segunda-feira, 4 de novembro de 2019

LIÇÃO 6- A Rebeldia de Saul e a rejeição de Deus




I. DEFINIÇÃO DE REBELDIA

No Aspecto Bíblico

O  Dicionário  Ilustrado da Bíblia define rebelião como “conduta ou
discurso incitando à revolta contra autoridade constituída ou outro
representante do governo legítimo” (Ed 4.15; Lc 23.19, sedição). O verbo
rebelar-se tem uma conotação hebraica, segundo Vine, própria e muito
forte, posto  que seu sentido é diversificado  em outros idiomas, tendo o
sentido de irar-se no aramaico; no árabe, quer dizer disputa e, no siríaco,
briga. Na sua essência, biblicamente falando, a rebeldia (marãh) trata-se de
uma oposição que alguém faz alicerçado no orgulho.


      No aspecto bíblico, a rebeldia pode ser praticada contra os líderes, os pais,
Deus e sua Palavra. Veja:

• Filho rebelde (Dt 21.18).
• Jerusalém rebelando-se contra Deus (Is 3.8).
• Homem de Deus rebelando-se contra Deus (1 Rs 13.26).
• Homem rebelando-se contra a Palavra do Senhor (1 Rs 13.21).
• Rebelião contra a Palavra do Senhor (Sl 107.11).

Os que praticam rebeldia buscam desafiar a Deus e a sua ordem (Lm 1.18),
razão pela qual sofrem as consequências divinas. Esse ato, conforme
supracitado, revela um coração não transformado ou regenerado, o que
pode por vezes evidenciar atitudes de insurreição, sedição.
O profeta Sofonias fala de uma cidade opressora porque era dominada pela
rebeldia (Sf 3.1,2).


Vivemos tempos em que as gerações são dominadas pelo sentimento de
rebeldia. O que prevalece nas universidades são pensamentos niilistas, que
atacam todo tipo de valores morais e cristãos, como também os poderes
estabelecidos, pois tal ensino originou-se em Nietzsche, que pregava a
independência humana e o realizar-se em si mesmo, não aceitando o
conformismo e a submissão. A rebeldia não é o procedimento correto
daquele que serve e teme a Deus. Isso porque, segundo nos revela a Palavra,
todos os que a praticaram tiveram um fim muito triste.
A nova geração de israelitas, que sobreviveram no deserto, foi alertada a não seguir
o modelo de seus pais, que se portaram rebeldemente (Sl 78.8; Jr 5.23);
assim, Paulo diz que o que foi escrito é para nossa advertência (Rm 15.4).
Rejeitemos terminantemente a rebeldia para podermos desfrutar das copiosas
bênçãos de Deus.


No Aspecto Psicológico


Somos cônscios de que a Psicologia busca analisar o comportamento
humano e sua interação com o ambiente físico e social. Nesse particular,
ela salienta a importância de cada pessoa ajustar-se a determinadas normas escritas
e a certos costumes estabelecidos por uma sociedade. Isso é necessário para que
as coisas funcionem bem.


Analisando introspectivamente o ser humano, muitos psicólogos pontuam
que cada ser vivente tem dentro do seu interior um lado rebelde, ou seja, que quer 
mudança. A rebeldia psicológica não é aquela que se propõe criar brigas, intrigas, 
desrespeito, quebra da hierarquia. Na verdade, ela é um sentimento interior que
não se conforma com certas normas estabelecidas, mas procura sair da zona de
conforto buscando um ajuste por meio de um caminho certo.


Destacamos positivamente uma rebeldia justa realizada por Martin Luther
King Jr. (1929–1968), Martinho Lutero (1483–1546), dentre outros. Ambos
rebelaram-se contra aquilo que estava errado. O primeiro pelos direitos dos
negros, de modo pacífico; já o segundo, querendo que a igreja voltasse aos
verdadeiros princípios exarados nas Sagradas Escrituras, e não apenas em
normas ditadas pela igreja.


A rebeldia psicológica não é aquele sentimento de ser contra tudo e contra
todos, de rejeitar o verdadeiro, a harmonia. Ela não é improdutiva. Na
verdade, ela surge quando algumas normas sociais são impostas
arbitrariamente; esse fogo é aceso no momento em que alguém se depara com
a quebra de valores justos, bons, verdadeiros.
Os psicólogos falam em dois tipos de rebeldia: a inteligente e a destrutiva.
A primeira busca questionar certas coisas procurando seu real sentido, seu ajuste,
entender o porquê de certa  coisa estar sendo feita.
A segunda surge de revoltas sem motivos, pautadas em interesses próprios.
São revoltas sem causas justas, visando única e exclusivamente contrariar as pessoas.


A rebeldia no seu aspecto positivo busca resolver problemas, procura o
bem do próximo, quer uma sociedade justa, um mundo melhor.
Quando uma pessoa age intencionada na defesa dos bons princípios, de uma sociedade
igualitária, de direitos iguais, pode-se dizer que, nesse parâmetro, sua rebeldia é a de não 
se conformar com o que não convém, mas, sim, com o que convém; por isso ela
é positiva.


O Cristão e a Rebelião


O cristão jamais deverá trilhar o caminho da rebeldia que visa destruir a
harmonia, a paz, a comunhão, dividir igrejas, colocar um crente contra o
outro. Pode-se notar que as Escrituras Sagradas destacam o respeito para com
as autoridades seculares (Rm 13.1; Tt 1.3) e que jamais se deve proceder
como ímpios, que buscam criar revoltas apenas para fins particulares (Pv
17.11). Os apóstolos Pedro e Judas falam daqueles que são dominados pelas
paixões infames da carne e não temem desrespeitar qualquer autoridade (2 Pe 2.10; Jd 1.8).


No  sentido de  não conformidade  com o que é errado,  o cristão pode
manifestar-se contrário, pois seu propósito é sempre estar ao lado da verdade,
da justiça, buscando a perfeita unidade, que é o vínculo da paz (Ef 4.3).
Quem é nova criatura em Cristo Jesus (2 Co 5.17) não trilha o caminho da rebeldia; 
por vezes, sua ação em relação ao sistema político secular, ou mesmo eclesiástico,
só pode acontecer quando não se está procedendo com justiça. No mais, tal ação deve ser
feita com oração, prudência, equilíbrio, atentando para os aspectos morais e espirituais,
mensurando-se até que ponto sua ação pode ser produtiva ou não.


Os que andam no caminho da rebeldia para mostrar erudição, que estão
fora do sistema, que são diferentes, podem sempre estar em perigo.
A Bíblia alerta-nos quanto ao risco por meio de quem vem o escândalo (Mt 18.7).
No caso de tomar qualquer atitude, o primeiro passo do cristão é orar, ver se sua ação
configura-se segundo os parâmetros bíblicos e qual o propósito dela.


II. A REBELDIA DE SAUL


Não Cumpria a Ordem Divina

Lendo os versículos 15-21, pode-se perceber facilmente que Saul não era
um líder. Sua escolha veio do povo, não de Deus, que o conhecia muito bem.
Deus só coloca na sua obra líderes de verdade, que estejam prontos a
obedecer-lhe. Saul era um escravo do povo. Suas decisões não eram pautadas
com boa base de liderança. Observe que, ao ser repreendido,
ele lança a culpa sobre o povo, assim como fez Adão, Eva, Arão (Gn 3.12; Êx 32.22).
Por não obedecer à ordem de Deus, poupando o melhor dos despojos dos amalequitas
e Agague, o Senhor desaprovou o reinado de Saul, que seria mais e mais decadente
dali em diante. Observe que Saul era um rei cheio de vaidade e autoconfiante.
Ao ser perguntado por Samuel se havia cumprido o que Deus tinha determinado,
ele prontamente diz que sim. Nesse particular, nota-se que ele  não tinha verdadeiro
temor e conhecimento do Senhor; daí o grande motivo de seu fracasso.
Está claro no texto que, sendo Saul pequeno, Deus exaltou-o, ou seja, deu-lhe o trono.
Todavia, diante de tamanha bondade do Senhor para com Saul,
ele sempre continuava desobedecendo, não ouvindo sua voz.
Quando Samuel repreende  Saul, ele apresenta suas argumentações sem base, e
o profeta apenas lhe diz que o obedecer é melhor do que qualquer sacrifício
(Os 6.6; Sl 50.8.14; 51.16; Is 1.11).




O Arrependimento de Deus em Relação a Saul


Na expressão do versículo 11, tratando do arrependimento de Deus em ter
posto Saul como rei, o que se deve entender é que tal conotação não tem
ligação semelhante com o arrependimento humano (1 Sm 15.29).
Por não ser obediente, Deus levantaria outro homem, que seria novamente
instrumento para cumprir os propósitos divinos.


No hebraico, a expressão “arrependo-me” é nacham, que quer dizer “sentir
muito, lamentar”. Quando aplicada a Deus, fala tão somente de mudança de
planos com respeito aos agentes humanos.
Diante de tudo o que havia feito de não obedecer à Palavra,
Saul não percebia o tamanho e a gravidade do mal que ele cometera, o que foi relatado
por Samuel.


Nesse diálogo, surgem dos lábios de  Samuel não apenas verdades que
feriram grandemente o coração de Saul, mas ele deixa claro que, mais do que
qualquer sacrifício, o que Deus deseja de um devoto sincero é obediência.
Saul é rejeitado como líder do povo de Deus porque rejeitou a sua Palavra.
Quem não obedece à Palavra do Senhor já foi rejeitado por Ele há muito
tempo; Ele já tem outro melhor para a sua obra.


É sempre bom lembrar que a melhor devoção é aquela que vem do coração,
e não das cerimônias externas, cheias de formalismo.
Quem é transformado interiormente pelo poder da Palavra de Deus exterioriza
isso na prática obedecendo.
Saul não obedecia como deveria porque não sabia os valores espirituais
que estavam por trás de tudo quanto Deus exigia.


O Pecado de Rebelião e Feitiçaria


O pecado da rebelião é descrito como algo sério pelo fato de tratar-se de
um levante contra Deus, sendo, nesse sentido, tão nocivo como a feitiçaria,
que, no hebraico, é qecem, adivinhação. Trata-se de magia com que se usam alguns
tipos de palavras para invocar demônios ou espíritos para prever o futuro e controlar
pessoas (Gl 5.20). Quem praticasse a rebelião era como se estivesse cometendo
o pecado de apostasia, pois buscar a feitiçaria era negar a pessoa do Deus supremo,
sua autoridade, colocando, assim, outros poderes em seu lugar.


Em relação à obstinação, do hebraico patsar, no hifil, que é causativo,
trata-se de demonstrar arrogância, insolência, presunção; assim, ela também
é tão nociva quanto os cultos que se fazem a ídolos, do hebraico ´awen.
Quem pratica a idolatria está cometendo um grande pecado, pois substitui o
Deus verdadeiro por um falso, o que também é um tipo de apostasia.
Na feitiçaria, o que se tem é o reconhecimento de poderes sobrenaturais;
quem a pratica despreza o poder de Deus. Na rebelião, a pessoa nega a autoridade divina.


III. SAUL: UM LÍDER SEM CRITÉRIOS

Não Sabia Esperar

Logo que Saul é coroado, não demora para que ele seja provado por Deus.
Esse teste divino tinha como objetivo provar sua confiança, ou seja, se ela
estava em Deus ou nos recursos do mundo. Jônatas, filho de Saul, tinha
lançado um ataque sobre os filisteus e agora eles vinham contra Israel (1 Sm 13.4,5).
A ordem de Samuel era que Saul esperasse antes de lançarem-se à batalha, mas,
sete dias depois, não chegando o profeta, Saul ficou sem controle, em estado de pânico,
temendo que seus soldados abandonassem-no.
Assim, ele desrespeita o que Samuel havia falado e logo oferece sacrifício a Deus,
preparando tudo para a batalha.
Não demorou para que Samuel chegasse e denunciasse seu pecado (1 Sm 13.10).


A desobediência de Saul ataca seriamente sua vida; na verdade, o trono,
pois o Senhor diz que tiraria dele o governo e que o daria a um homem
melhor, Davi, que seria segundo o seu coração (1 Sm 13.14). Nunca é bom
desobedecer, ser impaciente, mas esperar com paciência (Sl 40.1), pois a
impaciência, o ato de não saber esperar, pode custar caro para nossa vida.

Saul: O Rei Rejeitado


Deus é  maravilhoso, bondoso, misericordioso. Ele concede ao rei Saul
mais uma chance para que pudesse demonstrar mudança de vida, de atitude,
evidenciando isso por meio de sua total e plena confiança em Deus.
É isso que  o capítulo 15 diz. Como já dito, ele recebeu a ordem de matar
os amalequitas
por completo, que seria um tipo de oferta para Deus, mas, novamente, ele volta a
desobedecer ao comando de Deus, escolhendo aquilo que achava ser melhor
para o Senhor.


Samuel repreende Saul severamente pelo pecado cometido outra vez,
como já era de costume. Saul não se arrepende, mas apresenta seus subterfúgios,
suas evasivas, buscando desculpar-se, justificar-se, afirmando que tinha separado
o melhor para Deus. O profeta diz a ele que o Senhor, mais do que qualquer sacrifício,
quer obediência.


Saul passa a ser um rei rejeitado porque se tornou presunçoso, arrogante,
rebelde, que não ouvia a voz de Deus. Consciente e propositalmente,
ele não atentou para tudo quanto o Senhor falou, preservando a vida humana e dos animais,
enquanto Deus havia dito para destruir tudo.

O Governo divino em mãos humana

 - Osiel Gomes



                                          Resultado de imagem para 6- A Rebeldia de Saul e a rejeição de Deus

                            Saul  Torna - se  Rei                      1 Samuel 14.45— 15.6(45).


Assim, o povo livrou a Jônatas -  a palavra em hebraico é padah, “resgatar ou redimir”, provavelmente através de sua substituição pelo sacrifício de algum animal (Gn 22.13; Êx 13.13; 34.20). O final desta fase da guerra (que foi concluída posteriormente) está marcado pelo versículo 46.4. Resumo do Reinado de Saul (14.47-52)Estes versículos resumem os feitos militares de Saul e descrevem os seus relacionamentos familiares. As  suas campanhas  o levaram contra Moabe na direção  sudeste (veja mapa), contra os amonitas para o leste, contra os edomitas além de Moabe para o sul e para o leste,  contra os reis de Zobá para o  norte além de Damasco e contra os filisteus para o oeste (47). A campanha contra os  amalequitas  (48) está descrita com detalhes no próximo capítulo.A família imediata de Saul consistia de sua esposa Ainoã; dos seus filhos Jônatas, Isvi, e Malquisua; e das suas filhas Merabe e Mical. O seu tio Abner era o general do exército (50), o comandante. Os inimigos persistentes de Saul eram os filisteus, contra quem ele permaneceu em conflito durante toda a sua vida. Para manter fortalecidos os seus exércir- tos, ele seguiu a política do alistamento militar conforme Samuel havia previsto em 8.11.C. A  Missão  contra Amaleque,  15.1-351.

O Compromisso de Saul com a sua Incumbência (15.1-9) Samuel foi levar uma mensagem do Senhor a Saul. O povo de Amaleque já tinha chegado aos limites da iniqüidade. Em Levítico 18 encontra-se uma lista dos pecados dos moradores da região, que incluía os amalequitas. Esse povo pecador e guerreiro tinha atacado os israelitas pela primeira vez em Refidim (Êx 17.8-13; Dt 25.17,18), onde foram derrotados. Mais tarde, eles entraram em Horma (Nm 14.43,45), onde tiveram êxito. Eles uniram forças com Eglom, rei de Moabe, em um ataque contra Israel (Jz 3.13) e com os midianitas nas suas incursões às colheitas e aos rebanhos de Israel (Jz 6.3-5,33; 7.12; 10.12).A ordem era destruir totalmente (3), uma frase que literalmente significa “banir”. A palavra (charam, cherem) em geral é usada com respeito a objetos ou pessoas que estão sob  o julgamento de  Deus, e que  devem ser destruídos ou tornar-se uma propriedade especial do Senhor. A palavra corresponde à extração radical de um câncer, realizada por um cirurgião, para evitar que o mal se espalhe pelo corpo. Para deixar claro o fato de que esta não era uma guerra que tinha simplesmente o objetivo de saquear e roubar, Israel recebeu a ordem de não levar os despojos./Todas as criaturas vivas deveriam ser levadas à morte,  e,  no  caso de  Jericó  (Js  6.17-2Í  -  “anátema”  significa cherem,  “colocado  sob anátema”), tudo o que pudesse ser queimado deveria ser destruído pelo fogo, e a prata, o ouro, o metal e o ferro deveriam ser consagrados a Deus.Saul reuniu o seu exército em Telaim (4), cuja localização é desconhecida. Havia 200 mil homens de onze tribos e 10 mil de Judá, outra evidência da separação entre elas, que no final resultaria em dois reinos. Antes de iniciar o grande ataque, Saul avisou aos queneus(6) que se separassem dos amalequitas, entre os quais habitavam. Os primeiros eram um povo relacionado com os midianitas e os amalequitas. Eram ferreiros por profissão, e tinham favorecido os israelitas durante os anos que passaram no deserto. Saul realizou um205
1 Samuel 15.6-35
Saul  Torna -se  Reiataque esmagador sobre os acampamentos dos amalequitas desde Havilá, no deserto árabe perto do Sinai, até Sur, a leste do Egito e ligada com as suas fortificações de fronteira(7). Mas o rei e os israelitas permitiram que vivesse o rei Agague e trouxeram o melhor do rebanho (9). Vil e desprezível -  de acordo com Moffatt, “comum e sem valor”.2. A Rejeição do Rei (15.10-35) Saul agora enfrentava a sua prova final. Ele fora avisado em muitas ocasiões, mas tinha fracassado repetidas vezes.

O Senhor disse a Samuel: Arrependo-me de haver posto a Saul como rei (11) -  a palavra hebraica, nacham, “arrepender”, significa “suspirar, sentir muito, lamentar”, e, quando usada a respeito de Deus, indica uma mudança de planos com relação aos instrumentos ou agentes humanos. O termo mais caracteristicamente  utilizado  para  o  arrependimento  humano  no  sentido  evangélico  ou  do Novo Testamento é shuwb, “virar ou retornar”. Embora Samuel,  sem dúvida, tivesse visto a chegada da crise, entristeceu-se muito e toda a noite clamou ao Senhor.Quando Samuel veio a Saul, este atrevidamente disse: Executei a palavra do Senhor (13). A resposta clássica de Samuel foi: “Que balido, pois, de ovelhas é este nos meus ouvidos, e o mugido de vacas que ouço?” (14). Uma vez mais Saul culpou o povo que, disse ele, perdoou ao melhor das ovelhas e das vacas, para as oferecer ao Senhor, teu Deus (15). O significado da palavra teu é clara. O Senhor já não era mais o Deus de Saul.Com pesar, Samuel revelou a Saul o que Deus lhe dissera. Face às repetidas alegações de obediência do rei, Samuel fez uma das maiores afirmações com a natureza da verdadeira devoção que se encontra na literatura profética: “Tem, porventura, o Senhor tanto prazer em holocaustos e sacrifícios como em que se obedeça à palavra do Senhor? Eis que o obedecer é melhor do que o sacrificar; e o atender melhor é do que a gordura de carneiros. Porque a rebelião é como o pecado de feitiçaria, e o porfiar é como iniqüidade e idolatria” (22,23).

Após desprezar a Palavra do Senhor, Saul foi rejeitado como o rei do povo de Deus.Saul imediatamente confessou: Pequei (24); uma confissão que não parece sincera, uma vez que ele ainda culpava o povo e estava mais preocupado com a sua reputação do que com o seu caráter (25; cf. também 30). O rasgar acidental da capa de Samuel ilustra dramaticamente a perda do reino. O julgamento contra Saul era agora definitivo, pois a Força de Israel (29) não mudaria, novamente, os seus propósitos em relação a Saul. A palavra hebraica para Força é netsach, literalmente “o objetivo”, como um objeto brilhante em cuja direção alguém daria “a glória, o esplendor”. Ela só é usada aqui como um título de Deus.Samuel rendeu-se à insistência de Saul para que oferecessem sacrifícios juntos. Mas a “adoração” do rei parecia ser somente aparente, e formada por palavras vazias (30,31). O velho profeta executou pessoalmente Agague (32,33).  Saul havia demonstrado a sua falta de dignidade para governar. O seu sucessor seria agora escolhido -  apesar disso Samuel teve dó de Saul (35). O Senhor se arrependeu -  cf. comentário sobre 15.11.Sobre o significado de animosamente (32), leia-se: “E, animadamente, Agague aproximou-se dele, cujo significado é: “Certamente a amargura da morte já passou” (Berk.).O  obedecer é melhor do que o sacrificar, 22, isto é visto no decorrer de toda esta narrativa. Aqui temos (1) uma obediência parcial, 10,11, cf. 3,9; (2) uma fidelidade declarada, 12,13; (3) um fracasso público, 14-19; (4) uma desculpa insatisfatória, 20,21;(5) uma repreensão profética, 22,23; (6) um arrependimento fingido, 24-27; (7) a destruição predita, 28-31.

                                                                                      BEACON-1 E 2 SAMUEL


Imagem relacionada

v. O confronto final de Samuel com Saul (15.1-35). Saul foi enviado a vingar uma injustiça antiga, não algo recente. Os amalequitas
eram invasores nômades que habitavam o deserto entre a fronteira
meridional de Judá, ao sul de Berseba, e o Egito, mas que se espa­lhavam para o sul na península do Sinai. Foi nessa última região queeles tentaram impedir Israel de chegar ao Sinai depois de sua mila­grosa travessia do mar Vermelho, e, por causa dessa oposição aopropósito salvador de Deus, os amalequitas foram condenados à des­truição (Êx 17.14-16; cf. Nm 24.20; Dt 25.17-19). Cabe a Saul execu­tar a sentença de Deus, e isso toma o acontecimento bem diferente de todas as outras guerras dele. Aqui, ele está engajado numa “ guerra santa” , em contraste com uma guerra de agressão ou de autodefesa. E uma guerra por ordem de Deus, executada como juízo de Deus e em nome dEle. A vitória é do Senhor, por isso não existe vantagem mate­rial alguma para o exército; todos os despojos de guerra pertencem ao Senhor e, assim, são santos. Por essa razão, tanto as pessoas quanto os bens são interditados. Ninguém pode se apossar deles. E fácil com­preender o ponto de vista dos soldados, que seriam tentados a se queixar de que haviam se colocado em perigo e, contudo, não tiveram benefício algum com a guerra. Contudo, o princípio era bem com­preendido, pois havia funcionado nas batalhas contra Jericó e Ai, tendo sido a base da conquista de Canaã. Aqui, havia cidades consagradas a outros deuses.
O Senhor as reivindicava para Seu povo, “entregou-asna sua mão” , mas a cidade de Jericó, por exemplo, junto com seus moradores e bens, teve de ser “consagrada como anátema a Javé” (BJ;Js 6.17), isto é, consagrada ao Senhor para destruição. A única exceção foi Raabe, que, por esconder os espiões israelitas, havia demonstrado estar do lado de Israel. Aconteceu que a nação pecadora de Israel tomou-se agente de Deus na derrota de outra nação pecadora. Foi uma etapa necessária no ininterrupto processo divino de operar a salvação da humanidade, e precisamos enxergar isso por tal prisma, não nos esquecendo de que a infidelidade de Israel encontrou destruição semelhante, embora não to­tal, nas mãos de assírios e babilônios. O incidente constitui um lem­brete de que é horrível opor-se ao Deus vivo. 1-3. Quando Samuel de repente apareceu a Saul, foi para lembrá-lo de que ele era rei, basicamente não por aclamação popular, mas pela nomeação do Senhor. Por isso, seu dever era executar as ordens do Se­nhor e, em especial, o comando vai... agora e fere a Amaleque, e des-trói totalmente a tudo o que tiver. O verbo heherim, “destruir comple­tamente” , é empregado sete vezes neste relato, como que para enfati­zar, mediante a repetição, esse ato especial de consagração ao Senhor dos Exércitos, que dirigiu e deu vitória aos exércitos de Israel. 4-7. Saul tomou uma providência imediata, reunindo os homens de combate em Telaim.

Um lugar denominado Telém está na relação das cidades fronteiriças ao sul de Judá, em Josué 15.24, mas até agora sua localização não foi identificada. No entanto, a geografia da cam­panha requer algum ponto no Neguebe, e Telém pertencia a Judá. A tribo de Judá foi especialmente mencionada entre as forças que acor­reram a Saul: elas constituíam dez contingentes (mil) de um total de duzentos contingentes, ou talvez fosse um acréscimo a eles. Cidade de Amaleque é uma expressão estranhamente vaga, e não se conhece qualquer cidade com esse nome; contudo, não é impossível que essa tribo de habitantes do deserto tivesse se instalado e construído um cen­tro para seu rei e sua corte. 127
 Os queneus estavam intimamente ligados a Israel desde a época de Moisés, tendo se instalado no Neguebe de Judá (Jz 1.16; cf. Êx2.15b-22; 3.1; 4.18-20; 18.1-5; Nm 10.29-32). Embora fossem inde­pendentes, eram aliados de Israel; daí a relutância de Saul em envolvê-los inadvertidamente quando atacasse Amaleque. Parece que eram especialistas em trabalho com metal (o nome significa “ artesão em metal”) e que haviam se instalado no meio de outros povos como artesãos; contudo, considerando as advertências de Saul, retiraram-sedo meio dos amalequitas e evitaram a derrota na guerra. A derrota infligida por Saul aos amalequitas foi total desde Havilá até Sur. Havilá, mencionada em Gênesis 25.18, era uma região da África a centenas de quilômetros de distância, ao lado da extremi­dade sul do mar Vermelho; a menos que houvesse outra Havilá noNeguebe, o nome foi mudado no processo de transmissão. Uma palavra original possível é “proveniente do vale” (cf. v. 5; mnhl, termo que pode ter sido assimilado ao nome hebraico em Gn 25.18). Sur fi­cava na fronteira oriental do Egito. 8-9. Encerrada a batalha, Saul interpretou à sua própria maneira a instrução de Samuel. Conquanto a população tenha sido destruída em sua totalidade conforme o decreto de consagrá-la ao Senhor, Saul e o povo pouparam a Agague, e o melhor das ovelhas; há uma clara in­sinuação de que Saul desejava ficar ao lado da opinião pública.

O povo amalequita era dispensável, mas era uma pena destruir animais tão ex­celentes! 10-12. Mais tarde (v. 29), parece que Samuel contradiz a palavra do Senhor: Arrependo-me de haver constituído rei a Saul. O Senhor não muda de idéia no sentido de que seus propósitos também mudam,mas Ele já não podia usar Saul. O próprio Saul era inteiramente res­ponsável por suas atitudes e ações. O Deus soberano detém de tal forma o controle que não tem a menor dificuldade com as ações dos seres humanos, ajustando Seus planos quando necessário, e assim mesmo atinge seus objetivos finais. O que foi exatamente que levou Samuel a se contristar tanto, a ponto de passar a noite inteira supli­cando em oração? Em primeiro lugar, a teologia de Samuel estavasendo questionada. Apesar de sua opinião contrária, ele havia coo­perado no processo de estabelecimento da monarquia, anunciando que 128
Saul era aquele que o Senhor escolhera (1 Sm 10.1, 24; 11.15). Agora,parecia que o Senhor, que “não mente nem se arrepende” (v. 29), tinha mudado de idéia, e Samuel não conseguiu se conformar com esse de­safio à soberania divina. Em segundo lugar, que seria da liderança de Israel? O país estava numa situação pior do que nunca. Por último,mas não menos importante, Samuel estava despedaçado interiormente pela palavra divina e precisava resolver sua própria confusão perante o Senhor. O sacrifício pessoal do ministério é percebido na vida de Sa­muel e nesta passagem em particular. Esperando que Saul ainda estivesse no Neguebe, Samuel parte em direção ao sul, e então descobre que tinha ido para o lado errado. Saul já havia voltado da luta contra os amalequitas e celebrado a vitória,erigindo um monumento comemorativo no Carmelo (1 Sm 25.2), local a aproximadamente 16 quilômetros ao sul de Hebrom, e que não deve ser confundido com o monte Carmelo. Graças às notícias que “ corriam de boca em boca” em Israel, Samuel foi poupado de uma longa e in­frutífera jornada, encontrando Saul relativamente próximo, em Gilgal,onde o reinado deste fora confirmado (1 Sm 11.14, 15).

13-16. Esse confronto entre Samuel e Saul devia ser o último,mas Saul, em todo o ardor de sua vitória, saudou Samuel entusias­ticamente, com a falsa certeza de que havia feito o que se esperava dele. Ao responder à indagação de Samuel sobre o barulho de animais guardados no curral, Saul ainda não estava preocupado. O povo havia poupado os melhores animais para os sacrificar ao Senhor teu Deus.A pequena palavra “teu” revela muito acerca de Saul, que não fala em“ nosso Deus” . Suspeita-se de que, quando se tomou a decisão de nãomatar o melhor dos rebanhos, havia mais motivações egoístas agindo do que o desejo de sacrificar, mas Saul soube tirar o máximo proveito da situação. O resto... destruímos totalmente revela uma visão total­mente imprópria de tudo o que era pretendido pelo herem, com seu atode dedicar tudo ao Senhor, incluindo os despojos de combate e do rei inimigo.

17-21. A tentativa de Saul de pôr a culpa no povo agora recai so­bre si mesmo. Por acaso ele não é o rei? Então é o responsável. O Se­nhor, a cuja escolha ele devia seu reino, havia lhe dado uma missão para cumprir. Como poderia fazer algo diferente? Mas Saul continuou a defender sua interpretação dos acontecimentos.

 22-23. Num pronunciamento profético memorável, Samuel de­clara de modo definitivo a futilidade de tentar depender do sacrifício ritual, quando o que se requer é a obediência. Nenhum cerimonial poderá compensar uma atitude rebelde contra Deus e Seus mandamen­tos, porque a resistência obstinada a Deus exalta a vontade própria e coloca-a no lugar de autoridade, que pertence unicamente a Deus. Eispor que ela é tão ruim quanto a “adivinhação” (IBB; através de espíri­tos maus; ARA, feitiçaria) e se equipara à idolatria, pois outro deus, o eu, usurpou o lugar do Senhor. A afirmação visto que rejeitaste apalavra do Senhor, ele também te rejeitou a ti, para que não sejas rei(no total cinco palavras em hebraico) põe à mostra a justiça da conde­nação. Saul desqualificou a si mesmo para reinar em Israel. Ele rejei­tou a submissão ao rei divino.

 24-26. Por fim, Saul admite que está errado, mas não leva total­mente a sério a condenação pronunciada por Samuel. Em face das cir­cunstâncias, poderá ele com certeza ser perdoado e continuar no cargo? Em seu reconhecimento, transgredi ( ‘ãbartí) o mandamento, o termo traduzido por “transgredi” é uma palavra comum que significa literalmente “passei por cima” (diríamos “fui negligente”); embora ele se expressasse desse modo, a contradição em suas palavras torna-se óbvia. Saul havia sentido a necessidade de apoio popular e fora inca­paz de resistir à tentação de adular, permitindo algum ganho material com a vitória. Samuel repete sua declaração da rejeição de Saul, a qual não pode ser retirada. Saul terá de conviver com os resultados de suaspróprias decisões.

 27-31. A essa altura, Saul estava plenamente cônscio das impli­cações de sua rejeição e, quando Samuel se virou para deixá-lo, ele agarrou e rasgou o manto do profeta, numa tentativa de salvar algumas migalhas de sua reputação. A veste rasgada de Samuel proporcionou uma ilustração vívida do reino rasgado e arrancado de Saul, o qual se­ria entregue a outro mais digno do que ele. Embora Saul tenha con­tinuado como rei, esse se tomou o dia decisivo na história de seu reinado, porque, nas palavras de Balaão, que tentou reverter a bênção do Senhor sobre Israel, “Deus não é homem, para que minta; nem para cumprir. Como poderia fazer algo diferente? Mas Saul continuou a defender sua interpretação dos acontecimentos.

22-23. Num pronunciamento profético memorável, Samuel de­clara de modo definitivo a futilidade de tentar depender do sacrifício ritual, quando o que se requer é a obediência. Nenhum cerimonial poderá compensar uma atitude rebelde contra Deus e Seus mandamen­tos, porque a resistência obstinada a Deus exalta a vontade própria e coloca-a no lugar de autoridade, que pertence unicamente a Deus. Eis por que ela é tão ruim quanto a “adivinhação” (IBB; através de espíri­tos maus; ARA, feitiçaria) e se equipara à idolatria, pois outro deus, o eu, usurpou o lugar do Senhor. A afirmação visto que rejeitaste apalavra do Senhor, ele também te rejeitou a ti, para que não sejas rei(no total cinco palavras em hebraico) põe à mostra a justiça da conde­nação. Saul desqualificou a si mesmo para reinar em Israel. Ele rejei­tou a submissão ao rei divino.

24-26. Por fim, Saul admite que está errado, mas não leva total­mente a sério a condenação pronunciada por Samuel. Em face das cir­cunstâncias, poderá ele com certeza ser perdoado e continuar no cargo? Em seu reconhecimento, transgredi ( ‘ãbartí) o mandamento, o termo traduzido por “transgredi” é uma palavra comum que significa literalmente “passei por cima” (diríamos “fui negligente”); embora ele se expressasse desse modo, a contradição em suas palavras torna-se óbvia. Saul havia sentido a necessidade de apoio popular e fora inca­paz de resistir à tentação de adular, permitindo algum ganho material com a vitória. Samuel repete sua declaração da rejeição de Saul, a qual não pode ser retirada. Saul terá de conviver com os resultados de suas próprias decisões.

27-31. A essa altura, Saul estava plenamente cônscio das impli­cações de sua rejeição e, quando Samuel se virou para deixá-lo, ele agarrou e rasgou o manto do profeta, numa tentativa de salvar algumas migalhas de sua reputação. A veste rasgada de Samuel proporcionou uma ilustração vívida do reino rasgado e arrancado de Saul, o qual se­ria entregue a outro mais digno do que ele. Embora Saul tenha con­tinuado como rei, esse se tomou o dia decisivo na história de seu reinado, porque, nas palavras de Balaão, que tentou reverter a bênção do Senhor sobre Israel, “Deus não é homem, para que minta; nem filho do homem, para que se arrependa” (Nm 23.19). Realmente, nãoé. Contudo, o Senhor também não poderia fazer vistas grossas a uma rejeição persistente e deliberada de Sua vontade, pois isso seria negar Sua soberania. Honra-me... agora diante dos anciãos do meu povo, e diante de Israel, implora Saul, que não está disposto a perder o pres­tígio e deseja a presença de Samuel, a fim de dar a impressão de que nada aconteceu. Samuel concorda com o pedido e acompanha Saul en­quanto este adora.

32-33. Samuel ainda não completou suas tarefas proféticas. Em­bora seja idoso (1 Sm 8.1) e, até onde sabemos, enquanto viveu jamais tenha matado qualquer pessoa, ele precisa terminar o que Saul deixou por fazer, e consagra ao Senhor Agague, o rei amalequita, matando-o.(Despedaçou segue a Vulgata; o verbo hebraico ocorre apenas aqui, e seu significado é incerto.) Desse modo, Samuel cumpre as ordens quecie mesmo dera (v. 3), mostra que está disposto e é capaz de realizar oque diz aos outros e, acima de tudo, que obedece aos mandamentos do Senhor.

34-35. Agora ocorre a separação definitiva: Gibeá e Ramá fi­cavam a menos de 16 quilômetros de distância uma da outra, mas Sa­muel nunca mais se encontrou com Saul. Samuel teve pena de Saul: conhecendo Saul desde a juventude ,ele havia se afeiçoado a Saul e sofria profundamente com o relaciona­mento rompido. Até o Senhor “ se entristeceu” (NIV) de ter feito Saul rei sobre Israel. Em geral, concorda-se que a casa de Saul em Gibeá (Tell el-Ful)foi descoberta nas escavações, embora seja assunto controverso se ele a construiu ou se a tomou dos filisteus. Era uma grande estrutura retan­gular, guardada por uma torre no único canto que restou.1 Em com­paração com o palácio que Davi mandaria construir (2 Sm 5.11), para não falar do palácio de Salomão (1 Rs 7.1-12), a cidadela de Saul era I. A reconstrução que W. F. Albright faz da planta baixa da cidadela encontra-se reproduzida em seu livro The Archaeology o f Palestine (Harmondsworth: Penguin Books, 1949), p. 121, e em IBD 2, verbete “ Gibeah” , p. 390, 391. Para uma avaliação recente da escavação no local, veja IBD 1, verbete “ Gibeah” , p. 557, 558. Não é possível definir quem construiu a fortaleza. 131
uma estrutura bem simples, planejada para defesa, e não para osten­tação. Talvez a causa de sua moderação seja a influência de Samuel,que, como se sabe, opunha-se ao auto-engrandecimento geralmente as­sociado à monarquia (1 Sm 8.10-18); nenhum dos dois sucessores ime­diatos de Saul viveu sob a sombra de um profeta tão eminente quanto Samuel, e nenhum deles hesitou em ressaltar sua própria importância por meio de planos de construção sofisticados. Será que Samuel continuou a ministrar justiça de sua casa em Ramá, enquanto Saul governava como rei em Gibeá (cf. 1 Sm 7.15-17)?1É fácil perceber que qualquer um na posição de Saul necessitaria de humildade, graça e sabedoria extraordinárias para conseguir manter a lealdade do povo e reconhecer a autoridade do líder mais velho e profeta do Senhor. O texto bíblico parece fazer diferentes avaliações de Saul como homem e como rei. Em primeiro lugar, ele é proclamado como o ungi­do do Senhor (1 Sm 10.1), equipado pelo Espírito de Deus (1 Sm 10.9)e aclamado pelo povo como a escolha do Senhor (1 Sm 10.24). E lelogo se revela alguém preparado para ganhar as guerras do povo do Senhor (1 Sm 11.5-11) e é solenemente estabelecido como rei (1 Sm11.12-15). Nessa ocasião, ele é generoso com seus inimigos, recu­sando-se a executar aqueles que lhe fizeram oposição, e ao mesmo tempo é modesto, até mesmo tímido, quanto a seu próprio direito à honra (1 Sm 9.21; 10.22). Entretanto, sua aparência é apropriada, pois é alto e tem bom porte (1 Sm 9.2; 10.23), sendo uma escolha popular.Como, então, explicamos o que acontece de errado? Saul começa em desvantagem, porque as tradições de Israel, que haviam se desenvolvido na sociedade igualitária da época de Moisés ena jornada pelo deserto, haviam se oposto à idéia de um rei humano. O Senhor era rei. Assim, quando Gideão foi convidado a dar origem a1. Uma das funções básicas da monarquia em Israel era ministrar justiça, e tanto Davi quanto Salomão são descritos como pessoas que cumpriram esse papel (2 Sm 8.15; 1 Rs 3.9, 28). Conforme K. Whitelam mostra no capítulo 1 de seu livro The Just K ing (Sheffield: JSOT Press, 1979), intitulado “ The Ideal” , a responsabilidade judiciária da monarquia era considerada importantíssima no antigo Oriente Próximo. Saul pode muito bem ter sentido que, destituído de seu papel de juiz, ele era menos do que rei de Israel. 

uma monarquia hereditária, ele soube dar a resposta certa (Jz 8.22, 23).Abimeleque, o “espinheiro entre as árvores”, conseguiu se estabelecer como rei, mas logo experimentou a queda (Jz 9.1-57). Samuel defen­deu com firmeza as tradições, e é com clara relutância que concordou com a inovação (1 Sm 8.6-9). Samuel, contudo, não tinha dúvidas quanto à escolha de Saul pelo Senhor, e há indícios de que chegou a amá-lo. Samuel, claro, representava o Senhor Deus soberano, cuja palavra tinha de ser suprema. Ele era o portador das instruções do Senhor,sendo sua tarefa cuidar que fossem realizadas com exatidão. Não havia qualquer outra cultura em que o rei tinha de se curvar desse modo pe­rante o representante humano da divindade, e isso foi um teste para Saul. Não há dúvida de que ele queria fazer o que era certo; ele espe­rou Samuel durante sete dias (1 Sm 13.8), mas não foi paciente portanto tempo. Teve o cuidado de buscar a orientação do Senhor para se opor à transgressão dos filisteus (1 Sm 14.2, 3,18), foi meticuloso ao cumprir, mesmo com desvantagem para si, o juramento que fizera (1Sm 14.24, 38-45), e não aceitou transgressão alguma da lei ritual, em­bora as circunstâncias fossem excepcionais (1 Sm 14.33-35). No en­tanto, apesar de sua preocupação em guardar a lei, Saul encontrou Sa­muel vindo ameaçadoramente sobre ele para condená-lo, dizendo-lhe em duas oportunidades que seu reino não continuaria e que seria subs­tituído por um homem segundo o próprio coração do Senhor (1 Sm13.14; cf. 15.28). Há algo de trágico na pessoa de Saul, o rei-herói de Israel. Ele está descobrindo seus poderes reais dentro da teocracia de Israel e ime­diatamente enfrenta as críticas de Samuel. O conflito entre igreja e Estado, tão familiar em períodos mais recentes da história, já estava em andamento. Conforme comentou um escritor de nossos dias, “a história do rei Saul, creio eu, é um dos relatos ‘desconfortáveis’ da Bíblia” .1Ninguém se sente totalmente convencido de que a história foi devidamente compreendida, pois Davi, que desde o início parece con­tar com apoio, cometeu pecados aterradores, dos quais Saul nunca foi1. Gunn 1980, p. 9. 133

culpado. Por que, então, Saul é julgado com tanta severidade? Davi,depois de todos os seus erros, encontrou perdão e manteve Bate-Seba como esposa, ao passo que Saul parecia destinado a fracassar desde o início de seu reinado. A idéia de um destino sombrio pairando sobre Saul foi tomada e examinada em detalhes por David Gunn. Ele propõe esta pergunta:“ Saul fracassa como rei porque, como ser humano, em seu íntimo ele é incompetente para o cargo, ou porque, em essência, é levado a agir de maneira errada por forças ou circunstâncias externas?” .1 Na história vista até agora (pois, embora a rejeição de Saul seja definitiva, seu rei­nado está longe do fim), o rei teve de enfrentar um grande número de dilemas: Jônatas havia precipitado a batalha de Micmás, e Saul, vendo o exército se desintegrar, sentiu-se forçado a cumprir as exigências ri­tuais para cujo cumprimento Samuel não tinha aparecido; de novo Jônatas tomou a iniciativa e, devido a seu surpreendente sucesso, en­volveu seu pai e todo o exército numa perseguição generalizada aos filisteus; Saul impôs um voto a seu exército para deixar claro o com­promisso deles com o Senhor, mas o voto apanhou Jônatas numa ar­madilha e privou os soldados do sustento alimentar tão necessário;finalmente, no incidente amalequita, Saul admitiu sua culpa, dizendo “temi o povo, e dei ouvidos à sua voz” , em oposição à ordem suprema do Senhor dada por meio de Samuel. Será que tudo isso não é um “destino” contrário, o “ lado sombrio” do tratamento dispensado por Deus à humanidade? Sem dúvida, Saul parecia impedido por inibições que não lhe per­mitiam assumir a liderança, e, em alguns aspectos, ele era inegavel­mente culpado; contudo, é difícil saber quem teria tido a maturidade eo discernimento espiritual para se sair bem onde Saul falhou. Parece que esse primeiro rei de Israel, à semelhança de Ananias e Safira nos primeiros dias da igreja, foi julgado pelos mais altos ideais possíveis, enão se lhe permitiu qualquer margem de erro. Ao mesmo tempo, nãose pondera sobre os muitos pecados associados com o reino, os quais Samuel havia relacionado (1 Sm 8.10-18), mas que Saul evitara.1. Ibid., p. 115. 134

Há um sentido em que Saul poderia ter se saído melhor, caso tivesse sido menos consciencioso em seu desejo de obter a orientação do Senhor (aguardar inerte as instruções, em vez de esperar a orien­tação enquanto avançava) e menos dependente da certeza de que estava sob a graça, quer de Deus, quer do homem. “ Sua preocupação honesta, porém angustiada, de acompanhar os passos do Senhor é um obstáculo prático para sua exploração da vitória ao máximo” — tal é o comentário de um escritor sobre 1 Samuel 14.36,1e em várias ocasiões Saul é caracterizado por uma incerteza aflita que o torna incapaz deagir. Em si mesma essa é uma personalidade falha, desqualificada para a liderança, pois espera-se que um rei implemente planos de ação. Sa-inuel não teria visto a indecisão de Saul por esse prisma, mas sim como resultado de uma obstinação lançada contra ele mesmo e, por­tanto, contra a palavra do Senhor. Um profeta posterior adverte contra o andar pela luz da própria tocha, e aconselha: “ Aquele que anda em trevas, e não tem luz, confie no nome do Senhor, e firme-se sobre o seu Deus” (Is 50.10-11, IBB). Foi isso que Saul achou impossível fazer: daí resulta boa parte da aflição do restante de sua vida, bem como a tragédia de seu reino até o momento. Saul talvez tenha sentido que poderia ter se saído muito melhor como rei não fosse Samuel;nesse caso, teria oportunidade de prová-lo a partir de agora. Ele tinha seguidores fiéis e era um grande guerreiro, mas faltava algo vital em sua vida. Em retrospecto, então, os “ incidentes-chave” escolhidos para in­clusão no relato do reinado de Saul ressaltam sua rejeição e mostram Jônatas sob uma luz favorável. Ele liderou Israel em combate e obteve grandes vitórias, as quais o tornaram tão popular que seu pai não lhe pôde fazer mal algum. Jônatas “recebe diversos sinais de aprovação divina e enorme aclamação do povo, como é próprio a um rei, no próprio contexto da rejeição de seu pai” .2 Desse modo, o cenário está1. Hertzberg, p. 116.2. Jobling, p. 8. Ele passa a frisar que até aqui, na narrativa, existe identificação de papéis entre Saul e Jônatas, mas também separação. O sentido da exaltação de Jô­ natas, segundo ele, “deve, sem dúvida alguma, ser procurado no papel mediador que Jônatas mais tarde desempenha na transição do reinado de Saul para o de Davi” . 135


I-e-II-Samuel- Serie Cultura Biblica - Joyce-G-Baldwin








Nenhum comentário:

Postar um comentário