terça-feira, 29 de dezembro de 2020

Lição 01 - João Batista, o Precursor do Nazareno

 


                        TEXTO BÍBLICO BÁSICO

Mt 3.1-4,6; Lc 3.15-18

1- E, naqueles dias, apareceu João o Batista pregando no deserto da Judéia,

2- E dizendo: Arrependei-vos, porque é chegado o reino dos céus.

3- Porque este é o anunciado pelo profeta Isaías, que disse :Voz do que clama no deserto: Preparai o caminho do Senhor, Endireitai as suas veredas.

4- E este João tinha as suas vestes de pelos de camelo, e um cinto de couro em torno de seus lombos; e alimentava-se de gafanhotos e de mel silvestre.

6- E eram por ele batizados no rio Jordão, confessando os seus pecados.


15- E, estando o povo em expectação, e pensando todos de João, em seus corações, se porventura seria o Cristo,

16- Respondeu João a todos, dizendo: Eu, na verdade, batizo-vos com água, mas eis que vem aquele que é mais poderoso do que eu, do qual não sou digno de desatar a correia das alparcas; esse vos batizará com o Espírito Santo e com fogo.

17- Ele tem a pá na sua mão; e limpará a sua eira, e ajuntará o trigo no seu celeiro, mas queimará a palha com fogo que nunca se apaga.

18- E assim, admoestando-os, muitas outras coisas também anunciava ao povo

TEXTO ÁUREO

No dia seguinte, João viu a Jesus, que vinha para ele, e disse: Eis o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo.

João 1.29

Palavra introdutória

Ao menos três três personagens neotestamentários são identificados como João: o apóstolo (autor de um dos evangelhos); João Marcos (sobrinho de Barnabé) e João Batista (apontado como o percursor do Messias).

João Batista, um dos mais destacados personagens do Novo Testamento, foi o homem designado por Deus para introduzir o ministério terreno de Cristo Jesus, e ele o fez com dignidade e grandeza.

COMENTARIO

OBJETIVOS

Entender que João Batista prenunciou o fim da Lei e dos profetas e anunciou o Reino de Deus; conhecer as principais características de um dos mais influentes personagens bíblicos; compreender que Deus confia grandes tarefas a pessoas corajosas e humildes; saber que ser fiel ao Senhor, algumas vezes, pode resultar no sacrifício da própria vida.

CONCLUSÃO

Em JOÃO 1.6, está escrito que houve um homem enviado de Deus, cujo no e era João. Está expressão assegura a autenticidade espiritual do ministério desse grande homem, que a nós serve de exemplo. Devemos dar graças a Deus por sua existência e excelência de seu ministério.

No entanto, recordamos a maravilhosa superioridade de Jesus Cristo sobre João Batista:

Jesus é a palavra, João Batista era um mensageiro;

Jesus é eterno, João Batista era temporal;

Jesus é a luz, João Batista era um anunciador da Luz;

Jesus é Deus, João Batista foi enviado por Ele;

Jesus é a vida, João Batista era um agente proclamador da vida;

João Batista morreu e foi sepultado por seus discípulos, Jesus ressurgiu como Salvador da humanidade.

Deus abençoe

sua vida!


HERÓIS DO NOVO TESTAMENTO- UM LEGADo

- Pr. Geziel Gomes:

(Revista: Central Gospel)



                     João Batista, o precursor do Nazareno

O nome João Batista em hebraico significa favor de Deus. E existe lógica em receber tal nome. Ele foi um dos mais influentes personagens bíblicos, prenunciou o fim da Lei e dos profetas e anunciou o Reino de Deus, é personagem único no plano divino através dos séculos - o último profeta na antiga aliança, portanto, o preparador para o tempo do Reino, para a entrada da nova dispensação, a Dispensação da Graça.

O nascimento e a infância

Não se sabe qual o sentido exato da palavra que indica o grau de parentesco entre Maria e Isabel.  Algumas versões traduzem por prima (ARC; AFC) e outras por parenta (ARA; NVI). Aceita-se que João Batista e Jesus Cristo eram primos em algum grau (Lucas 11.34-36; 56, 57).

João teve um dos nascimentos mais espetaculares narrados nas Escrituras Sagradas. Seus pais, Zacarias Izabel já eram idosos, não tinham nenhuma perspectiva humana para que ele nascesse, pois sua mãe era mulher estéril (Lucas 1.5). Ambos oravam ao Senhor a respeito dessa situação e pediam um filho. Zacarias era sacerdote, e durante um momento em que ministrava, o anjo Gabriel apareceu e anunciou as orações seriam atendidas por Deus e o casal teria um filho. Zacarias pareceu duvidar da promessa do Senhor e pediu um sinal, foi repreendido e castigado com a perda da fala até que João Batista fosse circuncidado (Lucas 1.11-18, 20, 59-64).

Com certeza, o anúncio que João Batista viria a nascer foi motivo de muitíssima alegria, pois na cultura judaica era vergonhoso para a mulher ser incapaz de dar à luz, e de não conceber ao menos um menino (Salmo 113.9; 1 Timóteo 2.14-15; Gálatas 4.27).

O período de sua infância na região montanhosa de Judá,  e na fase adulta permaneceu no deserto até começar suas atividades como profeta em Israel (Lucas 1.39, 40, 80).

Enquanto João Batista estava no útero de Isabel, o anjo Gabriel foi enviado a Maria, a mãe de Jesus, para anunciar a ela que Jesus Cristo também nasceria (Lucas 1.26-27).

Viveu de maneira muito semelhante a Elias, outro importante personagem bíblico. O modo como os dois viveram era rústico, vestiam-se com túnica de pele de camelo (2 Reis 1.8; Mateus 3.4). Nos dias atuais, nômades e árabes pobres usam roupas com o mesmo aspecto.

Além da roupa, João também se alimentava rusticamente, comia gafanhotos e bebia mel silvestres que eram encontrados no deserto (Levíticos 11.22; Deuteronômio 32.13; 1 Samuel 14.25-29). Ainda hoje, na Arábia Palestina, Etiópia, e outras regiões do Oriente, é comum a parte mais pobre da sociedade servir-se de mel e gafanhotos como alimento principal.

Há fortes indícios de que João Batista tenha habitado na região de Qumram, onde foram encontrados na década de 1940 importantes manuscritos do Mar Morto.
Cogita-se, mas não é possível afirmar que tenha havido ligação entre João Batista e os essênios, grupo de judeus que exerciam forte influência religiosa na vida de Israel. Apesar de os essênios não serem mencionados nas Escrituras, é certo afirmar que eram considerados monges na geração em que o profeta viveu.

O ministério de João Batista marcou o fim de um tempo bíblico, foi o último dos profetas da antiga aliança, abriu o advento de um novo período na história da humanidade, que é a Dispensação da Graça (Lucas 16.16).

A personalidade 

Jesus Cristo comparou João Batista ao profeta Elias, porque ambos combateram tenazmente a hipocrisia, a desonestidade, e a maldade praticada em sua geração. Consecutivamente, Elias enfrentou Acabe e João Batista a Herodes (Mateus 17.11-13).

O perfil de João Batista é um exemplo de abnegação, renúncia e serviço. Os pontos áureos do ministério dele não são considerados gloriosos pelos padrões das biografias desse mundo. É descrito como um homem de pouca diplomacia pelos evangelistas. Era austero, sério, e demonstrava ser indivíduo corajoso diante de ameaças e atitudes contrárias às orientações de Deus. Não usava meias palavras e tinha posicionamentos veementes contra atitudes que entendia ser pecado e imoralidade (Mateus 14.4).

Com integridade e valentia, recusou-se a batizar aqueles que vinham até ele sem demonstrar arrependimento. Denunciou Herodes Antipas por ser homem mau, protestou contra o casamento dele com Herodias, disse que o casamento era ilícito pois vivia com sua cunhada, esposa de Filipe (Mateus 3.7; 14.4; Marcos 6.17-19; Lucas 3.7, 19).

O ministério

O anjo Gabriel descreveu a finalidade de seu ministério, informou que ele foi escolhido por Deus para introduzir o ministério terreno de Jesus Cristo, preparando o povo para a vinda de Jesus. E o profeta conscientemente cumpriu sua missão (Lucas 1.14-17; João 1.19-34). Foi proferida por ele a expressão contundente: "Eis o Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo" (João 1.29).

A descrição que os evangelhos fazem sobre o ministério de João Batista é curta.  Mateus, Marcos e Lucas estão plenamente alinhados ao descrever sua mensagem principal: arrependimento, seus seguidores ao ouvi-lo eram tomados  por forte quebrantamento e contrição.

As narrativas do ministério de João iniciaram com relatos de sua administração nos rituais de batismo nas águas do rio Jordão. Em todo o tempo, esclarecia que batizar era menção ao sacrifício redentor de Cristo. A cena de sua atuação batizando impactou sua geração, pois cunhou-se dizer "o batismo de João". Há referência sobre suas atividades nos rito do batismo nos evangelhos e no Livro Atos dos Apóstolos (10.37; 11.16; 13.24; 19.3).

Ele pregava de forma intensa: exortava a todos para mudarem o estilo de vida; apontava publicamente para Cristo como superior a ele; denunciava abertamente o pecado dos religiosos fariseus; anunciou o sacrifício e eternidade de Cristo; e sobre a atuação do Espírito Santo na Dispensação da Graça (Mateus 3.2, 7-8, 11, Lucas 3.8; João 1.15, 29, 33, 36).

As diferenças entre João Batista e Jesus Cristo

Jesus é a Palavra, João Batista era um mensageiro;
Jesus é eterno, João Batista era temporal;
Jesus é a luz, João Batista um anunciador da luz;
Jesus é a vida. João Batista era uma anunciador da vida;
Jesus morreu e ressurgiu da sepultura como Salvador da humanidade, João Batista morreu e foi sepultado por seus discípulos.

Conclusão

Deus confia grandes tarefas a pessoas corajosas e humildes.
Algumas vezes João Batista foi confundido com o Messias, confusão que poderia inflar seu ego  não foi uma dificuldade, pois esclareceu que não era (Mateus 14.1-2; 16.13-14; Marcos 6.14; 8.27-28). Após relutar em batizar Jesus porque se considerava inferior a Ele e entender que deveria fazer isso para cumprimento das Escrituras, Jesus começou a pregar e os discípulos de João deixaram de acompanhá-lo para segui-lo. Ele não se ressentiu: "Importa que ele cresça e eu diminua" (João 3.22-30).

Ser fiel ao Senhor pode resultar em grande sacrifício. O zelo de João Batista foi cruelmente castigado, pois Antipas encerrou-o em um calabouço da fortaleza de Machaerus, em uma das regiões mais  agrestes da Peréia meridional, ao oriente do Mar Morto, onde não demorou para ser decretada sua morte por decapitação, ordem de Herodes, e sepultado por seus discípulos (Lucas 3.19-20).
Jesus Cristo declarou que entre os nascidos de mulher João Batista foi o maior (Mateus 11.11; Lucas 7.28).

E.A.G.
__________

O artigo contém compilações de Lições da Palavra de Deus, ano 9, edição nº 36, cujos comentários são assinados pelo Pr. Gesiel Gomes. Revista publicada pela Editora Central Gospel, referente ao 4º trimestre de 2013.



                 JOÃO BATISTA, O PRECURSOR DO NAZARENO

Esboço

1.  Caracterização Geral

2.  Família e Começo de Vida

3.  Fontes Informativas

4.  Ministério e Mensagem de João Batista

5.  Elias Redivivo

6.  João Batista e Jesus

7.  Seguidores de João Batista

8.  Morte de João Batista

Bibliografia

1. Caracterização Geral

a. O PrecursorJoão, filho de Zacarias (que era sacerdote) e de Isabel (igualmente de ascendência sacerdotal), foi o precursor de Jesus, o Cristo. As datas de seu nascimento e da inauguração de seu ministério público não podem ser determinadas com precisão. As sugestões variam de 8 a 4 A.C., quanto ao seu nascimento, e de 26 a 28 D.C., quanto ao início de seu ministério público. Lucas informa-nos que João Batista nasceu quando seus pais eram ambos de avançada idade. No evangelho de Lucas temos a bela visão de Zacarias, que mostrou que João seria um vaso especial para servir ao Senhor. Ele nasceu na região montanhosa da Judéia, – onde também passou os primeiros anos de sua vida. Isabel, sua mãe, era parenta (talvez prima) de Maria, mãe de Jesus. João vivia como um asceta, segundo se vê em Mat. 3:4. Vestia-se de maneira similar à de Elias (11 Reis 1:18).

Alguns estudiosos pensam que João Batista era: a reencarnação de Elias; mas outros, mais acertadamente, dizem que ele meramente cumpriu um ministério como o de Elias. Ou alguém que ministrava no poder e espírito de Elias. João Batista era uma voz no deserto, que conclamava os homens ao  arrependimento, para que eles se voltassem para o Cristo, o Cordeiro de Deus (João 1:23,29). Foi o Batista quem preparou o núcleo inicial dos discípulos de Jesus, os quais, finalmente, se tornaram seus seguidores, quando chegou o tempo aprazado para isso.

b. A Mensagem de João Batista. Essa mensagem tinha como ênfase principal a necessidade de arrependimento, a breve inauguração do Reino de Deus à face da terra, e o iminente aparecimento do Messias, que haveria de julgar, purificar e unificar o povo de Deus. João Batista identificou Jesus como o Messias prometido, embora pareça ter hesitado quanto a essa identificação, pelo menos durante algum tempo, quando, sofrendo no cárcere, e sob forte desapontamento, chegou a duvidar (Mar. 11:3).

c. O Batismo de Jesus por João. Entre os que vieram receber o batismo de João, achava-se o próprio Jesus, que quis assim identificar-se com o grupo separado daqueles que buscavam fervorosamente o reino de Deus . Foi nessa oportunidade que João declarou enfaticamente que Jesus era o Messias. Ver Mat. 3: 13-15.

d. Um Extenso MinistérioSabemos que o ministério de João Batista não se confinou ao vale do Jordão, O trecho de João 3:23 mostra-nos que ele deixou aquele local e, por algum tempo, pregou batismo de arrependimento em Enom, perto de Salim, onde havia muita água para imergir os penitentes. W.F. Albright (The Archeology of Palestina) diz que esse lugar ficava a sudeste de Nablus, perto das cabeceiras do wadi Far’ah, em território samaritano. Depois disso, João retornou ao território governado por Herodes Ântipas, provavelmente a Peréia. Acabou despertando a hostilidade de Herodes Ântipas, e mais ainda de sua segunda esposa, Herodias, ao denunciar que o casamento deles era ilícito, porquanto ela era esposa de um irmão dele. Por esse motivo, João foi encarcerado na fortaleza de Maquero, na Peréia; e, poucos meses mais tarde, foi executado. Ver Mat. 14:1-12 quanto a essa narrativa.

e. João Batista e os EssêniosOs eruditos comumente têm-feito a ligação entre João Batista e os essênios. Os seus hábitos ascéticos e os locais onde ele costumava pregar, perto de onde os membros daquela seita se localizavam, bem como as afinidades entre João Batista e os manuscritos do mar Morto, encontrados em Qumran, chegam quase a confirmar essa pura especulação. Um grupo de ascetas essênios residia na margem noroeste do mar Morto; e tanto João Batista como os membros dessa seita residiam no deserto da Judéia; ambos tinham um caráter nitidamente sacerdotal; ambos davam ênfase ao batismo em água como sinal de purificação interna; ambos ensinavam um iminente juizo divino; ambos apelavam para Isaias 40:3 como a autoridade para suas missões. Os eruditos, pois, até hoje continuam a debater essa possível conexão entre o Batista e os essênios. Mas, se porventura João em algum tempo fez parte do grupo, então é certo que ele ultrapassou em muito as limitações do ..,grupo e tornou-se líder de um movimento distinto. E mesmo possível que, bem antes de iniciar- seu ministério, o Batista tivesse tido ligações com eles; o fato, porém, é que o movimento de João Batista nada tinha a ver com os essênios. Em Qumran, o batismo era um rito de iniciação; mas João universalizou a imersão, tornando o sinal daquele movimento que em breve acolheria ao Messias. A mensagem do Batista dirigia-se à nação inteira de Israel. Ele não falava em nenhuma seita separatista e exclusivista. O batismo de João tornou-se uma espécie de ato escatológico, a declaração em favor da crença em um apocalipse que em breve se manifestaria.

f. João, ImersorTanto o Novo Testamento (no grego), quanto Josefo, chamam João Batista por esse nome. A imersão em água era um elemento essencial e básico em seu ministério. Essa imersão ou batismo era o sinal de arrependimento e de aceitação da mensagem de João como precursor do Messias. Preparava as pessoas para um discipulado sério e especial. Ver Josefo (Anti. 18.5,2).

g.O Movimento de João Batista. João era homem dotado de grande poder e influência. Os evangelhos acharam por bem mostrar que ele mesmo não era o Messias, e que ele não tinha quaisquer ambições messiânicas. Ver João 1:19-28. E o trecho de Atos 18:25 mostra-nos que o movimento de João Batista teve prosseguimento mesmo após a formação da Igreja cristã. Ver também Atos 19:1-7. A obra intitulada Reconhecimentos Clementinos sugere que o movimento continuou e que chegou a entrar em conflito com grupos cristãos. Alguns estudiosos têmafirmado que a comunidade dos mandeanos  que até hoje sobrevive, teve suas origens nomovimento de João Batista; porém, nada de certo se pode afirmar quanto a esse respeito.

h. Reconhecimentos ClementinosEntre a literatura que alegadamente procedeu da pena de Clemente de Roma (embora isso não seja verdade), temos as Homilias que, presumivelmente, preservam os ensinos e os sermões de Clemente de Roma. Também existem dez livros chamados Reconhecimentos Clementinos. Esses volumes, alegadamente, oferecem-nos informes históricos associados a Clemente, com grande abundância de ensinamentos. Entretanto, ambas  essas obras parecem mais ter-se originado entre os gnósticos judeus, datando de algum periodo da porção final do século li D.C. Mas, embora esse material não seja genuinamente clementino, não há razão alguma para duvidarmos que contém alguns informes históricos genuínos, como aquele que diz que o movimento gerado por João Batista continuou até o fim do século II D.C.

2. Família e Começo de Vida

João Batista era filho do sacerdote Zacarias, que pertencia ao turno de Abias (I Cr(J. 24:10). Sua mãe, Isabel, também era de familia sacerdotal, pois é até chamada de «das filhas de Arão» (Luc. 1:5). Seu nascimento foi miraculoso, visto que ambos os seus pais eram de idade avançada. Ele nasceu na região montanhosa da Judéia. Maria, mãe de Jesus, foi visitar Isabel, e permaneceu com ela por cerca de três meses. Ver Luc. 1:56. Elas eram parentas (Luc. 1:36).

Alguns estudiosos pensam que elas eram «primas», conforme a palavra grega correspondente é traduzida; mas outros preferem pensar que o termo grego sungenes não demarca nenhum grau especifico de parentesco, e que pode ser melhor traduzido por «parenta». Esse termo grego é tão indefinido que pode até significar «compatriota». Ver Josefo (Guerras 7.262; Anti. 12.338). Talvez Jesus e João Batista fossem primos em algum grau desconhecido. Praticamente

nada sabemos acerca da vida de João Batista, antes dele dar inicio a seu ministério público.

Sabemos somente que ele residia na região montanhosa da Judéia, embora a cidade onde ele residia não seja mencionada nas páginas do Novo Testamento. É evidente que ele vivia sob o voto dos nazireus (vide), permitindo que seus cabelos crescessem e não aparando os cantos da barba. Evitava todo vinho e toda bebida alcoólica, e vivia como asceta. Por isso mesmo, alguns eruditos têm pensado que, pelo menos em algum tempo, antes de iniciar seu ministério. ele

se tenha associado com os essênios, que habitavam em comunidades separadas, no deserto. Porêm, não há provas conclusivas quanto a essa especulação. O trecho de Lucas 1:80 meramente diz-nos que João cresceu e se tornou forte, habitando no deserto, até o tempo de sua manifestação a Israel.

3. Fontes  Informativas

Nossas fontes informativas sobre a vida de João Batista são os quatro evangelhos e algumas poucas citações das obras de Josefo. Há outras alusões, nos ensinos mandeanos e no Josefo Eslavônico. Porém, os informes ali contidos, de acordo com os estudiosos, revestem-se de pouco valor histórico.

4. Ministério e Mensagem de João Batista

a. O Precursor de Cristo. A vida de João Batista visava a preencher um propósito todo especial, ou seja, o de ser o precursor do Messias. Tal como se dá no caso do próprio Senhor Jesus, pouco se sabe acerca. do período de preparação de João Batista. João Batista deu inicio ao seu ministério público poucos meses antes do Senhor Jesus iniciar seu próprio ministério. Tal como se deu com o Filho de Deus, João Batista dispunha de curtíssimo prazo para cumprir o seu ministério. Josefo afiança que João Batista era pessoa dotada de grande magnetismo pessoal e força de atração. A vida dele foi como Um brilhante meteoro que apareceu subitamente, brilhou durante um breve período, e desapareceu. Alguns chegaram a pensar que ele seria o Messias prometido, e o primeiro capítulo do evangelho de João cuida em mostrar que essa opinião estava equivocada, porquanto João Batista mesmo nunca fizera tal reivindicação. Todavia, a vida de João Batista foi de tal modo poderosa que outros identificaram-no com Elias. E, em certo sentido, estavam com a razão. Foi o próprio Senhor Jesus quem declarou: «E, se o quereis reconhecer, ele mesmo é Elias, que estava para vir» (Mat. 11:14).

b. João Batista Foi uma Figura Profética. Ele se assemelhava aos profetas do Antigo Testamento, sobretudo com Elias (ver Mat. 5:4 com 11 Reis 1:8 e Zac. 13:4). Os autores do Novo Testamento ensinaram que ele cumpriu a profecia de Isa. 40:3 (ver Mat. 3:3; 17:10-12; ver também Mal. 3:1 e 4:5).

Como um homem do destino, João Batista coube dentro dos tempos do cumprimento de promessas messiânicas e, durante um tempo breve mas crucial realizou o seu ministério terreno. Embora fosse grande, do ponto de vista espiritual, é deveras significativo que Jesus tenha afirmado que o menor no Reino de Deus será maior do que ele (Mat. 11:11). Isso nos revela algo sobre a grandiosidade espiritual que o Reino de Deus haverá de trazer.

c. Um Profeta Asceta. João pode ter vivido ou não sob os votos do nazireado . Seja como for, ele vivia de modo extremamente ascético, vestido, como Elias, com pêlos de camelo e comendo gafanhotos e mel silvestre, e falando acerca de acontecimentos apocalípticos e sobre a necessidade dos homens se arrependerem. Tudo, em João Batista, fazia lembrar Elias. e as multidões vinham ouvi-lo.

d. Retirada e Reforma. Embora, a exemplo dos essênios, João Batista se tivesse retirado do convívio social, de forma alguma ele se distanciou da sociedade de seus dias. Sua missão consistia em anunciar as condições, àquela sociedade, mediante as quais os homens de então deveriam acolher o Messias e o seu reino. O Batista engolfou Samaria em seu ministério (João 3:23). Se é que João Batista começou entre os essênios (um ponto muito disputado), então, por certo, ele não se limitou a essa «denominação», visto que a sua mensagem profética era universal, e ele não pregava a uma claque fechada, conforme faziam os essênios.

e. O Messias Anunciado por João BatistaO Novo Testamento deixa claro que João Batista esperava que o Messias estabelecesse o seu reino, pela força, se necessário, e que isso constituiria um acontecimento apocalíptico. De fato, João referia-se a esse advento com termos idênticos àqueles em que os pregadores modernos aludem ao Segundo Advento de Cristo. O Novo Testamento não tenta esconder que o Batista, em certa medida, ficou desapontado diante do modo como Jesus se apresentou publicamente. Jesus não reuniu algum exército, nem se mostrou militante. Ao que parecia, não foi ao menos capaz de proteger o seu homem-chave, ou seja, ao próprio João Batista. Os adversários de Jesus pareciam estar ganhando todas as vitórias. Verdadeiramente, do ângulo de João, as coisas não estavam avançando nada bem. Foi por essa razão que ele enviou mensageiros a Jesus, para que indagassem se ele era, veramente, o Messias, Aquele pelo qual ele, João Batista estava esperando. Ver Mat. f 1:2 ss . João ouvia falar sobre os grandes prodígios de Jesus; mas ali estava ele mesmo, no cárcere. Como poderia ser isso?

A resposta de Jesus… dificilmente  poderia tê-lo satisfeito. Jesus não foi capaz de anunciar qualquer progresso na revolução! Não tinha reunido nenhum exército; não obtivera qualquer poder político; não havia um numeroso grupo de seguidores dispostos a combater por ele. Tudo quanto Jesus pôde dizer é que os cegos estavam recebendo de volta a visão, que os aleijados estavam andando novamente, que os leprosos estavam sendo purificados, que os surdos estavam ouvindo, que os mortos estavam sendo ressuscitados dos mortos, e que aos pobres estava sendo anunciado o evangelho. Dificilmente esse era o Messias pelo qual João estava esperando! Ou, pelo menos, muitos pensam assim a respeito de João. Não obstante, naquela mesma ocasião, Jesus afirmou que João estava cumprindo a predição de Mal. 3:1: «Eis que eu envio o meu mensageiro que preparará o caminho diante de mim… » Sim, o caminho fora preparado por João; mas o caminho não parecia ser aquele pelo qual João esperava. Não é que o Batista tivesse perdido a fé em sua missão, mas ficou muito desanimado, indagando se Jesus realmente cumpria os requisitos da missão messiânica. Os profetas do Antigo Testamento não sabiam separar a primeira da segunda vindas de Cristo. Pedro alude a isso em I Pedro 1: 11: «•• .investigando atentamente qual a ocasião ou quais as circunstâncias oportunas, indicadas pelo Espírito de Cristo, que neles estava, ao dar de antemão testemunho sobre os sofrimentos referentes a Cristo, e sobre as glórias que os seguiriam». Eles não entendiam que, na primeira vinda haveria os «sofrimentos» de Cristo, e que só em sua segunda vinda haverá as «glórias». Esse era o motivo da perplexidade de João Batista.

f. O Mistério da Cegueira de Israel. Paulo falou, profundamente admirado, sobre essa cegueira, em Rom. 11:2S ss. Ele explicou que a cegueira de Israel era uma necessidade, a fim de que o evangelho pudesse ser anunciado às nações gentílicas também, para que houvesse uma Igreja formada por judeus e gentios, igualmente. Mas, chegado o tempo certo, e removido o véu que agora tapa os olhos do povo judeu, eles haverão de reconhecer que o Senhor Jesus é o Messias prometido. Não obstante, Israel é responsável pelos seus atos. O poder predestinador do Senhor usa a vontade humana sem destrui-la, embora não saibamos precisar como. O décimo primeiro capítulo de Mateus mostra como a mensagem de João Batista e de Jesus caíram em ouvidos surdos, como eles tocaram para o povo, mas eles não dançaram; como eles lamentaram, mas o povo não chorou. João veio como um asceta; mas Jesus, ao contrário, não era asceta. Todavia, nem João Batista e nem Jesus tinham sido devidamente ouvidos. O povo judeu permaneceu na indiferença (Mat, 11:16-19). Nem mesmo os poderosos prodígios de Jesus levaram o povo judeu a arrepender-se (vs, 20 ss). No entanto, um pequeno remanescente acreditou, mediante o poder de Deus; e a esses foram revelados os mistérios do reino de Deus (vs. 25 ss). Ê significativo que dentre esse contexto de rejeição, emergiu aquele belo convite de Jesus, por tantas vezes citado: Vinde a mim, todos os que estais cansados e oprimidos, eu vos aliviarei. Tomai sobre vós meu jugo, e aprendei de mim, que sou manso humilde de coração; e achareis descanso para as vossas almas. (Mateus 11:28,29).

g. O Batismo de JoãoSem dúvida a imersão aplicada por João Batista era muito mais que algum rito de iniciação, a fim de que membros fossem aceitos em alguma seita (como era o caso entre os essênios), Antes, era um sinal de conversão a Deus, um sinal requerido de que uma pessoa havia abandonado seus antigos caminhos pecaminosos, em preparação .para acolher ao Messias e ao seu reino. Todavia, o batismo de João não era um batismo cristão, com todo o seu simbolismo e significado. Para tanto, era mister que Jesus morresse e ressuscitasse. Mas, à semelhança do batismo cristão, apontava para o arrependimento, a renovação espiritual e a resolução de viver a vida de um piedoso discípulo da retidão. Também havia um intuito messiânico, pelo que estava aliado bem de perto com a fé cristã, que em breve Jesus haveria de trazer. Supomos que aqueles que foram batizados por João, ao se unirem ao movimento cristão, não eram rebatizados. No entanto, houve casos de pessoas, inteiramente ignorantes sobre Cristo e suas reivindicações, que, embora tivessem sido discípulos de João Batista, mais tarde foram novamente batizadas (ver Atos 19:1 ss). Os judeus costumavam batizar os gentios que se convertessem ao judaísmo, imergindo-Ihes totalmente o corpo, o que representava uma completa purificação. Não há que duvidar que esse precedente foi o que determinou o espírito e o modo da imersão aplicada pelo Batista. O evangelho de João destaca o ponto que .João batizava em Enom, perto de Salim. porque ali . havia muita água. Teria sido inteiramente fora de ordem, do ponto de vista dos judeus, se João se pusesse à beira de um rio, com algum candidato ao batismo, para então apanhar uma pequena quantidade de água e a derramar sobre a cabeça do candidato. Isso não seria imersão, mas aspersão.

A seita de Qumnm (ver Sobre Khlrbet Qamran) praticava um batismo de arrependimento que assinalava os novos convertidos ao seu grupo, permitindo-lhes o ingresso na seita. Porém, isso era meramente uma adaptação da imersão de prosélitos ao judaísmo. O Manual de Disciplina, em seu quinto capítulo, descreve o batismo praticado entre os essênios. Se João Batista estivera, em algum tempo, associado aos essênios, então, naturalmente, teria continuado a prática de batismo, mas o batismo dos essênios não era o verdadeiro precedente de seu batismo, que ia buscar raízes ainda mais longe na história do povo judeu.

5.Elias Redivivo

Era doutrina comum entre os judeus do começo do cristianismo que grandes personagens proféticas do Antigo Testamento, teriam mais de uma missão espiritual terrena. Muitos rabinos pensavam que Jeremias fosse a reencarnação de Moisés. E eles esperavam que Elias voltasse a viver como o precursor do Messias. E do próprio Senhor Jesus chegaram a pensar que ele fosse Jeremias ou algum dos antigos profetas. Ver Mat. 16:14. E os discípulos de Jesus tinham consciência da tradição, promovida pelos fariseus, de que Elias deveria retomar à vida, antes da carreira do Messias, envolvendo-se no drama de sua aparição (Mat. 17:10 ss). Jesus, chegado o momento certo, ensinou que Elias já viera a este mundo, na pessoa de João Batista. Alguns intérpretes crêem que João Batista foi uma autêntica reencarnação de Elias; mas outros crêem que o Batista cumpriu o espirito daquela profecia, mas que ele não era o próprio Elias. João Batista declarou que ele mesmo não e-ra Elias (João 1:21). Porém, aqueles que acreditam que João Batista era. realmente, a reencarnação de Elias, salientam que a pessoa reencarnada (com algumas notáveis exceções) usualmente não tem consciência de sua anterior identidade (ou identidades). Eu mesmo não penso que podemos eliminar essa possibilidade sobre bases dogmáticas. Pois o próprio Novo Testamento ensina casos especiais de. reencarnação, com vistas a missões terrenas especiais. As duas testemunhas do Apocalipse (cap, 11) aparecem como quem já tinha outras histórias terrenas. – O anticristo, segundo se lê em Apo. 17:8,11, haverá de subir do hades a fim de cumprir ainda uma outra missão diabólica. Os cristãos antigos pensavam que o anticristo seria Nero redivivo. E muitos crentes ensinam, até hoje, que Elias terá uma outra missão na terra, antes do segundo advento de Cristo.

João foi cheio do Espírito Santo desde antes do seu nascimento (Luc. 1:15).

Os autores neotestamentários também fazem de João uma figura profética, especificamente como o precursor do Messias. Ê muito significativo, e sem dúvida autêntico, que João, de certa feita, em um momento de desencorajamento, em seu cárcere, duvidou que Jesus teria cumprido os requisitos da missão messiânica, pela qual ele vinha procurando (Mat. 11:2 ss). Porém, não há razão alguma para supormos daí que nunca houve qualquer reversão nessa dúvida de João. Todos nós experimentamos instantes de dúvida e desencorajamento; e João Batista, afinal de contas, era apenas um homem. Seja como for, é significativo que João Batista e Jesus efetuaram ministérios paralelos, embora distintamente separados. Nunca houve uma completa unificação dos dois esforços, mesmo depois que o cristianismo já estava bem firmado. Porém, sabemos, com base nos registros históricos, que muitos seguidores de João Batista bandearam-se para Jesus, e que o próprio João encorajou isso. Tanto Jesus quanto João reivindicavam autoridade divina para suas respectivas missões, e afirmavam outro tanto um acerca do outro (Mat. 21:23-27).

6. João Batista e Jesus

Sabe-se que alguns dos primeiros discipulos de Jesus vieram do círculo dos discípulos do Batista (João 1:35 ss), embora o movimento resultante da missão de João Batista tivesse continuado por muito tempo depois dos primórdios do cristianismo. Alguns estudiosos crêem que tanto João Batista quanto Jesus
estiveram ligados aos essênios, pelo que teriam conexão e amizade antes do ministério público de um e de outro. Como primos em algum grau. também
pode ter havido alguma forma de contato doméstico social entre eles, antes de iniciarem seus respectivos ministérios públicos. A história tem ocultado essas
coisas de nós;

7. Seguidores de João Batista

a.. João tinha seguidores que formavam um movimento espiritual crescente, antes mesmo do começo do ministério público de Jesus. O primeiro capítulo do evangelho de João mostra-nos isso.

b. Quando Jesus iniciou o seu ministério público, pelo menos alguns dos principais discípulos de João vieram engrossar o movimento encabeçado por Jesus (João 1:35 ss).

c. O movimento liderado por João continuou, paralelo ao de Jesus, havendo pontos de contato entre os dois movimentos (Mat. 11:2 ss).

d. O movimento de João Batista continuou atuante, mesmo depois da morte dele, e entrou até bem dentro da era apostólica. Apolo fora discípulo de João Batista (Atos 18:24 ss). Outros discípulos de João converteram-se ao cristianismo, e assim uniram-se à Igreja primitiva (Atos 19:1-7).

e. Os Reconhecimentos Clementinos (fim do século 11 D.e.) dão provas de algum conflito entre os posteriores seguidores de João Batista e o cristianismo. Todavia, que certeza se ‘poderia ter se as pessoas que continuaram o movimento Batista eram fiéis às suas idéias? João pode ter sido para elas uma espécie de santo patrono, e não uma figura histórica do movimento deles.

8- Morte de João Batista

O relato da morte do Batista é contado em Mar.6:17-29. Essa é a única crônica importante dos evangelhos que não gira especificamente em torno de Jesus. E isso mostra a importância que João Batista tinha para o cristianismo primitivo. E perfeitamente possível que o episódio tenha sido preservado tanto pelos discípulos de Jesus quanto pelos discípulos de João. Josefo fornece-nos outros detalhes sobre a questão, conforme observou-se acima. João, sem dúvida, foi tido como uma ameaça política para a autoridade de Herodes. A execução de João Batista, por ordem de Herodes, não se deveu meramente ao fato de que João objetava ao casamento de Herodes com sua própria cunhada, Herodias. Herodes havia encarcerado João no castelo de Marquero, na margem oriental do mar Morto. Foi então que João mandou indagar a Jesus acerca de suas reivindicações messiânicas (Mat. 11). Herodias, amargurada contra João, por achar que este interferia em sua vida particular, foi a mola que levou Herodes a mandar executar o Batista e, sem dúvida, ela ficou muito satisfeita em ver-se livre daquele empecilho. Herodes, por sua vez, sabia que João era homem reto (Mar. 6:20). Não fizera ainda qualquer violência contra ele, por saber que ele era tão estimado pelo povo comum, e não queria se arriscar a provocar qualquer revolta popular (Mar. 6:20). Porém, Herodias acabou ganhando a parada; e podemos ter a certeza de que Herodes não tentou entravar a vontade dela. Herodias exigiu a cabeça de João Batista como prêmio pela dança tão aplaudida de sua filha. A jovem muito agradara a Herodes e aos convivas meio a1coolizados, que participavam de sua festa de aniversário natalício. Herodes mandou um executor cortar a cabeça de João Batista. E a cabeça de João foi exposta ao público. Quando os discípulos de João souberam o que havia acontecido, obtiveram o seu cadáver e o sepultaram. Em seguida, foram informar Jesus e seus discípulos sobre o que acontecera (Mat, 14:3-12; Mar. 6:17-29). E a noticia teve um profundo efeito sobre o Senhor Jesus. Ao ouvir sobre o acontecido, ele se retirou para a Galiléia, talvez sentindo o perigo contra si mesmo e contra os seus discípulos (Mat. 4: 12). E, sabedor da execução de João, retirou-se para um lugar solitário (Mat. 14:3), sem dúvida a fim de orar e meditar, para meditar  sobre o que faria em seguida, sob aquelas novas circunstancias.

Bibliografia: AM GEY KR KU ND RO(1912) UN.

https://www.ensinopentecostal.com.br/subsidio-licao-1-central-gospel-4o-trimestre-2013/



              O CORREIO DO REI

 Lucas 3:1-8

 Para Lucas a aparição de João Batista é um dos pontos em que a história muda. É assim tanto que se situa o momento com seis dados diferentes.

  (1) Tibério era o sucessor de Augusto e portanto o segundo dos imperadores romanos. Cerca dos anos 11 ou 12 d. C. Augusto o tornou seu colega no poder imperial, mas não se tornou imperador único até o ano 14 d. C. O décimo quinto ano de seu reinado deve ter sido entre 28 e 29 d. C. Lucas começa situando a aparição de João no cenário mundial, o cenário do Império Romano.

  (2) Os três dados seguintes que Lucas dá se relacionam com a organização política da Palestina. O título tetrarca significa literalmente governador de uma quarta parte. Em províncias tais como Tessália e Galácia, que estavam divididas em quatro seções ou áreas, o governador de cada uma delas era chamado tetrarca; mas mais tarde a palavra ampliou seu significado e se aplicou ao governador de qualquer parte. Herodes o Grande morreu no ano 4 A. C., depois de ter reinado quarenta anos. Dividiu seu reinou entre três de seus filhos e em um primeiro momento os romanos aprovaram sua decisão.

  (a) Deu Galiléia e Peréia a Herodes Antipas, quem reinou desde ano 4 A. C. até o ano 39 d. C. Portanto, Jesus viveu principalmente sob o reinado deste soberano e em seus domínios da Galiléia.

  (b) Deu Ituréia e Traconites a Herodes Felipe, que reinou do 4 A. C. até 33 D. C. A cidade da Cesaréia de Felipe foi chamada assim por ele, porque ele a mandou construir.

  (c) Deixou Judéia, Samaria e Edom a Arquelau. Um rei péssimo. Os judeus no final pediram aos romanos que o tirassem de seu cargo; e Roma, preocupada com os contínuos problemas da Judéia, instalou um procurador ou governador romano. Assim foi como os romanos começaram a governar diretamente sobre a Judéia. Nesse momento era governador Pilatos, que esteve no poder desde o ano 25 até 37 d. C. De modo que neste parágrafo Lucas nos dá uma visão panorâmica da divisão do reino que tinha pertencido a Herodes o Grande. (3) Não sabemos virtualmente nada do Lisânias.

  (4) Uma vez esclarecida a situação mundial e política da Palestina, Lucas relata a situação religiosa e se situa a aparição de João no momento em que Anás e Caifás eram sacerdotes. Nunca houve dois sumo sacerdotes ao mesmo tempo. Por que, então, Lucas nos oferece dois nomes? O sumo sacerdote era ao mesmo tempo a cabeça civil e religiosa da comunidade. Na antiguidade o posto tinha sido hereditário e tinha durado toda a vida.

  Mas com a chegada dos romanos o posto era objeto de todo tipo de intrigas. O resultado foi que entre os anos 37 A. C. e 26 d. C. houve mais de vinte e oito sumo sacerdotes. Anás foi em realidade sumo sacerdote entre os anos 7 e 14 d. C. Portanto neste momento está fora de seu posto; mas foi passado por não menos de quatro de seus filhos e Caifás era seu genro. Portanto, embora Caifás era o supremo sacerdote reinante, Anás ostentava o poder. Esta é a razão pela qual Jesus foi levado a ele em primeiro lugar logo depois de ser preso (João 18:13) apesar de que nesse momento não estava em funções. Lucas associa seu nome com Caifás porque, apesar de ser este o sumo sacerdote, Anás era ainda o sacerdote de maior influencia no país.

  Os versículos 4-6 são uma citação de Isaías 40:3-5. No Oriente, quando um rei se propunha visitar parte de seus domínios mandava um correio para que avisasse as pessoas que deviam preparar os caminhos.

  Durante o serviço de coroação na Abadia do Westminster encontramos um paralelo moderno disto. Quando toda a congregação estava sentada apareceu inesperadamente um grupo de limpadores com escovas e aspiradoras que começaram a limpar os tapetes de modo que estes estivessem absolutamente limpos para a chegada da rainha.

  Assim, pois, João é considerado como o correio do Rei. Mas a preparação sobre a qual insistia, era uma preparação do coração e da vida. Dizia: "O rei está por chegar, corrijam não seus caminhos, e sim suas vidas." Em nossas mãos está a tarefa perene de fazer com que a vida seja digna de ser vista pelo Rei.

         JOÃO CHAMA AO ARREPENDIMENTO

  Lucas 3:7-18

  Aqui nos defrontamos com a mensagem de João às pessoas. Em nenhum outro lugar se nota tão claramente a diferença entre João e Jesus porque, qualquer que fosse a mensagem de João, não era evangélica. Não se tratava de boas novas; eram novas de terror. João tinha vivido no deserto. A face do deserto estava coberta de arbustos e matagais, assaz seca como isca. Algumas vezes uma faísca acendia a face do deserto e saíam de seus ninhos as víboras e as serpentes fugindo aterrorizadas das chamas ameaçadoras. João comparava a elas as pessoas que seriam batizadas. Os judeus não tinham a menor dúvida de que nos planos de Deus eles eram a nação mais favorecida. Sustentavam que Deus julgaria todas as nações com uma medida mas aos judeus com outra. Em realidade sustentavam que um homem estava livre de todo juízo simplesmente pela virtude de ser judeu. Um filho de Abraão estava livre de juízo. João lhes dizia que o privilégio racial não significava nada; que Deus julgava a vida e não a linhagem.

    Há três pontos sobressalentes na mensagem de João.

  (1) Demandava que os homens compartilhassem suas riquezas uns com outros. Era um evangelho social que estabelecia que Deus nunca absolverá ao homem que se contente tendo muito enquanto outros têm pouco.

  (2) Ordenava ao homem não deixar seu trabalho, e sim trabalhar por sua própria salvação fazendo seu trabalho como devia ser feito. Que o coletor de impostos seja um bom funcionário, que um soldado seja um bom defensor. O dever do homem era servir a Deus onde ele o tinha posto. João estava convencido de que em nenhuma parte se pode servir a Deus melhor que no trabalho diário.

  (3) João estava seguro de que ele era só o precursor do Rei. Este estava por vir, e com ele o julgamento. A pá mencionada era uma grande pá chata de madeira; com ela os grãos eram lançados ao ar; os grãos pesados caíam ao chão e a palha voava. E assim como se separava a palha do grão, o Rei separaria os bons dos maus.

  De maneira que João pintava um quadro do juízo, mas se tratava de um juízo que um homem podia enfrentar com confiança se tinha saldado suas dívidas com seu vizinho, e se tinha realizado fielmente sua tarefa diária. João foi um dos pregadores mais efetivos do mundo. Uma vez Chalmers, quando o felicitaram por um sermão, disse: "Sim, mas o que fez?" Está claro que João pregava a ação e produzia ação. Não se ocupava de sutilezas teológicas, mas sim da vida.

            A DETENÇÃO DE JOÃO

  Lucas 3:19-20

  João era um pregador da justiça tão direto e franco que não podia senão correr perigo. Josefo, o historiador judeu, diz que a causa de sua detenção era que Herodes "temia que a grande influencia que João exercia sobre o povo lhe desse poder e inclinação para organizar uma rebelião, pois pareciam preparados a fazer algo que ele propusesse".

  Isto sem dúvida é certo, mas o Novo Testamento nos dá uma causa muito mais pessoal e imediata. Herodes Antipas se casou com Herodias e João o repreendia por isso.

   As relações envoltas neste casamento são extremamente complicadas. Herodes o Grande era um homem que se casou várias vezes. Herodes Antipas era filho do Herodes o Grande e de uma mulher chamada Maltake. Herodias era filha do Aristóbulo, que também era filho de Herodes o Grande e de Mariana, chamada comumente a asmonea. Como vimos, Herodes tinha dividido seu reino entre Arquelau, Herodes Antipas e Herodes Felipe. Tinha outro filho, também chamado Herodes, que era filho do Mariana, filha do sumo sacerdote. Este Herodes não teve parte do reino de seu pai e vivia em Roma.

  Casou-se com o Herodias. Era em realidade seu meio tio, porque o pai dela, Aristóbulo, e ele eram filhos de Herodes, mas de distintas mães. Herodes Antipas em uma de suas visitas a Roma, seduziu-a e se casou com ela, que era sua cunhada, por estar casada com seu meio irmão, e ao mesmo tempo sua sobrinha por ser filha de seu outro meio irmão, Aristóbulo. Todo este procedimento causou comoção à opinião judaica, já que era contrário à Lei, e inapropriado sob qualquer ponto de vista.

  É algo muito perigoso repreender a um tirano oriental, mas João o fez. O resultado foi que o prendeu e o encarcerou em um calabouço do castelo do Macário nas bordas do Mar Morto.

  Não podia haver nada mais cruel que tomar a esta criatura do deserto e encerrá-la em um calabouço.

  Finalmente foi decapitado para gratificar o ressentimento do Herodias (Mateus 14:5-12; Marcos 6:17-29). É sempre perigoso dizer a verdade; e entretanto quem se une à verdade, poderá no momento terminar no cárcere ou no patíbulo, mas no final sairá vitorioso.

  Uma vez, o conde do Morton, que era regente de Escócia, ameaçou a André Melville, o reformador. Disse-lhe: "Não haverá tranqüilidade neste país até que meia dúzia de homens como você sejam pendurados ou desapareçam do lugar." Melville lhe respondeu: "Senhor! Tratar a seus cortesãos dessa maneira! Para mim tanto faz me apodrecer no ar ou na terra... Deus seja louvado; não está em suas mãos enforcar nem exilar sua verdade." Platão disse uma vez que um homem sábio sempre preferirá sofrer equivocadamente que fazer coisas equivocadas.

  Só devemos nos perguntar a nós mesmos se em última análise e em definitiva preferiremos ser Herodes Antipas ou João Batista.

Lucas (William Barclay)

 


            O APARECIMENTO DE JOÃO BATISTA

 Mateus 3:1-6

 O aparecimento de João foi como o ressoar repentino da voz de Deus. Naquela época os judeus eram dolorosamente conscientes de que os profetas já não falavam. Dizia-se que durante quatrocentos anos não tinha havido profeta algum. Ao longo de vários séculos a voz da profecia se manteve calada. Tal como eles mesmos diziam: "Não havia voz, nem quem respondesse." Mas em João voltou a fazer-se ouvir a voz profética.

  Quais eram as características de João e sua mensagem?

  (1) Denunciava intrepidamente o mal em qualquer lugar que o encontrasse. Se o rei Herodes pecava, contraindo um casamento ilegal e pecaminoso, João o reprovava. Se os saduceus e os fariseus, dirigentes da ortodoxia religiosa daquela época, estavam afundados em um formalismo ritualista, João não duvidava em dizer-lhe diretamente. Se as pessoas comuns viviam afastados de Deus, João o jogava na cara. Em qualquer lugar que João visse o mal no Estado, na Igreja, na multidão intrepidamente, ele o denunciava. Era como uma luz acesa em algum lugar escuro: era como um vento de Deus que varria todo o país.

 Conta-se de um famoso jornalista que, apesar de ser famoso, nunca cumpriu a fundo os deveres de sua profissão, diz-se que provavelmente nada conseguia perturbá-lo. Ainda há lugar, na mensagem cristã, para a advertência e a denúncia. "A verdade", disse Diógenes, "é como a luz nos olhos irritados." E acrescenta: "Quem nunca ofendeu a ninguém jamais fez bem a ninguém." Possivelmente tenha havido momentos em que a Igreja foi muito cuidadosa e procurou não ofender. Há ocasiões em que já não há lugar para a suave amabilidade e chega o momento da acerba recriminação.

  (2) Convocava os homens à justiça, e o fazia com um profundo sentimento de urgência. A mensagem do João não era uma mera denúncia negativa. Era uma apresentação positiva das exigências morais de Deus. Não somente denunciava a conduta dos homens, pelo que tinham feito, mas sim os convocava a fazer o que deviam fazer. Não somente os condenava pelo que eram, mas sim os desafiava a ser o que deviam ser. Era como uma voz que chamava os homens às coisas mais elevadas. Não se limitava à condenação do mal, mas sim punha diante dos homens o bem. É possível que a Igreja tenha passado por momentos nos quais ficou preocupada principalmente em dizer aos homens quais eram as coisas que não deviam fazer, descuidando sua missão de colocar ante eles os mais altos ideais cristãos.

  (3) João vinha de Deus. Sua procedência era o deserto. Achegou-se aos homens só depois de ter passado anos de preparação sob a orientação de Deus. Tal como disse Alexander Maclaren: "João saltou na arena, por assim dizer, plenamente desenvolvido e com a armadura completa." Veio com uma mensagem de parte de Deus e não com uma opinião pessoal dela. Antes de falar com os homens tinha passado muito tempo em companhia de Deus. O pregador, o docente que fala com voz profética, sempre é aquele que vem à presença dos homens, vindo da presença de Deus.

  (4) João apontava para além de si mesmo. Não somente era uma luz que iluminava o mal, uma voz que reprovava o pecado, mas além disso, um sinal indicador do caminho para Deus. Não desejava que os homens se fixassem nele, seu objetivo era prepará-los para Aquele que havia de vir. Uma das crenças judias da época era que Elias voltaria antes da vinda do Messias, e que seria o arauto do Rei que viria. "Eis que eu vos enviarei o profeta Elias, antes que venha o grande e terrível Dia do SENHOR" (Malaquias 4:5). João usava um vestido de pele de camelo e se cingia com um cinturão de couro. Este traje reproduz exatamente o que se descreve como a roupa de Elias em 2 Reis 1:8. Mateus o relaciona com uma profecia de Isaías (Isaías 40:3).

  Na antiguidade, no oriente, os caminhos eram muito ruins. Há um antigo provérbio que diz: "Há três estados miseráveis: estar doente, passar fome e viajar." Antes que um viajante empreendesse seu caminho recebia a recomendação de "pagar todas suas dívidas, fazer provisão para os que dependiam dele, oferecer presentes a seus amigos e parentes no momento da partida, devolver tudo o que tivesse recebido em custódia, levar consigo dinheiro e a melhor disposição para viajar e despedir-se de todos". Os caminhos mais freqüentados não eram mais que rastros. Não eram caminhos consolidados, porque a terra na Palestina é dura o suficiente para suportar o trânsito de burros e mulas, bois e carretas. Qualquer viagem por um daqueles caminhos era uma aventura e certamente uma circunstância que na medida do possível devia evitar-se. Havia uns poucos caminhos pavimentados, feitos pelo homem. Josefo, por exemplo, diz-nos que Salomão mandou construir uma vereda de basalto preto em todos os caminhos que levavam a Jerusalém, para que a viagem fosse menos penosa aos peregrinos, e "para manifestar a grandeza de suas riquezas e governo".

  Todos estes caminhos pavimentados, feitos pelo homem, eram construídos por ordem do rei e para uso do rei, e por isso eram chamados de "caminhos reais". A reparação só era feita quando o rei precisava fazer uma viagem por eles. Antes que chegar, o rei enviava uma mensagem aos habitantes para que preparassem o caminho para o rei. João estava preparando o caminho para o rei. O pregador e o docente de voz profética não se destaca a si mesmo, mas a Deus. Seu objetivo não é fazer com que seus semelhantes se dêem conta de quão inteligente ele é, mas sim percebam a majestade de Deus. O verdadeiro pregador é o que fica obliterado pela mensagem.

   Os homens reconheceram João como um profeta, embora durante muitos anos não se escutou voz profética alguma, porque era uma luz que iluminava as trevas dos homens e punha de manifesto suas más ações, uma voz que convocava os homens à justiça, um sinal que dirigia a atenção dos homens para Deus, e porque descansava sobre ele essa autoridade incontestável que possuem aqueles que vêm falar aos homens vindos da presença de Deus.

            A MENSAGEM DE JOÃO: A AMEAÇA

Mateus 3:7-12

   Na mensagem de João há, ao mesmo tempo, uma ameaça e uma promessa. Toda esta passagem está cheia de imagens muito vívidas.

   João chama os fariseus e saduceus "geração de víboras", e lhes pergunta quem os aconselhou a fugirem da ira vindoura. Aqui entram em jogo uma de duas imagens. João conhecia o deserto. Em alguns lugares, no deserto, há matas muito secas de pasto, e arbustos espinhosos miúdos, quebradiços pela falta de umidade. Às vezes se produzem incêndios. Quando isto ocorre o fogo arrasa o pasto e os arbustos como um rio de fogo, porque estão tão secos como isca. Sobre o fronte do incêndio fogem os escorpiões, as serpentes e todas as outras animálias que encontravam refúgio no monte. São expulsos de suas tocas pelas chamas, e escapam para salvar suas vidas. Mas possivelmente haja outra imagem. Em todo campo semeado há uma boa quantidade de pequenos animais: ratos de campo, coelhos, lebres, galináceos. Quando se faz a colheita toda esta fauna deve fugir, porque seus ninhos e covas ficam a descoberto e não têm onde refugiar-se. João concebe sua tarefa nos termos destas imagens. Se os fariseus e os saduceus vêm para receber o batismo, são como as animálias que fogem para salvar sua vida quando se produz um incêndio no monte ou aparece o segador com sua foice.

   E os adverte que não adiantará nada protestarem sua ascendência abraâmica. Para o judeu ortodoxo esta era uma afirmação incrível. Para ele Abraão era único. Tão único era no favor que tinha merecido de Deus por sua bondade, que seus méritos não somente bastavam para estabelecer sua própria justiça, mas também a de todos os seus descendentes. Tinha estabelecido um "tesouro de méritos" que as necessidades de todos seus descendentes não poderiam esgotar. De maneira que os judeus acreditavam que, pelo fato de ser judeus, e não por nenhum mérito próprio que tivessem podido acumular, tinham a bem-aventurança eterna assegurada. Diziam que "todos os israelitas têm porte no mundo vindouro".

  E falavam dos "méritos libertadores dos pais". Acreditavam que Abraão estava sentado à porta do Geena (Inferno) para evitar a entrada de qualquer judeu que tivesse sido consignado a ele e seus terrores. Acreditavam que graças aos méritos de Abraão os navios israelitas navegavam pelos mares sem sofrer percalços:

    A MENSAGEM DE JOÃO: A PROMESSA

 Mateus 3:7-12 (continuação)

   Mas depois da ameaça, na mensagem de João, vinha a promessa que também incluía uma ameaça. Como dissemos, João apontava para além de si mesmo, Àquele que havia de vir. Naquele momento desfrutava de uma grande reputação e sua influência era enorme. Entretanto, dizia que não era digno sequer de desatar as sandálias dAquele que havia de vir – um dever de escravo. A atitude de João era negar-se a si mesmo e não atribuir-se importância. Sua única importância, tal como ele a entendia, era servir de indicador que anunciava a vinda dAquele que havia de vir.

   Disse que Aquele que havia de vir os batizaria com o Espírito e com fogo.

   Ao longo de toda sua história os judeus tinham esperado a vinda do Espírito de Deus. Ezequiel escutou pela boca de Deus as seguintes palavras: "Dar-vos-ei coração novo e porei dentro de vós espírito novo; tirarei de vós o coração de pedra e vos darei coração de carne. "Porei dentro de vós o meu Espírito e farei que andeis nos meus estatutos, guardeis os meus juízos e os observeis" (Ezequiel 36:26-27). "Porei em vós o meu Espírito, e vivereis" (Ezequiel 37:14). "Já não esconderei deles o rosto, pois derramarei o meu Espírito sobre a casa de Israel, diz o SENHOR Deus" (Ezequiel 39:29). "Porque derramarei água sobre o sedento e torrentes, sobre a terra seca; derramarei o meu Espírito sobre a tua posteridade e a minha bênção" (Isaías 44:3). "E acontecerá, depois, que derramarei o meu Espírito sobre toda a carne" (Joel 2:28).

   Qual, então, é o dom e a obra deste Espírito de Deus? Ao procurar dar resposta a esta pergunta devemos lembrar que corresponde fazê-lo em termos hebraicos. João era judeu, e estava falando com judeus. Não pensa nem fala em termos da doutrina cristã do Espírito Santo, mas sim de acordo com a doutrina judaica do Espírito.

  (1) A palavra hebréia que significa espírito é ruach, e esta, como pneuma, em grego, não significa somente espírito. Também significa alento. O alento é a vida, e portanto a promessa do Espírito é uma promessa de vida. O Espírito de Deus insufla a vida dEle no homem. Quando o Espírito de Deus entra em alguém, desaparecem a fadiga e a derrota que deterioram e empalidecem a vida e uma corrente de nova vida penetra em nós.

  (2) Esta palavra ruach não somente significa alento mas também vento. É o termo que designa o vento da tormenta, esse forte vento que Elias escutou uma vez. Vento significa poder. O vento arrasta o navio em alto mar e desarraiga a árvore que cresce no deserto. O vento possui um poder irresistível. O Espírito de Deus é o Espírito de poder. Quando o Espírito de Deus penetra na vida de um homem, sua fraqueza é coberta com o poder de Deus. É capacitado a fazer o impossível, a enfrentar o que ninguém enfrenta, a suportar o insuportável. Dissipa-se a frustração, chega a vitória.

  (3) O Espírito de Deus está relacionado com a obra criadora. O Espírito de Deus é Aquele que se movia sobre a face do abismo e converteu o caos num cosmos, converteu a desordem em ordem e deu forma ao universo a partir das brumas incriadas. O Espírito de Deus nos pode recriar. Quando o Espírito de Deus entra numa vida humana a desordem de nossa natureza humana converte-se na ordem de Deus; nossas vidas descontroladas, desordenadas, são modeladas pelo Espírito até que elas fiquem em sintonia com a perfeita harmonia de Deus.

  (4) Os judeus atribuíam certas funções especiais ao Espírito. O

Espírito trazia a verdade de Deus aos homens. É o Espírito quem revela a verdade de Deus aos homens. Cada nova descoberta, em qualquer campo do pensamento, é um dom do Espírito. O Espírito penetra na mente de um homem e converte suas incertezas humanas em certezas, transforma sua ignorância humana em conhecimento divino.

  (5) O Espírito capacita os homens a reconhecerem a verdade de Deus quando esta se apresenta. Quando o Espírito entra em nossos corações nossos olhos são abertos. São eliminados os preconceitos que nos cegavam. Desaparece a vontade de auto-afirmação que nos entrevava. O Espírito põe o homem em condições de ver.

  Tais são os dons do Espírito e, do ponto de vista de João, eram esses os dons que Aquele que havia de vir traria à humanidade.

   A MENSAGEM DE JOÃO: A PROMESSA E A AMEAÇA

  Mateus 3:7-12 (continuação)

   Na mensagem do João há uma palavra e uma imagem que combinam a promessa com a ameaça. João diz que o batismo daquele que havia de vir seria um batismo de fogo. O conceito de um batismo de fogo inclui pelo menos três idéias.

    (1) Em primeiro lugar vem a idéia de iluminação. A labareda envia uma luz através da noite, que ilumina até os rincões mais escuros. A chama do farol guia o marinheiro ao porto e ao viajante a seu destino. No fogo não há somente destruição, há luz e guia. Jesus é a luz do farol que guia os homens à verdade e a seu verdadeiro lar junto a Deus.

  (2) Existe a idéia de calor. Houve um grande homem notável por sua extraordinária bondade, que era descrito como alguém que ia acendendo fogos nas habitações frias. Quando Jesus entra na vida de um homem, acende em seu coração o calor do amor a Deus e a seus semelhantes. O cristianismo é sempre a religião do coração inflamado.

  (3) Existe a idéia de purificação. Neste sentido a purificação envolve destruição. O fogo purificador destrói o falso e deixa somente o verdadeiro. A chama tempera, fortalece e purifica o metal. Quando Cristo entra no coração de um homem, seu fogo purificador elimina a escória do mal. Às vezes isto ocorre mediante experiências dolorosas, mas se alguém acredita que nas experiências de sua vida Deus está operando todas as coisas para seu bem, seu caráter surgirá dos transes mais difíceis, limpo e purificado, até que, sendo puro de coração, possa ver deus.

  De maneira que a palavra "fogo" contém as idéias da iluminação, o calor e a purificação da entrada de Jesus Cristo no coração do homem.

  Mas também há outra imagem que contém os elementos de promessa e de ameaça – a do aventador. Trata-se da grande forquilha de madeira com a qual se jogava ao ar o grão para que o vento se encarregasse de separá-lo da palha. O grão era recolhido nos celeiros e toda a palha que ficava no lugar era usada como combustível.

  A vinda de Cristo necessariamente envolve uma separação. Os homens podem rechaçá-lo ou aceitá-lo, Quando são confrontados por Ele, estão ante uma escolha que não podem evitar. Ou se está a favor dEle ou contra Ele. E esta escolha é a que determina o destino de cada ser humano. Os homens são separados em dois grupos segundo sua reação diante de Jesus Cristo.

    No cristianismo não há forma de evitar a suprema escolha eterna. No parque da cidade do Bedford, na Inglaterra, John Bunyan escutou uma voz que o fez erguer-se de um salto e o obrigou a enfrentar a eternidade: "Abandonará seus pecados e irá ao céu, ou ficará com seus pecados e irá ao inferno?" Em última análise essa é a escolha que nenhum ser humano pode evitar.

  A MENSAGEM DE JOÃO: A DEMANDA

  Mateus 3:7-12 (continuação) Em toda a pregação de João havia uma demanda fundamental, e esta era: "Arrependei-vos!" (Mateus 3:2). Esta era também a existência fundamental de Jesus, porque este iniciou seu ministério pregando o arrependimento e a fé no evangelho (Marcos 1:15). Fica evidente que convém deter-nos para analisar muito bem o que significa este arrependimento, e como se deve interpretar esta exigência básica, tanto do Rei como de seu arauto.

  Deve destacar-se que tanto João como Jesus usam a palavra "arrependimento" sem explicar seu significado. Usavam-na com a segurança de que seus ouvintes saberiam perfeitamente o que queria dizer.

  Vejamos qual é o ensino judaico a respeito do arrependimento. Para o judeu o arrependimento era um dos elementos fundamentais da fé e de toda relação com Deus. G. F. Moore escreve:

  "O arrependimento é a condição única, mas inexorável, do perdão divino e da restauração do homem a seu favor; o perdão e o favor divino nunca são negados a quem se apresenta ante Deus genuinamente arrependidos." E adiciona: "Uma das doutrinas cardeais do judaísmo é que Deus remete plenamente e de maneira gratuita os pecados do penitente."

  Os rabinos diziam: "Grande é o arrependimento porque traz a saúde ao mundo; grande é o arrependimento porque chega até o Trono da Glória."

    C. G. Montefiore escreveu: "O arrependimento é o grande elo mediador entre Deus e o homem." A lei, segundo o ensino dos rabinos, teria sido criada dois mil anos antes do universo, mas o arrependimento é uma das seis coisas que foram criadas até antes da Lei. As seis eram: o arrependimento, o paraíso, o inferno, o glorioso Trono de Deus, o Templo celestial e o nome do Messias. Diziam: "Um homem pode arrojar uma flecha que chegue a várias centenas de metros, mas o arrependimento chega até o Trono de Deus." Há uma famosa passagem rabínica que coloca o arrependimento no primeiro de todos os lugares. "Quem é como Deus um mestre dos pecadores, que lhes ensine o arrependimento?" Demandavam à Sabedoria "Qual será o castigo do pecador?" e esta respondia: "O mal perseguirá os pecadores" (Provérbios 13:21). Demandavam à Profecia e esta respondia: "A alma que pecar, essa morrerá" (Ezequiel 18:4). Demandavam à Lei e esta respondia: "(o sacrifício) será aceito para expiação dela" (Levítico 1:4). Demandavam a Deus e este respondia: "Que se arrependa e obterá assim sua expiação. Meus filhos, o que outra coisa exijo de vós senão que me busquem e vivam?" De maneira que para o judeu o único caminho de volta a Deus é o arrependimento.

   A palavra hebraica que se usava como equivalente de "arrependimento" é em si extremamente interessante. É a palavra teshubá, que é o substantivo correspondente ao verbo shub que significa "dar a volta". O arrependimento é o rosto dar volta ao mal e voltar-se para Deus.

   G. F. Moore escreve: "O significado primitivo e transparente do arrependimento, no judaísmo, envolve sempre uma transformação da atitude do indivíduo a respeito de Deus. Quanto à conduta do indivíduo ou do povo que se arrepende, a conseqüência direta do arrependimento é a reforma moral e religiosa." C. G. Montefiore escreve: "Para os rabinos a essência do arrependimento consiste em uma mudança de atitude tão radical que inevitavelmente dele virá uma mudança na vida e no comportamento." Maimonides, o grande erudito judeu medieval, define o arrependimento da seguinte maneira: "O que é o arrependimento? O arrependimento significa que o pecador abandona seu pecado e o elimina de seus pensamentos e resolve que jamais voltará a incorrer nele, tal como está escrito: 'Deixe o ímpio seu caminho e o homem iníquo seus pensamentos'."

   G. F. Moore, de maneira muito interessante e valiosa, observa que com a só exceção das palavras que copiamos entre parêntese a definição de arrependimento da Confissão do Westminster seria perfeitamente aceitável para um judeu: "O arrependimento para a vida é uma graça salvadora, mediante a qual o pecador, a partir de uma autêntica convicção de pecado, e da percepção da misericórdia de Deus (em Cristo), volta-se de seu pecado para Deus, com dor e tristeza por seu pecado, ao que chegou a odiar, com o propósito pleno de viver em uma nova obediência, coisa que põe por obra." Uma e outra vez a Bíblia fala deste apartar-se do mal e voltar-se para Deus. Ezequiel o diz da seguinte maneira: "Vivo eu, diz o Senhor JEOVÁ, que não tenho prazer na morte do ímpio, mas em que o ímpio se converta do seu caminho e viva" (Ezeq. 33:11). Diz Jeremias: “Converte-me, e serei convertido, porque tu és o SENHOR, meu Deus.” (Jeremias 31:18). Diz Oséias: “Volta, ó Israel, para o SENHOR, teu Deus, porque, pelos teus pecados, estás caído. Tende convosco palavras de arrependimento e convertei-vos ao SENHOR; dizei-lhe: Perdoa toda iniqüidade, aceita o que é bom e, em vez de novilhos, os sacrifícios dos nossos lábios.” (Oséias 14:1-2).

   A partir de tudo isto fica claro que no judaísmo o arrependimento incluía uma exigência ética. É apartar-se do mal voltando-se para Deus, com a correspondente mudança no comportamento, na ação. João estava plenamente inscrito na tradição de seu povo quando exigia que seus ouvintes trouxessem frutos dignos do arrependimento. Há uma bonita oração da sinagoga judia que diz: "Faze que voltemos, Pai, à Tua Lei; aproxima-nos, Rei, a Teu serviço; traze-nos de volta em perfeito arrependimento até Tua presença. Bendito sejas Tu, ó Senhor, que te deleitas com o arrependimento." Mas este arrependimento devia manifestar-se em uma autêntica transformação da vida. Um rabino, comentando Jonas 3:10, escreveu: "Meus irmãos, não se diz dos ninivitas que Deus tenha visto seu cilício e jejum, mas sim viu suas obras, e deste modo interpretou que se voltaram de seus caminhos pecaminosos."

   Os rabinos diziam: "Não sejam como os parvos, que quando pecam trazem sacrifício ao templo, mas não se arrependem. Se alguém disser: Pecarei e me arrependerei; pecarei e me arrependerei, não lhe será permitido arrepender-se." Uma lista de cinco pecadores imperdoáveis incluía "os que pecam para arrepender-se, e os que se arrependem muito e voltam a pecar novamente." Diziam: "Se a pessoa tiver algo imundo em suas mãos, não bastarão as águas de todos os mares do mundo para lavar-lhe mas se arroja a coisa imunda, com um pouco de água bastará." Os mestres judeus falavam do que se denominava, "as nove normas do arrependimento", ou seja as nove necessidades de um autêntico arrependimento. Encontravam-nas na forma de mandamentos em Isaías 1:16, 17: “Lavai-vos, purificai-vos, tirai a maldade de vossos atos de diante dos meus olhos; cessai de fazer o mal. Aprendei a fazer o bem; atendei à justiça, repreendei ao opressor; defendei o direito do órfão, pleiteai a causa das viúvas.”

   O filho do Sirach escreve no Eclesiástico: "Não diga, pequei, e o que ocorreu comigo? Porque o Senhor é longânimo. Não confie estupidamente na expiação enquanto segue adicionando pecado sobre pecado, e não diga sua compaixão é grande, Ele perdoará a multidão de meus pecados; porque Ele é um Deus de misericórdia e de ira, e sua ira descansa sobre os pecadores. Não demore a voltar-se para Senhor, não vá adiando de dia em dia" (Eclesiástico 5:4-7). E volta a escrever, em outro lugar:

   "O homem que se lava para purificar-se do contato com um corpo morto e depois o volta a tocar, que benefício obtém de sua purificação? Deste modo ocorre com um homem que faz jejum por seus pecados e continua pecando nas mesmas coisas; quem ouvirá suas orações, e que razão havia para que se afligisse com penitências?" (Eclesiástico 31:30-31).

  O judeu sustentava que o verdadeiro arrependimento tem como resultado não somente um sentimento de tristeza, mas uma mudança na vida e o mesmo sustentam os cristãos. O judeu experimentava um santo horror ante a idéia de negociar com Deus por sua misericórdia e o mesmo os cristãos. O judeu sustentava que o autêntico arrependimento deve produzir frutos que demonstravam a realidade do arrependimento e o mesmo os cristãos. Mas os judeus tinham outras coisas a dizer sobre o tema do arrependimento, e devemos prosseguir com elas.

   A MENSAGEM DE JOÃO: A DEMANDA

  Mateus 3:7-12 (continuação 2)

  Há uma nota quase apavorante na demanda ética que envolve a idéia judia do arrependimento, mas há outros aspectos desta que são extremamente reconfortantes.

   Sempre é possível arrepender-se. "O arrependimento", diziam, "é como o mar, qualquer um pode banhar-se nele a qualquer hora." Possivelmente haja momentos em que os portais da oração estão fechados, mas sempre pode transitar-se pelo caminho do arrependimento. Ninguém pode jamais fechar as portas do arrependimento.

  O arrependimento é completamente essencial. Conta-se de uma espécie de discussão que Abraão manteve com Deus. "Não podes puxar os dois extremos da corda ao mesmo tempo", disse Abraão a Deus. "Se desejas uma estrita justiça, o mundo não a pode suportar. Se desejas preservar o universo que Tu mesmo criaste, a justiça perfeita é impossível." O mundo não pode seguir existindo a não ser graças à misericórdia de Deus e a porta sempre aberta do arrependimento. Se não houvesse outra coisa senão a justiça de Deus, esta significaria o fim de todos os homens e de todas as coisas. Tão essencial é o arrependimento, que para fazê-lo possível Deus mesmo cancela suas demandas: "Bem amado é o arrependimento aos olhos de Deus, porque por seu amor cancela ele suas próprias palavras." A ameaça da destruição que pende sobre o pecador é cancelada mediante a aceitação do arrependimento de seus pecados. O arrependimento dura tanto quanto a vida. Enquanto dura a vida, dura a possibilidade do arrependimento. "A mão de Deus se estira por baixo das asas da carruagem celestial, para arrebatar o penitente das garras da justiça." O rabino Simeão Ben Yohl disse:

   "Se um homem tiver sido absolutamente justo todos os dias de sua vida mas se rebela no último dia, destrói toda sua obra anterior, porque está escrito: ‘A justiça do justo não o livrará no dia da sua transgressão’ (Ezequiel 33:12). Mas se um homem tiver sido absolutamente mau todos os dias de sua vida e no último dia se volta de sua maldade, Deus o receberá, porque está escrito, ‘a impiedade do ímpio não lhe será estorvo no dia que se voltar de sua impiedade’ (idem). ‘Muitos’, diziam, ‘vão ao céu depois de anos e anos de justiça, mas outros ganham em uma hora.’ Como diria o poeta, referindo-se ao homem que obtém a misericórdia de Deus no instante de sua morte: ‘Entre os arreios e o solo, enquanto caía, procurei a misericórdia e foi minha.’ ”

  Tal é a misericórdia que aceita até o arrependimento secreto. O rabino Eleazar disse:

   “O modo de ser do mundo é que se um homem tiver insultado a outro publicamente e depois de um tempo procura reconciliar-se com ele, o ofendido lhe diz: ‘Você me insultou em público e agora quer que nos reconciliemos em privado e isso não pode ser. Vá e busque aqueles em cuja presença me insultou e então sim me reconciliarei com você.’ Mas não é assim com Deus. Qualquer um pode ficar de pé em um estrado e blasfemar, em praça pública, e o Santo lhe dirá: ‘Arrependa-te, entre nós dois, e eu te receberei.’ A misericórdia de Deus se estende até àquele homem tão envergonhado por sua ofensa que somente pode confessar a Deus.”

   Deus não se esquece de nada, porque é Deus, mas tal é sua misericórdia que não somente perdoa o pecado do penitente mas sim, embora pareça incrível, esquece-o: "Quem, ó Deus, é semelhante a ti, que perdoas a iniqüidade e te esqueces da transgressão do restante da tua herança?" (Miq. 7:18). "Retraíste toda a tua cólera, do furor da tua ira te desviaste" (Salmo 85:3, TB). O homem poderá talvez perdoar, mas esquecer a ofensa é algo que só se pode esperar de Deus.

   O mais maravilhoso de tudo é que Deus percorre Ele mesmo a metade do caminho, e às vezes mais ainda, para sair ao encontro do pecador penitente: "Volta-te tanto como possas, e eu farei o resto do caminho." Os rabinos, em seus melhores momentos, perceberam a imagem do pai que, na magnificência de seu amor, corre para sair ao encontro do filho pródigo.

   Entretanto, até recordando toda esta misericórdia, segue sendo verdade que no anterior arrependimento é necessária a reparação do mal cometido, quando esta é factível. Os rabinos diziam: "A ofensa deve ser paga, e o perdão procurado e recebido. O verdadeiro penitente é o que volta a ter a oportunidade de cometer o mesmo pecado, nas mesmas circunstâncias, e não o faz." Os rabinos sublinham repetidas vezes a importância de restabelecer as relações humanas cada vez que as tem quebrado.

   Há uma passagem rabínica extremamente curiosa: "Aquele que é bom em relação ao céu e a seus próximos é um bom zadik (Um zadik é um justo). Aquele que é bom em relação ao céu, mas não em relação a seus próximos, é um mau zadik. Aquele que é mau em relação ao céu e de seu próximos é um mau pecador. Aquele que é mau em relação ao céu, mas é bom em relação a seu próximo, não é um mau pecador." O fato de que a reparação seja tão necessária faz com que o pior pecador seja o que ensina a outros a pecar, porque não pode oferecer reparação por sua maldade, desde que não sabe até onde chegaram os efeitos de seu mau exemplo e em quantos chegou a influir.

   Mas não somente se necessita que haja reparação para que o arrependimento seja autêntico, também deve haver confissão. Em repetidas passagens bíblicas encontramos esta exigência. "O homem ou a mulher que cometer alguns dos pecados com que os homens prevaricam contra Jeová e delinqüem, aquela pessoa confessará o pecado que cometeu" (Números 5:6-7). "Aquele que encobre seus pecados não prosperará, mas o que os confessa e se aparta, alcança misericórdia." (Provérbios 28:13). “Confessei-te o meu pecado e a minha iniqüidade não mais ocultei. Disse: confessarei ao SENHOR as minhas transgressões; e tu perdoaste a iniqüidade do meu pecado.” (Salmo 32:5). O homem que pretende ser inocente e se nega a admitir que pecou é o que está condenado (Jer. 2:35). Maimonides sugere uma fórmula que qualquer um pode usar para confessar seus pecados! "Ó Deus, pequei, cometi iniqüidade, incorri em transgressões contra ti, e tenho feito tal e qual coisa. Estou entristecido e envergonhado por minhas ações, e nunca voltarei a incorrer nelas." O verdadeiro arrependimento requer a humildade que admite os pecados e os confessa.

   Não há caso perdido para o arrependimento, nem homem que esteja além da possibilidade de arrepender-se. Os rabinos diziam: “Ninguém afirme, ‘Porque pequei, já não tenho remédio’. Confie em Deus e arrependa-se e Deus o receberá.” O exemplo clássico de uma conversão e reforma moral virtualmente impossível é o do Manassés. Adorou aos baais, introduziu deuses estranhos em Jerusalém, e até chegou a sacrificar meninos a Moloque no vale do Hinom. Então foi levado cativo a Assíria e ali, em sua hora mais difícil, experimentou um terrível remorso de consciência. Em tal situação orou a Deus e este escutou sua súplica e o voltou a trazer para Jerusalém. "Então, reconheceu Manassés que o SENHOR era Deus" (2 Crônicas 33:13). Às vezes se necessita o castigo de Deus e sua ameaça para fazer com que o homem volte para seu lar junto ao Pai Eterno, mas ninguém está fora do alcance de Deus para recuperá-lo.

   Há uma última crença judia em relação ao arrependimento que deve ter estado presente na mente do João. Pelo menos alguns entre os mestres religiosos do judaísmo ensinavam que se Israel pudesse fazer um ato de arrependimento perfeito, mesmo que fosse apenas durante um só dia, imediatamente ocorreria a vinda do Messias. Somente a dureza dos corações dos homens atrasava o envio do Redentor divino ao mundo.

     O arrependimento estava no próprio centro da fé judia daqueles tempos, assim como da fé cristã, pois o arrependimento consiste em apartar-se do pecado e voltar-se para Deus, e para a vida que Deus quer que vivamos.

Mateus (William Barclay)



                                                

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