TEXTO
ÁUREO
“Eis
que temos por bem-aventurados os que sofreram. Ouvistes qual foi a paciência de
Jó e vistes o fim que o Senhor lhe deu; porque o Senhor é muito misericordioso
e piedoso” (Tg 5.11).
VERDADE PRÁTICA
O livro de Jó não é apenas uma preciosidade da
literatura universal, mas, sobretudo, uma poderosa resposta de Deus para as
grandes questões da vida.
LEITURA BÍBLICA EM CLASSE
2 Timóteo 3.16; Ezequiel 14.14,19,20;
Tiago 5.11.
2 Timóteo 3
16 — Toda
Escritura divinamente inspirada é proveitosa para ensinar, para redarguir, para
corrigir, para instruir em justiça,
Ezequiel 14
14 — ainda
que estivessem no meio dela estes três homens, Noé, Daniel e Jó, eles, pela sua
justiça, livrariam apenas a sua alma, diz o Senhor Jeová.
19 — Ou se
eu enviar a peste sobre a tal terra e derramar o meu furor sobre ela com
sangue, para arrancar dela homens e animais;
20 — ainda
que Noé, Daniel e Jó estivessem no meio dela, vivo eu, diz o Senhor Jeová, que
nem filho nem filha eles livrariam, mas só livrariam a sua própria alma pela
sua justiça.
Tiago 5
11 — Eis que
temos por bem-aventurados os que sofreram. Ouvistes qual foi a paciência de Jó
e vistes o fim que o Senhor lhe deu; porque o Senhor é muito misericordioso e
piedoso.
OBJETIVOS ESPECÍFICOS
Abaixo, os objetivos específicos referem-se ao que o
professor deve atingir em cada tópico. Por exemplo, o objetivo I refere-se ao
tópico I com os seus respectivos subtópicos.
- I.
Mostrar que, a partir das evidências
internas do livro, é possível conhecer o contexto no qual Jó viveu;
- II.
Especificar o gênero literário e de que
forma esse conhecimento ajuda na compreensão do Livro de Jó;
- III.
Identificar o propósito e a mensagem do
Livro de Jó.
INTERAGINDO COM O PROFESSOR
Há coisas que acontecem na vida do crente que,
inevitavelmente, leva-o a fazer perguntas que traduzem a angústia da alma: Se
Deus é justo e amoroso por que permite que um justo sofra tanto? Perguntas como
esta podem ser consideradas o pano de fundo do livro que estudaremos neste
trimestre: Jó. Nosso objetivo é compreender o que o livro diz a respeito do
assunto, as respostas humanas dadas ao sofrimento e, finalmente, a resposta de
Deus a Jó e seus amigos.
Para comentar o tema desse trimestre, contaremos com
o pastor José Gonçalves. Ele é escritor, conferencista, membro da Comissão de
Apologética da CGADB e líder da Assembléia de Deus em Água Branca — PI.
COMENTÁRIO
INTRODUÇÃO
Neste trimestre estudaremos o Livro de Jó, uma das
obras mais fascinantes da Bíblia. Não há em toda literatura bíblica outra obra
semelhante. Diferente na sua estrutura, no estilo e, sobretudo, no conteúdo, o
Livro de Jó demonstra a grandeza de Deus diante da finitude humana. É,
portanto, uma obra que alimenta a nossa esperança quando tudo mais parece ter
perdido o sentido.
PONTO
CENTRAL
O
Livro de Jó é uma poderosa resposta de Deus para grandes questões da vida.
SUBSÍDIOS ENSINADOR CRISTÃO
O LIVRO DE JÓ
O Livro de Jó é uma literatura bíblica única. Ele
apresenta uma estrutura diferente, um estilo singular e um conteúdo teológico
em que põe em contraste a grandeza de Deus com a pequenez humana. Estas são
razões básicas para o nosso interesse em estudar esse precioso livro.
Entretanto, há uma razão maior: É a Palavra de Deus que alimenta a nossa
esperança diante de uma tragédia. Nesse sentido, em algum momento de nossa
história nos identificaremos com a de Jó. Por isso, o livro nos traz consolo e
esperança.
Apresentação do trimestre
Como todo início, é importante que você apresente a
estrutura geral do trimestre. Fale um pouco sobre o tema geral, isto é, A
Fragilidade Humana e a Soberania Divina: Lições do Sofrimento e da Restauração
de Jó, e selecione alguns títulos que serão aprofundados nos próximos meses a
fim de despertar no aluno a importância do trimestre. Por exemplo, dentre todos
os títulos, há pelo menos quatro que, no mínimo, trarão inquietação aos alunos:
(1) A Teologia de Elifaz: Só os Pecadores Sofrem? (2) A Teologia de Bildade: Se
Há Sofrimento, Há Pecado Oculto? (3) A Teologia de Zofar: O Justo não Passa por
Tribulação? (4) A Teologia de Eliú: O Sofrimento É uma Correção Divina?
São perguntas que, no mínimo, algum aluno já fez ao
longo de sua caminhada cristã. Essas indagações, geralmente, aparecem nos
momentos de fragilidades existenciais. Seja por uma perda, uma doença, um
desemprego, um caos social. Enfim, no processo de algum sofrimento, algumas
questões levantadas no livro de Jó passam a ser as nossas questões.
Acerca da Lição 1
Trata-se de uma lição introdutória. E seu objetivo é
apresentar as questões de autoria, local e data em que o livro foi escrito;
especificar a estrutura literária do livro; identificar o propósito e mensagem
do Livro de Jó. Nesta lição, o conteúdo convergirá para mostrar que o Livro de
Jó é uma poderosa resposta de Deus para as grandes questões da vida.
Uma informação importante
O segundo tópico faz uma distinção entre prosa e
poesia. Ele apresenta a organização literária do livro em Prosa-Poesia-Prosa.
Estude sobre esses gêneros literários, pois sua compreensão permitirá entender
o Livro de Jó, desfrutar de sua beleza estética e alimentar a alma com seus
ensinamentos.
A
fragilidade humana e a soberania divina
— O sofrimento e a restauração de Jó
Comentarista: José Gonçalves
Um
comentário bíblico que pretende ser, ao mesmo tempo, conservador e confessional
precisa atender alguns requisitos. Primeiramente, ele não pode distanciar-se
daquilo que prega e ensina o cristianismo histórico. Nesse aspecto, o comentarista
deve ter o cuidado para não cair na tentação de querer reinventar a roda. Ele
não pode, portanto, ignorar mais de 2 mil anos de tradição cristã. Dizendo isso
de outra forma, ele não pode deixar-se levar pela onda do momento e tentar introduzir
no texto teorias ou ideias que se distanciam dele pelo simples fato de que
estão na moda. Por outro lado, por ser de natureza confessional, o comentarista
precisa ser fi el àquilo que reza os seus códigos doutrinários, no caso do
presente livro, que é ligado à tradição pentecostal clássica, quer seja um
conjunto de verdades fundamentais, quer seja declaração de fé.
No
presente comentário, procurou-se seguir essas diretrizes. Para que esse alvo
fosse alcançado, procurou-se dialogar com a tradição cristã desde os seus
primórdios. Uma ampla bibliografi a foi consultada desde os primeiros
comentários sobre Jó, que remontam aos Pais da Igreja, passando pelos
comentaristas do período medieval até à presente época.
Tanto
Clemente Romano (35–97 d.C) e Tomás de Aquino (1225–1274 d.C), para citar os
mais antigos, como Sicre Díaz (2002) e Daniel Estes (2013), entre os mais
modernos, foram consultados. Quando a obra é vista no seu formato final, esses
esforços tornam-se justificáveis.
Sendo
um comentário que servirá de apoio às Lições Bíblicas da Escola
Dominical, ainda existem algumas outras peculiaridades. Isso, por exemplo, exigiu um esboço próprio que se ajustasse ao formato adotado por essas lições, que são em número de 13. Muitos esboços foram consultados, mas o que mais pareceu ajustar-se à realidade desse formato foi aquele encontrado na obra dos expositores da Bíblia (The Expositor’s Bible Commentary).
Todavia,
mesmo sendo o esboço mais completo dentre os consultados, a obra dos
expositores da Bíblia também mantinha as suas peculiaridades, sendo, portanto,
aproveitado apenas em parte. Sendo assim, vi-me no desafio de trabalhar um
esboço próprio, com poucas adaptações, para essa publicação. O resultado final
não me pareceu destoar dos já existentes.
Pois
bem, dito isso, é necessário destacar que o presente comentário procurou
enfrentar todos os problemas levantados pelo livro de Jó, quer seja em relação
à teodiceia, quer seja alguns outros de natureza puramente exegética. Nesse
aspecto, foi tratada a questão relativa à origem e natureza do mal, bem como a
fala da esposa de Jó. Foi também necessário traduzir em linguagem teológica
aquilo que é, em seu princípio, de natureza puramente filosófica. Talvez o
objetivo não tenha sido alcançado no seu todo, mas, sem dúvida, deixou o
caminho mais fácil para quem quer chegar lá.
Uma
palavra a mais precisa ser dada sobre a estrutura do presente comentário. Os
cinco primeiros capítulos são dedicados inteiramente para tratar sobre Jó e o
seu dilema. No capítulo 1, é feito um apanhado geral sobre o contexto social,
cultural e histórico no qual Jó viveu. Da mesma forma, o capítulo 2 procura
descrever, sempre fazendo exposição do texto, fatos e detalhes da vida e rotina
de Jó. O propósito é fazer com que o leitor familiarize-se com Jó e com o mundo
do qual ele participou. Os capítulos 3 e 4 tratam, respectivamente, sobre a realidade
de Satanás e o dilema de Jó. Já o capítulo 5 mostra quando Jó quebra o silêncio
e amaldiçoa o dia do seu nascimento. Os capítulos 6, 7 e 8 tratam da teologia
dos amigos de Jó. Como o texto do livro de Jó é arranjado de forma poética, no
formato de uma peça teatral, algumas adaptações foram necessárias na estrutura do
texto do presente comentário. A mais relevante é a que agrupou todas as falas
de cada um dos amigos de Jó nos capítulos que tratam da teologia de cada um
deles. Dessa forma, por exemplo, as falas de Elifaz, que são intercaladas pelas
respostas de Jó — o que faz com que elas estejam distribuídas em diferentes
capítulos do livro —, são aqui colocadas em um único bloco. Isso tem o efeito
positivo de não se enxergar de forma unilateral esses discursos nem tampouco
cair em reducionismos na sua análise. Quer dizer, esse formato permite ver a
visão do todo, e não apenas de partes fragmentadas.
O
capítulo 9 foi dedicado exclusivamente para tratar do assunto da sabedoria. É
mostrado no texto que alguns autores veem esse capítulo como se ele estivesse deslocado
do restante do livro de Jó, não tendo relação nem com o que vem antes, o
capítulo 27, nem tampouco com o que vem depois, o capítulo 29. Todavia, como
ficou demonstrado, esse capítulo é posto propositadamente nesse lugar. O objetivo
é contrastar a sabedoria humana, que está presente nos amigos de Jó, com a
sabedoria divina, que é encontrada somente no temor do Senhor.
O
capítulo 10 expõe a última defesa de Jó e antecipa aquilo que será apresentado
no capítulo 11: a Teologia de Eliú. Da mesma forma que o tema referente à
sabedoria levantou controvérsias por parte da crítica bíblica, assim também os
discursos de Eliú. Alguns autores defendem que Eliú não fazia parte da redação
original e que teria sido uma interpolação tardia feita por algum escriba para
solucionar o impasse criado entre Jó e os seus três amigos. Todavia, como ficou
demonstrado neste comentário, essa teoria é carente de comprovação.
Por último, os capítulos 12 e 13 tratam da revelação de Deus a Jó e de como ele foi restaurado. O leitor desatencioso ficará frustrado com a forma como Deus responde a Jó. Como Naamã (2 Rs 5), o general sírio que era leproso e foi curado pela intervenção do profeta Eliseu, muitos esperavam que, naquele momento, Deus fosse fazer algum show pirotécnico quando se revelou a Jó; mas não foi isso que aconteceu. Na verdade, Deus, em vez de responder às perguntas de Jó, fez-lhe mais perguntas ainda. Todavia, são nessas perguntas que a sabedoria de Deus demonstrou a sua graça ao patriarca. Jó é restaurado, o Senhor é glorificado, e nós somos edificados!
Algumas importantes questões devem ser levadas em conta quando alguém se propõe a estudar o livro de Jó. A primeira delas está relacionada aos fatos concernentes à autoria, à data e ao contexto no qual o livro foi escrito. Quem escreveu Jó? Evidentemente, não há um consenso entre os estudiosos sobre quem, de fato, escreveu o livro de Jó. Todavia, uma exposição dos argumentos daqueles que defendem Jó como autor da obra que leva o seu nome, bem como daqueles que a contestam, ajudam muito na compreensão do sentido dessa magistral obra da literatura bíblica e universal. Em segundo lugar, deve-se perguntar em que contexto os fatos narrados no livro ocorreram? Precisar o período da história onde os eventos narrados no livro ocorreram lançará luz no seu entendimento. Em terceiro lugar, em que época aconteceu a redação do livro? Jó foi escrito na época em que ocorreram os fatos narrados no livro ou teria sido produto de uma redação posterior? Essas são perguntas que não têm respostas fáceis; todavia, são muito importantes para serem ignoradas.
Autoria e data
Em
relação ao autor do livro de Jó, deve ser observada primeiramente a questão da
autoria simples e da autoria múltipla do livro. Teria sido o livro de Jó
escrito por uma única pessoa e de uma só vez ou teria sido uma composição feita
por autores diferentes ao longo de muitos anos?
Elmer
B. Smick (1988, p. 845) observa que alguns autores defendem a autoria múltipla
para o livro de Jó. A razão seria puramente de natureza estrutural. Alega-se,
por exemplo, que o prólogo estaria em desconexão com o epílogo e com os
diálogos existentes no restante do texto. Pope
(1973,
citado por Smick, 1988, p. 846) cita, por exemplo, a ausência de
Eliú
no início do livro, vindo a aparecer somente no seu final. Dessa forma, Pope
deduziu que Eliú teria sido um personagem introduzido posteriormente no texto
por outro redator para tentar solucionar o impasse criado entre Jó e os seus
três amigos. Essa, portanto, teria sido uma interpolação posterior feita no
texto. Dessa forma, esse mosaico ou colcha de retalhos no qual se teria transformado
o livro de Jó existira em razão do uso de fontes diferentes feito por autores
também diferentes.
Sem
dúvida, é uma teoria que não deve ser ignorada; todavia, como destacou Smick
(1988, p.846), esses argumentos vão contra as evidências internas do livro. O
Diabo, por exemplo, é totalmente ignorado nos diálogos entre Jó e os seus
amigos e não está presente no epílogo do livro. Todavia, ninguém põe em dúvida
a unidade do livro devido a esse fato. O que se percebe é que o Diabo aparece
somente no início da obra, porém a sua atuação é crucial para o entendimento do
enredo do livro, incluindo o seu desfecho. Dessa forma, não há nada no livro de
Jó que depõe contra a sua unidade devido ao fato do aparecimento de Eliú somente
na parte final do livro.
Como foi destacado, essas questões
relacionadas à autoria têm suscitado intensos debates e posições diametralmente
opostas. O próprio Jó, segundo argumentam alguns comentaristas (Zuck, 1981),
teria sido o autor da obra que leva o seu nome, enquanto outros defendem que Moisés
ou, ainda, algum outro nome depois do exílio babilônico tenha-a escrito.1
Zuck (1981, p.11) observa o seguinte:
Sendo que o autor não se identifica a si mesmo, os eruditos da Bíblia podem somente especular sobre quem poderia ter escrito. Numerosas sugestões têm sido formuladas, incluindo a que foi o próprio Jó, Eliú (o quarto amigo que entra em cena no final do livro, cap. 32–37), Moisés, Salomão, Ezequias, Isaías, alguém depois do exílio babilônico, quem sabe se Esdras ou um autor anônimo uns duzentos anos antes de Cristo.2
Alguns
fatores são levados em conta em favor da autoria mosaica para o livro de Jó.
Algumas semelhanças entre o livro de Jó e o livro de Gênesis — o contexto
patriarcal, por exemplo — dão a impressão de que ambas as obras fizeram parte
do mesmo contexto cultural.3 Mesquita
(1979)
argumenta que a referência às minas citadas no capítulo 28 de Jó demonstraria
certa familiaridade com o ambiente vivido por Moisés durante os seus 40 anos no
deserto. De acordo com Mesquita (1979, p. 11), no deserto, Moisés “teria
entrado em contato com os mineiros que extraíam essas preciosidades para a
corte egípcia”.4
Em favor da autoria de outro autor, que teria vivido depois do exílio babilônico, argumenta-se que o contexto do livro retrataria os fatos refletidos por esse período da história hebraica. Dessa forma, Stornilolo (2018, p. 9) defende que alguém que escreveu Jó queria responder às perguntas dos exilados,
que haviam perdido tudo, ficando
empobrecidos como Jó, e muitos como ele, ficaram enfraquecidos e doentes.
Sobravam muitas perguntas: O que resta de tudo? Onde fica a religião?
O que é a religião? O que os fracos e empobrecidos têm a dizer sobre Deus? Daqui para frente, como encarar a vida?
A
posição assumida por Zuck (1981) em favor do próprio Jó como sendo o autor do
livro que leva o seu nome demonstra ser a menos problemática. Algumas questões
de natureza interna do livro apontam nessa direção. Por exemplo, os detalhes
das conversas registradas na obra sugerem que o livro tenha sido escrito por
alguém que tenha vivenciado os fatos.
Depois
de haver sido restaurado, Jó ainda viveu mais 140 anos, o que lhe deu tempo de
sobra para organizar e narrar os fatos com ele ocorridos.
Assim
como Moisés, que escreveu os livros do Pentateuco, exceto o fato relacionado ao
registro da sua morte, assim também teria ocorrido com
Jó. Zuck (1981, p. 11) destaca o seguinte:
Não é coisa estranha nos tempos do Antigo Testamento um escritor narrar a história de si mesmo na terceira pessoa. Naturalmente damos por certo que alguém, sem ser Jó, escreveu os últimos versículos, descrevendo a morte de Jó e dizendo os anos com que faleceu. Podemos afirmar que isso não era estranho ao estilo de escrita da história antiga.
Ainda
deve ser destacado que, independentemente de quem tenha sido o autor do livro
de Jó, a inspiração do livro não está em questão. Jó é um livro inspirado e,
como tal, deve ser lido. Todavia, em relação à data da sua redação, quando
colocada numa época muito tardia, como, por exemplo, após o exílio babilônico
ou período persa, há uma forte tendência em enxergar o livro de Jó apenas como
literatura folclórica,5 um livro cuja poesia é belíssima, mas que não passa de
uma peça de ficção de natureza a
histórica. Sem dúvida, uma interpretação que se guia por esse entendimento tem forte impacto sobre a compreensão da sua mensagem.
Contexto Cultural e Religioso
Talvez
um dos fatos mais importantes relacionados ao livro de Jó diz respeito ao seu
contexto histórico-cultural. A redação de Jó 1.17, diz:
“[...]
Ordenando os caldeus três bandos, deram sobre os camelos, e os tomaram, e aos
moços feriram ao fio da espada; e só eu escapei, para te trazer a nova”. Essa
referência aos caldeus como nômades coloca Jó no segundo milênio antes de
Cristo; logo, no contexto dos patriarcas.6 O contexto descrito no livro de Jó
reflete, sem dúvida, a cultura patriarcal.
Daniel J. Estes (2013, p. 251) destaca:
Muitos doS detalhes do livro parecem se encaixar melhor na era patriarcal de Abraão, Isaque e Jacó. Por exemplo, os antigos nomes divinos El, Eloah e Shaddai são usados na maior parte do livro. Além disso, as posses de Jó se parecem muito com as posses dos patriarcas, e seu tempo de vida é comparável ao deles.7
Guinan (2017), quando destaca o contexto cultural do livro de Jó, observa que, naquele contexto, a sociedade era tribal, guiada pela tradição oral e também refletindo uma cultura marcada pela vergonha. Essas três características culturais apresentadas no livro de Jó ajudam na compreensão da sua mensagem. Ao comentar o contexto tribal no qual Jó viveu, Guinan (2017) destaca que o patriarca preocupa-se com a família, os seus descendentes, bens e propriedades. Os laços familiares são muito fortes e espera-se continuar na memória deles. A tradição oral prevalece dentro dessa tribo. Guinan (2017, p. 214) destaca:
A comunicação e a educação dependem primordialmente da palavra falada; é o que une a sociedade. À medida que a conversa entre Jó e seus amigos se inflama, a retórica se torna mais bombástica, até insultante. Isso é consistente com uma cultura oral na qual o importante não é que simplesmente algo seja dito, mas também como é dito. O que as pessoas dizem se destaca bastante.
A sociedade patriarcal era marcada por uma cultura da honra, denominada por Guinan (p. 214) de cultura da vergonha. Nesse aspecto, os valores mais importantes nesse contexto são a honra e a vergonha. Aqui, possuir um nome honrado é objeto de grande apreço e estima. O que Salomão disse em tempos posteriores ainda refletia esses valores: “Mais digno de ser escolhido é o bom nome do que as muitas riquezas; e a graça é melhor do que a riqueza e o ouro” (Pv 22.1). Guinan (199, p. 214) observa que
o fato de Jó parecer estar errado e assim ser considerado por seus amigos já seria, por si só, fonte de grande sofrimento e aflição. É importante não só estar certo e ser justo, mas também ser reconhecido como tal pelos outros.
Se o contexto cultural é importante para a correta compreensão da mensagem de Jó, da mesma forma é o contexto religioso. Três elementos podem ser destacados nesse ponto. Primeiramente, o livro de Jó é escrito seguindo o modelo da literatura sapiencial. 8 Nesse tipo literário, é dado um grande valor à experiência. Enquanto os seus amigos acusavam-no de ter cometido pecado, Jó, devido à sua experiência, ficou firme na defesa da sua inocência. Carol Newson (1992, p. 133 citada por Ceresko, 2004, p. 76), ao comentar sobre os argumentos dos amigos de Jó, escreve:
Embora seus argumentos sejam sofisticados e variados, Jó sustenta sua opinião numa única razão fundamental. Ele sabe que o senso comum e as tradições dos amigos, sua racionalidade e suas revelações, não correspondem à experiência que ele mesmo tem. Para Jó, manter a todo custo a integridade significa insistir na validade e na autoridade de sua própria experiência, mesmo quando esta pareça ter contra si tudo o que o mundo conhece como verdadeiro.
Duas
outras características devem ser levadas em conta ainda dentro do contexto
religioso do livro de Jó, a saber: o uso abundante de metáforas legais e o uso
de linguagem de lamento. Guinan (2017) destaca que, no contexto de Jó, as
disputas entre duas partes envolvidas eram primeiramente tratadas de maneira
informal. Falhando essa primeira tentativa, então o acusado pronunciava um
juramento de inocência e fazia o seu protesto formalmente a uma terceira
pessoa, o juiz, que, nesse caso, exigia do acusador a apresentação de provas.
Guinan (2017, p. 214) destaca que a “linguagem legal é empregada quando Jó
protesta inocência e clama por um terceiro que faça justiça (por exemplo, 9.33;
16.9; 19.25)”.
O livro de Jó, assim como faziam os israelitas
em tempos de crise e aflição, externa o seu lamento diante de Deus. Guinan
(2017, p. 214) destaca que, após perder a família e os bens, Jó mergulha num
profundo dilema.
Da mesma forma, Simonetti e Conti (2010, p. 19) destacam que o livro de Jó
apresenta o drama de um homem justo que, depois de haver sido golpeado pela desgraça, é consciente de não merecê-la. Ainda que Jó não perca sua esperança e não maldiga a Deus, se pergunta porque teve que sofrer tal calamidade.
Os seus amigos, que, a princípio, chegam como consoladores, terminam como algozes. Diante do sofrimento, Jó extravasa o seu lamento clamando por inocência. O capítulo 3 ilustra o profundo lamento de Jó diante das calamidades que se abateram sobre ele. Diante das tragédias que lhe sobrevieram, Jó lamenta pelo dia em que nasceu; lamenta porque não havia nascido morto e lamenta porque ainda estava vivo!
Ethos e pathos na mensagem de Jó
Não
há dúvida de que o tema da sabedoria, como, por exemplo, aquela exposta no
livro de Provérbios, passa a ser contrastada com a sabedoria encontrada no
livro de Jó. Enquanto Provérbios põe a sabedoria em termos morais, isto é, com
o Senhor recompensando os bons e punindo os maus, Jó, por outro lado, contrasta
com essa forma de crer. Daniel Estes
(2013, p. 336) destaca que
o propósito maior do livro de Jó é demonstrar que embora a retribuição seja vista como uma verdade geral, a regra da soberania de Deus sobre o mundo não pode ser reduzida a uma fórmula rígida de retribuição.
Na
contramão da Teologia da Retribuição, Jó é um poderoso discurso contra a ideia
de que o justo não sofre ou passa por revezes. O livro ecoa aquilo que, tempos
depois, o salmista verbalizaria no Salmo 73: “Por que os justos sofrem e os
ímpios prosperam?” (ver Sl 73).
Não há dúvida de que Jó faz contraste com
a doutrina da retribuição e demonstra inquestionavelmente a condição humana
frente à soberania divina. O Deus de Jó é soberano. Todavia, a sua soberania
não deve transformá-lo em um algoz ou carrasco. O livro deixa claro que Ele permite
Jó ser testado até o limite último, mas não para provar que era soberano ou
mostrar que era Deus, mas, sim, para provar que, mesmo oculto e ficando em
silêncio, Ele estava com Jó e amava-o. Em Jó, a graça às vezes está oculta, mas
está lá! Foi por amor que Ele reabilitou-o, e não, simplesmente, porque era
soberano e podia fazer isso. O Senhor estava interessado no relacionamento com
Jó e permitiu o Diabo tocá-lo para mostrar que Jó não servia a Deus por
interesse, mas também porque o amava. Nesse aspecto, o livro de Jó levanta-se
como um poderoso protesto contra a frieza que o legalismo religioso produzia no
universo da fé. O culto a Deus não podia ser explicado em termos de leis ou
regras meramente cerimoniais ou até mesmo morais. Elas eram importantes sim,
mas não eram tudo. O livro não põe o preceito acima do princípio; não põe em
evidência a Lei, mas a graça. Nesse sentido, a religião não é apenas regras,
mas, sobretudo, relacionamento. Dessa forma, Jó antecipa-se em muitos séculos
àquilo que os profetas pregariam. Assim como Jó, os profetas viam Deus não
apenas como ethos, isto é, preceitos ético-morais, mas, sobretudo, pathos, isto
é, amor, coração e afeto. Deus não era apenas razão, mas também emoção.
Aqui, a contribuição de Abraham J. Heschel
(2012) — sem dúvida, um dos maiores estudiosos do fenômeno profético no antigo
Israel — será de grande importância para mostrar que aquilo que em Jó
apresenta-se de forma embrionária passa a ganhar corpo e forma nos profetas.9
Heschel
(1907–1972), um judeu austro-americano, estudou a ocorrência da profecia entre
os hebreus e no mundo antigo, e os seus estudos há muito se tornaram referência
mundial na pesquisa do movimento profético antigo. Mas é, sobretudo, a sua
compreensão da relação existente entre pathos e ethos e como estes norteiam a
práxis profética que fornecem uma grande contribuição na compreensão desses
importantes personagens da história bíblica. Heschel (1973, vol. I, p. 70)
destacou que o estudo da profecia bíblica revela que a experiência dos profetas
caracterizava-se pelo que ele denomina de “coparticipação com os sentimentos de
Deus, uma simpatia com o pathos divino”. O pathos divino é, portanto, refletido
no profeta e, consequentemente, na sua forma de agir. Nesse aspecto, Heschel
destaca que a resposta do profeta à inspiração divina é a simpatia que ele demonstra
por aquilo que Deus quer e sente e, também, por aquilo que a ele foi revelado.
Julius Wellhausen (1844–1918) creditou aos profetas a criação do monoteísmo ético no antigo Israel.10 Heschel (1973, vol. II, p. 109), por outro lado, não nega a contribuição dos profetas para o monoteísmo ético, mas destaca que a sua gênese não pode ser atribuída aos profetas clássicos, pois a moralidade já era uma bandeira levantada muitos tempo antes destes. Na análise de Heschel, o perigo dessa abordagem é fazer-se separar o ethos do pathos. Por essa proposta, os profetas seriam simples mensageiros morais em oposição ao cerimonialismo ritual. Para Heschel (1973, vol. II, p. 109), a moralidade “não era a principal característica da mensagem profética”. Para ele, o ethos divino não opera sem o pathos. Heschel (1973, vol. II, p. 110) destaca:
Qualquer pensamento de uma objetividade ou uma auto-subsistência das ideias platónicas, seja a ideia da beleza ou da justiça, é estranha aos profetas. Deus é eternamente pessoal, todo sujeito. Seu ethos e pathos são um. A preocupação com a justiça, a paixão com que os profetas condenavam a injustiça, [estava] enraizada em sua simpatia com o pathos divino. A principal característica do pensamento profético é a primazia da participação de Deus na história. A história é o domínio com o qual as mentes dos profetas estão ocupadas. São movidos por uma responsabilidade para com a sociedade, por uma sensibilidade ao que o momento exige.
Isso é importante, porque, no entendimento de Heschel (1973, vol.II, p. 110), a compreensão dos profetas sobre Deus não se limitava apenas a uma “ideia” sobre Ele, mas a um entendimento dEle. Não era, portanto, um conhecimento advindo de uma investigação teórica. Os profetas não se referiam a Deus como um ser distante e inalcançável, mas como estando sempre próximo e presente. Esse relacionamento íntimo com Deus era, sem dúvida, a fonte da sua inspiração, mas não a única. Dessa forma, a compreensão do propósito de Deus para o mundo vinha da inspiração que vinha dEle e, também, da correta compreensão da história. Heschel (1973, vol. II, p. 116) destaca que “a presença e anseio de Deus falou com eles através das manifestações da história”. Isso significa que os profetas receberam o seu conhecimento primeiramente da inspiração divina que tiveram e, secundariamente, dessa mesma presença divina na história. Heschel (1973, vol. II, p. 119) destaca que essa forma de Deus revelar-se aos profetas caracteriza a relação entre o pathos e o ethos.
Para o profeta, como assinalamos, Deus não se revela numa qualidade de absoluto abstrato, mas num relacionamento pessoal e íntimo com o mundo. Ele não apenas ordena e espera pela obediência; Ele também é afetado pelo que acontece no mundo e reage de acordo. Eventos e ações humanas despertam em alegria ou tristeza, prazer ou raiva. Não é concebido como julgar o mundo e ser separado dele. Ele reage de maneira íntima e subjetiva e, portanto, determina o valor dos eventos. Como é evidente do ponto de vista bíblico, as obras do homem podem movê-lo, afetá-lo, afligi-lo ou, pelo contrário, fazê-lo feliz e contente. Essa noção de que Deus pode ser intimamente afetado, que possui não apenas inteligência e vontade, mas também pathos, define de maneira básica a consciência profética de Deus.
No seu relacionamento com Deus, o homem não se conduz de forma passiva, mas numa forma dinâmica que se constitui um desafio aberto. Não acontece em um mundo de contemplação, mas numa relação apaixonada (Heschel, vol. II, p. 120). Assim sendo, não há, portanto, uma separação entre pathos e ethos, como dois polos em constante oposição ou em movimento dialético. Para Heschel (1973, vol. II, p. 120) “não há uma dicotomia de pathos e ethos, de motivo e norma. Não existe em forma conjunta em oposição; eles implicam-se e presumem-se um ao outro”. Nas palavras de Heschel (1973, vol. II, p. 122):
Não
há dicotomia de pathos e ethos, de motivo e norma. Ele não existem em forma
conjunta, como estando em oposição eles implicam e pressupõem um ao outro. O
pathos de Deus é ético, já que Ele é a fonte da justiça, e Seu ethos é cheio de
pathos porque Deus é absolutamente pessoal, carente de algo impessoal. O
pathos, então, não é uma atitude tomada arbitrariamente. Sua lei interna é a lei
moral; o ethos é inerente ao pathos. Deus se importa com o mundo e compartilha
seu destino. Na verdade, esta é a essência da natureza moral de Deus: Sua
disposição para ter uma participação íntima na história do homem.
Por fim, Heschel (1973, vol. II, p. 123) destaca que
a compreensão da teologia do pathos é capaz de mudar o entendimento que se tem
dos problemas humanos. Nesse aspecto, a visão do profeta sobre o homem é a
mesma que Deus tem desse mesmo homem. Deus está entrelaçado na existência
humana, e, dessa forma, aquilo que os homens fazem interessa a Ele. Heschel
destaca que “o pecado, a culpa, o sofrimento, não podem separar-se da situação
divina. A vida de pecado é algo mais que um fracasso do homem; é a frustração
de Deus” (Heschel, 1973, vol. II, p.123). Citando Deuteronômio 10.14-15,
Heschel (1973, vol. II, p. 124) destaca que, jamais na história, o homem foi
levado tanto a sério como no pensamento dos profetas. Na mente dos profetas,
destaca Heschel (1973, vol. II, p. 124),
o
homem não é apenas uma imagem de Deus; é a preocupação perpétua dele. A ideia
de pathos acrescenta uma nova dimensão à existência humana. Tudo quanto o homem
faça, afeta não só a sua própria vida, mas também a vida de Deus na medida em
que esta é dirigida ao homem.
A grande contribuição do pensamento de Heschel é que
ele não apenas ajuda a resgatar a função da profecia na sociedade hebraica,
mas, sobretudo, o verdadeiro sentido da religião — o relacionamento correto com
Deus. Assim como os profetas, Jó demonstra que o experimentar Deus é muito mais
profundo do que o falar sobre Ele. Nesse aspecto, tanto o pathos como o ethos
nos profetas e em Jó, conforme definidos por Heschel, são paradigmas da
verdadeira espiritualidade. Em outras palavras, o servir a Deus dá-se em bases
relacionais, e não numa forma de barganha do tipo toma lá dá cá.
A Fragilidade Humana e a Soberania
Divina
(Livro de Apoio Adulto)
CONCEITO GERAL DOS LIVROS POÉTICOS
Os Salmos, Jó e os Provérbios, nas Bíblias
hebraicas, formam um grupo à parte, com a denominação de Livros poéticos.
Eclesiastes e Cântico dos Cânticos; e é frequente entre os estudiosos gregos
bem como entre os autores modernos, estender a todos o nome de Livros poéticos.
Eclesiastes possui forma poética, embora menos rigorosa. Trata-se, portanto, de
um elemento comum a todos esses livros.
O que caracteriza toda a poesia hebraica é o chamado
paralelismo.
Há poucas ocorrências de rimas na poesia hebraica.
A efetividade da poesia hebraica é grandemente
devida à sua liberdade de abstrações. Sempre apela aos sentimentos
fundamentais. No intuito de expressar seu desespero, o Salmista designa as
sensações que o caracteriza com as expressões "minha garganta está
seca", "meus olhos falham", "eu mergulho em profundas
dificuldades e não encontro lugar firme".
O LIVRO DE JÓ
O livro de Jó é o mais destacado de todos esses
esforços registrados na literatura mundial.
A narrativa trata da vida de um homem cujo nome
provê o título do livro. O livro abre com um prólogo em prosa que descreve Jó
como um homem rico e reto. Depois de uma série de calamidades, tudo que ele
tem, incluindo seus filhos, lhe é tirado. A pergunta levantada no prólogo é se
Jó vai conservar sua integridade diante de tamanho sofrimento. Somos informados
que ele saiu vitorioso: Jó 2:10 - Porém ele lhe disse: Como fala qualquer
doida, falas tu; receberemos o bem de Deus, e não receberíamos o mal? Em tudo
isto não pecou Jó com os seus lábios.
A HISTORICIDADE DO LIVRO
Com frequência, alguns perguntam: Será que Jó é um
homem real? Ou, será que o livro de Jó é uma história real? Estas duas
perguntas não precisam receber a mesma resposta. Que houve um Jó com a
reputação de retidão é fato atestado por uma referência a ele em Ezequiel 14:14
- Ainda que estivessem no meio dela estes três homens, Noé, Daniel e Jó, eles
pela sua justiça livrariam apenas as suas almas, diz o Senhor DEUS. É muito
provável que a narrativa básica do livro tenha sido fundamentada em uma
personagem real com esse nome.
LUGAR NO CÂNON
O livro de Jó faz parte da terceira divisão do cânon
hebraico, o Kethubim, os hagiógrafos, ou Escritos. A ordem nessa divisão tem
variado nas diferentes tradições. Atualmente Jó é colocado entre Provérbios e
Cantares de Salomão (Cânticos de Salomão) no cânon hebraico. A Tradução
Brasileira coloca Jó entre Ester e os Salmos, onde Jó é o primeiro dos três
grandes livros poéticos.
A CONTRIBUIÇÃO TEOLÓGICA
Todos os livros da Bíblia devem ser estudados como
um todo, com suas partes vistas em relação ao propósito geral do autor. Isso
merece atenção especial em Jó. Suas partes não devem ser arrancadas do todo, e
suas ênfases principais não devem ser cristalizados em princípios rígidos nem
calibrados em proposições estreitas.
O RELACIONAMENTO DE DEUS COM O
SOFRIMENTO DO CRENTE
O primeiro fato a ser lembrado é este: Deus
acompanha o nosso sofrer. Satanás é o deus deste século, mas ele só pode
afligir um filho de Deus pela vontade permissiva de Deus. Deus promete na sua
Palavra que Ele não permitirá sermos tentados além do que podemos suportar, 1
Co. 10:13 - Não veio sobre vós tentação, senão humana; mas fiel é Deus, que não
vos deixará tentar acima do que podeis, antes com a tentação dará também o
escape, para que a possais suportar
TEXTO EXTAÍDO : Faculdade Teológica das
Assembleias de Deus
AGOSTINHO APOLINÁRIO DO CARMO
Lição 9 - Os Livros Poéticos
- 01/06/2003
INTRODUÇÃO
Há uma coletânea de livros na parte dos Hagiógrafos
(Escritos sagrados) do cânon judaico que denominamos em nossa cultura bíblica
de Livros Poéticos. São eles: Jó, Salmos, Provérbios, Eclesiastes e Cantares de
Salomão. Três deles são chamados de Livros Sapienciais, que significa, livros
da sabedoria: Jó, Provérbios, Eclesiastes e alguns salmos. Se bem que a
expressão “livros sapienciais” é também aplicada a todo o grupo de livros. Essa
literatura por Deus inspirada floresceu nos dias áureos de Salomão, embora sua
origem seja muito antiga (1 Rs 4.30,31; Jr 18.18; Et 1.13).
Os livros hagiógrafos, ou seja, os escritos
sagrados, são a terceira porção da Bíblia hebraica, os chamados
"Ketuvim", que envolvem os livros que hoje denominamos de poéticos
(Jó, Salmos, Provérbios, Eclesiastes e Cantares de Salomão) e alguns históricos
(Rute, Ester, os dois livros de Crônicas, Esdras e Neemias)e proféticos (Daniel
e Lamentações). Já os "Meguillot" são cinco livros que são lidos, até
hoje, nas festividades judaicas: Rute (que é lido no Pentecostes), Ester (que é
lido em Purim), Eclesiastes (que é lido na Festa dos Tabernáculos), Cantares de
Salomão (que é lido na Páscoa) e Lamentações (que é lido em Tishá Beav, dia de
jejum que lembra a destruição do templo de Jerusalém). (Pb.Caramurú).
I. O
LIVRO DE JÓ
Veja mais comentários sobre o livro em Lições da
vida de Jó
1. Sua posição no cânon judaico.
2. Autoria. Jó é considerado o livro mais antigo da
Bíblia.
3. Conteúdo.
4. O impacto causado na humanidade.
5. Sua historicidade.
Autor: Desconhecido Tema: Por
Que Sofre o Justo? Data: Incerta
Considerações Preliminares
Jó é um dos livros sapienciais e poéticos do AT;
“sapiencial”, porque trata profundamente de relevantes assuntos universais da
humanidade; “poético”, porque a quase totalidade do livro está elaborada em
estilo poético. Sua poesia, todavia, tem por base um personagem histórico e real
(ver Ez 14.14,20) e um evento histórico e real (ver Tg 5.11).
Os fatos do livro se desenrolam na “terra de Uz”
(1.1), que posteriormente veio a ser o território de Edom, localizado a sudeste
do mar Morto, ou norte da Arábia (cf. Lm 4.21). Assim sendo, o contexto
histórico de Jó é mais árabe do que judaico.
Há duas datas importantes relacionadas a Jó: (1) a
data do próprio Jó e dos eventos descritos no livro; e (2) a data da escrita
inspirada do livro. Certos fatos indicam que Jó viveu por volta dos tempos de
Abraão (2000 a.C.) ou até antes. Os fatos mais destacados são:
(1)
ele ter vivido mais 140 anos após os eventos do livro (42.16), o que sugere uma
duração de vida de quase 200 anos (Abraão viveu 175 anos);
(2)
suas riquezas eram calculadas em termos de gado (1.3; 42.12);
(3)
sua atividade como sacerdote da família, idêntica à de Abraão, Isaque e Jacó
(1.5); (4) a família patriarcal como unidade social básica, semelhante aos dias
de Abraão (1.4,5, 13);
(5)
as incursões dos sabeus (1.15) e dos caldeus (1.17), que se encaixam na era
abraâmica;
(6)
o uso freqüente (trinta e uma vezes) do nome patriarcal comum de Deus, Shaddai
(“O Onipotente”), e
(7)
a ausência de referência a fatos da história israelita ou à lei mosaica também
sugere uma era pré-mosaica (i.e., antes de 1500 a.C.).
Há
três diferentes pontos de vista sobre a data da escrita deste livro.
Talvez
tenha sido escrito:
(1)
durante a era patriarcal (c. 2000 a.C.), pouco depois da ocorrência dos eventos
citados, e talvez pelo próprio Jó;
(2)
durante o reinado de Salomão ou pouco depois (c. 950—900 a.C.), pelo fato de o
estilo literário do livro assemelhar-se ao da literatura sapiencial daquele
período; ou
(3) durante o exílio de Judá (c. 586—538
a.C.), quando, então, o povo de Deus procurava entender teologicamente o
significado da sua calamidade (cf. Sl 137). Se não foi o próprio Jó, o escritor
deve ter obtido informações detalhadas, escritas ou orais, oriundas daqueles
dias, as quais ele utilizou sob o impulso da inspiração divina para escrever o
livro na feição em que o temos. Certas partes do livro vieram evidentemente da
revelação direta de Deus (e.g. 1.6—2.10).
Propósito
O livro de Jó lida com a pergunta dos séculos: “Se
Deus é justo e amoroso, por que permite que um homem realmente justo, tal como
Jó (1.1, 8) sofra tanto?” Sobre esse assunto o livro revela as seguintes
verdades: (1) Satanás, como adversário de Deus, teve permissão para provar a
autenticidade da fé de um homem justo, por meio da aflição, mas a graça de Deus
triunfou sobre o sofrimento, porque Jó permaneceu firme e constante na fé,
mesmo quando parecia não haver qualquer proveito em permanecer fiel a Deus. (2)
Deus lida com situações demais elevadas para a plena compreensão da mente
humana (37.5). Nesses casos, não vemos as coisas com a amplitude que Deus vê e
precisamos da sua graciosa auto-revelação (38—41). (3) A verdadeira base da fé
acha-se, não nas bênçãos de Deus, nem em circunstâncias pessoais, nem em teses
formuladas pelo intelecto, mas na revelação do próprio Deus. (4) Deus, às
vezes, permite que Satanás prove os justos mediante contratempos, a fim de
purificar a sua fé e vida, assim como o ouro é refinado pelo fogo (23.10; cf. 1
Pe 1.6,7). Tal provação resulta numa maior integridade espiritual e humildade
do seu povo (42.1-10). (5) Embora os métodos de Deus agir, às vezes, pareçam
contraditórios e cruéis (conforme o próprio Jó pensava), ver-se-á, no fim, que
Ele é plenamente compassivo e misericordioso (42.7-17; cf. Tg 5.11).
Visão Panorâmica
Há cinco divisões distintas no livro de Jó: (1) o
prólogo (1—2), que descreve a calamidade de Jó e a causa subjacente disso; (2)
três ciclos de diálogo entre Jó e os seus três amigos, nos quais estes buscam,
na mente humana, respostas para o sofrimento de Jó (3—31); (3) quatro monólogos
de Eliú, um homem de menos idade que Jó e seus três amigos. Estes monólogos
contêm certo vislumbre de compreensão do significado (mas não a causa) do
sofrimento de Jó (32—37); (4) o próprio Deus, que fala a Jó da sua ignorância e
das suas queixas e ouve a resposta de Jó à sua revelação (38.1—42.6); (5) o
epílogo (42.7-17), com a restauração de Jó. O livro de Jó está escrito em forma
poética, com exceção do prólogo, do trecho 32.1-6a, e do epílogo. No cap. 1,
temos Jó como um homem justo e temente a Deus (1.1, 8) e o mais importante de
todos do Oriente (1.3). Repentinamente, uma série de grandes calamidades
destruiu seus bens, seus filhos e sua saúde (1.13-22; 2.7-10). Jó ficou
totalmente desorientado, sem saber que estava envolvido a fundo num conflito
entre Deus e Satanás (1.6-12; 2.1-6).
Os três amigos de Jó — Elifaz, Bildade e
Zofar — chegaram para consolar Jó, mas, em vez
disso, passaram a debater com ele sobre o porquê dos seus infortúnios.
Insistiam que, pelo fato de Deus ser justo, os sofrimentos de Jó evidentemente
eram castigos por seus pecados ocultos, e que o seu único recurso era o
arrependimento. Jó rejeitou essas respostas preconcebidas, afirmou a sua
inocência e confessou sua incapacidade de compreender sua situação (3—31). Eliú
apresentou outra perspectiva, a saber, que o sofrimento de Jó tinha a ver com o
propósito divino de purificar Jó ainda mais (32—37).Finalmente, todos se
calaram, inclusive Jó, enquanto o próprio Deus falou com ele da sua sabedoria e
poder como Criador. Jó confessou, arrependido e humilhado, sua ignorância e
pequenez (38—41). Quando Jó arrependeu-se de estar argumentando com o
Todo-poderoso, (42.5,6) e orou por seus amigos que o tinham magoado
profundamente (42.8-10), foi liberto da sua prova de fogo e duplamente
restaurado (42.10). Além disso, Jó foi vindicado quando Deus declarou que o
patriarca tinha falado a respeito dEle “o que era reto” (42.7). Os dias
subseqüentes de Jó foram mais abençoados do que os anteriores à sua aflição
(42.12-17).
Características Especiais
Sete características principais assinalam o livro de
Jó.
(1) Jó, um habitante do norte da Arábia, foi um
não-israelita justo e temente a Deus, que talvez tenha existido antes da
família de Israel, e do seu concerto com Deus (1.1).
(2) Este livro é o mais profundo que existe sobre o
mistério do sofrimento do justo.
(3) Revela uma dinâmica importante, presente em toda
prova severa dos santos: enquanto Satanás procura destruir a fé dos santos,
Deus está operando para depurá-la e aprofundá-la. A perseverança de Jó na sua
fé permitiu que o propósito de Deus prevalecesse sobre a expectativa de
Satanás (cf. Tg 5.11).
(4) O livro é de valor inestimável pela revelação
bíblica que contém sobre assuntos-chaves tais como: Deus, a raça humana, a
criação de Satanás, o pecado, o sofrimento, a justiça, o arrependimento e a fé.
(5) Boa parte do livro ocupa-se da avaliação
teológica errônea que os amigos de Jó fizeram do sofrimento deste. A repetição
freqüente desta avaliação errônea no livro talvez indique tratar-se de um erro
comum entre o povo de Deus; erro este que exige correção.
(6) O papel de Satanás como “adversário” dos
justos, o livro de Jó o demonstra mais do que em qualquer outro livro do AT.
Entre as dezenove referências nominais a Satanás no AT, quatorze ocorrem em Jó.
(7) Jó demonstra com toda clareza o princípio
bíblico de que os crentes são transformados pela revelação, e não pela
informação (42.5,6).
O Livro de Jó e Seu Cumprimento no NT
O Redentor a quem Jó confessa (19.25-27), o Mediador
por quem ele anseia (9.32,33) e as respostas às suas perguntas e necessidades
mais profundas, todos têm em Jesus Cristo o seu cumprimento. Jesus
identificou-se inteiramente com o sofrimento humano (cf. Hb 4.15,16; 5.8), ao
ser enviado pelo Pai como Redentor, mediador, sabedoria, cura, luz e vida. A
profecia da parte do Espírito sobre a vinda de Cristo, temo-la mais claramente
em 19.25-27. Menção explícita de Jó, temos duas vezes no NT: (1) Uma citação
(5.13, em 1 Co 3.19) e (2) uma referência à perseverança de Jó na aflição e o resultado
misericordioso da maneira de Deus lidar com ele (Tg 5.11). Jó ilustra muito bem
a verdade neotestamentária de que quando o crente experimenta perseguição ou
algum outro severo sofrimento, deve perseverar firme na fé e continuar a
confiar naquele que julga corretamente, assim como fez o próprio Jesus quando
aqui sofreu (1 Pe 2.23). Jó 1.6—2.10 é o mais detalhado quadro do nosso
adversário, juntamente com 1 Pe 5.8,9.
TEXTO
EXTRAÍDO : R. Laird Harris
Doutor em Filosofia e Letras
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