segunda-feira, 9 de dezembro de 2019

Lição 11: As Consequências do Pecado de Davi




I.             DEFINIÇÃO DE PECADO NO ANTIGO E NO NOVO TESTAMENTO

No Antigo Testamento Von Rad 58 está certo quando afirma que Israel tinha diversos termos para a palavra pecado, mas apenas analisar etimologicamente seu sentido ou buscar uma definição por meio de um vocábulo não disseca sua essência. Quem assim procede pode correr o risco de aplicá-las fora do seu devido contexto, conforme descrevem as Escrituras.

Nessa mesma linha de pensamento andou G. Ernest. 59 Segundo ele, não se pode buscar a natureza do pecado simplesmente por meio de um aspecto etimológico, pois isso não ajuda em quase nada. Ele pontua que há semelhança no uso da palavra pecado no Egito, Babilônia e Grécia. Assim, na sua concepção, o melhor é estudar a palavra pecado ainda que buscando seu sentido pelo vocabulário, dentro do contexto da fé.

Na definição da palavra pecado, usando o vocábulo hata, fala de alguém que erra o alvo; é como alguém que atira uma pedra e erra seu ponto almejado (Jz 20.16). Pode ser aplicada no caso de alguém que segue uma viagem, mas que erra o caminho (Pv 19.2).

Outra palavra que descreve o pecado no sentido de perverter ou tornar mau é o vocábulo hebraico awôn (1 Sm 20.21). Pode-se entender que, somente pelo uso desses dois vocábulos, o pecado é algo que leva alguém a andar errado, perverso; ele jamais ajuda uma pessoa a alcançar o alvo certo, a se conduzir corretamente, pois é tortuoso, irregular, nunca segue um padrão de normalidade, verdade, santidade, justiça, retidão. O pecado é sempre sujo, imoral, não busca a pureza divina, o que é correto; por isso que separa o homem de Deus (Rm 3.23). Vale dizer que, nas páginas do Antigo Testamento, o pecado é descrito quase por inteiro como pessoal. Quem o pratica o faz conscientemente e por sua própria decisão, isso porque o homem é um ser livre para fazer suas escolhas, decisões, ao contrário dos animais irracionais e das coisas; elas jamais podem pecar, pois não têm decisão sobre nada.

 Sendo livre e tendo capacidade para fazer a escolha entre o bem e o mal, o Antigo Testamento fala de pecados cometidos pelo povo de Deus, tanto de modo coletivo como individual, lembrando que, por meio da nação ou pessoal, cada um seria responsável pelo seu próprio pecado (Dt 9.6-24; Sl 106.6-39; Is 59.1-8; Jr 2.4-28; Ez 16.14-58; Am 2.6,8; Mq 2.1,2). O importante é entender que, segundo o Antigo Testamento, estão estampadas em suas páginas as ênfases proféticas contra Israel por causa de suas experiências com o pecado, evidenciando assim procedimento torto para com Deus, como também a falta de retidão. Esses profetas dissecaram não somente a raiz de uma palavra para falar do pecado e seus males, mas usaram figuras de linguagem corriqueiras com o propósito de mostrar o tanto que o pecado suja a pessoa que o pratica.

 O profeta Jeremias falou da sujeira do povo de Deus, esclarecendo que ele estava sujo e precisava ser limpo, assim como faziam as lavadeiras (Jr 2.22). O profeta Isaías, falando do pecado do povo de Deus, afirmou que, por causa de sua prática, todos estavam doentes (Is 1.5,6). Na linguagem pastoril, uma ovelha que saísse do rebanho, considerada como desgarrada, era sinal de pecado (Jr 23.3). O agricultor descrevia o pecado como um trigo repleto de palhas que precisava ser peneirado (Am 9.9).

Em se tratando de ouro, prata, minas, os objetos que precisavam passar por um refinamento eram comparados à vida daqueles que eram impuros, pecadores e precisavam de purificação (Ez 22.18.19). Para o construtor, quem praticasse ou vivesse no pecado seria comparado a uma parede torta (Am 7.8). Na linguagem da dona de casa, o pecado era comparado a um chão sujo (Is 14.23). Na visão do oleiro, quem cometia pecado era como um vaso com barro e pedras (Jr 18.1-4). Note que em todo o Antigo Testamento o pecado é visto como algum ruim, sujo, feio, por isso é que Deus não ama o pecado, apenas o pecador; dele todos nós precisamos fugir, buscando a purificação por meio da fé em Cristo Jesus, o Filho de Deus, o qual tem poder para perdoar os nossos pecados.

No Novo Testamento

A ideia neotestamentária para pecado é hamartia. Trata-se de errar o alvo, por isso se chega ao fracasso, não alcançando o padrão estabelecido. Fora do seu sentido original, a palavra pecado alcançou sua universalidade e, nesse particular, ela é descrita categoricamente como princípio.

 Entende-se, à luz do Novo Testamento, que o pecado em si é um ato, mas também uma condição, ou seja, o que se pode fazer, praticar e, como condição, trata-se do estado em que a pessoa se encontra quando o comete. Ao lermos Romanos 3.23, o homem está na condição de pecador porque primeiramente o praticou, fez um ato.

João descreve o pecado como sendo um desvio desregrado da verdade que se conhece, de não proceder moralmente segundo a retidão exigida por Deus (1 Jo 3.4), assim ele salienta a condição humana sem a regeneração e tais práticas resultam de atos pecaminosos (Mt 15.19).

 Nas páginas do Novo Testamento, está claro que o pecado faz o homem errar de direção, dos ideais divinos, pois se afasta daquilo que foi proposto por Deus, dos seus projetos, intentos benéficos. Fora do padrão estabelecido por Deus, o homem caminha a esmo e, desse modo, vive impiamente, o que pode ocasionar sérias consequências para sua vida, pois não corresponde ao ideal divino (2 Pe 2.6), que está contido em Jesus Cristo, o Filho de Deus, o qual deseja que sejamos semelhantes a Ele (Rm 8.29).

Vivendo fora do modelo estabelecido por Deus, então o homem pratica os seguintes atos: (1) Asebeia – Impiedade (2 Pe 2.6); (2) Parabasis – Transgressão contra os princípios divinos (Mt 6.14; Tg 2.11); e (3) quebra da lei, distanciamento da lei moral (At 23.3; 2 Pe 2.16).

Resumidamente, o Novo Testamento traça o pecado em diversas linhas de pensamento e modo, mas, em todas as suas definições, ele é apresentado negativamente, e que a cura para esse inimigo cruel é somente Jesus Cristo. Através do sacrifício feito por Jesus Cristo na cruz do Calvário, aquele que crê pode ser uma nova criatura.

II.           A REPREENSÃO DO PROFETA NATÃ AO REI DAVI

Uma Consciência Morta O apóstolo Paulo falou daqueles que têm consciência cauterizada (1 Tm 4.2), do grego kauteriazo, quer dizer “marcar com ferro em brasa”. Seu aspecto figurativo fala de vidas insensíveis, as quais foram marcadas pelo pecado e já não há mais incômodo algum com aquelas marcas provocadas pelo fogo. O cristão que está com sua consciência cauterizada pelo pecado não reage mais e vê tudo com naturalidade.

Davi estava com sua consciência morta, adormecida. Há um ano escondia seu duplo pecado, assim, para atiçar outra vez essa consciência morta, foi necessário que o profeta Natã fosse até ele e, por meio de uma parábola, provocasse nele um sentimento de reação. O profeta falou de um rico proprietário que possuía muitas ovelhas e vacas, mas injustamente apropriou-se da ovelhinha do homem pobre, a qual ele havia criado com tanto amor para fazer um guisado a um viajante. Diante da parábola dita por Natã, o rei evidenciou seu sentimento de raiva querendo condenar logo aquele que havia cometido tamanha injustiça, crime.

Observe que Davi, com sua consciência morta, viu um grande crime em um ato praticado por alguém, enquanto ele não atentava para o seu duplo pecado, que era muito mais horrível. Quem tem consciência morta não vê o tamanho do seu pecado, mas procura seguir sempre na mentira, engano, para que ninguém tome conhecimento dos seus procedimentos sujos. Observe que o próprio Davi com suas palavras diz ao profeta que o tal homem é digno de morte, ou melhor, filho da morte; fala que deveria, pela ovelhinha, restituí-la quatro vezes mais, conforme as exigências da lei (Êx 22.1). Nesse sentido ele iria fazer de tudo para que a justiça fosse feita completamente. Acredita-se que por meio dessa interpretação estaria até mesmo ultrapassando a lei.

 Hoje se precisa de homens como o profeta Natã, ungidos pelo poder do Espírito Santo com voz profética para despertar as vidas e consciências mortas que estão dentro de nossas igrejas, pregando a verdadeira mensagem divina para produzir arrependimento e vida, como Deus falou Ezequiel (Ez 37.4-9).

Mostrando a Gravidade do seu Pecado

 Um verdadeiro homem de Deus respeita as pessoas, mas, quando necessário, as repreende. Natã amava e honrava a Davi como rei, mas seu compromisso era primeiramente com Deus e sua Palavra, por isso teve que ir ao rei e denunciar energicamente seus pecados, suas transgressões, sua sujeira. Pode-se notar a tônica do profeta: “Tu és este homem”. Não há rodeio. Ele vai direto ao ponto e fala do duplo pecado do rei: adultério e homicídio. Davi quebrou a lei divina e assim deveria pagar seriamente por tudo isso, porque quebrou o princípio estabelecido, o qual conhecia muito bem: “Não adulterarás” (Êx 20.14). Davi estava com o coração endurecido, mas agora fora iluminado pela parábola de Natã.

 O cristão deve evitar o pecado a todo custo, pois seus resultados são sempre maléficos; primeiro ele afasta o homem de Deus e, segundo, seus efeitos são sentidos constantemente. Uma pessoa que comete pecado pode têlos todos perdoados por meio da fé no sacrifício de Jesus Cristo (2 Co 5.17; 1 Jo 1.9), todavia, ainda que perdoado, seus efeitos são vistos.

Ainda hoje a humanidade sofre por causa do pecado cometido por Adão e Eva. Quantos cristãos que tinham uma vida bonita, limpa, mas que trilharam o caminho do adultério, da mentira, do roubo, manchando páginas lindas do seu viver. Mesmo perdoado, sente ainda seus efeitos destruidores. Por isso é sempre bom atentar para o conselho bíblico de andarmos no Espírito para não sucumbirmos aos desejos da carne (Gl 5.16).

 Traindo a Generosidade Divina

Além de mostrar o tamanho do pecado de Davi, o profeta Natã destaca que ele não fez caso da bondade divina, de tudo quanto o Senhor tinha feito por ele, ou melhor, agido em seu favor. Foi por ordem divina que Davi foi ungido rei na presença dos seus irmãos. Deus fez assim para que ele pudesse ocupar a posição de rei (1 Sm 16.1,12,13). Durante as perseguições envidadas por Saul, sempre Deus o livrou dos seus sutis planos, inclusive da morte. Fora isso, concedeu a Davi a capacidade para vencer as crises emocionais.

O profeta lembra que Davi tinha muitas mulheres e acredita que ele tenha ficado com o harém de Saul, pois era assim que acontecia quando um rei sucedia outro (2 Sm 16.21,22; 1 Rs 12.17,25). Mesmo tendo muitas mulheres, Davi não se contentou. Queria mais e mais. Diante de tudo isso, ainda o profeta diz que se tudo isso era pouco aos seus olhos, Deus lhe acrescentaria mais, todavia, a mulher de Urias não, pois era casada. Davi não soube louvar, agradecer a Deus por sua generosidade divina, pela potencialidade que se tornou, pelas riquezas que alcançou, por tamanha bondade em sua vida, mas desprezou a Palavra de Deus, tomando para si uma coisa que não poderia ser sua. Ainda assim, mandou matar um de seus melhores soldados (2 Sm 23.18-24).

É triste ver um homem como Davi, abençoado em tudo por Deus, conhecedor dos seus mandamentos, não andar nem viver conforme a iluminação que tinha da parte dEle, mas que se sujou no pecado depravadamente. Jamais devemos proceder como Davi, esquecendo da generosidade divina. É sempre importante termos em mente o que disse o salmista, para não nos esquecermos de nenhum dos benefícios divinos (Sl 103.2).

III.         AS CONSEQUÊNCIAS DO PECADO DE DAVI

O Resultado dos Pecados Cometidos Davi não cumpriu com os mandamentos da lei de Deus. Ele deveria ser morto, mas o texto diz que foi perdoado por Deus, ou seja, poupado da execução. É claro, pela ótica humana, ele deveria morrer. A não execução de Davi, conforme salientam alguns estudiosos, se deu porque ele ainda teria que cumprir parte da missão para a qual fora enviado. Ele teria mais valor para Deus estando vivo do que morto.

 Observe que Davi faz uso da espada dos filhos de Amom para matar Urias e, desse modo, a espada não sairia de sua casa. Nesse sentido, diga-se de passagem, é como Jesus disse: “[...] todos os que lançarem mão da espada à espada morrerão” (Mt 26.52). Lendo o capítulo 12.10 de 2 Samuel, é dito que a espada não se afastaria da casa de Davi, ou seja, o que ele havia plantado agora iria colher (Gl 6.7). O perdão de Davi por parte de Deus não o isentava dos grandes males que iria sofrer. A violência iria atingir sua casa, tanto dos de dentro como de inimigos de fora. Podemos ver pelos relatos bíblicos que isso de fato aconteceu tristemente e logo, como a morte do filho com BateSeba.

É interessante atentar para um detalhe: não era comum um monarca ter tanta ternura, amor, compaixão por uma criança vinda do harém, o que revela a ternura do coração de Davi; mesmo assim a criança morre e, nos versículos 20-23, ele entrega tudo nas mãos de Deus. Depois segue o assassinato de Amnom (2 Sm 13.15), a morte de Absalão (2 Sm 18.14) e a execução de Adonias (1 Rs 2.25). Suas concubinas foram publicamente tomadas por Absalão e possuídas perante os olhos de todo o Israel (2 Sm 16.22). A falta de caráter de Davi iria refletir nos seus filhos, por isso é que se fala que o mal estaria em sua casa.

Doravante, Davi e sua casa iriam passar por duros sofrimentos, diversos ais, claro, por causa da lei da semeadura. Da casa de Davi, conforme Natã, iria se levantar uma rebelião, promovida por Absalão, que iria possuir suas concubinas em pleno meio-dia. Enquanto Davi fez em secreto com BateSeba, agora tudo seria em público. Davi iria pagar caro com todos esses sofrimentos por não valorizar o acúmulo de bênçãos que lhe foram dadas por Deus.

O Governo divino em mãos humana 
                         - Osiel Gomes

                                   



II SAMUEL 11.9-11 5.
A mulher concebeu', segundo o ponto de vista do narrador, que tem em mente Davi o tempo todo, Bate-Seba não é citada pelo nome.Para Davi, ela fora apenas “ a mulher”, em vez de uma pessoa; além disso, não se menciona em momento algum a agonia da incerteza que ela passou, principalmente porque estava envolvido um filho do rei.Agora, era a vez de Davi ficar perturbado. 6-8. Para Davi, uma dissimulação parece ser o caminho óbvio, de modo que ele manda chamar Urias, o hetew, o leitor observa que ele não é membro da comunidade da aliança de Israel. Que espécie de pes­soa irá se revelar? Ele é recebido na corte, perguntam-lhe sobre o bem-estar (salôm) de Joabe e a respeito do exército e da guerra; contudo,como observa Fokkelman, “ a resposta de Urias não é incluída na nar­rativa — uma omissão importante, simbolizando que Davi simples­mente o deixa falar, sem prestar nenhuma atenção ao relato que ele apresenta” .
1 Como contraste, o narrador emprega o discurso direto para aquilo que realmente interessa a Davi (v. 8). Um presente real destina-se a incentivar Urias a se considerar especialmente favorecido e, então, descontrair-se e aproveitar a oportunidade para ir para casa e ficar com a esposa.
9-11. Porém Urias se deitou à porta da casa real... e não desceu para sua casa, decidindo, em lugar disso, permanecer com todos os servos do seu senhor. Por três vezes destaca-se que Urias não foi para casa, pois, a despeito do que o rei dissera, ele sabia qual era seu dever,o qual não incluía licença. Davi esperava que Urias demonstrasse ser como ele; ao contrário, porém, ele se revelou um homem de integri­dade, cuja lealdade era antes de mais nada para com os interesses do rei e não para com sua própria satisfação. Arriscando-se a levantar sus­peita em Urias, Davi pergunta por que ele não tinha ido para casa, e ele responde: A arca, Israel e Judá ficam em tendas... Surpreendente­mente, antes de qualquer outra coisa, esse heteu menciona o símbolo da aliança como tendo influenciado seu comportamento. Ele também tem consciência de sua solidariedade com os soldados na frente debatalha, sobre os quais não deseja levar vantagem. Essas duas consi­1. Fokkelman 1981, p. 53. 263

I I SAMUEL II. 12-13
derações aplicavam-se ainda mais ao rei, que tinha a responsabilidade final pela guerra e dera tanta ênfase à lealdade da aliança; agora,porém, um estrangeiro está lhe mostrando que ele é de uma negligên­cia desprezível. 12-13. Davi permanece demasiadamente ocupado com seu problema para se preocupar com as questões morais. Ele tem mais um estratagema em mente: irá divertir Urias, e existe uma boa chance deque, quando Urias tiver se banqueteado e bebido à mesa do rei, seu firme propósito enfraqueça e ele vá para casa ter relações com sua mulher. Mas não; outra vez ele passa a noite com os servos de seu se­nhor, ainda fiel a seu soberano ( ’ãdôn) e a seu sublime propósito. O preço de tal lealdade demonstrará ser muito alto: ele insiste no que é certo e perde a vida.
 14-17. Davi escreveu uma carta a Joabe e fez Urias levar sua própria sentença de morte. Tudo era parte da tentativa de Davi de se proteger da revelação da verdade; no entanto, ironicamente, o inci­dente tomou-se um dos mais conhecidos nas Escrituras. Cita-se apenas a informação essencial da carta: Davi passa para as mãos de Joabe o assassinato de um homem inocente. Isso coloca Joabe na posição nada invejável de conflito entre a lealdade ao rei e a lealdade à sua própria consciência. Mesmo sua competência profissional como general é colocada em risco pela necessidade de ir contra seu próprio julgamento devido ao que o rei ordena. No incidente, houve considerável perda devidas, incluindo alguns do povo, dos servos de Davi, e Urias.
18-21. O mensageiro enviado até o rei leva um registro oral do combate, e o cumprimento de sua tarefa é registrado nos versículos 22­24, mas “as preocupações de Joabe acerca do relato (vv. 19-21) rece­bem muito mais atenção, chegando até a ocupar lugar central” .1Fundamental para seu argumento era algo que o mensageiro não pre­cisava dizer, mas que Joabe considerava de grande importância: Quem feriu a Abimeleque, filho de Jerubesete? A referência é a Juizes 9.50­57, segundo o qual, no cerco de Tebes, Abimeleque chegou tão perto 1. Fokkelman 1981, p. 61, onde um a apresentação em forma de diagrama dos versículos de 14 a 25 mostra o hábil emprego de uma estrutura quiástica, um padrão concêntrico. 264

II SAMUEL 12.5-6
sua audiência com o rei, esboçando um caso hipotético que poderia muito bem ter ocorrido num dos tribunais locais. Não há nada que in­dique tratar-se de uma parábola, e Davi, o juiz supremo, que poderia se manifestar em casos difíceis, prestou atenção aos detalhes esboçados pelo profeta em 61 palavras cuidadosamente escolhidas. O caso diz respeito a dois homens, um rico, outro pobre. Mesmo tão poucas informações despertam o interesse; as desigualdades da vida sempre estão conosco.
2-3. Os bens do rico colocam-se em contraste gritante com a cousa nenhuma do pobre; suas ovelhas e gado em grande número,com uma cordeirinha; o crescimento natural do rebanho, com a neces­sidade que o pobre teve de comprar seu único e precioso bem. Agora,vemos o pobre de maneira tal que podemos conhecê-lo. Ele cria com todo cuidado a cordeira que comprou, tratando-a como se fosse um membro da família, mimando-a como a uma filha querida. Os dois se tomam inseparáveis.
 4. Um visitante chega para ver o rico, mas este, em vez de usa seu próprio rebanho para recepcionar o hóspede, toma a ovelha de esti­mação do pobre e passa a prepará-la como o prato principal de seu banquete. Agora também conhecemos o rico em toda sua avareza e in­sensibilidade.
 5-6. Davi envolve-se com os dois homens de Natã; ele consegue perceber exatamente como são, reagindo com justa ira e com uma veemência que talvez tenha surpreendido a si mesmo: Tão certo como vive o Senhor, o homem... deve ser morto. O juramento era desne­cessário, mas é sinal de um intenso envolvimento. Davi sentencia o rico à morte. Mas por quê? Ele não cometeu assassinato. Davi procura se ocupar com a realidade externa, o rico e sua má ação, mas, na realidade, está envolvido consigo mesmo e pro­cura dessa maneira restabelecer seus sentimentos de bem-estar... Com este objetivo, Natã oferece a Davi uma tela de projeção, e este, de fato, projeta-se veementemente. Ele pretende dar o vere­ dicto acerca de outro, mas o que acontece é que dá o veredicto so­ bre si mesmo.11. Fokkelman 1981, p. 77. 267

II SAMUEL 12.7-12
Davi tenta se livrar de sua consciência culpada ao sentenciar outra pessoa, enquanto inconscientemente sentencia a si próprio. Só depois ele menciona a restituição quadruplicada para compensar a perda do pobre, explicando a lógica por trás de seu veredicto: o rico fez tal cousa e, portanto, deve ser considerado responsável; sua disposição mental também foi repreensível: ele não se compadeceu. Aqui, na reação de Davi, encontramos uma prova, se houvesse necessidade de alguma, de que a humanidade é dotada de um aguçado senso de justiça que opera com eficiência, contanto que o indivíduo que profere a sen­tença não esteja pessoalmente envolvido. Ao mesmo tempo, a cons­ciência do indivíduo que profere a sentença revela sua culpa (ou ino­cência) ao observador atento.
7-12. Com habilidade, Natã apresentou seu caso e conseguiu uma abertura que lhe permite transmitir tudo o que deve dizer sem perda de tempo ou de palavras: Tu és o homem. Davi condenou a si mesmo e,de repente, tem de encarar seu próprio veredicto, dado acerca de outro,mas agora aplicado infalivelmente a si mesmo. Não poderia haver exemplo mais instrutivo do poder da parábola como ferramenta no aconselhamento. Todas as defesas de Davi foram destruídas com um só golpe, e ali está ele, despido perante seu juiz. Natã veio apresentar o juízo de Deus e, por isso, não ousa suavi­zar o impacto de suas palavras. Na verdade, ele fala na primeira pessoa as exatas palavras do próprio Deus. E um momento terrível tanto para o profeta quanto para o rei. Mas o caminho foi aberto pelo apelo da parábola à consciência do rei, a qual demonstrou estar em ordem,dando sentença de morte ao rei. Agora, Davi tem de deixar que a palavra do Senhor faça-lhe um exame profundo para trazer à luz o lado oculto e obscuro de sua personalidade, de forma que Davi o admita. Primeiramente, Davi tem de considerar tudo o que recebeu das mãos de Deus: Eu te ungi... e eu te livrei... dei-te. Ele teve a riqueza de experimentar o favor do Senhor desde a juventude, quando foi ungido por Samuel, quando foi livrado da morte nas mãos de Saul e quando herdou o reino e as mulheres de teu senhor. Evidentemente, o costume era de que o harém do monarca morto seria herdado pelo sucessor, e,de acordo com essa regra, Davi já havia ampliado sua família. De maneira alguma ele poderia reclamar, dizendo que saíra perdendo; ele 268

II SAMUEL! 2.7-12
era o rico. Além disso, caso tivesse pedido mais, teria obtido mais, tala extensão da generosidade do Senhor para com ele. Apesar de tudo isso, Davi fez o que era mal perante ele,desprezando assim a palavra do Senhor e Sua autoridade. Davi sabia o que tinha acontecido com Saul quando este rejeitou a palavra do Se­nhor (1 Sm 15.23); agora, ele próprio estava sob julgamento. A Urias, o heteu, feriste à espada-, embora Davi tivesse planejado essa morte à distância, ele era tão culpado de assassinato quanto se tivesse atravessado o homem com sua própria espada. Como poderia escapar da pena de morte? Embora, pela lei da terra, talvez não fosse julgado culpado, ele não tinha base alguma para apelar diante do juiz divino, que passou a revelar o adultério que motivou o assassinato. O castigo que o Senhor aplicará está exatamente à altura dos crimes cometidos. Não se apartará a espada jamais da tua casa indica que a dinastia de Davi, ao contrário daquela de Saul, vai permanecer,mas essa boa notícia é modificada pelo castigo contínuo de guerras prolongadas e de derramamento de sangue. Nisso, a nação toda está envolvida, e gerações vindouras se recordarão do pecado de Davi, en­quanto lutam em guerras sem fim. Além disso, da tua própria casa suscitarei o mal sobre ti; no que diz respeito a suas esposas, ele as per­derá para outro homem. O Senhor diz: ... tomarei tuas mulheres, assim como Davi tomou Bate-Seba (2 Sm 11.14); contudo, enquanto Davi tinha agido secretamente, desta vez todo o Israel testemunhará a re­tribuição do Senhor, pois é necessário que se veja que a justiça foi feita e a lei do Senhor foi mantida. “Da perspectiva de Natã, a questão é clara. Foi Javé quem deu o reino. Javé, por sua vez, não deixará que o ato de violenta espoliação praticado pelo rei não traga consequências para seu reino.” 1 A narrativa que segue mostrará como essas con­seqüências ocorreram durante a vida de Davi, fazendo com que tragédia e perdas assinalassem os últimos anos de seu reinado, atin­gindo não somente a ele. A repreensão de Natã, falada em nome do Senhor, dá a impressão de que o próprio Senhor agirá diretamente para castigar Davi; a operação desse castigo inclui as tramas interligadas de1. Gunn 1982, p. 97. 269

II SAMUEL 12.13-15
A diferentes membros da família de Davi, motivadas pelos mesmos pe­cados que desgraçaram seu pai e pelo desejo de prestígio e poder. A ação da providência divina, declarada ao longo das Escrituras, é vista em todo seu mistério, porque se realiza por meio de atos voluntários dos participantes humanos nesse drama. 13-15a. O rei responde pela segunda vez ao profeta, agora comum veredicto sobre si mesmo, intimamente ligado ao veredicto que deu sobre o rico (vv. 5, 6), mas esta segunda sentença é muito mais difícil de expressar do que a outra. Agora, Davi assume plena res­ponsabilidade e encara o fato de que não há desculpa, tendo incorrido em pena de morte. Embora seja rei, confessa a culpa diante do profeta que, a despeito de ser porta-voz de Deus, é de qualquer maneira um dos súditos de Davi. Tal humilhação é incrivelmente difícil de suportar e poderia ter sido considerada um suicídio político, mas o rei, conven­cido da integridade de Natã como profeta, rebaixou-se em confissão.Imediatamente, veio a surpreendente resposta: ... o Senhor te perdoou o teu pecado; não morrerás. Esse foi o momento decisivo na vida de Davi e a indicação mais clara de que ele era diferente de Saul no re­lacionamento mais essencial de todos, o de submissão ao Senhor Deus.Por isso, encontrou perdão, ao passo que Saul jamais aceitou a culpa e a rejeição que a acompanhava. O salmo 32, tradicionalmente aceito como expressão dos pensamentos de Davi nesta ocasião, transborda a alegria de conhecer o perdão em lugar da culpa, a restauração da comunhão após a dor da convicção do pecado. Em vez de morte, ele tem nova vida, por participar tão livremente da graça de Deus. Essa experiência transformadora não significa, contudo, que as sentenças que o Senhor anunciou mediante o profeta tenham sido anu­ladas. As conseqüências do “desprezo” (BLH) de Davi pelo Senhor ainda têm de ser enfrentadas; assim, há ainda outra conseqüência como sinal: ...o filho que te nasceu morrerá. Com isso, o profeta cumpriu sua missão; ele parte e a audiência termina. iv. A morte da criança (12.15Ò-23). Davi é uma pessoa surpreendente, tanto que os mais íntimos a ele na corte não compreendiam amaneira como sua mente funcionava. Ele sabia, pelo que Natã havia-lhe dito, que a criança que Bate-Seba tivera iria morrer, e nesse acon­tecimento a justiça ficaria clara para todos.            
Dessa maneira, Israel e os observadores fora de Israel iriam notar o fato de que o Senhor realmente era um Deus de justiça, que avaliava as ações. Davi, porém, de volta à comunhão com o Senhor, estava extremamente consciente da bondade amorosa do Senhor em lhe conceder perdão e restabelecê-lo, apesar de seu passado de culpa, como o rei da aliança de Israel. Isso lhe permitiu buscar o Senhor novamente em oração, e, assim, quis explorar ao máximo a possibilidade de, em resposta à sua súplica, o Senhor lhe conceder a vida da criança. 15b. Este é um caso em que as Escrituras associam uma enfermidade com o pecado de um dos pais (cf. Jo 9.2), mas, como aconteceu no caso do homem que nasceu cego, o propósito era a glória de Deus. O escritor bíblico não hesita em atribuir diretamente ao Senhor a doença da criança, de conformidade com a palavra do profeta Não há nada de superficial nesta oração de Davi. Seu amor pela criança, cujo nome nem mesmo é mencionado, é tão grande que ele jejua por uma semana e fica sem dormir para se dedicar à oração. Esse homem emotivo compreendia o significado da palavra amor à luz do amor de Deus para com ele, e desejava ardentemente que a criança fosse poupada. Quando ela morre, pois sua oração recebe uma resposta negativa, ninguém tem coragem de lhe dar a notícia, por recear sua reação, mas eles tinham interpretado mal a mente do rei Assim que descobriu que a criança havia morrido, Davi, em vez de ficar pranteando, retomou sua vida rotineira, à qual seus servos haviam inutilmente tentado levá-lo durante a semana anterior. Ele até mesmo entrou na casa do Senhor, e adorou na tenda onde a arca de Deus fora instalada (2 Sm 6.17). Isso prova que Davi havia aceitado o julgamento da parte do Senhor, apesar da semana passada em agonia, quando, por assim dizer, havia antecipadamente dado vazão à sua grande dor. Agora que ocorreu a morte, ele é capaz de romper as convenções, chegando ao ponto de adorar o Deus que levou a criança. Feito isso, ele interrompe o jejum e pede comida Os servos precisavam de uma explicação para um comportamento tão confuso. A resposta de Davi tem permitido que cada nova geração de leitores aprecie a lógica de seu raciocínio. Quem sabe se o Senhor se compadecerá de mim...? mostra a convicção de Davi de que ele estava em contato com o Deus que trata Seus filhos como indivíduos e corresponde-lhes à fé. Assim, enquanto ouve a palavra do Senhor por intermédio de Natã (v. 14), não a aceita com fatalismo, mas, sim, da maneira como uma criança recebe a declaração feita por um dos pais, o qual às vezes muda de idéia sobre um castigo,caso a criança se comporte de forma aceitável. Davi compreendeu um elemento importante em profecias de julgamento, um aspecto expresso por nosso Senhor enquanto contemplava o julgamento que se aproximava de Jerusalém:...quantas vezes quis eu reunir teus filhos... e vós não o quisestes! (Lc 13.34).
O Senhor tem em mente bênçãos para aqueles que pedem, e Davi não as perderá por não ter pedido (Tg 4.2). Entretanto, agora que a criança morreu, a resposta é definitiva: Eu irei a ela, porém ela não voltará a mim. Davi se defronta com sua própria mortalidade e mesmo aí encontra esperança, pois antevê o momento em que voltará a se unir com seu filho. O Senhor que enviara Natã até Davi tinha dado a palavra final, e Davi, embora de luto, estava satisfeito. 

v. O nascimento de Salomão ( ). O nascimento de um segundo filho de Bate-Seba e Davi certamente faria lembrar a doença e a morte do primeiro. Este filho sobreviveria? O nome que seus pais lhe deram, Salomão, deriva da palavra hebraica sãlôm, paz, prosperidade, refletindo desse modo suas esperanças com esta nova vida. Natã vem trazer uma mensagem de ânimo, nitidamente expressa num segundo nome, Jedidias, amado pelo Senhor ; essa criancinha não iria morrer.1 Agora Davi sabia que de fato havia sido restaurado à comunhão com o Senhor, e, entre todos os seus muitos filhos, este se tornou especial. 1. O nome pode ser um título de legitimação real, indicando proteção divina e o amor duradouro de Javé. N. Wyatt, Jedidiah and Cognate Forms as a Title o f Royal Legitimation, Biblica 66 (1985),



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Apresentado pelo Comentarista das Revistas Lições Bíblicas
Adultos da CPAD, pastor Osiel Gomes.


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