TEXTO ÁUREO
“Se teus
filhos pecaram contra ele, também ele os lançou na mão da sua transgressão”
(Jó 8.4).
VERDADE PRÁTICA
A existência do sofrimento não quer dizer que haja pecado oculto.
Jó 8.1-4; 18.1-4; 25.1-6.
Jó
8
1
— Então,
respondeu Bildade, o suíta, e disse:
2
— Até
quando falarás tais coisas, e as razões da tua boca serão qual vento impetuoso?
3
— Porventura,
perverteria Deus o direito, e perverteria o Todo-Poderoso a justiça?
4
— Se
teus filhos pecaram contra ele, também ele os lançou na mão da sua
transgressão.
Jó
18
1
— Então,
respondeu Bildade, o suíta, e disse:
2
— Até
quando usareis artifícios em vez de palavras? Considerai bem, e, então,
falaremos.
3
— Por
que somos tratados como animais, e como imundos aos vossos olhos?
4
— Ó
tu, que despedaças a tua alma na tua ira, será a terra deixada por tua causa?
Remover-se-ão as rochas do seu lugar?
Jó
25
1
— Então,
respondeu Bildade, o suíta, e disse:
2
— Com
ele estão domínio e temor; ele faz paz nas suas alturas.
3
— Porventura,
têm número os seus exércitos? E para quem não se levanta a sua luz?
4
— Como,
pois, seria justo o homem perante Deus, e como seria puro aquele que nasce da
mulher?
5
— Olha,
até a lua não resplandece, e as estrelas não são puras aos seus olhos.
6 — E quanto menos o homem, que é um verme, e o filho do homem, que é um bicho!
OBJETIVO GERAL
Mostrar que nem sempre o sofrimento é consequência de um pecado oculto, como pensava Bildade.
OBJETIVOS ESPECÍFICOS
Abaixo, os objetivos específicos referem-se ao que o professor deve atingir em cada tópico. Por exemplo, o objetivo I refere-se ao tópico I com os seus respectivos subtópicos.
- I. Destacar o
argumento de Bildade que contrastava o pecado com o caráter santo e reto
de Deus;
- II.
Explicar a
concepção de Bildade que associava o pecado à quebra da moralidade
religiosa;
- III. Esclarecer a argumentação de Bildade que contrapunha a pequenez humana com a grandeza de Deus.
INTERAGINDO COM O PROFESSOR
Deus é reto e justo. Ele é santo. Nesta lição veremos a contraposição que Bildade faz do caráter de Deus com o pecado humano. Logo, se Deus é santo e justo Ele não compactua com o pecado oculto de uma pessoa. Essa é uma doutrina correta. A constatamos ao longo de toda a Escritura. Entretanto, a acusação de pecado oculto se aplicaria a Jó? O livro deixa claro que não. O problema de Jó não era o pecado oculto. Embora seu amigo Bildade o acusasse, ele estava certo de que não havia nada a esconder. O diálogo de Jó e Bildade deve nos levar a seguinte reflexão: os problemas que se abatem na vida dos servos de Deus quase sempre não podem ser explicados de forma simplista.
COMENTÁRIO
INTRODUÇÃO
Nesta aula, estudaremos sobre a teologia do segundo amigo de Jó, Bildade. Veremos que ela apresenta o caráter justo e reto de Deus em contraposição ao suposto pecado oculto de Jó. Estudaremos também a defesa de Bildade por uma moralidade rígida, fundamentada em meros preceitos religiosos, sem, contudo, guiar-se por princípios espirituais. E, finalmente, analisaremos a ideia de que, segundo Bildade, Deus é um ser muito distante e que, devido a sua onipotência e grandeza, está muito longe do mortal. Ele, portanto, é inacessível. Ao longo de cada argumento de Bildade, veremos a contraposição de Jó.
PONTO CENTRA
Quando há sofrimento não se quer dizer que há pecado oculto.
A fragilidade
humana e a soberania divina — O sofrimento e a restauração de Jó
Comentarista: José Gonçalves
Capítulo
07 - A Teologia de Bildade: se Há
Sofrimento,
Há Pecado Oculto?
DO SIMPLES AO
COMPLEXO
A
teologia d os amigos
de Jó, embora
se movendo e m
eixos diferentes, demonstram
possuir uma mesma
direção. Todos defendem um
tipo de justiça
retributiva, que tem
como consequência final
a recompensa dos bons e o castigo d os maus. É por isso que, à s vezes,
o livro dá a impressão de
ser muito repetitivo.
Esse, porém, é
um recurso que o
autor utilizou para deixar em relevo aquilo que ele queria tratar. Fouilloux
et al
(1998, p. 138)
destaca que essa
é a novidade
e originalidade do
livro de Jó, qu e
marca a grande
virada do pensa mento
judeu sobre o mal. É a
passagem de u ma teoria simples — os bons
são recompensados, os maus
são punidos —
a uma reflexão sobre
o mistério do
mal que ultrapass a
o entendimento humano.
A
teologia d e Bildade,
assim como a
do seu a m igo
que o precedeu, também caminha
na antiga direção
do pensamento teológico.
O seu argumento caminha
na direção de
que onde há
sofri mento sempre, há algum
pecado por trás.
Na defesa da
sua tese, ele
desenvolve o seu argumento
teológico, primeiramente com
ênfase centrada no
caráter de Deus. Em
segundo lugar, na
defesa da moralidade
tradicional e, em terceiro lugar, na exaltação da
onipotência divina.
DEUS REVELADO NO SEU CARÁTER JUSTO (8.1 -7)
Então,
respondeu Bildade, o
suíta, e disse:
Até quando falarás
tais coisas, e as
razões da tua
boca serão qual
vento impetuoso? Porventura, perverteria
Deus o direito,
e perverteria o
Todo- Poderoso a justiça? Se teus filhos pecara m contra ele, também ele
os lançou na mão
da sua transgressão.
Mas, se tu
de madrugada buscares a Deus e
ao Todo- Poderoso pedires
misericórdia, se fores puro e reto, certamente, logo despertará
por ti e restaurará a morada da tua justiça. O teu princípio, na verdade, terá
sido pequeno, mas o teu último estado crescerá em extremo.
“Então,
respondeu Bildade, o suíta,
e disse: Até
quando falarás tais coisas,
e as razões
da tua boca
serão qual vento
impetuoso?” (8.1,2). O texto
declara que Bildade
era “ suíta”. Adam
Clarke (2014, p.
11) observa que há a suposição de que ele seria descendente
de Suá, um dos filhos de Abraão com
Quetura, e que
morava na Arábia,
denominada na Bíblia
de “terra oriental” (Gn 25.1-2; 6).
“Porventura,
perverteria Deus o
direito, e perverteria
o Todo-Poderoso a justiça?”
(8 .3). Bildade está
incomodado com a
fala d e Jó. No
seu entender, Jó,
por estar sendo
afligido , estaria acusando
o Senhor de ser
injusto. Bildade acredita
que Jó está
sendo punido pelo
pecado que cometeu e, por isso,
está convencido de que os
argumentos de Jó não
passavam de palavras
a o vento. Bildade
entendia que, ao
agir assim, querendo atribuir a Deus
o mal que lhe sobrevinha, Jó estaria, na verdade, acusando o Senhor de ter pervertido o direito
e a justiça. Todavia, B ildade acreditava que Deus estaria afligindo a Jó de
forma justa. Se Jó estava sob julgamento divino, era porque havia uma causa
para isso.
“Se
teus filhos pecaram contra ele, também ele os lançou na mão da sua transgressão” (8.4). Nesse texto, Bildade
causa mais dor e
sofrimento a Jó quando
envolve os seus filhos
na sua argumentação.
Segundo Bildade, os filhos
de Jó morreram
porque cometeram pecado.
Deus punira-os com a
morte. Ele estava
convencido de que
isso só aconteceu porque as
ações pecaminosas deles
haviam transbordado. Dessa
forma , Deus foi totalmente
justo em tê-los
matado. Como ficará
demonstrado posteriormente,
Jó sentiu-se muito
ferido com essas
palavras. O amigo nem
mesmo lembrou que
Jó intercedia pelos
seus filhos e
santificava -se por eles.
“Se
fores puro e reto, certamente, logo despertará por ti e restaurará a morada
da tua justiça”
(8.6). Esse versículo
torna-se quase como
um refrão na teologia dos amigos de Jó. Trata-se de uma afirmação
repetitiva da doutrina da retribuição, um princípio da lei de causa e efeito:
“Se você for bom, Deus irá
abençoá-lo. Se fo r
mal, Deus irá puni-lo”.
Não há nada errado
em exigir-se pureza,
retidão e um
agir justo diante
d e Deus. Certamente, o
Senhor agrada-se de
quem anda em
santidade e justiça.
O problema com essa argumentação é
que ela insiste
na culpa de
Jó, que o texto
deixa claro que
era um homem
íntegro, reto, temente
a Deus e que
se desviava do mal. Se
essas palavras de
Bildade fossem corretas,
então nada de ruim deveria estar acontecendo a Jó. A verdade, porém, era que a calamidade
abatera-se sobre Jó sem que ele tivesse culpa por isso.
As
palavras de Bildade
— “Se fores puro
e reto, certamente,
logo despertará por ti e restaurará a
morada da tu a justiça” (8.6 ) — parecem-se muito com as palavras do seu
amigo Elifaz — “Une-te, pois, a Deus, e tem paz, e,
assim, te sobrevirá
o bem” (22.21).
A ideia é
que as ações,
quando feitas corretamente, produzem
méritos diante de
Deus. Havia , portanto, na
fala de Bildade
um tipo de
meritocracia humana. Alguns
teólogos (Atkinson, 2010, pp.
67,68) enxergam nos
discursos dos amigos
de Jó semelhança
com a teologia
que, posteriormente, seria
conhecida como
pelagianismo.⁶⁸ Grosso modo,
o pelagianismo defende
que o homem, independentemente da graça, pode chegar-se a Deus sozinho.
A IMPUREZA E IMPERFEIÇÃO HUMANAS
“Então, Jó respondeu
e di sse: Na
verdade s ei que
assim é; porque como se justificaria o homem para com
Deus?” (9.1,2). Contrariamente ao pensamento
de Bildade, Jó
estava convencido de
que já vivia
uma vida reta diante
de Deus. A
insistência de Bildade
para que ele
buscasse a pureza e a
retidão soava aos seus ouvidos
que ele precisava nivelar-se ao
Altíssimo na sua pureza. Isso, evidentemente, Jó tinha consciência de qu e
seria algo inalcançável: “Ainda que me lave com água de neve, e purifique
as minhas mãos
com sabão, mesmo
assim me submergirás
no fosso, e as
minhas próprias vestes
me abominarão” (9.30,31).
Ninguém poderia alcançar um
estado de perfeição
completa, e Jó
tinha consciência disso. Viver essa santidade absoluta seria impossível,
visto que quem a possui é somente o Senhor.
A questão para
Jó, portanto, era
outra . O seu
amigo insistia que o
seu sofrimento era
consequência d e um
pecado não confessado, enquanto
a experiência de
Jó dizia-lhe que
isso não era verdade.
UMA FERRENHA DEFESA DA ÉTICA TRADICIONAL
(18.1-6) Então, respondeu
Bildade, o suíta,
e disse: Até
quando usareis artifícios em vez de
palavras? Considerai bem,
e, então, falaremos. Por que
somos tratados como
animais, e como
imundos aos vossos olhos?
Ó tu, que
despedaças a tua
alma na tua
ira, será a terra
deixada por tua
causa? Remover-se-ão as
rochas do seu lugar? Na verdade,
a luz dos
ímpios se apagará,
e a faísca
do s eu lar
não resplandecerá. A luz se escurecerá
nas suas tendas,
e sua lâmpada sobre ele se apagará.
“Na
verdade, a luz
dos ímpios se apagará, e
a faísca do s
eu lar
não resplandecerá” (18.5). Bildade posiciona-se na defesa da moral
tradicional. Há um conteúdo
ético embutido por
trás dos seus
argumentos de que a
luz dos ímpios se apagará . Vivemos em um universo moral onde as ações sempre
produziram consequências. Ele, portanto,
posiciona-se em defesa da
moralidade que herdara
dos antepassados. Não
há dúvida de q
ue o rigorismo ético
não está presente
apenas no discurso
dos amigos de Jó,
mas também pode ser encontrado em outras partes do Antigo Testamento.
A
Antiga Aliança posiciona-se
a favor de uma moralidade
de cunho universal. Compreender
a evolução do
pensamento ético dentro
da revelação hebraica do
Antigo Testamento sem dúvida contribui
para o entendimento do contexto
de Jó.
UMA
ÉTICA UN IVERSAL
A
diferença existente entre a moralidade de Israel e os demais povos vizinhos
pode ser explicada pelo contraste entre uma fé monoteísta vivida pelos hebreus
e a crença
politeísta vivida pelos
demais povos vizinhos. Enquanto o
monoteísmo, centralizado na
pessoa de um Deus único revelado aos
hebreus, era um
elemento unificador de
um padrão ético absoluto e
de natureza universal,
por outro lado
a fragmentação de crenças, distribuídas entre vá rias
divindades, impedia esse consenso ético nos demais povos. Dessa forma, Kinlaw
(2007, p. 242) destaca o seguinte:
Há uma qualidade absoluta na ética, resultante
d o fato de que Deus é u m e
soberano, sem igual,
sem rival. O
politeísmo apresentava uma base
múltipla e variada para o sistema de valores dos homens, o que impedia que
houvesse qualquer unidade.
Um
só Deus —
logo, uma só
vontade — conferia
unidade a toda
a criação. É exatamente
essa ideia de
Deus como a
fonte de todas
as coisas criadas que
confere à ética
do Antigo Testamento
o caráter de universalidade. Kinlaw
a inda observa que
a transcendência de Deus
permitia uma aplicação
universal da lei moral
em Israel que
o tornava singular em
todo o mundo
antigo. Ante o
Criador, todos os
homens são iguais. A lei moral
era aplicada tanto ao rei quanto ao plebeu mais comum. Os mais
pobres e poderosos
tinham a mesma
responsabilidade que os mais
humildes (ver as
histórias de Davi
e Natã , 2 Samuel 12,
e Nabote e Acabe, 1 Rs 21). Há um só Deus e uma só lei
para todos.
Os
pressupostos do monoteísmo
ético⁶⁹, fundamental para a
compreensão da ética
judaica, são mais
des envolvidos no contexto
dos profetas. Os profetas
foram, sem dúvida,
os principais defensores
de um padrão moral elevado de
cunho universal. Isso não
significa dizer que os
profetas “ inventaram” uma
nova moralidade. Na
verdade, eles invocavam
princípios éticos há muito implantados pela Palavra de Deus, mas que haviam sido esquecidos
ou negligenciados pelo povo de alguma forma.
A palavra de
Deus era, portanto,
a base da
denúncia profética. Wurtwein (1985,
p. 136), por
exemplo, d estaca que
a acusação que os
profetas proferem denúncias
em seu nome
(de Deus) não
deve s er compreendida
primordialmente como expressão de uma consciência ética que se
tenha manifestado pela
primeira vez com
os profetas. Pelo contrário, ela se orienta
pela lei, expressão
da vontade de Javé e formulada, por exemplo, no Livro do Pacto
muito antes dos profetas.
Os
pressupostos judaicos para a expressão
da moralidade de natureza universal, sem dúvida al guma,
são encontrados na exigência da fé
monoteísta, que, por
sua vez, se
refletia o caráter
de Deus. Isso
ganha mais relevância ainda
no contexto dos
profetas, pois se
credita a eles o
início do monoteísmo ético. Segundo a Enciclopédia Judaica (2 007, p. 449)
enquanto o paganismo
chega na unicidade
de sua divindade
através do raciocínio filosófico
e por considerações
ontológico-metafísicas, a fé bíblica
chega à unicidade
de sua divindade
por causa de
considerações éticas e através de
uma visão direta sobre o absoluto
caráter da lei moral. Assim, o
monoteísmo bíblico pode ser distinguido do monoteísmo pagão em que só ele é o
monoteísmo ético.
Geerarhardus Vos
(2010, p. 253)
destaca que muitos
críticos acreditam que o
aparecimento d o elemento
ético no judaísmo
“deve ter vindo entre
os dias de
Elias e Eliseu,
por u m lado,
e a época
de Amós e Oseias por outro”. Mesmo que não se
concorde com todas as alegações da crítica
bíblica sob re a
gênese do elemento
ético no judaísmo
(como ficou demonstrado, os
profetas não cri aram
uma nova ética,
mas perpetuaram a já existente),
todavia não há como negar que o
monoteísmo ético torna -se mais
evidente na boca dos profetas. Esse fato, por exemplo, é afirmado na resposta
dada pelo povo
ao sacrifício proposto
pelo profeta E lias:
“O que vendo todo o povo,
caiu sobre os
seus rostos e disse: só
o Senhor é Deus!
Só o Senhor
é Deus! (1
Rs 18.39). Keil
e Delitzsch (2009,
vol. 1, p. 1005)
corroboram esse fato,
dizendo: “ Com este
milagre Deus não somente legitimou a Elias como seu servo
e profeta senão que se mostrou como Deus vivo a quem Israel devia servir [...] Deus
é Deus! O verdadeiro ou Deus real”.
Isso se torna
mais emblemático no
caso d e Eliseu.
Não há dúvida d e
que o cronista
de 2 Reis
queria destacar esse
fato na cura
de Naamã, o oficial
sírio. Quando curado,
Naamã reconheceu diante
de Eliseu que “[...] em toda a
terra não há Deus, senão em Israel” (2 Rs 5.15).
Wiersbe
(2008, p. 511)
põe em relevo
essa expressão do
oficial sírio: “Naamã havia
acabado de testemunhar que só Jeová, o Deus de Israel, era o Deus
de toda a
terra (v. 15)!”.
Dessa forma, os
pressupostos éticos verbalizados nas
falas de Elias
e Eliseu são d
e natureza universal
e ganham relevância e expressão para a moralidade contemporânea.
A fé monoteísta é importante para a moralidade, seja ela judaica seja
cristã, porque o seu fundamento
não reside na natureza, como
criam os filósofos pré-socráticos ; não
estava no mundo
das ideias, como
queria Platão, nem tampouco
na prática da
razão pura, como
defendia Kant. A sua base está no caráter d e Deus, que quis
revelar -se ao homem. Esse é um ponto
de grande importância quando se busca
uma fé fundamentada
em princípios. Se a
fonte dos valores
for qualquer coisa
fora de Deus (natureza, cosmos, homem, etc.),
forçosamente se tornará relativista.
Por ser uma
religião monoteísta, o
judaísmo desenvolveu o seu
conceito de moralidade
a partir da
revelação dessa verdade.
Esse princípio, como ficou
demonstrado, pode ser
encontrado em diferentes períodos da
história bíblica, tanto
em Jó, como
também nos antigos profetas. Nos
dias de Jó,
evidentemente havia uma
tradição com forte conteúdo moral. Os valores éticos eram
cultivados e passados de pai para filho.
O capítulo 18
mostra Bildade acusando
Jó de tentar
subverter essa moralidade tradicional.
Bildade entendia que
Jó, ao defender -se,
não reconhecendo que havia
pecado, estava contra
o fluxo da
história. Ele acreditava que a punição
d os maus e
a recompensa dos bons era
uma verdade inquestionável e inegociável. Por outro lado, Jó está
consciente de que não possui
nenhuma justiça própria
e, por isso,
sabe que precisa
de um mediador ou intercessor (19.21-24). Ele não quer mais se
autojustificar. Somente Deus é
justo e puro.
Ele sabe que
o seu “Redentor
vive” e que, por fim, atenderá ao seu clamor.
EM
DEFESA DA ONI POTÊNCIA DIVINA (25.1-6)
Então, respondeu Bildade, o suíta, e disse:
Com ele estão domínio e temor; ele faz
paz nas suas alturas. Porventura, têm número os seus exércitos? E
para quem não
se levanta a
sua luz? Como,
pois, seria justo o homem perante
Deus, e como seria puro aquele que nasce da mulher? Olha, até a lua não
resplandece, e as estrelas não são puras aos seus olhos. E quanto menos o
homem, que é um verme, e o filho do homem, que é um bicho!
“Com
ele estão domínio e temor; ele faz paz nas suas alturas” (25.2). O terceiro
discurso de Bildade é bem resumido e apresenta uma defesa da grandeza de
Deus. Bildade dá
sinais de que
está cansado e
de que não quer mais discutir com Jó. Ele está escandalizado
diante da obstinação de Jó frente aos seus argumentos . Stadelma nn (1997, p.
103) destaca: Numa
síntese densa e resumida, Bildade
dá a
versão abreviada dos argumentos apresentados pelos amigos de Jó,
descrevendo os traços principais da epifania
de Deus em
contraste com a
contingência humana. O motivo que o levou a inserir aqui a descrição do
poder e do esplendor da majestade divina foi talvez a alusão a o julgamento,
no capítulo anterior,
ou a manifestação
da perfeição divina,
cuja imagem de pureza
absoluta e ideal
de santidade mostram
a meta a que o homem deve tender (vv. 1-6).
Havia uma distância intransponível entre o
homem e Deus na mente de Bildade. O
homem não passava de um ser frágil e passageiro, que mais se assemelhava
a um verme
(v. 6). Dessa
forma, até mesmo
os astros celestes apresentavam
imperfeições diante da
majestade divina (v. 5
). Se as coisas eram assim, então o que
fazia Jó pensar diferente? Ele achava-se como sendo de alguma
importância? Nas palavras de Schonberger:
Efetivamente Bildade
condensa em palavras,
experiências fundamentais da fé:
a sublimidade e
a incompreensibilidade de Deus,
a miséria e
a decadência mortal
do ser humano.
Também o salmista do
Sl 2 2 deve
confessar de si
mesmo: “Quanto a
mim, sou verme, não homem, riso
dos homens e desprezo do povo” (Sl
22.6). Se o ser humano quiser compreender a si mesmo, não pode escapar
a este
discernimento. Contudo, de
acordo com o
testemunho da Escritura, com
este disc ernimento ainda
não se alcança
o fim do reconhecimento humano.
De modo que
o salmista também
pode dizer: “Vós que
temeis a Iavé,
louvai-o! [...] Temei-o,
descendência de Israel! Sim, pois ele não desprezou, não desdenhou a
pobreza do pobre” (Sl 22.23-24)
[...] Também aos
amigos de Jó não ficou ignorado o
conhecimento acerca do
agir salvífico de
Deus (cf. 5.19 - 27;
8 .20-21; 11.16-19; 22 .21-30).
No entanto, parece
que não se
abriu para eles nenhum acesso
próprio, interior, a esse
conhecimento. D e modo que, em
razão de seu
conhecimento fechado, no
final eles devem emudecer. No
entanto, onde o ser
humano s e cala a Palavra de Deus ainda se levanta.
DEUS ONIPOTENTE, PORÉM SEMPRE PRESENTE
(26.1-4)
Jó
reage com ironia às palavras de Bildade. Dizer que Deus é grande, majestoso e
tremendo a um homem moribundo e consumido pela doença não ajuda
em nada (vv. 1
-4). Jó
demonstra ter consciência
da transcendência divina,
não a nivelando à
criatura em nenhum
mo mento. Ele também sabe que a criação é um testemunho vivo da
majestade divina. Todo o Universo é um retumbante testemunho da grandeza do
Altíssimo. Jó, porém, respondeu e disse: Como ajudaste aquele que não tinha
força e sustentaste o
braço que não
tinha vigor!
Como
aconselhaste aquele que não
tinha sabedoria e
plenamente lhe fizeste
saber a causa,
assim como era! Para quem proferiste
palavras? E d e quem é o espírito que saiu d e ti? “Como
aconselhaste aquele que
não tinha sabedoria
e plenamente lhe fizeste
saber a causa,
assim como era!”
(26.3). Como já
foi destacado, Jó dá início à sua
fala ironizando as palavras de Bildade. João Crisóstomo (Oden, 2010,
p. 182) observa
que Bildade não
deve s er reprovado
por ter defendido um atributo de
Deus, o que
é normal. No
entanto, ele não deveria ter condenado Jó. Era possível
defender os atributos de Deus sem acusar o
seu amigo. No seu comentário
do livro de
Jó, a patrística
faz importantes observações sobre
esse debate. Oden
(2010, p. 182)
comenta: em sua resposta,
Jó demonstra como
Bildade está acusando-o
falsamente e sem fundamento
ainda que trate
de parecer prudente
e sábio (Crisóstomo, Gregório).
Ao mesmo tempo, as palavras de Bildade sobre a ordem divina do mundo dão a Jó a
ocasião de expressar sua compreensão e admiração pelo papel providencial de Deus
sobre o universo (Juliano de Eclana,
Olimpiodoro, Isodad, Gregório).
A prudência “excessiva” se faz
evidente quando um se
mostra que rer ser
mais prudente do
que o outro. Pretender dar
conselho a mesma
Sabedoria é um
ato de perversidade (Gregório). Deus tem ordenado à
luz e à escuridão que ocupem seu tempo estabelecido em
boa harmonia e que nã o
prevaleça uma sobre
a outra (Isodad). Como de
costume, os pais da igreja veem nas palavras
d e Jó uma mensagem profética: neste
discurso anuncia a
difusão do evangelho
e a destruição do mal pelo poder
de Cristo (Felipe, Efrén).
Na
análise de Jó (26.1-14), a descrição que
Bildade faz da divindade é imperfeita
e incompleta. Jó
exalta a o Senhor
e reconhece a sua
onipotência. Ele mostra
que o cosmo criado
por Deus, mesmo
revelando toda a sua vastidão, contempla apenas um simples vislumbre do
Criador. Jó faz referência
ao domínio de
Deus, mas não se refere a
esse domínio como sendo
uma esfera onde
se esconde o Senhor e
onde homem algum pode
penetrar (26.14). No
Universo criado por
Deus e por
Ele regido, as pessoas
também fazem parte
do projeto divino.
Deus convive com as
pessoas dentro desse
seu domínio. Ele
não é um
ser inalcançável e inacessível
como Bildade defende
que seja. Ele
não é apenas
soberano; é também amor.
É compaixão e
graça. Aconselhar um moribundo
como Jó simplesmente com a imagem
da onipotência divina sem levar em conta
a sua compaixão provou ser ineficaz . “Como ajudaste aquele que nã o
tinha força e sustentaste
o braço que
não tinha vigor!”
(v. 2 ). Samuel
Terrien (1997) destaca que
Bildade ignora as
categorias do bem
e do mal,
não compreende as agonias espirituais de Jó e não percebe o s mistérios
de um Deus cuja transcendência não encobre o amor.
⁶⁸ Veja
uma exposição sobre essa doutrina na obra: Dicionário
de Religiões, Crenças e
Ocultismo. São Paulo: Vida, 2009.
⁶⁹ “O Monoteísmo Ético é o conceito originado no judaísmo segundo o qual Deus é a base ética para a sociedade”
A fragilidade
humana e a soberania divina
— O sofrimento e a restauração de Jó
José
Gonçalves
A Teologia de Bildade
Introdução
Afirmou Calvin Coolidge ser a prosperidade
apenas um instrumento a ser usado, não uma divindade a ser venerada. O conselho
de Coolidge não tem sido levado a sério pelo homem moderno que,
transformado numa máquina de consumir, trata os bens materiais como se
fossem estes o supremo bem da vida. Infelizmente, até os evangélicos têm-se
deixado seduzir por essa deusa que, vestida de doutrina e adorna da de
teologia, não precisou de muito esforço para entronizar-se entre os santos. E,
assim, pôs-se a Teologia da Prosperidade a enfermar a Igreja de Cristo.
Esse arremedo de doutrina induz os fiéis a
inverterem os mais caros valores da fé cristã: o mais importante, agora, para
milhões de filhos de Deus, não é o ser; e, sim: o ter. Hoje, julgamos os servos
de Cristo não pelo que são, mas pelo que têm. Se muito possuem, muito lhes
somos favoráveis; se pouco, pouco lhes somos favoráveis; e, se nada mais detêm,
em nada lhes somos favoráveis. Assim foi o patriarca Jó avaliado por seu amigo
Bildade
—
um típico representante da Teologia da Prosperidade.
Talvez
esteja você sendo avaliado por seus poucos haveres, ou pelas angústias que
enfrenta. Não se exaspere! Você é ovelha daquEle Pastor que tem nas mãos tudo
quanto necessitamos.
I. Quem Foi Bildade
Também não
possuímos muitas informações acerca
de Bildade. Limita-se a Bíblia a informar que este amigo de Jó era um suíta. Certamente morava ele em Canaã, ou
em suas imediações, pois: a) falava uma língua aparentada a de Jó e a de
seus amigos; b) não demorou em
encontrar-se com Elifaz e Zofar quando
combinaram vir consolar
o patriarca; c) sua
visão de mundo era bem parecida com a de seus dois outros companheiros.
Conclui-se ter sido Bildade um semita que habitava no território cananeu, onde
Suá, à semelhança de Temã, era um dos muitos pequenos reinos ali estabelecidos.
No Livro de Jó, temos três discursos de
Bildade, nos quais realça ele a prosperidade como a evidência de uma vida aprovada
por Deus. Eis por que, agora, despreza a Jó; neste, vê o sinal da ira divina.
No drama do patriarca, cumpria-se o que disse Ovídio: “Enquanto o homem tem uma vida próspera,
conta sempre com um numeroso grupo de amigos; tão logo a adversidade o visita,
os pretensos amigos o abandonam”.
II. A Prosperidade como
Evidência da Bênção de Deus
Predecessor
da Teologia da Prosperidade, afirmou Bildade
a
seu amigo Jó: “Mas, se tu de madrugada
buscares a Deus e ao Todo-poderoso pedires misericórdia, se fores puro e reto,
certamente, logo despertará por ti e restaurará a morada da tua justiça. O teu
princípio, na verdade, terá sido
pequeno, mas o teu último estado crescerá em extremo” (Jó 8.5-7).
Como
julgar suas declarações? Embora
lógicos em sua aparência; apesar
de exteriormente aceitáveis;
e, conquanto teologicamente consumíveis,
os enunciados de Bildade não se achavam de acordo com o pensamento divino. Tais
postulados em muito se assemelhavam às proposições que Satanás apresentou ao
Cristo no deserto. Eram verdades fora de seu contexto; portanto, inválidas.
Mas, o que vem a ser a Teologia da
Prosperidade? Por que é ela tão perigosa?
1. Definição. Se
nos detivermos na História da Igreja
Cristã, constataremos
que, todas as
vezes que a
economia mundial é ameaçada por uma recessão, surgem teólogos que,
aproveitando-se das circunstâncias, põem-se a enfatizar a posse dos bens
materiais como o mais importante legado da vida.
De início, essa ênfase parece inofensiva;
é até recebida como a última revelação de Deus. Com o tempo, porém, começa a
reclamar uma doutrina até se fazer teologia; daí a sua sistematização é um
passo. Defini-la não é difícil; combatê-la, sim.
Por conseguinte, é a Teologia da
Prosperidade a doutrina, segundo a qual o crente, por ser filho de Deus, jamais
enfrentará problemas financeiros e outras agruras, pois foi ele destinado a
viver de maneira regalada; não tem de se defrontar com as provações tão comuns
aos outros seres humanos.
2. As origens
da Teologia da Prosperidade na
Igreja
Cristã.
ATeologia da Prosperidade, como a conhecemos, tem as suas origens na Reforma
Protestante do Século XVI. Não estou insinuando hajam sido Lutero ou Calvino
proponentes dessa heresia; alguns pósteros, contudo, supervalorizando os
ensinos concernentes ao trabalho e às atividades comerciais, acabaram por
enveredar-se por um perigoso materialismo; pois foram incapazes de entender a doutrina daqueles homens
a quem Deus levantara não somente para avivar-lhe a Igreja, como também
para educar os povos da Europa. Vejamos o caso específico de Calvino.
Chegando João Calvino
à Suíça, deparou-se com uma nação espiritual, moral e economicamente
arruinada. Na reabilitação daquele povo dolente e já perigosamente viciado, o
reformador passou a realçar o trabalho como bênção de Deus.
Ora, se o trabalho era uma bênção (como de
fato o é) por que não o seria também o seu fruto: a riqueza?
Max Weber faz uma judiciosa análise da
ética protestante que, segundo ele, acabou por gerar o capitalismo ocidental:
“Uma simples olhada nas estatísticas ocupacionais de qualquer país de
composição religiosa mista mostrará, com notável freqüência, uma situação que muitas vezes provocou discussões na
imprensa e literatura católicas e nos congressos católicos, principalmente na
Alemanha: o fato de que os homens de
negócios e donos do capital, assim como
os trabalhadores mais especializados e o pessoal mais habilitado
técnica e comercialmente das modernas empresas são predominantemente
protestantes”.
Prossegue Max Weber: “Um escritor
contemporâneo tentou definir a diferença de atitudes diante da vida econômica
da seguinte maneira: ‘O católico
é mais quieto, tem menor impulso aquisitivo; prefere
uma vida a mais segura possível, mesmo tendo menores rendimentos, a uma vida
mais excitante e cheia
de riscos, mesmo
que esta possa
lhe propiciar a oportunidade de ganhar honrarias e
riquezas. Diz o provérbio, jocosamente: ‘Coma ou durma bem’. Neste caso, o protestante
prefere comer bem, e o católico, dormir sossegado”.
O pastor Wilson Castro Ferreira assim
analisa a influência de João Calvino no capitalismo: “Para Calvino, conforme
alguns dos seus biógrafos, o mandamento que requer o descanso de um dia é tão
importante na parte que ordena esse descanso,
como na outra parte que
ordena: ‘trabalharás seis dias’.
E no Calvinismo, especialmente, que parece verificar-se a combinação de um
extraordinário capitalismo com a mais intensa forma de piedade. Max Weber vem
buscar em Benjamin Franklin, nas suas curiosas máximas, a amostra da ética
puritana. Embora reconheça que Benjamin Franklin não é um ortodoxo puritano,
mas um ‘deísta descolorido’, é,
todavia, descendente de puritanos
e a sua filosofia de
trabalho e de economia é fruto da influência que
recebera de seu pai: ‘Depois da indústria e frugalidade, nada mais contribui
tanto para erguer um jovem na vida do
que a pontualidade e a retidão nos seus atos. ‘O som do seu martelo às
cinco da manhã e às oito da noite,
ouvido por um credor, fá-lo complacente por mais seis meses; mas se ele
o vê na mesa de bilhar, ou ouve a sua voz na taberna, quando você devia estar
trabalhando, mandará buscar o dinheiro no dia seguinte”.
3. A heresia que tem como fonte o consumo.
Torcendo a doutrina de Calvino, alguns evangelistas puseram-se a construir a
chamada Teologia da Prosperidade que, desde a década de 1970, vem comprometendo
importantes artigos de fé, como se a vida do homem consistisse apenas nos
haveres materiais.
No exame dessa questão, evitemos os
extremismos. Em primeiro lugar, o trabalho não pode ser considerado maldição declarou, com tanta pertinência, nos últimos dias sobrevirão
tempos
trabalhosos; porque haverá homens... avarentos... mais
amigos
dos deleites do que amigos de Deus, tendo aparência de
piedade,
mas negando a eficácia dela”’.
Foi essa doutrina que Bildade resolveu
ensinar a Jó. Pensava ele que, se o patriarca estava sofrendo era porque cometera
algum pecado contra o Senhor. Pois somente os pecadores são acossados com
tantos infortúnios; os justos, defendia, estão
isentos dessas intempéries.
Detenhamo-nos, um pouco mais, na doutrina de Bildade que, como
pode você observar, possui muitos pontos de contato com a teologia de Elifaz.
4. A Teologia da Prosperidade e a idolatria.
Acreditavam os pagãos que, estando os deuses satisfeitos, tudo lhes iria bem;
caso contrário: haveriam de amargar a fome, a sede, o frio, o ataque dos animais. Como, porém,
manifestava-se a satisfação dos deuses? Na prosperidade que concediam aos seus
devotos.
Lamentavelmente, até os próprios judeus
seriam induzidos a pensar dessa maneira. No tempo do profeta Jeremias, adoravam eles a rainha
dos céus por supor que a sua felicidade proviesse dela: “Mas, desde que
cessamos de queimar incenso à Rainha dos Céus e de lhe oferecer libações,
tivemos falta de tudo e fomos consumidos pela espada e pela fome. Quando nós
queimávamos incenso à Rainha dos Céus e lhe oferecíamos libações, fizemos-lhe
bolos para a adorar e oferecemos- lhe libações sem nossos maridos?” (Jr 44.19).
Por conseguinte, tem a Teologia da Prosperidade como
fundamento a idolatria dos bens materiais que, por seu turno, vai gerando nos
que a adotam, uma avareza crônica. E o que é a avareza senão idolatria? A
advertência é do apóstolo Paulo: “Mortificai, pois, os vossos membros que estão
sobre a terra: a prostituição,
a impureza, o apetite desordenado, a vil concupiscência e a avareza, que é
idolatria” (Cl 3.5).
Ill As Contradições da Teologia da
Prosperidade
Além de brincar com as palavras e jogar com raciocínios aparentemente
válidos, Bildade põe-se a invocar o testemunho dos antigos. Não agem assim os
modernos proponentes da Teologia da Prosperidade? Na defesa deste aleijão
doutrinário, torcem as Sagradas Escrituras, deformam a verdade, fazem uso de
subterfúgios exteriormente lógicos e até citam, fora de seu contexto, o
testemunho de vozes autorizadas (2 Pe 3.16).
I.
A prosperidade material nem sempre é
evidência da bênção de Deus. De acordo com a História Sagrada, vêm os ímpios
prosperando materialmente; às vezes, até mais que os justos (SI
73.1-10). O que
dizer da civilização
inaugurada pelo homicida Caim?
A cidade por
ele fundada era, tecnologicamente, avançadíssima (Gn
4.17-22). Enquanto isso, nem notícia
temos do progresso
alcançado pelos filhos
do piedoso Sete. Que
riquezas lograra Enoque? Ou
Noé? Ou ainda Sem? Enquanto isso,
iam os descendentes do mdecoroso e irreverente Cão fundando grandes impérios:
Líbia, Egito, Etiópia e os domínios de Canaã (Gn 10.1-20).
2. As provações dos justos. O registro dos fatos
que ocorreram após a era de Bildade destaca alguns homens que, apesar de sua
comprovada e ímpar piedade, foram submetidos às piores agruras.
Se Abraão, Isaque e Jacó
foram abençoados com grandes
riquezas, foi José vendido como escravo, e como escravo viu-se
constrangido às mais
singulares humilhações
(Gn
37.26-36). Elias, Amós e Lázaro vivenciaram necessidades básicas. O primeiro
viu-se na contingência de nutrir-se do que lhe traziam os corvos (I Rs
17.5-7). O segundo, como boieiro, alimentava-se de sicômoros (Am 7.14).
E o terceiro, além da extrema pobreza, fora coberto por uma terrível chaga; e,
assim, abandonado por todos, comia das migalhas que caíam da mesa do rico (Lc 16.20-25).
3. A evidência de uma vida piedosa. Não quero,
com isso, ressaltar a pobreza como evidência de uma vida plena de Deus,
como não o é também a riqueza; nas Sagradas Escrituras, deparamo-nos tanto com
ricos piedosos quanto com pobres incrédulos e nada tementes a Deus.
Temos
de agir com equilíbrio e discernimento, pois os extremismos teológicos, quer à esquerda,
quer à direita da Bíblia, são
nocivos. Logo: que ninguém seja julgado pelo que tem, mas pelo que é (M t 5.16; I Tm 5.25;Tg
1.26,27). Quer
Deus nos conceda riquezas, quer nos
deixe experimentar necessidades, tenhamos em mente que Ele é soberano e, como
tal, sabe tratar
seus filhos (Jr
18.1-6). Habacuque e
Paulo sabiam viver na abundância, e não se perturbavam na privação
(Hc
3.17-19; Fp 4.10-13).
IV A Justa Porção de Agur
A Teologia da Prosperidade é diabolicamente
perversa e mentirosa: conduz os filhos
de Deus a buscar a riqueza, por concluírem ser esta tão importante quanto
a salvação. Alerta
Paulo, contudo, que, os que porfiam por
serem ricos, caem em muitas ciladas (I Tm 6.9). O mesmo apóstolo ainda alerta
ser o dinheiro a raiz de todos os males (I Tm 6.10).
I. A teologia da miséria. Não é a nossa intenção
urdir uma teologia da miséria, como
se esta fosse suficiente para conduzir-nos
aos céus. Se o fizermos, cairemos nas
mesmas
heresias
daqueles monges que, com os seus votos de pobreza,
supõem
já ter logrado a riqueza celeste. Assim como há ricos
piedosos,
e Jó, entre todos os ricos, pontificava por sua integridade, há também pobres
ímpios e inimigos de Deus — e não são
poucos!
2. A
porção de Agur.
Onde buscar este
equilíbrio?
Encontrá-lo-emos
na petição que, certa vez, um homem chamado Agur endereçou a Deus: “Duas coisas te pedi; não mas negues, antes
que morra: afasta de mim a vaidade e a palavra mentirosa; não me dês nem a
pobreza nem a riqueza; mantém-me do pão
da minha porção
acostumada; para que, porventura, de farto te não negue e
diga: Quem é o SENHOR?
Ou que, empobrecendo, venha a furtar e
lance mão do nome de Deus” (Pv 30.7-8).
Noutras palavras, rogava Agur ao Senhor o
pão nosso de cada dia (Mt 6.11).
Atentemos também a esta recomendação do
Senhor Jesus: “Por isso, vos digo: não andeis cuidadosos quanto à vossa vida,
pelo que haveis de comer ou pelo que haveis de beber; nem quanto ao vosso
corpo, pelo que haveis de vestir. Não é a vida mais do
que o mantimento,
e o corpo, mais
do que a vestimenta?” (M t 6.25).
Vejamos o que ainda diz Paulo: “Porque nada
trouxemos para este mundo e manifesto é que nada podemos levar dele.
Tendo, porém, sustento e com que nos
cobrirmos, estejamos com isso contentes” (1 Tm 6.7,9).
Conclusão
Então,
a que conclusão chegamos? É prejudicial ao crente possuir riquezas? Todavia, se
a não usarmos para expandir o Remo de Deus e para minorar o sofrimento de
nossos irmãos,
impiamente agimos.
Por isso deve o rico
gloriar-se em seu
abatimento
(Tg 1.9).
Quer pobres, quer ricos, gloriemo-nos
sempre em Deus, pois Ele fez tanto um quanto o outro. Além disso, não disse o
Senhor que
sempre haverá pobres na terra? (Dt
15.11) Eis por que o
rico tem de ajudar o
pobre, a fim de que
todos tenham o mínimo necessário para viver.
Portanto, que nenhum Bildade venha acusar
os que, à semelhança de Jó, encontram-se no crisol da provação. A riqueza e a
pobreza não podem servir de parâmetros para se julgar os servos daquEle que
tudo possui, mas que de tudo se despojou por amar-nos com um amor eterno.
COMENTÁRIO DE JÓ
CLAUDIONOR DE ANDRADE
Jó 8
c) Primeiro
discurso de Bildade. 8:1-22.
24
Bildade prova ser tão insensível quanto Elifaz em relação à miséria de Jó. Ele
despreza a defesa que o sofredor faz do seu lamento, ignora sua crítica sobre a
atitude pouco simpática dos seus amigos e continua dando a Jó mais conselhos
iguais aos de Elifaz em nome da justiça divina (vs. 2-7) e da tradição
venerável (vs. 8-19). Depois, desajeitadamente, anexa uma palavrinha de
estímulo (vs. 20-22).
2a. Até quando. Aqui não há nenhuma
apreciação pelos meses de paciência; só indignação pelos poucos minutos de
impaciência!
3a.
Perverteria Deus o direito? É claro que Deus não era injusto com Jó. Mas por
trás da pergunta retórica de Bildade jaz o julgamento: Jó colhia os frutos do
pecado. Esse aspecto da justiça divina, embora sem dúvida envolvesse o lamento
de Jó, não estivera antes de tudo em seus pensamentos. O patriarca contemplara
seu destino mais pela perspectiva metafísica da transcendência divina e
limitação humana. Focalizando a atenção sobre o aspecto judicial, os
consoladores só conseguiram intensificar a tentação do seu amigo. A teodicéia
de Jó era tão inadequada quanto a deles. A razão portanto lhe dizia que Deus
devia estar profundamente aborrecido com ele. Mas sua consciência se recusava a
reconhecer uma transgressão proporcional ao seu sofrimento. Onde então ficava a
justiça? Onde estava o bom Deus que ele conhecia?
4b. Ele os lançou no poder de sua transgressão. Uma aplicação surpreendentemente impiedosa, mas inteiramente consistente com a tese do amigo! Embora a forma seja condicional, a intenção é declarada.
Jó 18
C) Segundo
Discurso de Bildade. 18:1-21.
Em
sua ânsia por um advogado divino, Jó penetra mais profundamente no mistério da
piedade do que seus conselheiros, cujas respostas posteriores degeneram em
arengas irrelevantes sobre a desgraça dos ímpios.
1-4. Ressentido com o pouco valor concedido
por Jó à perspicácia dos seus acusadores (v. 3; cons. 17:10; 12:7), Bildade
refuta na mesma moeda: Tu, que despedaças na tua ira (v. 4a), como um bruto
estúpido, bramindo que Deus tem culpa (cons. 16:9). A julgar da maneira como Jó
se debate mortalmente contra a ordem da criação estabelecida e contra a
providência (particularmente contra a lei da retribuição invocada por seus
amigos), pareceria que ele espera que o universo seja replanejado só para ele
(v. 4b, c). As formas do plural nos versículos 2 e 3 são possivelmente alusões
sarcásticas ao fato de Jó ter-se associado com o grupo dos justos (cons. 17: 8,
9).
5-21. Este quadro de palavras, intitulado
pelo artista as moradas do perverso (v. 21a), não é uma semelhança exata do
original, mas é suficiente para que Jó o reconheça como seu retrato. Ele
contempla o local da sua tenda salpicado de enxofre, símbolo da maldição
perpétua de Deus (v. 15b; cons. 1:16; Gn. 19:24; Dt. 29:23). Ele se vê
consumido pelo primogênito da morte (v. 13b), isto é, a enfermidade mortal;
enviado apressadamente ao rei dos terrores (v. 14b), a própria morte;
precipitado no esquecimento (vs. 16-19), um espetáculo de horror diante do qual
o povo involuntariamente estremece (v. 20).
Jó 25
c) Terceiro Discurso de Bildade. 25:1-6.
Bildade
foge ao desafio de Jó (24:25). Ansioso, entretanto, para dizer alguma coisa,
ele repete idéias expressas antes por Elifaz (cons. 4:17 e segs.; 15:14 e
segs.) e aceitas por Jó (cons. 9:2; 14:4). A repetição inepta indica que os
filósofos esgotaram seus recursos de sabedoria. O breve e frágil esforço de
Bildade representa seu alento moribundo. O subseqüente fracasso de Zofar em
falar representa o silêncio dos derrotados (cons. 29:22). Jó, um insignificante
verme do pó, diz Bildade, comparando-o com os gloriosos corpos celestes (v. 6),
não deve ter esperanças de comprovar sua inocência diante de Deus (v. 4), cuja
majestade imponente prevalece universalmente (vs. 2, 3), deixando envergonhados
até o resplendor da lua e das estrelas (v. 51. O discurso é reverente mas
irrelevante.
Jó (Comentário Bíblico Moody)
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