Texto
Áureo
“Porque
antes do meu pão vem no meu suspiro; e os meus gemidos se derramam como água.”
(Jó 3.24)
Verdade Prática
O sofrimento pode nos levar a situação de extrema angústia, mas não devemos perder a esperança no agir de Deus.
LEITURA BÍBLICA
EM CLASSE
Jó 3.1-26
1- Depois disto,
abriu Jó a boca e amaldiçoou o seu dia.
2- E Jó,
falando, disse:
3- Pereça o dia
em que nasci, e a noite em que se disse: Foi concebido um homem!
4- Converta-se
aquele dia em trevas;
5- Contaminem-no
as trevas e a sombra da morte; habitem sobre ele nuvens; e, ali, repousam os
cansados. negros vapores do dia o espantem!
6- A escuridão
tome aquela noite, e não se goze entre os dias do ano, e não entre no número
dos meses!
7- Ah! Que
solitária seja aquela noite e suave música não entre nela!
8- Amaldiçoem-na
aqueles que amaldiçoam o dia, que estão prontos para fazer correr o seu
pranto.
9- Escureçam-se
as estrelas do seu crepúsculo; que espere a luz, e não venha: e não veja as
pestanas dos olhos da alva!
10- Porquanto
não fechou as portas do ventre, nem escondeu dos meus olhos a canseira.
11- Por que não
morri eu desde a madre e, em saindo do ventre, não expirei?
12- Por que me
receberam os joelhos E por que os peitos, para que mamasse?
13- Porque já
agora jazeria e repousaria; dormiria, e, então, haveria repouso para mim
14- com os reis
e conselheiros da terra que para si edificaram casas nos lugares assolados,
15- ou com os
príncipes que tinham ouro, que enchiam as suas casas de prata
16- Ou, como
aborto oculto, não existiria; como as crianças que nunca viram a luz!
17- Ali, os maus
cessam de perturbar e, ali, repousam os cansados.
18- Ali, os
presos juntamente repousam e não ouvem a voz do exator.
19- Ali, está o
pequeno e o grande, e O servo fica livre de seu senhor.
20- Por que se
dá luz ao miserável e vida aos amargurados de ânimo,
21- que esperam
a morte, e ela não vem; e cavam em procura dela mais do que de tesouros
ocultos;
22- que de
alegria saltam, e exultam, achando a sepultura?
23- Por que se
dá luz ao homem, cujo caminho é oculto, e a quem Deus o encobriu?
24- Porque antes
do meu pão vem O meu suspiro; e os meus gemidos se derramam como água.
25- Porque 0 que
eu temia me veio, e o que receava me aconteceu.
26- Nunca estive descansado, nem sosseguei, nem repousei, mas veio sobre mim a perturbação.
INTERAGINDO COMO
PROFESSOR
A lição desta semana esclarece que Jó desejou intensamente a morte. Ao desejá-la, o patriarca tem como objetivo dar fim ao ciclo de sofrimento que Satanás lhe impôs. Constataremos nesta lição que, apesar de ele desejar morre não buscou o suicídio. Nesse aspecto, a vida de Jó nos passa uma mensagem muito importante, mostrando-nos que, mesmo diante do mais terrível sofrimento, o patriarca não ousou entrar numa “jurisdição” que pertence somente a Deus.
Ele, indiretamente, nos transmite a importante mensagem de que o único que pode decidir acerca do início e do fim da vida é o Deus Altíssimo.
PONTO
CENTRAL:
O lamento de Jó revela toda Sua dor como ser humano.
INTRODUÇÃO
Na lição anterior vimos de perto o drama vivido por Jó. Uma série de calamidades se abateu sobre ele de forma catastrófica. Do estado de riqueza e prosperidade, Jó passou a viver na adversidade; seus amigos foram para consolá-lo, mas ficaram sem palavras ao contemplarem seu debilitado estado de saúde. Entretanto, depois de sete dias, ele rompeu o silêncio com um lamento que veio do fundo da alma.
Nesse lamento Jó mirou o dia de seu nascimento e, através de três perguntas, desabafou tudo o que sentia naquele momento: Por que nasci? Por que não nasci morto? Por que ainda continuo vivendo? Nesta lição veremos a reação humana diante do sofrimento. Perceberemos que não há qualquer indício de que Satanás tivesse alcançado êxito diante de Jó. Na perspectiva do patriarca, se Deus era a causa de sua vida, deveria também ser a causa de sua morte, pois se dEle vinha o bem, também deveria vir o mal.
CPAD
– Adultos – A Fragilidade Humana e a Soberania Divina: Lições do Sofrimento e
da Restauração de Jó
O OMBRO
AMIGO
Antes
de Jó levantar
o seu lamento,
ele recebeu a vis
ita dos
seus amigos (Jó 2.11-13). Sensibilizados com as calamidades que
sobrevieram a Jó, os seus
três amigos, Elifaz,
Bildade e Zofar,
vieram visitá-lo. Não há
nada no
texto que demonstre
que esses amigos
não estivessem movidos de
boas intenções nessa
visita. Todavia, à
medida que o
debate acontece entre eles e Jó,
o clima de animosidade fica evidente. Nesse momento, eles queriam “condoer-se”
com o patriarca
que perdera tudo,
inclusive a saúde. Daniel Estes
(2013, p. 684) destaca o seguinte:
O termo hebraico para “amigo” (rea) refere-se a um vizinho, um amigo ou um colega. Pelos discursos subsequentes, parece evidente que esses três homens sã o colegas intelectuais de Jó como professores de sabedoria. No entanto, a intenção principal deles em se encontrar com Jó não é acadêmica, mas pastoral, pois eles passam a simpatizar com ele para que possam lhe confortar.
No momento de sofrimento e angústia, todos
precisam de uma mão amiga. Chorar com
os que choram
é um mandamento
bíblico (ver Rm 12.15). Não existe fé robusta fora da
comunidade. Talvez u ma das maiores tragédias
do cristianismo contemporâneo
esteja na ausência
da fraternidade entre irmãos.
Há grandes e
majestosas catedrais, todavia abarrotadas de cristã os
que se sentem
vazios e sozinhos .
Não há dúvida de
que existe muita
gente nas igrejas,
porém pouco calor
humano nos relacionamentos. O
número dos desigrejados ou cristãos
indeterminados aumenta a
cada dia. Talvez
precisássemos diminuir de
tamanho para crescermos em
comunhão. Como Jó,
todos passam por áreas cinzenta s onde a única coisa que se torna
visível é a presença de um amigo.
PACIÊNCIA X PERSEVERANÇA
Uma
leitura rápida no
capítulo 3 demonstra
que a reação
de Jó diante da
segunda prova é
bem diferente d aquela
adotada na primeira. Nos
capítulos 1 e 2,
vê-se um Jó resigna do
e conformado com tudo o que lhe
sobrevém. Entretanto, a
partir do capítulo
3, Jó continua
resignado, porém não demonstra o mesmo conformismo de antes. De fato,
quando o apóstolo Tiago faz
referência a Jó
na sua carta,
ele destaca mais
a sua perseverança do que a sua
paciência . Esse fato é claramente demonstrado pelo u so da palavra grega hupomoné, usada em Tiago 5.11,
cujo sentid o é mais bem compreend ido como perseverança, e não paciência.⁵⁴ Jó
foi mais perseverante do que
paciente. Ele é
resignado, mas não
conformado. Ele está pronto
a questionar por
que tudo aquilo
está sobre vindo sobre ele. Entretanto, isso
não significa dizer
que há uma
ruptura na narrativa
do texto e que esse Jó não
tem nada a ver com o primeiro. Só há um Jó. Nem significa
dizer também que Jó perdeu
a fé e
amaldiçoou a Deus
como Satanás havia dito. Nada disso aconteceu e nem é sugerido pela
narrativa. O que, d e fato, acontece
é que Jó, desconhecendo a
trama diabólica, não tem
explicação racional e
teológica para tudo
o que lhe
sobreveio. Isso o leva
a questionar tudo e a todos.
Após o primeiro ciclo de provas, Jó está exausto e querendo entender a razão do seu sofrimento.⁵⁵ Por não saber dos bastidores da sua prova, Jó via tudo aquilo como se fosse uma ação direta de Deus. Isso, evidentemente, aumentava o seu drama e intensificava o seu lamento. O lamento de Jó, todavia, não deve ser visto como algo escandaloso e fora de contexto. Na verdade, a narrativa, de uma forma nua e crua, mostra o lado humano de Jó; ou seja, Jó não é um super-homem, que está imune aos problemas e vicissitudes da vida. Não! Pelo contrário! Jó mostra toda a sua humanidade quando está disposto a questionar e a entender os dilemas da vida para os quais não tem explicação. É esse o Jó que tem inspirado a tantos e permitido que o sofredor, o afligido e o oprimido identifiquem-se com a sua causa. É esse Jó que o capítulo 3 apresenta. No primeiro lamento, ele questiona por que havia sido concebido ou nascido; no segundo, por que não havia nascido morto e, no terceiro, por que continuava vivo. Contudo, debaixo de intenso conflito psicológico, jamais pensou em dar cabo da própria vida.
POR QUE NASCI? (3.1-10)
Depois
disto, abriu Jó a boca
e amaldiçoou o
seu dia. E
Jó, falando, disse: Pereça
o d ia em
que nasci, e
a noite em q
ue se
disse: Foi concebido um homem!
Converta-se aquele dia em trevas; e Deus
, lá de cima, não
tenha cuidado d ele,
nem resplandeça sobre
ele a luz! Contaminem-no as
trevas e a
sombra da morte;
habitem sobre ele nuvens; negros vapores do dia o espantem!
A escuridão tome aquela noite, e não se goze entre os dias do ano, e não entre
no número d os meses! Ah! Que solitária seja
aquela noite e suave música não
entre nela! Amaldiçoem-na aqueles
que amaldiçoa m o dia, que
estão prontos para fazer
correr o seu
pranto. Escureçam-se as
estrelas do seu crepúsculo; que
espere a luz, e não venha; e não veja as pestanas dos olhos
da alva! Porquanto
não fechou a s
portas do ventre,
nem escondeu dos meus olhos a canseira.
“Depois disto, abriu Jó a boca e amaldiçoou o
seu dia” (3.1). Depois de sete dias
e sete noites
na presença dos
seus amigos, que
nada lhe disseram (2.13), Jó
abriu a boca em um profundo lamento. Ele amaldiçoou o dia do seu
nascimento.⁵⁶ Jó era um homem
em conflito! De
um lado, estavam os seus
amigos representando a
teologia tradicional,
fundamentada numa lei de causa e efeito. O justo não sofre nem passa por
adversidades; se sofre
e não prospera,
é porque pecou.
Por outro lado,
a teologia de Jó
também conflitava com
a sua experiência.
Ele sabia ser íntegro
e reto, todavia
estava sofrendo! Será
que Deus o
teria rejeitado e abandonado? Nas palavras de Andrés Glaze (2005, p. 249):
O patriarca
sentia-se rejeitado por
Deus. No entanto,
em seu lamento, ele
não pediu uma
restituição do que
havia perdido, mas
buscou desesperadamente direção
e coragem para
viver. Por causa de
sua tribulação, ele
ansiava pela morte
e, ao mesmo
tempo, a temia.
Os fundamentos ortodoxos
de sua crença
haviam sido destruídos: sem
sentir a presença d e Deus e com sua
grande dor, ele não encontrou motivos
para viver. Ele
lutou com uma
aparente contradição dolorosa: a fé indicava que Deus sempre foi sábio e
justo em seus desígnios; de su a experiência, a
razão sugeria que Deus, em sua maneira de trabalhar, era arbitrário e
injusto.
Aqui
estava o dilema
d e Jó. A
sua teologia dizia
uma coisa, mas a
sua experiência dizia outra. Os seus amigos a inda não haviam falado, mas,
sem dúvida, Jó
conhecia a forma
de pensar deles,
que não era
muito diferente da sua até então.
Era um consenso
na teologia tradicional daqueles dias que
Deus sempre recompensa
os bons, mas
pune os maus. Isso
ficará mais claro quando começa
o debate de Jó
com os seus amigos, mas o que Jó estava
experimentando agora conflitava com essa
teologia .
“Pereça o dia em que nasci, e a noite em
que se disse: Foi concebido um
homem!” (3 .3).⁵⁷ O
verbo hebraico abad,
traduzido aqui como “pereça”, possui
o sentido d e
destruir. É traduzido
dessa forma em Levítico 23.30, quando o Senhor pro mete
destruir quem trabalhasse no dia da
expiação.⁵⁸ Essa forma
de lamento não
era incomum dos
povos do Antigo Oriente.
Jeremias, por exemplo,
também fez um l a
mento semelhante. Assim como Jó, Jeremias sentiu-se rejeitado — Jeremias, pelo seu
próprio povo, e Jó, pelo seu próprio Deus.
Maldito o
dia em que
nasci; o dia
em que minha
mãe me d eu
à luz não seja
bendito. Maldito o
homem que d eu
as novas a
meu pai, dizendo: Nasceu-te u m
filho; alegrando-o com isso
grandemente. E seja esse homem como as cidades que o Senhor destruiu sem
que s e arrependesse; e ouça
ele clamor pela
manhã e, ao
tempo do meio-dia,
um alarido. Por
que não me
matou desde a
madre? Ou minha mãe não foi minha sepultura? Ou não
ficou grávida perpetua mente? Por
que saí da
madre para ver
trabalho e tristeza
e para que
se consumam os meus dias na confusão? (Jr 20.14-18)
“Converta-se aquele
dia em trevas;
e Deus, lá de cima,
não tenha cuidado dele,
nem resplandeça s obre ele
a luz!” (3 .4).
O sofrimento de Jó era
intenso. Toda angústia
e sofrimento não
existiriam se ele
não tivesse sido concebido.
Isso, de fato,
poderia existir se
o dia do
seu nascimento pudesse ser
apagado. O seu desejo era
que aquele dia
houvesse se convertido em trevas,
que equivalia a dizer: “Seja apagado do calendário ” (Clarke, 2014, p. 4). O
seu desejo era que esse d ia, tendo sido apagado, não fizesse falta no
calendário de Deus para completar os
dias do ano.
“Contaminem-no as
trevas e a
sombra da morte;
habitem sobre ele nuvens; negros vapores do d ia o
espantem!” (3.5). O sentido deste texto
é destacado por Daniel
Estes (2018, p.
810): A frase
hebraica é uma expressão superlativa que significa
literalmente “sombra da morte”, como no Salmo 23:4. Aqui, Jó se refere a uma sombra especialmente escura que
dominaria e obscureceria
de vista o d
ia de
seu nascimento, assim
como um eclipse solar total transforma
a luz do d ia em escuridão. Jó usa
o verbo gaal
(reclame), cujo sentido
é “resgatar” ou “agir
como parente”. Esse
vocábulo é aplicado
a um parente
que tem o
direito de reclamar uma herança ou vingar a morte de um consanguíneo
(Clarke, 2014, p. 4).
Jó deseja que as densas trevas tivessem
esse direito s obre o dia em que ele
foi concebido. Dessa
forma, esse d ia
jamais teria raiado
ou existido. Em outra s palavras, ele não queria resgate algum por
aquele dia, que, no seu
entender, jamais deveria
ter existido. A
linguagem é poética, procurando capta r todo o drama e
lamento do patriarca.
“A
escuridão tome aquela noite, e não se
goze entre os d ias do ano,
e não
entre no número
dos meses!” (3.6).
Albert Barnes (2015,
p. 2077) destaca o seguinte:
A palavra
“escuridão”, no entanto,
não expressa bem
a força do original. A palavra ôphel é poética e
denota trevas mais intensas do que
é denotada pela palavra que
geralmente é traduzida
como “trevas” chôshek. São
trevas acompanhadas de
nuvens e de tempestades. Herder
entende isso como
significado, que as
trevas devem tomar conta daquela noite e levá-la embora, para que não se
junte a os meses
do ano. Mas
o verdadeiro sentido
é que Jó
desejou ser mergulhado em
trevas tão profundas,
que nenhuma estrela surgisse sobre ele; nenhuma luz fosse
vista.
“Amaldiçoem-na aqueles que
amaldiçoam os dias,
que são peritos em
suscitar o leviatã”
(3.8, Almeida Recebida).
Jó recorre àqueles
que poderiam despertar o leviatã, um monstro marinho da cultura
semítica. O termo ocorre seis
vezes no texto
hebraico e é
traduzido às vezes
como serpente, dragão e crocodilo (Jó 3.8; 41,1; Sl 74.14; Is 27.1).⁵⁹
Acreditava -se ser um monstro
dos mares com
poderes de engolir
os d ias e
as noites. A Septuaginta
traduz como ketos,
com o sentido
de “criatura marinha enorme” (Muraoka, 2009, pp. 396,397).
Na cultura semítica, é considerado uma das primeiras criaturas criadas por
Deus. É interpretada d essa forma na
tradução dos LXX
em Gênesis 1.21.
Na sua linguagem
poética, Jó desejava que
o leviatã pudesse
dar fim ao
dia do seu
nasci mento, pois , dessa forma,
o seu sofrimento não existiria.⁶⁰
“Escureçam-se as estrelas do seu
crepúsculo; que espere a luz, e não
venha; e
não veja as
pestanas dos olhos
da alva!” (Jó
3.9). O versículo
9 encerra a primeira seção sobre o lamento de Jó: Por que nasci? E ra o
desejo de Jó que
as estrelas da
alva, entendida pelos
intérpretes como sendo
o planeta Vênus e Mercúrio (Champlin, 2001, p. 1875) não tivessem
brilhado na noite da sua concepção. Na sua linguagem poética, Jó compara o
nascer do dia a uma pessoa que, ao
despertar pela manhã, abre as suas pálpebras e vê as luzes do dia raiando. O desejo
de Jó era que não houvesse nenhum luzeiro
no Universo para
reluzir os seus
raios sobre o
fatídico dia do seu
nascimento.
“Porquanto não fechou as portas do ventre, nem
escondeu dos meus olhos a canseira” (3.10). Alguns autores entendem a expressão
“fechou as portas do ventre”
como representando o
momento da concepção
(Zuck, 1981, p. 29),
enquanto outros entendem
como uma referência
ao nascimento (Andersen, 2008,
p. 103). Todavia,
como destaca Ande rsen acertadamente, seja
como for, o
sentido está em
Jó desejar nunca
ter nascido.
Como
já foi destacado
neste livro, antes
de qualquer crítica
que se faça a Jó pelo seu
questionamento, é necessário entender o mundo cultural no qual
Jó vivia. Jó
vivia e r espirava
uma cultura da
honra, onde ser desonrado
era pior do
que a morte.
Era exatamente o
que estava acontecendo ou
iria acontecer com
maior intensidade com
Jó. Como u m homem bom, justo, piedoso e temente a Deus
podia ser submetido a uma situação vexatória
daquelas? Estaria ele
vivendo uma espiritualidade ou religiosidade de
fachada? O que
as pessoas pensariam
dele? E os
seus amigos? Para um homem honrado, isso doía mais do que a própria morte.
POR QUE NÃO NASCI MORTO? (3.11 -19)
Por
que não morri
eu desde a
madre e, em
saindo do ventre,
não expirei? Por que me receberam
os joelhos? E por que
os peitos, para que
mamasse?
Porque já agora jazeria e repousaria;
dormiria, e, então, haveria repouso
para mim, com
os reis e
conselheiros da terra
que para si edificavam
casas nos lugares
assolados, ou com
os príncipes que
tinham ouro, que enchiam
a s suas casas
de prata; ou,
como aborto oculto,
não existiria; como as crianças que nunca viram a luz. Ali, os maus
cessam de perturbar; e, ali, repousam os
cansados. A li, os
presos juntamente repousam e não
ouvem a voz do exator. Ali, está o pequeno e o grande, e o servo fica livre d e
seu senhor. “Por que
não morri eu
desde a madre
e, em saindo
do ventre, não expirei?”
(3.11). As questões
de ordem retórica
têm continuidade no argumento
d e Jó. Ele
questionara por
que havia sido
concebido, e agora ele indaga por que não nasceu morto. D
esse ponto em diante, Jó não mais amaldiçoa,
mas questiona. O
primeiro questionamento é por que
não morreu ao nascer. A expressão hebraica
(3.11)
possui o sentido
de “natimorto”, isto
é, alguém que
já nasce morto. A morte,
portanto, era vista como uma libertação da dor.
“Porque
já agora jazeria
e repousaria; dormiria,
e, então, haveria repouso para
mim, com os
reis e conselheiros
da terra que
para si edificavam casas nos
lugares assolados” (3.13,14). Não se deve pensar aqui que Jó não tivesse
perspectiva com a
vida pós-morte. Em outra parte
do seu livro, Jó demonstra acreditar na vida eterna (Jó 19.25). Na
verdade, Jó vê a morte
aqui como u m
grande nivelador social
(Estes, 2013, p.
823).
Todos
são iguais no
túmulo. Tanto reis
como príncipes e
plebeus são iguais na sepultura .
Não importa o que fizeram em vida.
“ou,
como aborto oculto,
não existiria; como
as crianças que
nunca viram a luz” (3.1 6). A palavra hebraica nephel possui o sentido
de aborto. É traduzida dessa
forma no Salmo
58.8 e em
Eclesiastes 6.3. Jó
cita o aborto, mas
não faz uma
defesa dele. Alguns
escritores acreditam que o
texto paralelo de Eclesiastes 6.3
apoiaria a prática do nephel (aborto).⁶¹
POR
QUE CONTINUO VIVO ? (3.20-26)
Por
que se dá
luz ao miserável,
e vida aos
amargurados de ânimo, que esperam a morte, e ela não vem; e
cavam em procura dela mais do que de
tesouros ocultos; q ue
de alegria saltam,
e exultam, achando a
sepultura? Por que se dá
luz ao homem,
cujo caminho é oculto, e
a quem Deus o encobriu? Porque antes do meu pão
vem o meu suspiro; e os meus gemidos se derramam como água. Porque o
que eu
temia me veio,
e o que receava me
aconteceu. Nunca es tive descansado, nem
sosseguei, nem repousei,
mas veio sobre
mim a perturbação.
“Por que
se dá luz ao miserável, e
vida aos amargurados de ânimo,
que esperam a
morte, e ela
não vem; e
cavam em procura
dela mais do que
de tesouros ocultos”
(3.20,21). Aqui tem
início o terceiro
bloco de questionamentos de
Jó. Agora, ele
pergunta a si
mesmo por que continuava vivo.
O sofrimento faz
com que o
aflito e o
amargurado de alma desejem
a morte como
uma forma de
livra mento. Isso não é
incomum em pessoas
que experimenta m, por
exemplo, grandes dores físicas
e até mesmo
psicológicas. Todavia, convém
dizer que querer
a morte para ver-se
livre da aflição
é bem diferente
de da r fim
à própria vida. Alguns
homens de Deus
na Bíblia, como
Jonas e Elias,
desejaram morrer quando foram
submetidos a grandes
tensões, mas nenhum
deles pensou em tirar a própria vida, pois a vida para esses profetas
era um dom de Deus e
somente Ele poderia
tirá-la. Deus seria
sempre o agente
dessa ação, e não
eles próprios. Jonas
disse: “Peço -te, pois,
ó Senhor, tira-me
a minha vida, porque
melhor me é
morrer do que
viver” (Jn 4.1);
de E lias está dito:
“ [...] e pediu
em seu ânimo
a morte e
disse: Já basta,
ó Senhor; toma a gora
a minha vida,
pois não sou
melhor do que
meus pais” (1 Rs
19.4). Como Jó, esses homens experimentara m momentos desesperadores ou grandes
conflitos psicológicos, mas
continuaram lutando pela vida. O suicídio nunca deveria ser visto como um
bem (At 16.27,28). Biblicamente, ele é sempre um mal. Em primeiro lugar, é um
mal para quem o comete e, também, um mal para os familiares de quem se suicidou. Jackson (2011, p. 61) destaca o
seguinte:
Em
toda a Bíblia,
o suicídio nunca
é apresentado como
uma opção para o
crente. Pelo contrário, é
o incrédulo quem escolhe
o suicídio para escapar de ser
morto pelos inimigos (cf. 1 Sm 31). Escolher viver enquanto se
deseja morrer é u ma
coisa (ver Jr
8.3; Ap 9 .6). Tomar
a questão em suas
próprias mãos é
outra completamente diferente. Dado o
estado mental de
Jó, deve ter
havido algo mais
na sua compreensão da realidade
que o impediu de dar esse passo.
Um
problema que precisa ser levado em conta em relação a o suicídio é a
questão relacionada à responsabilidade moral. Não
há dúvida de que o
suicídio é um a
tentado contra a
própria vida, que
é um dom
de Deus (Gn 9.6).
Nesse caso, parece
impossível escapar-se da
responsabilidade moral.
Todavia, alguns teólogos
parecem argumentar que
não há responsabilidade moral
no caso de u
m suicida porque,
segundo acreditam, não há
consciência moral por parte de quem pratica tal ato.⁶²
“Por que se dá luz ao homem, cujo caminho é oculto, e a quem Deus o encobriu?” (3.23). No capítulo 1 do livro de Jó, Satanás argumentara que a fidelidade de Jó dava-se em razão de uma cerca que Deus havia posto em volta dele. Deus protegia a Jó (1.10). Agora, Jó faz uma reclamação no sentido contrário. Ele cria que estava preso d entro das muralhas do sofrimento. A angústia cercava-o de todos os lados. Por desconhecer os bastidores da tentação, Jó cria que Deus seria quem o prendera. O patriarca reclama e questiona, mas não blasfema.
A Fragilidade Humana e a Soberania
Dívina
José Gonçalves
Capítulo 9
Jó Amaldiçoa o Dia do seu Nascimento
Introdução
A
jornalista evangélica Andréia Di Mare perguntou-me, quando eu finalizava este
livro, quanto tempo durara a provação de Jó. Confesso que, até aquele momento,
não havia atinado ainda sobre o assunto. Reparei então que, se lermos atentamente
a história do patriarca, haveremos de constatar que a tribulação do paciente
servo de Deus pode haver se estendido por quase um ano. Levemos em conta alguns
fatores.
Desde que as calamidades começaram a se abater sobre Jó, até à chegada de seus amigos, temos pelo menos três semanas. Pois Elifaz, Bildade e Zofar tiveram de se deslocar de longínquas regiões até à terra de Uz. Aqui chegando, quedaram- se emudecidos por sete dias; faltavam-lhes palavras para consolar alguém que não podia ser consolado.
Finda
aquela semana, pôs-se Jó a
falar. Suas primeiras alocuções foram de amarga maldição
contra o dia de seu nas c imento.
Se o Diabo
esperava fosse o patriarca
dirigir suas invectivas contra Deus,
enganara-se. Em momento
algum, portou-se Jó de maneira blasfema e irreverente em relação ao
Senhor Deus.
A pergunta da irmã Di Mare é uma resposta mui oportuna; revela que o perseverante varão, antes de endereçar todos aqueles reptos contra o seu natalício, suportara pelo menos um mês de resignada dor. Embora não saibamos exatamente quantos dias durou a sua prova, de uma coisa temos certeza: foi mais do que podia suportar um ser meramente humano.
I. Jó Amaldiçoa o seu Dia Natalício
Até
este momento, comportara-se Jó de maneira irrepreensível. Diante de todas
aquelas tormentas, tivera ele a necessária humildade e ousadia de lançar-se em terra,
e adorar a Deus. O autor sagrado
adianta que, em tudo isso, não pecara ele contra o Senhor (Jó 1.22).
Mas, agora, já desfigurado pela doença e já
em tudo uma pavorosa ruína, põe-se a amaldiçoar o seu dia natalício. E ele o
faz diante de seus três amigos: Elifaz, Bildade e Zofar.
I.
Jó amaldiçoa o
dia do seu nascimento.
Atentemos
ao que narra o autor sagrado: “Depois
disto, abriu Jó a boca e amaldiçoou o
seu dia” (Jó 3.1). O
verbo amaldiçoar usado, nesta passagem, é mui significativo em hebraico:
qâlal denota as seguintes ações: tratar com menosprezo, desprezar.
Com a palavra, o patriarca Jó:
“Pereça o dia em que nasci, e a noite em que
se disse: Foi concebido um homem!
Converta-se aquele dia em trevas; e Deus, lá de
cima, não tenha cuidado dele, nem resplandeça sobre ele a luz!
Contaminem-no as trevas e a sombra da morte; habitem sobre ele nuvens; negros
vapores do dia o espantem! A escuridão tome aquela noite, e não se goze entre
os dias do ano, e não entre no número dos meses!” (Jó 3.3-6).
Sim, ele amaldiçoa enfaticamente o dia de
seu nascimento. Em momento algum, porém, desfere qualquer palavra contra o
Senhor, conforme salienta F. B. Meyer: “Jó abre a boca com uma maldição. Mas
ela não era contra Deus, como Satã espe rava. A palavra hebraica é
diferente da que ele
emprega (Jó2.9). Ele não amaldiçoa Deus, mas o dia do seu nascimento, e
pede que sua existência despojada e sofredora possa terminar o mais depressa
possível. As palavras de Jó são muito proveitosas para todos aqueles cujo
caminho é oculto. A alegria da vida se foi? Todavia seus deveres permanecem.
Continuemos nestes e o caminho nos levará de volta à luz”.
Na noite em que Jó nasceu, houve não
somente luz, como música: “Ah! Que solitária seja aquela noite e suave música
não entre nela!” (Jó 3.7). Entretanto, almeja agora não somente apagar aquela luz
que lhe iluminou o nascedouro, como sufocar a melodia que lhe embalou os
primeiros instantes na terra.Sofocleto
chegou a considerar
o seu aniversário
como aquele pesado tributo a que era obrigado a pagar para continuar
existindo. Em contrapartida, Moisés, diante da brevidade da vida humana; ante
os sofrimentos que nos cercam; defronte de todos os enfados e canseiras que nos
rodeiam; e já em frente ao inexorável da existência, uma só coisa pediu ao
Senhor: “Ensina-nos a contar os nossos
dias, de tal maneira que alcancemos coração sábio” (SI 90.12). Que estou eu sugerindo?
Não era sábio o coração de Jó? Então, por que amaldiçoa o dia de seu natalício?
Seria razoável todo aquele amargor? Responderia
ele que sim, como Jonas o
fez diante da
aboboreira ressequida (Jn4.9). No
auge do crisol, todas as coisas nos parecem razoáveis e lógicas. Mas, passada a
tormenta, percebemos quão ilógicos nos portamos (Jó 42.3). E em nossa ilogicidade que mostra Deus toda a
beleza de sua razão.
2.
Os amaldiçoadores profissionais.
Buscando tornar ainda mais forte a imprecação que
lançava contra o dia de seu nascimento,
deseja agora o
patriarca que um
amaldiçoador profissional ajude-o a cobrir de impropérios a noite em que
veio à luz: “Amaldiçoem-na aqueles que amaldiçoam o dia, que estão prontos para fazer correr o
seu pranto” (Jó 3.8).
Se Jó deseja esconjurar a noite, por que
busca os préstimos daqueles que anatematizam o dia? Infelizmente, muitos são os
amaldiçoadores profissionais. Sem carteira assinada e sem contrato formal de
trabalho, ajuntam-se em sindicatos para regulamentar suas imprecações e defender
seus esconjuros. Competentes em seu ofício, sempre acabam por imprecar o
próprio Deus.Não se ajunte aos tais. Por mais difícil que lhe seja a situação,
lembre-se de Paulo.
Não obstante os sofrimentos, as provações e
as angústias que sobre si recaíam, ainda encontrava forças para exortar os
fiéis: “Em tudo dai graças, porque esta é a vontade de Deus em Cristo Jesus
para convosco” (I Ts 5.18).
Thomas Goodwin mostra quão belo e inefável é o agradecer: “As mais doces bênçãos são conseguidas com oração e usufruídas com ação de graças”. O que estamos insinuando? Que não era Jó agradecido a Deus? No entanto, é nos momentos de grande tormento que devemos tributar as mais exaltadas ações de graças àquEle que, segundo a sua soberania, pode tanto nos dar a vida, como nos tirar a existência.
II. A Alma Amargurada Requer
Coisas
nada RazoáveisEnquanto amaldiçoava o seu natalício, Jó pôs-se a requerer de
Deus algumas coisas que, se atendidas, colocariam em risco a própria harmonia
da criação. Infelizmente, é assim mesmo que agimos ao sentir a ardência do
crisol. Nesses instantes, a oração parece lógica e a petição,
razoável; depois, nem lógicos
nem razoáveis se nos mostram os insistentes rogos.
I.
A mecânica celeste.
Em primeiro lugar, pede Jó ao Senhor que
altere a mecânica celeste: “Escureçam-se as estrelas do seu crepúsculo; que
espere a luz, e não venha; e não veja as pestanas dos olhos da alva!” (Jó 1.9). Fosse Deus ouvir a petição de seu
servo, haveria de tirar ao sol toda a claridade, e à terra, o movimento de
rotação; a astronomia perderia a sua estabilidade.
Se é o sol que alumia a maioria das
estrelas; se é o sol que lhes empresta não somente a luz, mas igualmente a
beleza e a poesia; se é o sol, cujos raios,
incidindo sobre outros corpos celestes, transforma-os em referências aos
viajores que, singrando os mares, ou rompendo os limites dos continentes,
necessitam de orientação sempre segura; se é o sol que governa o dia, e à
noite, faz-se representar pela lua e pelas
estrelas que pontilham os céus, por que haveria o Senhor de escurecê-lo?
Não satisfeito, reivindica o patriarca a
Deus: “Converta- se aquele dia em trevas; e Deus, lá de cima, não tenha cuidado
dele, nem resplandeça sobre ele a luz!” (Jó 3.4). Sabe o que representa tal
prece? A paralisação completa da terra, tornando-lhe sem efeito
o movimento de rotação,
através do qual são gerados os dias e as noites. Naquele
longo dia de Josué, o planeta não sofreu grandes prejuízos por haver o
Todo-Pode- roso agido miraculosa e providencialmente (Js 10.12). Suponhamos,
porém, haja qualquer diminuição ou aumento na rotação da terra; imaginemos que
essas alterações durem apenas desprezíveis
segundos seja para mais, seja
para menos; que conseqüências
sofreria a terra?
Se a rotação do planeta se fizer mais
lenta, haverá um aumento considerável na temperatura, tornando a vida aqui insuportável;
se mais rápida, haveremos de registrar ventos de até dois mil quilômetros por
hora. E como seriam insuportáveis as noites
mais longas, e mais compridos os
dias! Eis por que o Senhor, em
sua infinita sabedoria, criou leis fixas a fim de que a vida na terra fosse
viável (Gn 1.15-18; SI 136.8; Jr 33.20).
Entretanto, requer Jó modifique o Senhor
tais leis, para que se apague da história o seu natalício. Não ouvira o Senhor
a Josué tornando longo aquele dia em Gibeão? E por que deixaria de atender ao
pedido de Jó que, na galeria dos santos,
acha-se entre os três maiores? E os graus no relógio de Acaz? Não retrocederam
dez pontos na sombra? (2 Rs 20.11). Por que teria Jó o seu ofício indeferido?
Embora transcenda o sobrenatural, Deus
opera racional e logicamente, no terreno do natural: não pode contrariar as
leis que Ele mesmo criou. E se por acaso as suspende, não age de maneira
absurda; põe-se a atuar, então, no
território das coisas impossíveis. Se cremos, de fato, em milagre, temos
de considerar razoável o instituto das
impossibilidades que fazem-se
possíveis no âmbito divino. Afirmou, certa vez, o pastor José Wellington
Bezerra da Costa que Deus é especialista em coisas impossíveis. Aleluia!
Não podemos ignorar, outrossim, a licença
poética com que o atribulado Jó pôs-se a
amaldiçoar o dia de seu nascimento.
Ilógico o seu poema?
Nada racional o seu
cântico?
Quando metidos em lutas, reivindicamos
coisas tão irrazoáveis a Deus que, fosse Ele ouvir-nos, comprometeria de vez a
harmonia da criação e haveria de nos pôr em risco a alma.
Os
judeus ortodoxos costumam
orar: “Senhor, jamais ouças a oração dos viajantes, a fim de
que não morramos de fome”. Pois todos os que viajam rogam a Deus: “Senhor, que
hoje não chova”. Você sabe quantas orações dessas são feitas todos os dias? E a
lavoura como haveria de vingar?
2.
As leis da biologia.
Em seguida, insta o patriarca ao Senhor a que
modifique as leis da biologia:
“Porquanto não fechou as portas do ventre, nem escondeu dos meus
olhos a canseira” (Jó 3.10). Por que tal
petição? Não se haviam casado os pais de Jó? Não haviam coabitado? Então, por
que Jó não haveria de ser concebido? Já pensou fosse o Senhor impedir o
nascimento de todos os atribulados? O
mundo estaria assolado e desértico.
Pois, conforme diz o salmista, o homem nasce para o enfado (SI 90.10).
Ora, se não impediu o Senhor o nascimento
de Caim; se não fechou o útero que acalentaria a Ninrode; se não cerrou a madre
àquele faraó que tanto
fustigaria os israelitas; se não
tornou estéril a concepção do Herodes
que mataria os inocentes, procurando assassinar o menino Jesus; se não frustou
a geração de" monstros como Nero, Stalin, Hitler, Mao Tsé-tung e Pol Pot,
como impedir que um santo, como Jó, fosse dado à luz? Parece-lhe isto razoável?
E quanto
aos que sofrem, não seria melhor fossem eles abortados? Abortar
um Noé? Um
Davi? Um Lázaro
de Betânia? Como seria
o mundo miserável
fossem tais vidas sacrificadas no
nascedouro da vida E o
Senhor Jesus? Não experimentou Ele o sofrimento dos sofrimentos? E se
aborta do, onde estaríamos? Mas,
graças a Deus, porque o castigo que nos traz a paz estava sobre Ele,
e por suas pisaduras fomos sarados.
Não
estamos insinuando seja o aborto
um ser humano incompleto; é um ser
humano tão pleno
quanto eu e você. Todavia, se não
tem o embrião a oportunidade de nascer e formar-se, como haverá de servir
a Deus em sua plenitude? Até o próprio Cristo, sendo Ele verdadeiro Deus
e verdadeiro homem, teve de naturalmente nascer,
embora sobrenaturalmente concebido, a fim de que nEle fosse cumprido
todo o plano redentor de Deus.
Querido irmão, Deus não precisa alterar a mecânica celeste nem contrariar as leis biológicas para resolver o seu problema. Tem Ele um modo próprio e bem particular para tratar conosco e resolver-nos todos os problemas. Não se desespere!
III. 0
que Aconteceria se a Petição de Jó
Fosse Ouvida
Ainda bem que Deus não nos ouve todas as
orações. Caso o fizesse, seriamos as mais infelizes das criaturas (Tg 4.1-3).
Em seu grande e infinito amor, Ele, às vezes, acena-nos com um sim;
outras, sinaliza-nos com um não; e,
ainda, como se nos fora exercitar na
paciência, tão somente diz-nos:
espere (SI 40.1). Levemos
sempre em conta
a sua soberana
e inquestionável vontade (Rm 12.2).
E se Deus, sabendo de antemão que Jó lhe
apresentaria semelhante rogo, resolvesse não lhe permitir a concepção? Seriamos
hoje mais pobres espiritual, teológica e literariamente. Pois o Livro de Jó é
uma das maiores obras-primas de todos os tempos. Além disso, consideremos o
problema que o livro sagrado elucida-nos acerca do sofrimento do justo. E o
exemplo do patriarca? Como achar semelhante paradigma de integridade, paciência
e amor provado?
Cerceado pela dor, o patriarca rogou a Deus
que lhe riscasse da história o dia de
seu nascimento. O que Jó
talvez ignorasse, naquele momento de repassadas angústias, era que tanto
o dia de seu natalício quanto o daquela agonia haviam sido feitos por Deus.
Portanto, que se regozijasse neles! Em sua epístola aos filipenses, Paulo, em
diversas ocasiões, exorta seus leitores a se alegrarem no Senhor (Fp 4.4).
O Cristianismo é a religião da alegria e do regozijo. Aleluia!
IV Este É o Dia que Fez o Senhor
O dramaturgo inglês William Shakespeare
declara através de um de
seus personagens: “Um
dia assim tão
feio e tão bonito, não vi jamais”. Assim também o
dia da provação de Jó. Um dia que, apesar de feio, mostrava-se bonito. Embora
naquele momento de provação, o patriarca tudo achasse desfigurado e cinzento, a
verdade é que, aos olhos de Deus, havia uma indescritível beleza em toda aquela
dor, e um colorido em todo aquele
ardentíssimo crisol. Acredito que, dia como aquele de Jó, ser humano jamais
veria.
Em
sua sabedoria espiritual, Jó
aceitou resignadamente todas as provações que lhe enviara o Senhor. Se
havia recebido o dia da abastança, por que recusaria o dia da carência? Se no
primeiro havia alegria, por que não haveria regozijo no segundo? Aliás, é o que
professa o salmista. Louvando ao Senhor
pelo fato de o haver livrado de todos os seus adversários, canta o rei Davi:
“Este é o dia que fez o SENHOR; regozijemo-nos e alegremo-nos nele” (SI
118.24).
O que significa regozijar-se? É uma alegria que excede todas as alegrias; uma alegria transcendente e que não se acha condicionada por nenhuma circunstância. O pensador japonês Toyohiko Kágawa revela, em meio às aflições, a grandeza da alegria que lhe ia na alma: “Apesar de estar cronicamente doente, sou capaz de viver como uma pessoa normal, porque tenho alegria — alegria à noite, alegria de dia, alegria na oração”. Sim, o que significa regozijar-se? Canta mais uma vez o salmista: “Este é o dia que fez o Senhor. Regozijemo-nos e alegremo-nos nele”. Ouça a eufonia hebréia: zeh-haíom asahYaveh nagilah venisemeah bo. O verbo semeah traz as seguintes conotações: regozijar-se, alegrar-se intensamente, entreter-se. Portanto, é possível regozijar-se mesmo no pior temporal; logo após, enviará o Senhor a bonança. Em Deus, somos de contínuo surpreendidos pela alegria.
Conclusão
Talvez esteja você, em razão de alguma
tribulação, maldizendo o dia do seu nascimento. Em todas as coisas, regozije-
se em Deus. Não permita que a tristeza lhe tome o coração, nem lhe roube a
alma.
Jó muito sofreu. Se num momento, veio ele
a amaldiçoar o dia do seu nascimento, disto se arrependeu no pó e na cinza. E,
assim, Deus o reabilitou, pois jamais proferiu qualquer palavra contra o
Senhor.
Todos os nossos dias são preciosos ao Senhor. Que aprendamos a contá-los a fim de que alcancemos corações sábios.
COMENTÁRIO DE JÓ
CLAUDIONOR DE ANDRADE
Jó 3
B. A Impaciência de Jó. 3:1-26.
Entre as alturas da serenidade espiritual do
prólogo e do epílogo, estende-se o abismo da agonia espiritual de ló. A descida
e a subida do abismo ficam marcadas por mudanças súbitas e dramáticas de
temperamento espiritual. Estas foram descritas em breves passagens
transicionais (isto é, caps. 3; 42:1-6). O primeiro delas descreve o mergulho
assustadoramente abrupto da paciência às profundezas do abatimento.
1. Amaldiçoou o
seu dia. O que transformou as submissos doxologias de ló em incontidas
imprecações? Teria a sua resistência espiritual se esgotado pelos dias e noites
de desespero físico? Ou teria, à vista dos distintos companheiros de sua antiga
prosperidade, revivido nele as honras desaparecidas e a felicidade do passado?
Ou será que o rosto dos seus amigos, horrorizados, cheios de piedade
inexprimível, refletiam de maneira horrível a feiúra do seu presente? A chave
não se encontraria na identidade dos seus amigos que eram "homens
sábios?" A presença taciturna desses filosóficos intérpretes da vida não poderiam
deixar de levar Jó a filosofar sobre a sua trágica experiência. Mas quanto mais
intensamente procurava uma explicação para ela, mais ansiosamente cônscio ele
se tornava da parede misteriosa que o aprisionava. À procura do por que, ele
logo perdeu o Caminho. Obcecado pelo terror de ter sido abandonado por Deus,
ele amaldiçoou sua vida desamparada. Nem a esta altura nem mais tarde Jó
cumpriu as predições satânicos de que renunciaria a Deus com uma maldição.
Amaldiçoando a sua própria existência, entretanto, Jó, realmente, atreveu-se a
discutir com o Soberano que a decretara. Tudo o que não é de fé é pecado;
portanto, eis aí a necessidade do arrependimento de Jó (cons. 42:1-6) para
renovar a sua paz com Deus.
3-10.
A inevitável presente miséria de Jó obstrui as lembranças dos felizes anos
passados quando ele lamenta o fato de ter nascido. Que o Todo-Poderoso não o
faça se lembrar do dia em que nasceu (v. 4), mas que reclamem-no as trevas e a
sombra de morte (v. 5a). Se a noite de sua conceição pudesse ser apagada do
calendário do tempo (v. 6), ou o monstro marinho (v. 8b, ASV, leviatã, símbolo
mitológico do inimigo da ordem cósmica) pudesse engoli-lo no caos.
11-19. Por que? Imprecação explosiva produz
lamentação de autopiedade. Por que, já que fora concebido e nascera, não ficara
entre os abortos ou natimortos (vs. 11, 16)? Até o confinamento da negra
sepultura – ainda não provérbio entre os homens desprezíveis e loucos,
participaria da sorte comum dos reis e príncipes (vs, 14, 15); ali todos
aqueles que são afligidos pelos "maus" e pelos senhores encontram
alívio das perturbações humanas (vs. 17-19).
20-26. Por que, não tendo nascido morto, mas tendo sido bem recebido e nutrido (v.12), sua vida miserável teve de continuar? Quando a lamentação se aproxima do fim, Jó finalmente anuncia seu problema básico : Por que Deus concedeu a luz da vida ao homem cujo caminho é oculto, e a quem Deus cercou de todos os lados (v. 23; cons, v. 20). A palavra que Satanás usou para descrever Jó como "cercado com sebe" por todos os lados com o favor de Deus (1:10), agora Jó usa referindo-se a alguém que está "tolhido" por Deus através de trevas e desfavores.
III. Juízo : O Caminho da Sabedoria
Obscurecido e Iluminado.
4:1 –
41:34.
A. O Veredito dos Homens. 4:1-37:24.
Considerando que o diálogo de Jó com
seus amigos relacionava-se mais com a lamentação de Jó do que diretamente com
suas calamidades, a missão dos amigos assume mais os ares de um julgamento do
que de consolo pastoral e continua assim progressivamente em cada sucessivo
ciclo de discursos. (Em relação à estrutura cíclica do diálogo, veja o Esboço
acima.) Os amigos assentaram-se como em um conselho de anciãos para julgarem o
ofensor clamoroso. A avaliação da culpa de Jó envolve discussão dos aspectos
mais amplos do problema da teodicéia, mas sempre com o caso particular de Jó e
a condenação à vista. Portanto, para Jó o debate não consiste em um estudo
imparcial e acadêmico do sofrimento em geral, mas uma nova e dolorosa fase dos
seus sofrimentos. Os amigos são enganados por seu apego à tradicional teoria,
ajudando e favorecendo a Satanás em sua hostilidade contra Deus, e obscurecendo
o caminho da sabedoria para Jó, o servo de Deus. Mas o debate serve para
silenciar esta sabedoria do mundo e assim prepara o iluminada pela glória da
ressurreição de Cristo – parecia muito melhor do que a sua existência. Ali Jó,
um pária e um caminho para a apresentação da via de acesso da aliança para a
sabedoria, que são apresentados nos discursos de Eliú e o Senhor. Novamente, no
apelo que Jó faz dos vereditos humanos ao supremo tribunal, expresso em seu
apaixonado anseio de expor o seu caso diante do Senhor, o debate busca a
manifestação visível de Deus.
Jó (Comentário
Bíblico Moody)
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