor e da misericórdia de Deus, e não como consequência do esforço pessoal, piedade ou atos de bondade.

LEITURA BÍBLICA EM CLASSE

Jó 42.1-17.

1 — Então, respondeu Jó ao SENHOR e disse:

2 — Bem sei eu que tudo podes, e nenhum dos teus pensamentos pode ser impedido.

3 — Quem é aquele, dizes tu, que sem conhecimento encobre o conselho? Por isso, falei do que não entendia; coisas que para mim eram maravilhosíssimas, e que eu não compreendia.

4 — Escuta-me, pois, e eu falarei; eu te perguntarei, e tu ensina-me.

5 — Com o ouvir dos meus ouvidos ouvi, mas agora te veem os meus olhos.

6 — Por isso, me abomino e me arrependo no pó e na cinza.

7 — Sucedeu, pois, que, acabando o SENHOR de dizer a Jó aquelas palavras, o SENHOR disse a Elifaz, o temanita: A minha ira se acendeu contra ti, e contra os teus dois amigos; porque não dissestes de mim o que era reto, como o meu servo Jó.

8 — Tomai, pois, sete bezerros e sete carneiros, e ide ao meu servo Jó, e oferecei holocaustos por vós, e o meu servo Jó orará por vós; porque deveras a ele aceitarei, para que eu vos não trate conforme a vossa loucura; porque vós não falastes de mim o que era reto como o meu servo Jó.

9 — Então, foram Elifaz, o temanita, e Bildade, o suíta, e Zofar, o naamatita, e fizeram como o SENHOR lhes dissera; e o SENHOR aceitou a face de Jó.

10 — E o SENHOR virou o cativeiro de Jó, quando orava pelos seus amigos; e o SENHOR acrescentou a Jó outro tanto em dobro a tudo quanto dantes possuía.

11 — Então, vieram a ele todos os seus irmãos e todas as suas irmãs e todos quantos dantes o conheceram, e comeram com ele pão em sua casa, e se condoeram dele, e o consolaram de todo o mal que o SENHOR lhe havia enviado; e cada um deles lhe deu uma peça de dinheiro, e cada um, um pendente de ouro.

12 — E, assim, abençoou o SENHOR o último estado de Jó, mais do que o primeiro; porque teve catorze mil ovelhas, e seis mil camelos, e mil juntas de bois, e mil jumentas.

13 — Também teve sete filhos e três filhas.

14 — E chamou o nome da primeira, Jemima, e o nome da outra, Quezia, e o nome da terceira, Quéren-Hapuque.

15 — E em toda a terra não se acharam mulheres tão formosas como as filhas de Jó; e seu pai lhes deu herança entre seus irmãos.

16 — E, depois disto, viveu Jó cento e quarenta anos; e viu a seus filhos e aos filhos de seus filhos, até à quarta geração.

17 — Então, morreu Jó, velho e farto de dias.

OBJETIVO GERAL

Mostrar o grande amor de Deus evidenciado na prosperidade de seus filhos.

OBJETIVOS ESPECÍFICOS

Abaixo, os objetivos específicos referem-se ao que o professor deve atingir em cada tópico. Por exemplo, o objetivo I refere-se ao tópico I com os seus respectivos subtópicos.

  • I. Sublinhar a atitude humilde de Jó em receber a repreensão divina pelos equívocos cometidos;
  • II. Destacar a espiritualidade de Jó demonstrada na intercessão pelos seus amigos;
  • III. Comentar sobre o último estado de Jó e suas implicações positivas para o entendimento do livro.

INTERAGINDO COM O PROFESSOR

Chegamos ao encerramento de mais um de trimestre. Essa é uma excelente oportunidade para fazer um diagnóstico de como foi a sua performance de educador ou educadora cristã. Procure avaliar como a sua turma se comportou ao longo do trimestre. Como foi o método usado, a interação e a percepção dos alunos. Isso pode ser feito por meio de perguntas individuais aos alunos. Você pode pesquisar na internet uma série de modelos de avaliação e adaptá-los a fim de que tenha uma amostra em sua classe. O importante é que você não deixe escapar a oportunidade de fazer uma autoavaliação, bem como avaliar toda a classe.

COMENTÁRIO

INTRODUÇÃO

Nesta última lição trataremos sobre a restauração de Jó. Veremos que ela se dá quando ele se humilha diante de Deus e intercede por seus amigos. Constataremos também que o testemunho de Deus sobre Jó provou ser verdadeiro, e seus amigos tiveram de se retratar. Durante toda provação, ele se manteve íntegro e não lhe foi atribuída impiedade alguma. Pelo contrário, o Senhor o restaurou de forma grandiosa.

 

PONTO CENTRAL 

Deus restaura o ser humano por causa de seu amor e misericórdia.

Título: A fragilidade humana e a soberania divina — O sofrimento e a restauração de Jó

Comentarista: José Gonçalves

 


Capítulo 13 - Quando Deus Restaura o Justo

    Depois  de  uma  longa  jornada  sobre  o  itinerário  espiritual  de  Jó, chegamos ao seu final. Depois d e idas e vindas, parece que tudo terminou como  havia  começado:  Jó,  um  homem  rico  e  famoso!  Todavia,  se  esse entendimento  fosse  mantido,  nada  daquilo  que  o  livro  de  Jó  procurou ensinar teria s ido absorvido. A visão distorcida da religiosidade praticada nos  seus  dias,  onde  Deus  sempre  recompensa  os   bons  e  pune  os  maus durante esta vida, continuaria sendo mantida. Não é isso  a que o livro de Jó  propõe-se  mostrar.  Na  verdade,  a  sua   mensagem  é  diametralmente oposta a esse tipo de entendimento.

   Jó terminou rico e próspero, mas não mais do mesmo jeito que havia começado. Temos no prólogo um Jó íntegro, reto e que se desviava do mal. Todavia,  como  demonstrará  os  diálogos  com  os  seus  amigos  e  o testemunho do próprio Criador, ele estava autoconfiante e cheio de justiça própria.  Evidentemente  que  o  texto  deixa  bem  claro  que  ele  não  fora submetido  à  prova  por  conta  disso,  mas  Deus,  na  sua  onisciência soberana,  permite  que  ele  passe  pela  fornalha,  e  é  aí  que  Jó  tomará consciência  de  quem  ele  era  de  fato.  No  princípio   da  sua  provação,  Jó queixa-se  de  Deus,  mas,  durante  o  seu  longo  sofrimento,  ele  queixa -se  a Deus. A diferença parece apenas de  ordem  gramatical ou semântica, mas é  muito  mais  do  que  isso.  Na  verdade,  a  queixa  de  Jó  ocorre primeiramente  porque  ele  está  vendo  a  sua  prova  sob  a  sua  antiga cosmovisão  —  os  justos  não  sofrem.  Durante  o  andar  da  carruagem,  Jó passa a perceber que de nada adianta continuar queixando-se de Deus; ele precisa queixar-se a  Deus,  isto  é,  conversar  com  o  Senhor e  buscar nEle a resposta para o seu dilema. Nesse aspecto, Jó entra na fornalha crente e sai dela  um  santo!  Não  há  dúvidas  de  que,  anteriormente,  Jó  também compartilhava  com  a  crença  tradicional  da  justiça  retributiva  —  D eus recompensa  os  bons  e  pune  os  maus.  Quando  o  Senhor  “vira  o  seu cativeiro”,  Jó  tem  consciência d e  que  a  prosperidade  acontece  em  meio  à adversidade e que a prosperidade deve ser vista no seu aspecto relacional, e  não  comercial.  Deu s  dá  porque  ama  e  é  adorado  porque  é  reconhecido como fonte desse amor.

   A HUMILHAÇÃO DE JÓ (42.1-6)

   Então,  respondeu  Jó  a o  Senhor  e  disse:  Bem  sei  eu  que  tudo  podes, e nenhum dos teus pensamentos pode ser impedido. Quem é aquele, dizes  tu,  que  sem  conhecimento  encobre  o  conselho?  Por  isso,  falei do que não entendia; coisas que  para mim eram maravilhosíssimas, e  que  eu  não  compreendia.  Escuta-me,  pois,  e  eu  falarei;  eu  te perguntarei,  e  tu  ensina-me.  Com  o  ouvir  dos  meus  ouvidos  ouvi, mas  agora  te  veem  os  meus  olhos.  Por  isso,  me  abomino  e  me arrependo no pó e na cinza.   

    “Bem sei eu que tudo podes, e nenhum dos teus pensamentos  pode ser  impedido”  (42.2).  A  visão  teofânica   experienciada  por  Jó  provocou  profundo  impacto  na  sua  vida.  Até  esse  momento  sublime,  encontramos um  Jó  entrincheirado,  cheio  de  razões  para  apresentar.  Ele   sempre demonstrou  estar  ciente  da  sua  inocência  e  não  a ceitava,  sob  hipótese alguma,  declinar  dessa  posição. E le  foi ca paz  de demonstrar  isso  quando enfrentou uma  série  de  calorosos  debates  teológicos  com os   seus amigos. Primeiramente,  Elifaz  enfrentou-o  com  a  tese  da  justiça  retributiva. Bildade,  da  mesma  forma,  acusou-o  de  levantar-se  contra  o  caráter  justo de Deus e querer destruir  a m oralidade tradicional. Por outro lado, Zofa r usou  palavras  ácidas  para  d izer  que  o  Senhor  demonstrava  ser extremamente  sábio  em  puni-lo  da  forma  como  estava  punindo.  Por último, Eliú alfineta-o quando mostra a sua autossuficiência.

   Stadelmann (1997, p. 114) escreve:

  Jó reconhece  que  os desígnios  de  Deus  ultrapassam infinitamente o entendimento humano. É   essa a  conclusão  que  chegou  por  meio da reflexão  teológica  s obre  os  dados  da  razão,  da  experiência  e  do diálogo,  e  precisamente  quando  entrou  nas  zonas  do  mistério  que somente Deus  pode esclarecer.  Percebeu, por  fim, que  na sua busca estava  em  jogo,  além  da  inteligência,  a  abertura  do  coração,  a liberdade  de  espírito,  o  rigor  moral.  São  atitudes  religiosas  que  o ajudaram a  compreender que  a  sabedoria do  homem vem d e Deus, que não é algo que sob e de baixo para cima, mas que desce de  cima para  baixo  e  que  é  uma  luz  de  Deus  que  ilumina  sua  inteligência.

   Por isso, Jó pode afirmar que seus olhos viram a Deus, isto é, o Deus da  interioridade,  não  da  exterioridade.  Deus  já  não  é  objeto  de  sua reflexão  e  de  suas  palavras,  mas  pes soa  viva   com  quem  entrou  em comunhão com humildade e arrependimento (vv.1-6).

    A  teofania finalmente  aconteceu!  Jó  vê-se  face  a  face  diante  da majestade  divina  e  contempla  as  maravilhas  de  um  Universo  criado  por Deus.  Mais  do  qu e  isso,  ele  contempla  o  desígnio  divino  no  criar  e preservar  a  criação.  Jó  vê-se  extasiado  diante  d e  tudo  isso.  De  repente,  a justiça  e  a  sabedoria  divina,  que  ele  tanto   questionara,  estavam  diante dele.  Ao  contemplar  a  glória  de  Deus,  deu-se  conta  do  seu  pecado.  Deus estava certo,  e ele  estava  errado. Como ele  poderia  questionar um  ser  tão sábio e justo? Era o momento de humilhar-se.

   A INTERCESSÃO DE JÓ (42.7-9)

   Sucedeu,  pois,  que,  acabando  o  Senhor  de  dizer  a  Jó  aquelas palavras, o Senhor disse a Elifaz, o temanita: A minha ira se acendeu contra ti, e contra os teus dois amigos; porque não dissestes de mim o que era reto, como o meu servo Jó. Tomai, pois, sete bezerros e sete carneiros,  e  ide  ao  meu  servo  Jó,  e  oferecei  holocaustos  por  vós,  e  o meu servo Jó orará por vós; porque deveras a ele aceitarei, para que eu  vos  não  trate  conforme  a  vossa  loucura;  porque  vós  não  falastes de  mim  o  qu e  era  reto  como  o  meu  servo  Jó.

    Então,  foram  Elifaz,  o temanita,  e  Bildade,  o  suíta,  e  Zofar,  o  naamatita,  e  fizeram  como  o Senhor lhes dissera; e o Senhor aceitou a face de Jó.   “Sucedeu,  pois,  que,  a cabando  o  Senhor  de  dizer  a  Jó  aquelas palavras,  o  Senhor  disse  a  Elifaz,  o  temanita:  A  minha  ira  se  acendeu contra ti, e contra os teus dois amigos; porque não dissestes de mim o que  era reto, como o meu servo Jó” (Jó 42.7). A intercessão de Jó em favor dos seus  amigos  dá -se  no  contexto  d e  um  revisionismo  teológico.  Deus  fala aos amigos de Jó q ue estes não falaram a respeito dele o que era reto como Jó  havia  falado.  A  necessidade da  apresentação de  sacrifícios  para  expiar a  culpa  demonstra  inquestionavelmente  que  os  amigos  de  Jó  haviam pecado  ao  fazerem  ousadas  a firmações  teológicas  sobre  Deus.  Isso significa  dizer  que  o  registro  d aquilo  que  eles  disseram,  que  faz  parte  do livro  de  Jó,  é,  sem  dúvida,  inspirado.  Todavia,  nem  tudo  aquilo  que falaram  refletia  a   verdade  de  Deus.  Há  muitas  coisas  d itas  por  eles  que, em parte, era verdade. Como foi demonstrado aqui, sempre foi a intenção do  autor  de  Jó  mostrar  que  a   defesa  da  justiça  retributiva  como  a  única opção  teológica  possível  era  um  equívoco.  Ela  acusava  inocentes  ao afirmar que eles estavam sendo punidos em virtude de um pecado pessoal cometido, quando, de fato, isso não era verdade, e Jó era o exemplo disso; por  outro  lado,  retirava  o  direito  do  Senhor  de  ser  soberano. Ela  também privilegiava uma relação de troca, e não um  relacionamento interpessoal. Quando  levada  às  últimas  consequências,  transformava   Deus  em  um objeto,  e  o  homem  em  mercadoria.  Schonberger  (2011)  acredita  que  é exatamente isso que o Senhor está condenando aqui, visto que Jó também sofre  reprimenda  por  parte  de  Deus  quando  demonstra  orgulho  e autossuficiência .  Jó,  a o  contrário  dos  seus  amigos,  estava  à  procura  da espiritualidade que vem d e dentro, fruto de uma relação íntima com Deus, e não simplesmente nos dogmas externos da religião.

     A RESTAURAÇÃO DE JÓ (42 .10-17)

   E o Senhor virou o cativeiro de Jó, quando orava  pelos seus amigos; e  o  Senhor  acrescentou  a  Jó  outro  tanto  em  dobro  a  tudo  quanto dantes  possuía.  Então,  vieram  a  ele  todos  os  seus  ir mãos  e  todas  as suas  irmãs  e  todos  quantos  d antes  o  conheceram,  e  comeram  com ele pão  em sua casa, e  se condoeram dele,  e  o  consolaram de todo o mal  que  o  Senhor  lhe  ha via  enviado;  e  cada  um  deles  lhe  deu  uma peça  de  dinheiro,  e  cada  um,  um  pendente  de  ouro.  E,  assim, abençoou  o  Senhor  o  último  estado  de  Jó,  mais  d o  que  o  primeiro; porque  teve  catorze  mil  ovelhas ,  e  seis  mil  camelos,  e  mil  juntas   de bois, e mil jumentas. Também teve sete filhos e três filhas. E chamou o  nome  d a  primeira,  Jemima,  e  o  nome  da  outra,  Quezia,  e  o  nome da  terceira,  Quéren-Hapuque.  E  em  toda  a  terra  não  se  acharam mulheres  tão  formosas  como  as  filhas  de  Jó;  e  seu  pai  lhes  deu herança entre seus irmãos. E, depois d isto, viveu J ó cento e quarenta  anos;  e  viu  a  seus  filhos  e  aos  filhos  de  seus  filhos,  até  à  quarta geração. Então, morreu Jó, velho e farto de dias.  

 

  “E o Senhor virou o cativeiro de Jó, quando orava pelos seus amigos; e  o  Senhor  acrescentou  a  Jó  outro  tanto  em  dobro  a   tudo  quanto  dantes possuía”  (42.10).  Depois  que  Jó  intercedeu  pelos  seus  amigos,  o  seu cativeiro  chegou  ao  fim.  A  bênção  de  Deus  foi  derramada abundantemente sobre  ele.  A  bênção  vai  da  prosperidade à  longevidade, e  ele,  então,  passa  a  ter  tudo  em  dobro.  O  seu  drama  terminou,  e  as  suas lições ficaram para as  gerações futuras.  Uma excelente exposição sobre as lições deixadas por Jó foi feita por David  Atkinson  (2010).  No  seu  excelente  comentário  sobre  o  livro  de  Jó,  Atkinson conclui  com o  que  denomina de   “amarrando cabos” (Atkinson, 2010,  p. 203).  Atkinson destaca  oito  pontos que  considera importantes no livro  de  Jó.  Aqui  será  feita  uma  síntese  desses  destaques  de  Atkinson, porque,  sem  dúvida,  eles  ajudarão  na  compreensão  das  lições  deixadas por esse livro fenomenal.  Em primeiro lugar, deve ser destacado que a mensagem de Jó é bem  clara — existem coisas entre o céu e a terra que estamos longe de imaginar. Nesse  aspecto,  Jó  é  envolvido  no  propósito  divino  mesmo  s em  ter consciência  disso.  Há,  portanto,  incertezas,  quebra-cabeças  e ambiguidades na vida de fé que devemos deixar como parte dos mistérios de Deus. “As coisas encobertas são para o Senhor, nosso Deus” (Dt 29.2 9). Devemos aceitar o fato de que Deus tem os seus mistérios e, então, receber o  dom  dado  por  Ele  para  mantermo-nos  de  pé  em  tempos  de  incertezas. Jó, portanto, é um gigante da fé nesse aspecto. Isso serve de exemplo para humilharmo-nos  diante  do  Senhor  e  pedir  a  Ele  que  aumente  nossa  fé  e que nos prepare para momentos como esse.

     Em  segundo  lugar,  há  u ma  advertência  no  livro  de  Jó  contra  a superficialidade  de  nossa  pregação,  em  especial  quando  se  trata  de pregarmos  a   verdade.  Por  todo  o  livro  de  Jó,  pode -se  observar  a insensibilidade  d os  amigos  dele  quando  mostram  grande  determinação em fazer com que Jó aceite aquilo que eles tinham como sendo certo. Nesse aspecto,  ninguém  será  ajudado  por  simplesmente  querermos  que  aceite nosso  ponto  de  vista,  mesmo  s em  saber  se  ele,  de  fato,  revela  a   verdade. Deveríamos,  portanto, a prender do  episódio  das  cinzas  o  seguinte: que  é preciso escutar o outro ou simplesmente estar com ele.

   Em  terceiro  lugar,  ficou  patente  na  mensagem  de  Jó  que  o  povo  de Deus também  sofre e  passa  por  revezes. Nesse  aspecto, as pessoas  boas  e piedosas também sofrem!  Coisas ruins  acontecem com  pessoas boas. Isso deveria  servir  de  exemplo  para  não  se  julgar  alguém  pelas  desventura s que as  circunstâncias impõem a  ele.  No universo da  fé, a  bênção  também advém  da  dor.  Nesse  aspecto,  o  sofrimento  cura  mesmo  quando  tudo  à sua volta demonstra o contrário. No sofrimento de Jó, o seu corpo, mente, espírito, relações, emoções e vontade estão envolvidos.  Nada fica de fora, já  que  todas  estão  interligadas .  Quando  se  ajuda  alguém,  deve  ser observado  que  não  é  uma  parte  daquela  pessoa  que  está  sendo  ajudada, mas o seu ser integral. Para algumas pessoas, o maior sofrimento vem por conta  da  sua  fé,  pois  o  crente  sempre  espera  u ma  resposta  d e  Deus,  que fica  em silêncio às  vezes. Nesse aspecto, Jó mostra  que a  convicção moral pode  fortalecer-se  em  meio  à  adversidade.  É  exatamente  isso  que  é corroborado pelo apóstolo Paulo em Romanos 5.3-4.

   Em  quarto  lugar,  há  uma  grande  diferença  entre  uma  crença ,  que Pascal  chamou  de  “o  Deus  dos  filósofos”,  e  a  fé  no  Deus  vivo  que  se  deu a  conhecer.  Os  amigos  de  Jó  reduziram  as  suas  crenças  em  Deus  numa simples  categoria  lógica  e  tentaram  enquadrar  Jó  dentro  dela.  Esse entendimento,  evidentemente,  era  distorcido  e  foi  reduzido  a   uma  mera lógica  natural.  Essa  fé  via  o  Senhor  apenas  como  o  “ Shaddai”,  o  Todo -Poderoso, em vez de “Jeová”, o Deus do pacto. Isso serve de exemplo para apegarmo-nos àquilo que Deus diz, de fato, na sua Palavra em vez de dar crédito a uma lógica distorcida. Só se conhece a Deus naquilo que Ele quis que  o  conhecêssemos.  Para  o  cristianismo,  a  revelação  máxima  de  Deus completou-se em Jesus Cristo.

   Em  quinto  lugar,  fica  o  exemplo  da  perseverança  de  Jó.  Ele permaneceu  firme  e  conscientemente  convicto  da  sua  inocência  mesmo em meio à adversidade. A voz da  consciência, educada como deve ser pelo Espírito  de  Deus  (que,  por  suposto,  estava  presente  quando  o  Senhor interrogava  a  Jó),  não  deve  ser  ignorada.  Da  mesma  forma  que  não ajudamos  quando  ignoramos  a s  necessidades  do  outro,  também  não  nos ajudamos quando ignoramos  a voz de nossa consciência.

   Em  sexto  lugar,  a  lei  do  “olho  por  olho  e  dente  por  dente”,  que  é centrada  na  culpa,  deve  ser  entendida  no  contexto  da  lei  do  amor, tomando  a  graça  como  ponto  de  partida.  Não  há  dúvida de  qu e  há  lugar para  um  julgamento  divino,  visto  habitarmos  em  um  universo   moral. Todavia,  essa  doutrina  pode  ser  usada  erroneamente  e,  em  vez   de restaurar  o  caído,  acaba  bloqueando  o  caminho  da  graça.  No  livro  de  Jó, observa-se que Deus ultrapassa a  lei do “olho por olho e dente por dente” ao  conceder  a  Jó  o  dom  da  sua  doce  presença .  Da  mesma  maneira,  a  doutrina  da  graça  transfere  as  questões  de  teodiceia  da  busca  por  causas passadas  para  a  esperança  de  uma  redenção  futura.  As  questões  de teodiceia  de  Jó  permanecem  sem  resposta,  porém  são  colocadas  em  um contexto  mais  amplo  e  mais  pessoal,  no  qual  não  precisa m  mais  ser formuladas.

   Em  sétimo  lugar,  o  mais   importante  do  livro  de  Jó  não  são  os  seus sermões ou a teologia apresentada, nem tampouco a  crença ortodoxa, nem sequer o caráter reto de Jó. Ainda que tudo isso seja importante, é apenas o reflexo de algo muito maior: o caminhar em comunhão com Deus neste mundo e o poder desfrutar da sua presença. Isso é ilustrado pelo apóstolo Paulo  em  1  Coríntios  12,  quando,  mesmo  através  do  sofrimento,  que  lhe causava um espinho na carne, ele desfrutava de profunda comunhão com Deus.

   Em  oitavo  lugar,  o  livro  de  Jó  transmite-nos   uma  mensagem  de alento  mesmo  em  meio  ao  maior  e  mais  intenso  sofrimento.  Mesmo  que não se saiba quando o sofrimento acabará, fica a mensagem que o Senhor transformará nossas feridas em  louvor. Deus não  prometeu  neste mundo uma  vida livre de sofrimento  — “No mundo  tereis aflições” (Jo 16 .33)  —, nem tampouco que conheceremos todos os  segredos de Deus. Entretanto, Ele prometeu-nos a  sua  graça. Alguns experimentarão cura e  restauração nesta  vida, enquanto  a  recompensa  de outros  será  nos  novos  céus  e  nova terra,  onde  não  haverá  mais  dor,  nem  lágrimas,  nem  tampouco  a  morte (ver Ap 21.1-4).

 Todavia, há graça  aqui e agora para todos nós! 

LIÇÃO 13 - QUANDO DEUS RESTAURA O JUSTO

 A FRAGILIDADE HUMANA E A SOBERANIA DIVINA: o sofrimento e a restauração de Jó

COMENTARISTA: JOSÉ GONÇALVES

 


                   A Restauração de Jó

Introdução

   O escritor português Camilo Castelo Branco fez certa vez  uma  declaração  sobre  a  felicidade  que,  à primeira vista, parece quadrar perfeitamente à história de Jó: “A felicidade vem a troco de lágrimas, como a consolação do salvamento a preço das agonias do naufrágio”.

  Esta conclusão, porém, não  consegue transcender  o  drama  sagrado;  vai  este  além  da  perspectiva meramente humana.  O problema aqui,  como já vimos, não é a felicidade; é o sofrimento do justo. Isto porque o patriarca, quando  feliz, não era feliz; chegando-lhe a infelicidade, começou a entender as bases da felicidade verdadeira. E, agora, não passando de ruínas, depara-se com a felicidade das felicidades: o encontro experimental com Deus.

   Neste capítulo, veremos como o Senhor vira-lhe o cativeiro, transformando-o num dos mais bem-aventurados homens  de todos  os  tempos.  As provações,  de  que fora alvo, tiveram sobre a sua vida um efeito maravilhoso: conduziram-no a viver uma sublime comunhão com o Senhor.

    O mesmo haverá de acontecer com você. Se o sofrimento hoje parece-lhe estranho, amanhã os resultados que deste haverão  de  advir tornar-se-ão  bem  familiares;  todas  as  coisas concorrem para o bem daqueles que amam a Deus.

   Vejamos, pois, como o Senhor vira o cativeiro  daqueles que lhe são caros.

L A Profunda Humilhação de Jó

   Com profunda e singular humilhação, o melhor dos homens daquela época, ouviu dois pronunciamentos que, judiciosamente,  apontaram-lhe  as  falhas:  o  discurso  de  Eliú  e  o monólogo do Todo-Poderoso. Jó, em momento algum, se exaspera. Agora tem ele certeza de estar sendo provado; na economia divina sempre é possível melhorar o que já é perfeito (Dt18.13; Pv 4.18; M t 5.48; Ef 4.13).

   Sem humilhar-se diante do Senhor, como poderá o homem obter o tão almejado crescimento  espiritual? Todos os heróis da fé, quer do Antigo, quer do Novo Testamento, seja da história da Igreja Cristã, seja das crônicas eclesiásticas, hu- milharam-se de tal forma ante o Supremo Ser, que vieram a obter um inefável encontro com Deus.

I.  O valor da humildade na experiência do crente.

   Realçando o valor da humildade na vida do crente, Agostinho é categórico: “Foi o orgulho que transformou anjos em demônios; é a humildade que faz homens serem como anjos”. Ali estava um homem que, através de todos os seus sofrimentos e agruras, achava-se prestes a fazer-se não um anjo, mas alguém melhor do  que os seres  angélicos. Aliás,  que anjo,  por mais poderoso e excelso, teve a experiência de um homem como Jó? Não afirmou Thomas Brooks que os homens mais santos são sempre  os  mais  humildes?  De  um homem  íntegro  como  o patriarca, a humildade não é um mero adorno; é-lhe algo inerente. Atentemos, pois, a confissão que este homem paciente e comprovadamente humilde faz ao Senhor.

2.  A confissão de Jó.

  O que  resta,  agora,  ao patriarca? Não obstante ser tido como um dos três homens mais perfeitos de todos os tempos, confessa Jó a sua falta, e reconhece a sua pequenez diante da imensidade de Deus:  “Por isso,  me abomino e me arrependo no pó e na cinza” (Jó 42.6).

  Ora,  que  pecado  cometera Jó para fazer tal confissão? Não  fora  ele  testado  de  todas  as  maneiras,  e  de  todos  os modos, provado? Por que semelhante confissão? E que somente nesta quadra de sua vida vem a reconhecer plenamente a soberania divina; qual barro nas mãos do oleiro, coloca- se ele à disposição do Senhor. J. I. Pacter, após haver discorrido sobre a humildade na vida do crente, escreve:  “Só depois que nos tornamos humildes e ensináveis e permanecemos extasiados diante da santidade e soberania de Deus, reconhecendo nossa pequenez, desconfiando dos nossos pensamentos  e desejando  ter a mente humilhada,  é  que podemos adquirir a sabedoria divina”.

    O que J. I. Packer quis aqui enfatizar é que o avivamento espiritual leva o homem a agir com profunda humildade diante do Todo-Poderoso. Sem este mover do Espírito, o crente jamais abrirá o  coração,  convidando venha o Senhor Jesus e nele faça morada. Pelo relato deste último capítulo de Jó, concluímos ter o patriarca experimentado um grande e poderoso reavivamento, pois  o  Senhor fez uma obra maravilhosa não somente em sua vida, como também na vida de sua esposa e na vida de seus amigos.

   F. B. Meyer assim comenta a experiência de Jó: “Em total submissão, Jó curvou-se diante de Deus, confessando sua ignorância e admitindo que tinha falado levianamente de coisas que não compreendia. Ele tinha replicado aos amigos que era tão bom quanto eles, mas agora confessava, que era o principal dos pecadores  como depois iria fazer o apóstolo Paulo. Uma coisa é ouvir falar sobre Deus, outra é vê-lo e conhecê-lo de perto. Bem que podemos abominar nossas orgulhosas palavras e arrepender-nos no pó e na cinza”.

   Sim, o que diria você ao ouvir tal confissão de um homem que era a mesma perfeição? De um homem, cuja integridade era reconhecida e avalizada até pelo próprio Senhor? Sim,  era Jó um homem perfeito. Mas, diante de Deus, quão imperfeitas são as  nossas  perfeições.  Diante  daquEle  que  é infinito  em  suas perfeições, o perfeito sempre poderá se aperfeiçoar; o bom sempre poderá melhorar (Fp 3.12; Cl 1.28). Jó o sabia muito bem.

3.  Ouvindo  e vendo  a  Deus.

   Jó  teve  de  se  calar  para compreender a natureza de seu sofrimento; e, perfeitamente, compreendeu-a.  Infelizmente,  muitos não logram o  mesmo entendimento, pois  ainda não  aprenderam a ouvir a voz  de Deus  (Hb  3.7,8).  Oram, mas não  lhe ouvem a resposta (Is 42.20). Com os seus murmúrios, acabam por encobrir a voz de Deus (SI 106.25).Primeiro ouviu Jó a voz de Deus; depois, seus olhos passaram a vê-lo (Jó 42.6). Até este momento, a fé que o patriarca professava em Deus, conquanto sublime e singularíssima, ainda era  intelectual.  Mas,  agora,  que os  seus  olhos vêem o Todo- Poderoso, começa a ter um conhecimento experimental do Senhor.

    Como é a sua fé? Intelectual? Ou experimental? O Senhor deseja que você o conheça integralmente (Os 6.1-3). Não são poucos os cristãos que ostentam uma fé meramente intelectual  em  Deus.  Sabem  que  o  Supremo  Ser  existe,  e  que Jesus Cristo  é o  único  e suficiente Salvador  da humanidade.  Seu conhecimento das coisas espirituais, todavia, jamais transcendeu o campo do intelecto. J. Blanchard afirmou com toda a razão que a fé que não vai mais longe do que a cabeça nunca pode trazer paz ao coração. O mesmo autor acrescenta que, onde a razão fracassa, a fé pode descansar.

    A fé que  ainda não  transcendeu o  intelectualismo,  por mais  correta,  por mais  ortodoxa,  e por mais  bíblica que se exiba, acabará por cair na apostasia. Haja vista o que aconteceu na Alemanha. Após a morte de  Lutero,  os herdeiros  da Reforma fecharam-se em suas escolas, pondo-se a estudar racionalmente as bases do Cristianismo. Não que isto seja errado.  Afinal,  a  fé  cristã é  mais  forte e mais  alta que  a razão humana. No entanto, os escolásticos alemães, ao invés de se porem  a buscar um novo  avivamento  espiritual,  passaram  a criticar a fé cristã. E foi assim que surgiu o liberalismo teológico, que acabou por lançar a Alemanha numa das piores fases de sua história. E foi justamente esta falha que abriu as portas aos nazistas assumirem o comando daquele país que, um século antes, era conhecido como a Atenas da Europa.

   Não se conforme com uma fé meramente intelectual. Conheça o Senhor de forma experimental, a fim de usufruir-lhe todas as bênçãos. O patriarca Jó teve de passar por todo aquele crisol a fim de experimentar quão maravilhoso era o Senhor.

  EL Intercessão e Restauração

   A prova a que Jó foi submetido não serviu apenas para si; foi também imprescindível aos seus amigos que, a partir daquele momento, pôr-se-iam a encarar as coisas divinas de maneira correta. Se até então pensavam eles que o Senhor haveria de se contentar com boas obras, ou com um simples relacionamento mercantil,  a partir de  agora terão  de se conscientizar de que Deus busca a nossa verdadeira adoração. O que mais lhe agrada em seus servos é um coração sincero e amável; um coração que, em seu abatimento, está sempre prestes a exaltar-lhe o nome.

   Na verdade, o sofrimento de Jó trouxe um grande aviva- mento a todos os que o cercavam. E os seus amigos, posto que molestos,  também foram alvo  das  misericórdias  do  Senhor. Portanto, a prova a que você está sendo submetido redundará num maravilhoso despertamento espiritual a todos que o rodeiam. Por isso, não se irrite com os seus amigos; ore por eles; interceda por eles.

  O Senhor dirige-se, neste momento, aos três amigos de Jó, e gravemente os repreende:

I.  Deus  repreende os  amigos  de Jó.

  “A minha  ira  se acendeu contra ti, e contra os teus dois amigos; porque não dissestes de mim o que era reto, como o meu servo Jó. Tomai, pois, sete bezerros e sete carneiros, e ide ao meu servo Jó, e oferecei holocaustos por vós, e o meu servo Jó orará por vós; porque deveras a ele aceitarei, para que eu vos não trate conforme a vossa loucura; porque vós não falastes de mim o que era reto como o meu servo Jó” (42.7,8).

   Desta advertência de Deus,  podemos  ver alguns  fatos bastante interessantes quanto à atuação de Jó. Em primeiro lugar, teria ele de agir como sacerdote. Quantas pessoas não estão necessitando de nossas orações! E, não raro, deixamos de lado nossas obrigações sacerdotais. No Antigo Testamento,  temos  além  de  Jó,  dois  outros  grandes  intercessores: Moisés  e  Samuel.  E  ambos  tiveram  sua  qualidade  como intercessores reconhecida (Jr  15.1). Samuel, aliás,  considerava um grave pecado  deixar de  interceder pelo  povo:  “E, quanto  a mim,  longe  de  mim  que  eu  peque  contra o  SENHOR,  deixando  de  orar por  vós;  antes,  vos  ensinarei  o caminho bom e direito” (I Sm  12:23).

2.  O sacerdócio de Jó.

 Mesmo em frangalhos, e mesmo não passando de ruínas, deveria Jó, naquele momento, atuar como sacerdote daqueles que muito o feriram com suas palavras.  Que  incrível  semelhança  com  o  Senhor Jesus  Cristo! Nosso  Salvador,  embora  tenha  sido  retratado  pelo  profeta como alguém desprovido de parecer e formosura, intercedeu por nós pecadores (Is 53.2,3,12). Se este retrato que o profeta revela do Senhor parece forte, o que diremos da pintura que do mesmo Salvador faz Davi:  “Mas eu sou verme, e não homem, opróbrio dos homens e desprezado do povo” (SI 22.6)?

  No auge da angústia, Jó era mui semelhante ao Senhor Jesus. Mas  quão  distante achava-se ele da glória exterior do sacerdócio  araônico! No  entanto,  caber-lhe-ia orar por seus amigos,  e  por seus  amigos  oferecer  os  sacrifícios  prescritos pelo Senhor.

  Tem você orado por seus amigos? Tem jejuado por eles? Ainda  que  estes  o  firam com palavras  e  atos,  não  deixe  de apresentá-los  diante  do  Senhor.  Intercedendo  pelos  que  o magoam, será mudado o seu cativeiro. Muitos crentes não são restaurados, porque não aprenderam ainda o valor da oração altruística e sacrificial; esta é a oração, na qual o filho de Deus, esquecendo-se  si,  lembra  ao  Pai  aqueles  que  suspiram  pelo aconchego dos irmãos.

 III. A Restauração de Jó

  Eis que o Senhor põe-se a virar o cativeiro de Jó; restaura- o integralmente. Se tudo ele perdera por completo e de uma só  vez,  de  forma duplicada  o Senhor o  abençoa.  Se  aquela tribulação não lhe tivesse sobrevindo, como se haveria diante daqueles que, latentemente, já lhe minavam a resistência espiritual e a harmonia do lar? Por conseguinte, temos de encarar como bênção as provações que o Senhor permite venham sobre nós. Por mais duras e aparentemente implacáveis, representam elas uma porta de escape. Cortland Myers, pondo-se a falar sobre a utilidade das  provações  na vida do  crente,  faz uma solene advertência: “Algum dia Deus revelará a cada cristão o fato de que as coisas contra as quais nos rebelamos foram os instrumentos que ele utilizou para aperfeiçoar e modelar nossos caracteres”.

   A essas alturas de sua prova, já sabia o patriarca por que houvera passado por todas aquelas dificuldades. E Deus, que o conduzira ao crisol, leva-o agora à bonança, virando-lhe o cativeiro.

I.  O cativeiro cativado.

   “E o SENHOR virou o cativeiro de Jó, quando orava pelos seus amigos; e o SENHOR acrescentou a Jó outro tanto em dobro a tudo quanto dantes possuía” (Jó 42.10).

  O Senhor virou o cativeiro de Jó. O que significa exatamente  esta  expressão?  Que  o Senhor Deus,  em sua infinita misericórdia, tornou cativo o cativeiro de Jó. Lembra-nos isto a triunfante ressurreição de Cristo: “Subindo ao alto, levou cativo o cativeiro e deu dons aos homens” (Ef 4.8). Eis por que, no momento mais agudo de sua provação, confessou o patriarca: “Porque eu sei que o meu Redentor vive, e que por fim se levantará sobre a terra” (Jó 19.25). Levantando-se o Redentor de Jó de sobre a terra, todo o cativeiro deste foi mudado; Ele levou cativo o seu cativeiro”. Diz o hebraico: Iavé shav et-shavit Iov. Sim, o Senhor cativou o cativeiro de Jó.

   Virando-lhe o cativeiro, pôs-se o Senhor a restaurar completamente o patriarca. Juntamente com o avivamento espiritual, veio também a restauração mais que duplicada de tudo o que o patriarca perdera.

2.  Restauração espiritual.

   Humilha-se Jó, reconhecendo a sua pequenez:  “Bem sei eu que tudo podes, e nenhum dos teus pensamentos pode ser impedido. Quem é aquele, dizes tu, que sem conhecimento encobre o conselho? Por isso, falei do que não entendia; coisas que para mim eram maravilhosíssimas, e que eu não compreendia. Escuta-me, pois, e eu falarei; eu te perguntarei, e tu ensina-me. Com o ouvir dos meus ouvidos ouvi, mas agora te vêem os meus olhos. Por isso, me abomino de me arrependo no pó e na cinza” (Jó 42.6).

   Jó reconhece a soberania divina. Por conseguinte, não lhe caberia questionar a Deus acerca da prova a que fora submetido. Não era Jó o barro? E Deus? Não era o Oleiro? Então que o barro se entregasse inteiramente ao Oleiro; Ele sabe o que está fazendo. E se Deus pode todas as coisas, nenhum de seus desígnios será impedido. Ele faz o que quer. Isto não significa, porém, que Deus fará alguma coisa que contrarie a sua natureza justa e santa. Sendo Ele amor, tudo fará a fim de que todas as coisas concorram para o bem daqueles que o amam.

    .Se antes possuía Jó uma fé meramente intelectual, agora já tem um encontro experimental com o Senhor. Antes, conhecia a Deus só de ouvir; agora os seus olhos o vêem. Que experiência maravilhosa! Sim,  agora,  os meus olhos o vêem: atab eini raateka.

  Antes Jó falara do que não entendia, mas agora emudece diante das maravilhas que o Senhor lhe mostra. E se o patriarca não houvera sido submetido a todo aquele crisol? Com o passar dos tempos, poderia perder até mesmo a confiança no Senhor.  Compreendendo  os planos de Deus, humilha-se Jó diante do Senhor. Eis o homem restaurado. Tudo começa quando nos humilhamos diante de Deus.

  A restauração material de Jó era apenas um pequeno detalhe naquela obra que o Senhor realizava em sua vida. Infelizmente, não são poucos os que, no crisol divino, preocupam-se muito mais com o passageiro do que com o eterno. Não podemos nos esquecer que, buscando o Reino de Deus, as outras coisas nos são automaticamente acrescentadas.

3.  Restauração material.

   O Senhor acrescentou a Jó outro tanto em dobro a tudo quanto dantes possuía: “E, assim, abençoou o SENHOR o último estado de Jó, mais do que o primeiro; porque teve catorze mil ovelhas, e seis mil camelos, e mil juntas de bois, e mil jumentas” (Jó 42.12,13).

  Mesmo hoje seria Jó considerado um homem mui rico. Se antes da provação, era já considerado o maior do Oriente, agora torna-se um dos  varões mais  poderosos  do terra. Na vida de Jó, a prosperidade não era uma teologia; era uma devoção amorosa e sacrificial; algo que lhe fazia parte da mordomia com a qual servia a Deus e ao próximo.

4. Restauração social de Jó.

   Os que desprezaram a Jó, estando este na angústia, agora presenteiam-no como se fora ele um príncipe:“

   Então, vieram a ele todos os seus irmãos e todas as suas irmãs e todos quantos dantes o conheceram, e comeram com ele pão em sua casa, e se -condoeram dele, e o consolaram de todo  o mal que o SENHOR lhe havia enviado;  e cada um deles lhe deu uma peça de dinheiro, e cada um, um pendente de ouro” (Jó 42.11).

   Jó,  agora,  é  exaltado  diante  de  todos  os  seus  amigos  e parentes. Vêm estes e trazem-lhe suas dádivas. E, assim, pôde ele recompor o seu patrimônio e reconstruir a sua vida econômica. Deus jamais  nos abandona.  Aliás, usa Ele  os  que nos abandonaram, a fim de que nos acolham.

 5. Restauração doméstica de Jó.

  Embora a Bíblia não o revele, a esposa de Jó veio a se converter ao Senhor, fazendo-se partícipe de toda a ventura do esposo. E se este, no auge do desespero, houvera despedido a mulher? Seria inconcebível uma vida espiritual restaurada sem um lar plenamente refeito.

   A mulher que antes fora contada entre as loucas,  arrependeu-se de seus pecados, passou a respeitar o esposo e a este consolou com dez maravilhosos filhos:  “Também teve sete filhos e três filhas. E chamou o nome da primeira, Jemima, e o nome da outra, Quezia, e o nome da terceira,  Quéren- Hapuque” (Jó 42.13,14). Acrescenta o escritor sagrado que, em toda a terra, não havia mulheres tão belas quanto as filhas de Jó.

  Querido irmão, não permita seja o seu lar destruído. Lute por sua esposa e filhos; reconstrua o seu casamento. Nenhuma restauração é possível sem um lar forte e bem constituído.

6.  Restauração histórica de Jó.

   O homem que fora tão caluniado por Satanás, tão incompreendido pela esposa e tão acusado  pelos  amigos,  entra agora  para  uma  exclusivíssima galeria; é posto entre os três mais piedosos homens de todos os tempos:  “Ainda que Noé, Daniel e Jó estivessem no meio dela, vivo eu, diz o Senhor JEOVÀ, que nem filho nem filha eles  livrariam, mas  só livrariam  a sua própria alma pela sua justiça” (Ez 14.20). Pode haver maior honra do que esta?

  Deus  não permite fiquem os  seus  servos  sem  a  devida honra; reabilita-os a fim de que todos venham a glorificar-lhe o nome. Se você tem sido caluniado por Satanás; se os amigos já não o tem em consideração, não se preocupe. Nós temos um Deus que tudo fará para colocar-nos num lugar de honra e destaque.

                          Conclusão

  Afirmou um crítico literário, certa vez, que dois são os defeitos  do Livro de Jó. O primeiro é que o antagonista da história — Satanás — sai de cena ainda no prólogo. E o segundo é que, diferentemente dos dramas gregos, romanos e ingleses, a história de Jó tem um final feliz. Não obstante, acrescenta o crítico, o Livro de Jó é o mais belo poema de todos os tempos.

  O que os críticos seculares classificam de defeito, nós chamamos de perfeição. Pois, de uma forma magistral,  o autor sagrado pôde conduzir o drama de Jó sem a presença do adversário. E se o Livro de Jó é concluído com final feliz, é por que se manteve com absoluta fidelidade aos fatos. Se os gregos, romanos e ingleses não se afeitam aos finais felizes, os que servimos a Deus sabemos que, apesar das intempéries, sempre haverá um final surpreendentemente  venturoso  àqueles  que confiam nas promessas do Pai celeste.

   Conforte-se na história  de Jó! Se  as  suas  angústias  são grandes, maiores ser-lhe-ão as consolações. De toda essa provação,  sairá  alguém  bem  melhor.  Em  sua história,  também haverá um final feliz.

   E não se esqueça: “Orando também juntamente por nós, para que Deus nos abra a porta da palavra, a fim de falarmos do mistério de Cristo” (Cl 4.3).

  A Deus toda a glória! Aleluia!

             COMENTÁRIO DE JÓ CLAUDIONOR DE ANDRADE

 

                           

FELIZ 2021
                                         

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