terça-feira, 15 de outubro de 2019

Lição 03 - A Verdade Sobre a Queda do Homem






     TEXTO ÁUREO

Mas temo que, assim como a serpente 
enganou Eva com a sua astúcia,
 assim também sejam de alguma sorte corrompidos
 os vossos sentidos, e se apartem da simplicidade 
que há em Cristo.
         2 Coríntios 11:3


COMENTÁRIO

Palavra introdutória
Nesta lição, verificaremos, dentre outros pontos capitais relacionados à Queda, diversos aspectos relacionados à tentação e às perdas da humanidade, advindas do pecado original.

1. PASSOS INICIAIS
No início de Gênesis, com referências paralelas no Novo Testamento, o texto bíblico apresenta-nos os responsáveis pela queda da raça humana. Observe.
  • Agente instigador: Satanás (Lc 22.3,4; Ap 20.2,7,8)
  • Agente ativo: a serpente (Gn 3.1-3; 2 Co 11.3)
  • Agentes passivos: Adão e Eva (Gn 3.4,6; Rm 5.12,14).

2. ASPECTOS DA TENTAÇÃO


2.1. Propósito
Na Queda, o ataque mortal foi dirigido aos agentes passivos da cena, ou seja, ao primeiro casal. Entretanto, o objetivo do diabo era atingir o Senhor Deus. Satanás focou todo seu poder no homem por ser ele a cora da criação.

2.2. Processo

A estratégia da serpente direcionou a mulher para o engano e a mentira. Como agente ativo no processo da tentação, ela começou indagando Eva acerca da única restrição estabelecida por Deus para ela e seu marido. O diabo, falando através da serpente pela segunda e última vez, negou firmemente a possibilidade de punição, limitações ou morte (Gn 3.4). Porém, o salário - a consequência - do pecado é a morte (Rm 6.23).

2.3. Estratégia
Satanás priorizou alcançar a mente da mulher, para, assim, manipular suas emoções. Ao afirmar que não haveria qualquer punição para quem comesse o fruto proibido, o maligno pretendia induzir Eva a pensar que ela era melhor do que o próprio Deus.

2.4. Propostas

O diabo, na tentativa de manipular a mulher, mencionou pelo menos quatro lucros fenomenais que o primeiro casal teria se comesse o fruto proibido. As propostas foram oferecidas sempre no plural - incluindo Adão e Eva: vossos.

2.4.1. Se abrirão os vossos olhos...
A serpente insinuava que Deus estaria escondendo muitas coisas de Adão e Eva, as quais eles teriam o direito de saber; assim, seduziu a mulher: "Não haverá limites para o que vocês desejarem ver; tudo o que quiserem contemplar, nada ficará oculto; não haverá nada escondido para vocês".

2.4.2. Conhecereis o bem e o mal...

Satanás, por boca da serpente, não falou sobre as terríveis consequências do mal. A Bíblia é a única fonte capaz de revelar tudo sobre o avesso do bem: somente Deus o conhece plenamente; assim, para preservar o homem da destruição, Ele não quis dar ao ser humano o direito de conhecê-lo ou praticá-lo, tornando-se, assim, seu escravo (Jo 8.34).

2.4.3. Não morrerei
Diante da inverdade de Satanás, Eva simplesmente ficou calada e não resistiu à tentação; assim, tomou o fruto, comeu-o e deu-o a Adão. Naquele exato momento (na Queda), ambos morreram (espiritualmente); não por terem comido o fruto, mas, sim, pela desobediência ao mandamento do Senhor (Gn 2.16,17).
Eis que surge o pecado, instaurando, assim, o rompimento da comunhão entre o homem e Deus: o corpo passa a sofrer debilidades físicas; a alma, o peso da culpa; e o espírito, aflições insuportáveis (Sl 31.10).

2.4.4. Sereis como Deus...
Na mente de Eva já dominada pela força maligna, possivelmente passaram pensamentos de poder, igualdade, independência, prestígio e glória indescritíveis.
A mulher não julgou que nada - nem ninguém - pode ser como o altíssimo, em quaisquer dimensões ou circunstâncias (Ex 15.11).

3. AS PERDAS DA HUMANIDADES





3.1. O poder diabólico do engano
Eis uma grande verdade: a mulher conversou com a serpente; focou alvos perigosos; duvidou da palavra de Deus; creu em tudo o que o diabo lhe disse; desprezou as bênçãos recebidas do Senhor; não avaliou as consequências dos seus atos; usou de seu livre-arbítrio para a prática do proibido; e acreditou que Adão e ela poderiam ser como Deus.

3.2. Passos para vencer a tentação

Três passos bíblicos são essenciais para vencer as tentações. Observe.
  • Resistir ao diabo e a todas as forças satânicas (Tg 4.7).
  • Revestir-se (vestir mais de uma vez) de toda armadura de Deus. (Ef 6.11,16).
  • Fugir da imoralidade sexual (1 Co 6.18); da idolatria (1 Co 10.14); do amor ao dinheiro (1 Tm 6.10); de doutrinas estranhas (1 Tm 6.3-5); do pecado (1 Tm 6.11); das ofertas do mundo (1 Jo 2.15); da ira, cólera, malícia, maledicência, palavras torpes e mentiras (Cl 3.8,9); das paixões da carne (2 Tm 2.22).  

CONCLUSÃO
Podemos vencer qualquer tentação se estudarmos a Palavra de Deus (1 Co 10.12), sistematicamente, se orarmos sem cessar, se buscarmos a plenitude do Espírito Santo, se pertencermos ao Corpo de Cristo (Igreja). Devemos manter nosso vaso exterior (o corpo) separada do pecado, e a alma e o espírito (homem interior) em santidade diante de Deus e do mundo que nos cerca.

ATIVIDADE PARA FIXAÇÃO

1. De acordo com o que foi exposto nesta lição, responda: O que Adão e Eva perderam , imediatamente após a Queda?

                                                        Fonte: Revista Lições da Palavra de Deus n° 60



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                As consequências do pecado original 

                            na queda do homem  

          Adão e Eva não tinham pecado ou se quer sabiam o que é isto, más conseguimos notar que através do pai da mentira, foi facilmente induzido pela serpente a buscar ser igual a Deus, fazendo assim a semente do pecado existir dentro da raça humana e com ele suas consequências.
Neste tópico quero abordar o que levou Adão e Eva transgredirem o mandato do Senhor e comer da arvore da Ciência do bem e do mal, e também quais foram os efeitos que este ato fez não só com a sua geração más com todos que vieram após ele.
Porque o pecado de Adão é apenas dele, mas as consequências todos nós herdamos.
Deus havia colocado o homem no jardim do Éden (lugar das delicias) como o próprio nome já prefigura era um jardim aonde tudo que tinha lá era bom, quem sabe os frutos que lá existiam, ou conviver com os animais de forma saudável, tanto que Deus fez brotar da terra toda árvore agradável a vista e boa para comida, e a árvore da vida no meio do jardim (Gênesis 2.9).

Só que neste mesmo ambiente de delícias tinha um fruto que ele não podia pegar (comer) que era da árvore da Ciência do bem e do mal, ao qual o próprio Deus ordenou desta forma (Gênesis 2.16-17).

Até o presente momento existia apenas Adão más Jesus viu que não era bom que o homem ficasse só (Gênesis 2.18) então de uma das costelas de Adão formou Eva, aquele homem que outrora estava solitário quando viu esta bela mulher se encantou de tal forma que fez oque podemos considerar “uma declaração de amor” à ela:

“E disse Adão: Esta é agora osso dos meus ossos e carne da minha carne; esta será chamada varoa, porquanto do varão foi tomada. Portanto, deixará o varão o seu pai e sua mãe e apegar-se-á a sua mulher, e serão ambos uma carne.” (Gênesis 2.24)

Agora não estava mais só tinha uma companheira que estaria sempre do seu lado, porém esta mesma mulher foi a qual foi induzida pela serpente a comer do fruto (há quem diga que não foi de uma hora para outra que despertou esta vontade de comer do fruto, pois primeira se vê para depois desejar, e até despertar o desejo precisa de repetidas vezes olhar para a arvore) , interessante que Satanás não usou argumentos viáveis, se pararmos para analisar, ele disse:
“Então, a serpente disse à mulher: Certamente não morrereis. Porque Deus sabe que, no dia em que dele comerdes, se abrirão os vossos olhos, e sereis como Deus, sabendo o bem e o mal.“ (Gênesis 3.4-5)

“Certamente não morrereis” – ao afirmar isto ele estava dizendo que Deus mentiu quando disse que “se comerdes certamente morrerás” (Gênesis 2.17),

acusava a veracidade de Deus, mas muito pelo contrário do que a Bíblia nos diz, porque na verdade Satanás é o Pai da Mentira (João 8.44). “Se abrirão os vossos olhos” – acusava neste momento que Deus não havia dado a eles um verdadeiro paraíso mas sim que o melhor ainda estava por vir quando viessem “abrir os olhos”. “Sereis como Deus” – o mesmo sentimento que Lúcifer despertou no coração querendo ser semelhante ao altíssimo (Is 14.13-14) agora transmitia para Eva, coisa esta que seria fácil de desmascarar pois a mulher sendo uma criatura formada pelas mãos de Deus, não haveria forma alguma de ser “igual a ele”, apenas tinha a essência da semelhança. 
A queda do homem Aquela mulher tinha tudo junto com Adão, estava no lugar das delicias, tinha diversas outras arvores naquele local que com certeza chamava muito a atenção “Más então como estas mentiras conseguiram de forma tão fácil seduzir á Eva de tal forma que conseguiu até induzir seu companheiro Adão?” , tal questionamento é fácil de ser respondido ao analisarmos mais afundo o seguinte versículo:
“E, vendo a mulher que aquela árvore era boa para se comer, e agradável aos olhos, e arvore desejável para dar entendimento, tomou do seu fruto, e comeu, deu também a seu marido, e ele comeu com ela.” (Gênesis 3.6). Boa para se comer: Concupiscência da carne. Agradável aos olhos: Concupiscência dos olhos. Desejável para dar entendimento: Soberba da vida.

Analisando este três desejos rapidamente se faz um paralelo com 1 João 2.16: “Porque tudo o que há no mundo, a concupiscência da carne, a concupiscência dos olhos e a soberba da vida, não é do Pai, más do mundo.” Eva despertou em si mesmo desejos mundanos estes que por sinal a fizeram cair em tentação, “porventura Deus não foi injusto ao colocar esta árvore no jardim e assim futuramente despertando o desejo em Eva e Adão?”
A resposta é: “Não! pois a Bíblia diz em 1 Coríntios 10.13 que não nos sobrevêm tentação alguma além do que possamos suportar”, quando Deus permitiu que Eva fosse tentada ele conhecia a capacidade daquela mulher então sabia que ela podia rejeitar más mesmo assim, ela não suportou e caiu no engano. 

Consequências da queda do homem 

A consequência que esta queda logo nos primeiros humanos foi desastrosa ao ponto da semente do pecado passar por todos (Adão e Eva eram os representantes legais da geração humana ali no Éden, logo por nossos
representante pecarem todos também fomos afetados) e todos nascerem em pecado como diz Davi em seu Salmo:
“Eis que em iniquidade fui formado, e em pecado me concebeu minha mãe.” (Salmos 51.5)

A causa ficou tão crítica ao ponto de Deus não achar nenhum justo:
“O Senhor olhou desde os céus para os filhos dos homens, para ver se havia algum que tivesse entendimento e buscasse a Deus. Desviaram-se todos e juntamente se fizeram imundos; não há quem faça o bem, não há sequer um.” (Salmos 14.2-3)

Com todos agora em pecado e destituídos da gloria de Deus (Romanos 3.23) a necessidade de um redentor aumentou ainda mais, porque as nossas iniquidades fazem divisão entre nós e Deus (Isaías 59.2), tanto que Jó fez o seguinte questionamento:

“Na verdade sei que assim é; porque como se justificaria o homem para com Deus.” (Jó 9.2)

Naquele momento ninguém o respondeu, talvez até tenha se feito um silêncio e ninguém falava nada, até porque ele por si mesmo não conseguiria se justificar, más um dia o Apostolo dos gentios (Paulo) respondeu em uma de suas cartas aos romanos:
“Sendo, pois, justificados pela fé, temos paz com Deus por nosso Senhor Jesus Cristo.” (Romanos 5.1)

Glorias a Deus! agora através da expiação de Cristo Jesus no calvário conseguimos ser justificados pelo seu sangue, porque o salário do pecado é a morte, más o dom gratuito de Deus é a vida eterna por Cristo Jesus nosso Senhor (Romanos 6.23).

O homem por si mesmo não consegue salvar-se porque tem uma natureza pecaminosa caída, más com o redentor isto se tornou possível, porque do mesmo modo que a morte veio por um só homem a salvação também (Romanos 5.15, João 3.16).

Quando deparamos com a ideia de que fomos considerados culpados por causa do pecado de Adão, nossa primeira reação é protestar, pois parece injusto. Afinal, não decidimos realmente pecar, não é? Então porque somos tidos como culpados? será justo que Deus haja assim?, Respondendo a isso, podemos dizer três coisas: (1) todos que protestam se isso injusto também cometeram voluntariamente muitos pecados efetivos, dos quais Deus também nos considera culpados. Essa sera a base fundamental do nosso julgamento no ultimo dia, pois Deus “retribuirá a cada um segundo o seu procedimento” (Romanos 2.6) e “aquele que faz injustiça recebera em troco a injustiça feita” (Colossenses 3.25). (2) Além disso, alguns argumentam o seguinte: “Se qualquer um de nós estivesse no lugar de Adão, também teria pecado como ele, como o demonstra a nossa subsequente rebeldia contra Deus”.

Acho provável que isso seja verdade, más não me parece um argumento concludente, pois faz suposições demais sobre o que iria ou não acontecer. Tal incerteza talvez não ajude muito a reduzir a sensação de injustiça que têm em alguns. (3) A resposta mais convincente à objeção é salientar que, se achamos injusto ser representado por Adão, então devemos também achar injusto que Cristo nos represente e que sua justiça nos seja imputada por Deus. Pois o procedimento que Deus usou foi precisamente o mesmo, e é exatamente isso que Paulo destaca aos romanos 5.12-21: “Porque, como, pela desobediência de um só homem, muitos se tornaram pecadores, assim também, por meio da obediência de um só, muitos se tornarão justos” (Romanos 5.19). Adão, nosso primeiro representante, pecou – e Deus nos considerou culpados. Mas Cristo, representante de todos que nele creem, obedeceu perfeitamente a Deus – e Deus nos considerou justos. Esse é simplesmente o modo como Deus estabeleceu que a raça humana viveria. Deus considera a raça humana como um todo orgânico, uma unidade, representada por Adão, como cabeça. E Deus também considera a nova raça dos cristãos, os redimidos por Cristo, como um todo orgânico, uma unidade representada por Cristo, como cabeça do seu povo. (Fonte: Teologia Sistemática – Wayne Grudem) Aqueles que ainda não aceitaram Jesus como único e suficiente salvador em concupiscência estão, e infelizmente não há outro fim para as suas almas se não se arrependerem, por mais que alguém argumente que não tem pecado, ou quem sabe até que não faz nenhum mal para ninguém então não precisa de Jesus.
Com base neste estudo que acabamos de analisar percebemos que não é bem por este caminho, todos nós temos pecados seja herdado ou seja cometido por nós mesmos, e mais do que nunca precisamos de um Salvador, estamos ao findar os tempos poucos dias são os que restam ainda para a geração humana oque há de vir vira, e não tardara.

Conclusão 

Com certeza, a maior consequência da queda de Adão e Eva foi o pecado que herdamos dela, más para vitória de todo aquele que crê em Jesus é que a partir do Messias o Filho de Deus temos a oportunidade de tirar essa natureza caída nossa, e se levantar com a força do Espirito Santo.

Extraído de:  https://enfoquebiblico.com.br/as-consequencias-da-queda-dohomem-genesis-3-6-2/ 


                             O olhar de Jesus na perspectiva da Queda 


A Queda. responde aos dilemas do homem: por que há tanto sofrimento, mazelas, doença e morte no mundo? 

      O livro de Genesis registra que, embora tenham sido criados por Deus como seres perfeitos, com livre arbítrio, inocência e pureza, o primeiro casal, Adão e Eva, resolveram quebrar o pacto e desobedecer ao mandamento divino (Gn 2:15-17; 3.6), ao comerem do fruto da árvore do conhecimento do bem e do mal. Eles ultrapassaram o limite moral estabelecido por Deus, provocando aquilo que a teologia chama de Queda, a condição decaída do homem em relação ao Criador, decorrente de um ato espontâneo de desobediência e rebelião.
A narrativa bíblica apresenta os efeitos catastróficos da rebeldia dos primeiros humanos. A Queda trouxe em primeiro lugar separação de Deus. Depois de ter pecado, Adão sentiu medo e tentou esconder-se Dele (Gn. 3.10), em virtude do sentimento de culpa - o alerta da consciência de ter transgredido a lei. É nesse sentido que John Stott afirma: “O pecado não somente separa; ele escraviza. Além de nos afastar de Deus, ele também nos mantém cativos” (1) , do medo, da ansiedade, da depressão, das angústias. Segundo, a Queda provocou o afastamento do primeiro casal. Adão colocou a culpa do pecado em Eva, que por sua vez apontou para a serpente (v. 12, 13). Terceiro, a Queda afetou toda a natureza, injetando desordem no Universo; o trabalho passou a ser realizado com maior dificuldade, pois a terra passou a produzir espinhos e cardos (v.18). Sendo assim, o “trabalho que originalmente era criativo e satisfatório, se tornaria uma questão de fatigante labuta e trabalho pesado” (2). Em outras palavras, toda a criação foi atingida pelos efeitos do pecado. No carta aos Romanos 8.20-22 Paulo explica: “Porque a criação ficou sujeita à vaidade, não por sua vontade, mas por causa do que a sujeitou. Na esperança de que também a mesma criatura será libertada da servidão da corrupção, para a liberdade da glória dos filhos de Deus. Porque sabemos que toda a criação geme e está juntamente com dores de parto até agora”.

A consequência mais grave da Queda, no entanto, foi o decreto da morte do ser humano, tanto física quanto espiritual. Deus já havia dito que se comessem do fruto da árvore da
ciência do bem e do mal, certamente morreriam (Gn. 2.17). Em outras palavras, a morte é o resultado do juízo divino sobre a desobediência. Pela morte física, o homem voltou à condição de pó da terra (Gn 3.19). Paulo diz que “por um homem entrou o pecado no mundo, e pelo pecado, a morte, assim também a morte passou a todos os homens, por isso que todos pecaram”(Rm 5.12). Ainda no livro de Gênesis (4.8) temos o relato do primeiro assassinato, Caim mata Abel. Quanto à morte espiritual, o pecado pôs uma barreira de separação entre Deus e o homem, tanto que Adão e Eva foram lançados para fora do Jardim do Éden, e Deus colocou querubins e uma espada inflamada para guardar o caminho da árvore da vida (Gn. 3.24). A ira de Deus foi lançada e por isso a humanidade está morta espiritualmente em ofensas e pecados (Ef. 2.1).
Alguém pode objetar: se a Queda foi provocada originalmente pela desobediência do primeiro casal, por que toda a humanidade é considerada culpada?. É aqui que entra o conceito teológico de pecado original (peccatun originale); isto é, por uma só ofensa (pecado) adveio o juízo sobre todos os homens para condenação (Rm 5.18). Em virtude da Queda o homem se tornou propenso ao pecado, à corrupção e ao mal. Paulo expressa da seguinte maneira: “Não há um justo, nem um sequer” (Rm 3.10). “Todos pecaram e destituídos estão da glória de Deus” (Rm 3.23). O apóstolo João também corrobora: “Se dissermos que não temos cometido pecado, somos mentirosos”.

A teologia cristã chama de depravação total a inabilidade do homem de, por si só, fazer aquilo que é bom. Em seu estado pecaminoso e caído, escreveu o teólogo holandês Jacó Armínio, o homem não é capaz, de e por si mesmo, quer seja pensar, querer ou fazer o que é, de fato, bom; mas é necessário que seja regenerado e renovado em se intelecto, afeições ou vontade e em todas as suas atribuições, por Deus em Cristo através do Espírito Santo, para que seja capaz de corretamente compreender, estimular, considerar, desejar e realizar o que que seja verdadeiramente bom (3).

A ideia da Queda e do pecado original no jardim do Éden parecem soar absurdo - e até mesmo infantil - para muitas pessoas. Mas ela é vital para a compreensão da natureza humana e para a interpretação de toda a realidade. O otimismo de algumas teorias filosóficas, com fundamento no pressuposto de que a humanidade é inerentemente boa, e que o mal é causado pela ignorância e falta de educação, tem se mostrado ilusória e
perigosa. Stott lembra que as oportunidades educacionais têm se espalhado rapidamente pelo mundo ocidental e muitos projetos sociais têm sido criados, entretanto, as atrocidades, a corrupção, os conflitos e a opressão insiste em acompanhar a humanidade. O que dizer dos exemplos cotidianos de jovens e adolescentes da classe média alta e rica, que apesar do acesso à educação de qualidade nas melhores escolas e universidades do mundo cometem crimes bárbaros, e o envolvimento na corrupção de políticos e profissionais com boa formação acadêmica?

Os autores Charles Colson e Nancy Pearcey afirmam que a face do mal é assustadoramente comum. Eles dizem isso depois de citar crimes bárbaros cometidos por pessoas aparentemente “normais”, sem qualquer aparência de maldade, como Susan Smith, a mulher que afogou seus dois filhos deixando que o carro caísse num lago com as crianças dentro do veículo; uma criança de 11 anos de idade e outra de 13 que depois de acionarem o alarme de incêndio da escola atiraram nos alunos e professores da escola em que estudavam, à medida que saíam do prédio; ou ainda o caso dos três jovens de Datmouth, Massachusetts, que cercaram um colega da nona séria e o mataram a facadas e, após o ato, sorriram e trocaram cumprimentos batendo as palmas da mão um do outro em pleno ar, como jogadores de basquete celebrando uma boa enterrada na cesta. Colson e Pearcey ainda afirmam que a cobertura da grande mídia dessas crimes oferece todas as respostas convencionais: pobreza (mas a maioria dos matadores era da classe média), raça (mas maioria é branca), infância complicada (mas milhões de crianças no mundo todo vêm de circunstancia de desaforáveis e nunca cometeram crimes) (4).

No Brasil, ao menos dois casos ilustram essa realidade sombria. O primeiro envolvendo a jovem Suzane Louise Von Richthofen que, juntamente com os irmãos Daniel Cravinhos e Christian Cravinhos, planejou com requinte de crueldade a morte de seus pais Manfred Albert von Richthofen e Marísia enquanto dormiam, na noite de 31 de outubro de 2012. O outro caso ocorreu em 28 de março de 2008, envolvendo a morte da menina Isabella de Oliveira Nardoni, de cinco anos de idade, arremessada do sexto andar do Edifício London, em São Paulo, pelo pai, Alexandre Nardoni, e pela madrasta da criança, Anna Carolina Jatobá. Em ambos os episódios os crimes foram cometidos por pessoas da classe média, com boa educação e sem qualquer problema de ordem psicológica.


A razão para se esquivar da explicação cristã para todos esses problemas é a temível palavra pecado. A sociedade pós-moderna, relativista e hedonista do tempo presente, rejeita por completo a ideia da responsabilidade moral. Nada obstante, ela precisa se voltar para o pressuposto bíblico do pecado original e da tendência para a maldade, como diz Paulo em Romanos 7.15 (“Porque o que faço não o aprovo; pois o que quero isso não faço, mas o que aborreço isso faço), a fim de conferir ordem e segurança para a sociedade. Exemplo disso é que os estados modernos partem da conceito básico que o homem, naturalmente, é falível e propenso à corrupção, daí a necessidade da limitação do poder e controle por parte de terceiros e pela própria sociedade. A estrutura social, jurídica e econômica deve ser estabelecida de tal forma que o poder não seja centralizado ou fique nas mãos de um pequeno grupo de pessoas, reclamando poder absoluto. Jónatas Machado enfatiza que o problema da corrupção moral da humanidade não tem sido negligenciado nem subestimado no mundo jurídico e, mais especificamente, ele tem sido um elemento presente no pensamento republicano desde a Antiguidade, com a defesa de um governo limitado por direitos fundamentais, do principio da separação dos poderes e da existência de controles internos e externos à atuação estatal, com fundamento da doutrina cristã da Queda . Até mesmo os direitos fundamentais devem ser limitados por valores supraindividuais, pois eles não significam o direito de se criar as suas próprias normas morais e de conduzir de acordo com elas em todas as circunstâncias, sob pena de anarquia e anomia (5).

Com efeito, no teste da realidade somente a cosmovisão cristã consegue responder satisfatoriamente ao problema da humanidade. A doutrina do pecado original, alguém disse, é a única filosofia validada por 35 séculos de história humana registrada . A corrupção, o egoísmo, a maldade, a mentira, a usurpação estão no cerne da alma humana, depois da Queda. Para comprovar, abra qualquer jornal diariamente ou assista ao noticiário da noite, para se dar conta da quantidade de crimes bárbaros, chocantes e sem motivos aparentes, que expõe a maldade do ser humano.
Enquanto isso:

Por contraste, a cosmovisão do “iluminismo” provou ser totalmente irracional e intolerável. A negação de nossa natureza pecaminosa e o consequente mito utópico não conduz a uma experiência social beneficente, mas à tirania. A confiança de que os seres humanos são aperfeiçoáveis provê a justificação para ter aperfeiçoá-los... não importa o que precisar. E com Deus fora do quadro, os que estão no poder não se sentem responsáveis diante de qualquer autoridade mais elevada. Eles podem usar qualquer meio necessário, não imporá quão brutal ou coercitivo, para remodelar as pessoas para ajustar-se às suas noções de sociedade perfeita. (6)

A VISÃO DE JESUS 

Mas será que Jesus também encarava a humanidade nessa perspectiva da queda e do pecado original? A resposta é sim, pois em diversas ocasiões de sua vida e ministério o vemos alertar para a maldade do homem, seus pecados e mazelas, não como fruto do meio, mas da própria natureza humana decaída e afastada de Deus. No capítulo três do evangelho de João a Bíblia registra a história de Nicodemos, homem de posição elevada em Israel que, depois de ouvir e ver os milagres realizados por Jesus, foi se encontrar com ele, dizendo: “Rabi, bem sabemos que és mestre vindo de Deus, porque ninguém pode fazer estes sinais que tu fazes, se Deus não for com ele”. Ao que Jesus lhe respondeu: “Na verdade, na verdade te digo que aquele que não nascer de novo não pode ver o Reino de Deus”. Duvidoso, Nicodemos perguntou: “Como pode um homem nascer, sendo velho? Porventura, pode tornar a entrar no ventre de sua mãe e nascer?”. Mas, Jesus respondeu: “Aquele que não nascer da água e do Espírito não pode entrar no Reino de Deus; o que é nascido da carne é carne, e o que é nascido do Espírito é espírito”.

A ênfase de Jesus sobre a necessidade de nascer de novo é muito clara: “aquele que não nascer de novo não pode ver o Reino de Deus”. A palavra “aquele” indica que o novo nascimento é uma necessidade universal, para todas as pessoas indistintamente, como condição para ver o Reino de Deus. Ora, somente é necessário nascer de novo se o primeiro nascimento - natural - possuir algum problema grave. Por isso as Escrituras chamam aqueles que ainda não (re)nasceram de homem natural (1Co 2.14), que não compreende as coisas do Espírito. Ao ensinar os seus discípulos o Mestre afirmou que o espírito é o que vivifica, a carne para nada aproveita (Jo 6.23).

O termo empregado para designar esse novo nascimento é regeneração, a nova vida em Cristo que somente pode ser alcançada pela graça do Espírito. Charles Spurgeon lembra que ninguém é regenerado pelo seu próprio esforço. “Uma pessoa pode mudar bastante, e isto é muito bom; que todos o façam. Uma pessoa pode rejeitar todos os maus hábitos, esquecer os vícios em que andava e controlar suas ações más; ninguém no mundo, porém, pode fazer-se nascer de Deus. Por mais que se esforce, jamais conseguirá realizar o que transcende o seu poder.... o maior esforço da carne não atingirá este patamar, de nascer do Espírito de Deus”. (7)
Sem a regeneração, portanto, o homem continua afastado de Deus e sujeito aos efeitos do pecado e à condenação divina decorrente da Queda. No capítulo três do evangelho de João, ainda na explicação a Nicodemos, Jesus diz:
Porque Deus enviou o seu Filho ao mundo, não para que condenasse o mundo, mas para que o mundo fosse salvo por ele. Quem crê nele não é condenado; mas quem não crê já está condenado, porquanto não crê no nome do unigênito Filho de Deus. E a condenação é esta: Que a luz veio ao mundo, e os homens amaram mais as trevas do que a luz, porque as suas obras eram más. Porque todo aquele que faz o mal odeia a luz, e não vem para a luz, para que as suas obras não sejam reprovadas. (Jo 3.16-20)

O trecho nos mostra que a condenação já foi decretada e não decorre de algo que a pessoa faça. Quem não crê já está condenado, diz o texto. Essa mesma ideia está presente em João 5.24: “Na verdade, na verdade vos digo que quem ouve a minha palavra, e crê naquele que me enviou, tem a vida eterna, e não entrará em condenação, mas passou da morte para a vida”. Por conta disso é que em diversas oportunidades Jesus fala sobre o inferno (Mt 5.22; 11.23; Lc 12.5) e a fornalha de fogo onde haverá prato e ranger de dentes (Mt 8.12; 13.42; 22.13).

Isso nos leva a compreender que a visão de Jesus sobre o homem não é romantizada, mas realista. Ele considera a incompletude, a pecaminosidade e a corrupção inerente ao ser humano. Por isso ele afirma: Sem mim, nada podeis fazer (Jo 15.5); Eu sou o caminho, e a verdade e a vida; ninguém vem ao Pai senão por mim (Jo 14.6). A crença em Jesus altera, por assim dizer, o status, a condição, da pessoa perante Deus, trazendo-lhe salvação, como veremos posteriormente, ao tratarmos da redenção.


Extraído de: http://www.cpadnews.com.br/blog/valmirnascimento/enfoque-cristao/112/oolhar-de-jesus-na-perspectiva-da-queda.html 


FONTE :


CAPÍTULO OITO

Origem, Natureza e Conseqüências do Pecado


OS COMEÇOS DO PECADO

A Bíblia refere-se a um evento nos recônditos mais distantes do tempo, além da experiência humana, quando o pecado se tornou uma realidade.13 Uma criatura extraordinária, a serpente, já estava confirmada na iniqüidade antes de "o pecado entrar no mundo" através de Adão (Rm 5.12; ver Gn 3).14 Essa antiga serpente aparece em outros lugares como o grande dragão, Satanás e o diabo (Ap 12.9; 20.2). O diabo tem andado pecando e assassinando desde o princípio (Jo 8.44; 1 Jo 3.8). O orgulho (1 Tm 3.6) e uma queda de anjos (Jd 6; Ap 12.7-9) também se associam a essa catástrofe cósmica.15

 As Escrituras também nos ensinam a respeito de outra queda: Adão e Eva foram criados "bons" e colocados num jardim idílico, no Eden, desfrutando de estreita comunhão com Deus (Gn 1.26 - 2.25). Por não serem divinos e porque eram capazes de pecar, era necessária uma contínua dependência de Deus. Semelhantemente, precisavam comer regularmente da árvore da vida.16 Isto nos é sugerido pelo convite a comer de todas as árvores, inclusive da árvore da vida, antes da Queda (2.16), e pela rigorosa proibição depois desta (3.22,23). Houvessem obedecido, teriam sido frutíferos e alegres para sempre (1.28-30). Alternativamente, após um período de prova, poderiam conseguir um estado mais permanente de imortalidade, mediante a trasladação para o Céu (Gn 5.21-24; 2 Rs 2.1-12) ou pela ressurreição do corpo sepultado na terra (cf. os crentes, 1 Co 15.35-54).

Deus permitiu que o Eden fosse invadido por Satanás, o qual tentou Eva com astúcia (Gn 3.1-5). Desconsiderando a Palavra de Deus, Eva entregou-se ao desejo por beleza e sabedoria. Tomou do fruto proibido, ofereceu-o ao seu marido e juntos comeram-no (3.6). Eva fora enganada pela serpente, mas Adão parece ter pecado em plena consciência (2 Co 11.3; 1 Tm 2.14; Deus concorda tacitamente com esse fato em Gn 3.13-19). É possível que Adão tenha recebido do próprio Deus a proibição de comer da árvore e que Eva a tenha ouvido somente através do marido (Gn 2.17; cf. 2.22). Adão, portanto, tinha mais responsabilidade diante de Deus, e Eva era mais suscetível diante de Satanás (cf. Jo 20.29). Talvez seja esta a explicação da ênfase que a Bíblia atribui ao pecado de Adão (Rm 5.12-21; 1 Co 15.21,22), embora, na realidade, Eva tenha pecado primeiro. Finalmente, é crucial observar que o pecado deles começou na sua livre escolha moral, e não na tentação (a que poderiam ter resistido: 1 Co 10.13; Tg 4.7). Isto é, embora a tentação os incentivasse a pecar, a serpente não colheu o fruto tampouco os forçou a comê-lo. O casal optou por assim fazer.

 O primeiro pecado da humanidade abrangeu todos os demais pecados: a afronta e desobediência a Deus, o orgulho, a incredulidade, desejos errados, o desviar outras pessoas, assassinato em massa da posteridade e a submissão voluntária ao diabo. As consequências imediatas foram numerosas, extensivas e irônicas (observe cuidadosamente Gn 1.26 - 3.24). O relacionamento entre Deus e os homens, de franca comunhão, amor, confiança e segurança, foi trocado por isolamento, autodefesa, culpa e banimento. Adão e Eva, bem como o relacionamento entre eles, entraram em degeneração. A intimidade e a inocência cederam lugar à acusação (jogavam a culpa um sobre o outro). Seu desejo rebelde pela independência resultou em dores de parto, labuta e morte. Seus olhos realmente foram abertos, e eles conheceram o bem e o mal (mediante um atalho), mas era pesado esse conhecimento sem o equilíbrio de outros atributos divinos, como o amor, a sabedoria e o conhecimento. A criação, confiada aos cuidados de Adão, foi amaldiçoada, gemendo pela libertação dos resultados da infidelidade dele (Rm 8.20,22). Satanás, que oferecera a Eva às alturas da divindade e prometera ao homem e à mulher que estes não morreriam, foi mais amaldiçoado que todas as criaturas e condenado à destruição eterna pela descendência de Eva (ver Mt 25.41)

• Finalmente, o primeiro casal humano trouxe a morte a todos os seus filhos (Rm 5.12-21; 1 Co 15.20-28).

O Midrash judaico entende a advertência divina de que a morte viria quando (literalmente "no dia em que") comessem da árvore (Gn 2.17) como uma referência à morte física de Adão (Gn 3.19; 5.5), pois um dia, aos olhos de Deus, é como mil anos (SI 90.4) - e Adão viveu apenas 930 anos (Gn 5.5). Outros a entendem como uma consequência natural do afastamento da árvore da vida. Muitos rabinos judaicos defendiam a ideia de que Adão nunca foi imortal e que sua morte teria chegado imediatamente se Deus, em sua misericórdia, não a tivesse adiado. A maioria sustenta que a morte espiritual - ou a separação de Deus - ocorreu naquele mesmo dia. 17

Não obstante a condenação, Deus graciosamente confeccionou túnicas de peles para Adão e Eva, a fim de substituir os aventais de folhas que eles haviam providenciado por sua própria iniciativa (Gn 3.7,21). 18

O PECADO ORIGINAL: UMA ANÁLISE BÍBLICA

 As Escrituras ensinam que o pecado de Adão afetou muito mais que a ele próprio (Rm 5.12-21; 1 Co 15.21,22). Esta questão é chamada pecado original e postula três perguntas: até que ponto, por quais meios e em que base o pecado de Adão é transmitido ao restante da humanidade? Qualquer teoria do pecado original precisa responder as três perguntas e satisfazer os seguintes critérios bíblicos:

 Solidariedade. Toda a humanidade, em algum sentido, está unida ou vinculada, como numa única entidade, a Adão (por causa dele, todas as pessoas estão fora da bemaventurança do Éden; Rm 5.12-21; 1 Co 15.21,22).

Corrupção. Por estar à natureza humana tão deteriorada pela Queda, pessoa alguma tem a capacidade de fazer o que é espiritualmente bom sem a ajuda graciosa de Deus. A esta condição chamamos corrupção total - ou depravação - da natureza. Não significa que as pessoas não possam fazer algum bem aparente, apenas que nada do que elas façam será suficiente para torná-las merecedoras da salvação. E este ensino não é exclusivamente calvinista. Até mesmo Armínio (mas não todos os seus seguidores) descreveu o "livre-arbítrio do homem em favor do verdadeiro Bem", na condição de "preso, destruído e perdido... não tem nenhuma capacidade a não ser aquela despertada pela graça divina". A intenção de Armínio, assim como depois a de Wesley, não era manter a liberdade humana a despeito da Queda, mas asseverar que a graça divina era maior até mesmo que a destruição provocada pela Queda. 19

 Assim a corrupção é reconhecida na Bíblia. Salmos 51.5 menciona Davi sendo concebido em pecado, ou seja: seu pecado remontava à concepção. Romanos 7.7-24 sugere que o pecado, embora morto, estava em Paulo desde o princípio. Mais categoricamente, Efésios 2.3 declara que todos somos "por natureza filhos da ira". "Natureza" (phusis) fala da realidade fundamental ou origem de uma coisa. Daí ser corrupto o "conteúdo" de todas as pessoas.20 Posto que a Bíblia ensina estarem corrompidos os adultos e que cada um produz o seu igual (Jó 14.4; Mt 7.17,18; Lc 6.43), os seres humanos forçosamente produzem filhos corruptos. A natureza corrupta produzindo filhos corruptos é a melhor explicação da universalidade do pecado. Embora vários trechos dos Evangelhos se refiram à humildade e à receptividade espiritual das crianças (Mt 10.42; 11.25,26; 18.1-7; 19.13-15; Mc 9.33-37,41,42; 10.13-16; Lc 9.46- 48; 10.21; 18.15-17), nenhum as afirma incorruptas. Realmente, algumas crianças são até mesmo endemoninhadas (Mt 15.22; 17.18; Mc 7.25; 9.17).

A pecaminosidade de todos. Romanos 5.12 declara que "todos pecaram". Romanos 5.18 diz que mediante um só pecado todos foram condenados, o que subentende que todos pecaram. Romanos 5.19 diz que mediante o pecado de um só homem todos foram feitos pecadores. Textos que falam da pecaminosidade universal não fazem exceções à infância. Crianças impecáveis seriam salvas sem Cristo, mas isto é antibíblico (Jo 14.6; At 4.12).

Ser merecedor de castigo também indica o pecado. Ser merecedor de castigo. Todas as pessoas, até mesmo as crianças pequenas, estão sujeitas ao castigo. "Filhos da ira" (Ef 2.3) é um semitismo que indica o castigo divino (cf. 2 Pe 2.14).21 As imprecações bíblicas contra crianças (SI 137.9) indicam esse fato. E Romanos 5.12 diz que a morte física (cf. 5.6-8,10,14,17) chega a todos porque todos têm pecado, aparentemente até as crianças. As crianças, antes da idade de responsabilidade ou consentimento moral (a idade cronológica provavelmente varia com o indivíduo), não são pessoalmente culpadas. As crianças não têm o conhecimento do bem e do mal (Dt 1.39; cf. Gn 2.17). Romanos 7.9-11 declara que Paulo "vivia" até à chegada da lei mosaica (cf. 7.1), a qual fez "reviver o pecado", que o enganou e matou espiritualmente.

A salvação das crianças. Embora as crianças sejam consideradas pecadoras e, portanto, passíveis do inferno, isso não significa que serão realmente mandadas para lá. Várias doutrinas indicam diferentes mecanismos para a salvação de algumas ou de todas: a eleição condicional dentro do calvinismo; o batismo das crianças dentro do sacramentalismo; a fé preconsciente; a presciência de Deus de como a criança teria vivido; a graciosidade específica de Deus para com as crianças; a aliança implícita com uma família crente (talvez incluindo a "lei do coração", Rm 2.14,15), que toma o lugar da aliança com Adão; a graça preveniente (do latim, "que vem antes da" salvação) que oferece a expiação a todos que não têm idade para a prestação de contas. De qualquer maneira, podemos estar certos de que o "Juiz de toda a terra" faz tudo com justiça (Gn 18.25).

 O paralelo entre Adão e Cristo. Romanos 5.12-21 e, em grau menor, 1 Coríntios 15.21,22 enfatizam um nítido paralelo entre Adão e Cristo. Romanos 5.19 é especialmente relevante: "Porque, como, pela desobediência de um só homem [Adão], muitos foram feitos [kathistêmi] pecadores, assim, pelo obediência de um [Cristo] muitos serão feitos [kathistêmi] justos". No Novo Testamento, kathistêmi tipicamente se refere a uma pessoa nomeando outra para um cargo. Nenhum ato propriamente dito é exigido para receber o cargo. Logo, pessoas que não haviam pecado especificamente poderiam ser feitas pecadoras por Adão. Paralelamente à obra de Cristo, Adão, por um ato legal, pode qualificar as pessoas como pecadoras, mesmo não havendo pecado da parte delas. (Que a pessoa precisa "aceitar Cristo" para ser salva não pode fazer parte desse paralelo, pois crianças incapazes de conscientemente aceitar Cristo podem ser salvas; 2 Sm 12.23).

Nem todos são iguais a Adão. Algumas pessoas claramente não pecaram da mesma maneira que Adão, mas cometeram outros pecados e morreram (Rm 5.14). 22 O pecado de um só homem. Em Romanos 5.12, Paulo declara repetidas vezes que o pecado de um só homem trouxe condenação e morte (ver também 1 Co 15.21,22) a todas as pessoas.

A terra amaldiçoada. Alguma base precisa ser identificada para a maldição lançada por Deus à Terra (Gn 3.17-18). A impecabilidade de Cristo. É necessário reconhecer que Cristo possuía natureza humana completa, mas totalmente protegida do pecado. A justiça de Deus. A justiça de Deus, que permitiu ao pecado de Adão passar a outras pessoas, precisa ser preservada.

O PECADO ORIGINAL: UMA ANÁLISE TEOLÓGICA

Muitas tentativas foram feitas para construir um modelo ou teoria teológica que encaixassem esses parâmetros complexos. Algumas das teorias mais relevantes são consideradas aqui.23

 Conceitos judaicos. Três correntes principais são identificadas no judaísmo. A teoria predominante é a das duas naturezas: a boa - yetser tov - e a má - yetser ra' (cf. Gn 6.5; 8.21). Os rabinos debatiam sobre a idade em que esses impulsos se manifestam, e se o impulso mau é realmente iniquidade ou apenas instinto natural. Seja como for, os maus são controlados pelo impulso mau, ao passo que os bons o controlam. A segunda teoria diz respeito aos "vigilantes" (Gn 6.1-4), anjos cujo dever era fiscalizar a humanidade, mas que acabaram pecando com as mulheres. Finalmente, há conceitos de pecado original que antecipam o Cristianismo. Mais dramaticamente, o Midrash explica, por analogia, a morte do justo Moisés. Uma criança pergunta ao rei por que ela está na prisão. O soberano responde que é por causa do pecado da mãe dela. Semelhantemente, Moisés morreu por causa do primeiro homem que trouxe a morte ao mundo. Resumindo, o pecado original não é uma inovação paulina. Pelo contrario, Paulo, inspirado pelo Espírito Santo, desenvolveu-o de conformidade com a revelação progressiva. 24

 O agnosticismo. Há os que sustentam não haver evidências bíblicas suficientes para uma teoria detalhada do pecado original. Qualquer assertiva quanto à pecaminosidade que vá além de uma conexão entre Adão e a raça humana é considerada especulação filosófica.25 Embora esteja correto que a doutrina não deve basear-se em especulações extra-bíblicas, é válida a dedução das Escrituras.

O pelagianismo. O pelagianismo enfatiza fortemente a responsabilidade pessoal na oposição à frouxidão moral. Pelágio (c. de 361 - c. de 420 d.C.) ensinava que a justiça de Deus não permitiria a transferência do pecado de Adão a outras pessoas e que, portanto, todas as pessoas nascem sem pecado e com total livre-arbítrio. O pecado é disseminado exclusivamente pelo mau exemplo. Por isso há uma possibilidade real de vidas sem pecado, e elas se acham dentro e fora da Bíblia. Tudo isso, porém, é antibíblico, além de anular as conexões que a Bíblia faz entre Adão e a humanidade. A morte de Cristo é reduzida tão-somente a bom exemplo. A salvação fica sendo meramente boas obras. A vida nova em Cristo não passa da antiga disciplina. Embora o pelagianismo tenha razão quando enfatiza a responsabilidade pessoal, a santidade e o fato de que alguns pecados são aprendidos, o movimento tem sido apropriadamente condenado como heresia. 26

O semipelagianismo. O semipelagianismo sustenta que, embora a humanidade tenha se enfraquecido com a natureza de Adão, sobrou livre-arbítrio suficiente para a iniciativa de ter fé em Deus, e então Ele corresponderá. A natureza enfraquecida é transmitida naturalmente a partir de Adão.27 Porém, como se sustenta a justiça de Deus após permitir que pessoas inocentes recebam uma natureza maculada e como é salvaguardada a natureza impecável de Cristo, ainda não foi bem explicado. Mais importante, em algumas formulações o semipelagianismo ensina que, embora a natureza humana esteja tão enfraquecida pela Queda, a ponto de ser inevitável que as pessoas pequem, a bondade inerente que possuem é suficiente para iniciar a verdadeira fé.

 A transmissão natural ou genética. Essa teoria sustenta que a transmissão da natureza corrupta baseia-se na lei da herança. Toma por certo que as características espirituais são transmitidas da mesma forma que as naturais. Tais teorias mencionam usualmente a transmissão da natureza corrompida, mas não a da culpa. Mesmo assim, não parece haver base adequada para Deus infligir numa alma virtuosa uma natureza corrupta. Nem está claro como Cristo pode ter uma natureza plenamente humana e ao mesmo tempo livre do pecado. 28

A imputação mediada. A imputação mediada entende que Deus imputou culpa aos descendentes de Adão por meios indiretos, ou mediados. O pecado de Adão o fez culpado e, como castigo, Deus corrompeu-lhe a natureza. E, como ninguém da sua posteridade tomou parte na sua ação, nenhum de seus descendentes é culpado. Mesmo assim, recebem a sua natureza como consequência natural de serem descendentes dele (não como julgamento). Porém, antes de cometerem qualquer pecado real ou pessoal (que a sua natureza necessita), Deus os julga culpados de possuir aquela natureza corrompida. 29 Infelizmente, essa tentativa de proteger Deus da inflição injusta da "culpa exclusiva" de Adão à humanidade resulta em acusar Deus de uma injustiça ainda maior - permitir que a corrupção, causadora do pecado, enfraqueça pessoas destituídas de culpa e depois julgá-las culpadas dessa mesma corrupção.

O realismo. O realismo e o federalismo (ver abaixo) são as teorias mais importantes. O realismo sustenta que o "tecido da alma" de todas as pessoas estava real e pessoalmente em Adão ("seminalmente presente", segundo o conceito traduciano da origem da alma) ,30 participando de fato do seu pecado. Cada pessoa é culpada porque, na realidade, cada uma pecou. A natureza da pessoa passa então a ser corrompida por Deus, como julgamento contra aquele pecado. Não há transmissão de pecado, mas a participação total da raça naquele primeiro pecado. Agostinho (354-430) aperfeiçoou a teoria, dizendo que a corrupção era transmitida mediante o ato sexual. Assim, conseguia manter Cristo livre do pecado original, porque Ele nasceu de uma virgem. 31 W. G. T. Shedd (1820—94) acrescenta um argumento mais sofisticado: por baixo da vontade das escolhas de todos os dias há a vontade profunda, a "vontade propriamente dita", que determina a direção que a pessoa segue em última análise. Foi essa vontade profunda que realmente pecou em Adão. 32

O realismo tem pontos fortes. Não apresenta o problema da culpa de terceiros, a solidariedade de Adão e da raça no pecado daquele é levada a sério e parece bem explicada a expressão "todos pecaram", de Romanos 5.12.

Apresenta, no entanto, alguns problemas. O realismo possui todas as fraquezas do traducianismo extremo. O tipo de presença pessoal necessária em Adão e Eva distorce até mesmo Hebreus 7.9,10 (cf. Gn 46.26), a passagem clássica traducianista. A expressão "para assim dizer" (Hb 7.9), em grego, sugere seja entendido figuradamente o que se segue.33 Ideias como a de uma "vontade profunda" tendem a exigir e pressupor um conceito determinista, calvinista, da salvação. O realismo por si só não pode explicar por que ou em que base Deus amaldiçoa a terra.

Portanto, torna-se necessário algo como a aliança. Para a humanidade de Jesus ser isenta de pecado, Ele deve ter cometido o primeiro pecado em Adão, sendo posteriormente purificado; ou Ele não estava mesmo presente em Adão; ou Ele estava presente mas não pecou, e seus antepassados humanos diretos permaneceram sem pecado em suas gerações. Cada uma dessas opiniões apresenta dificuldades (uma alternativa é sugerida adiante). A ideia de que todos pecaram pessoalmente parece contradizer o conceito de que o pecado de um só homem fez de todos pecadores (Rm 5.12,15-19). Posto que todos pecaram em Adão, com Adão e como Adão, sugere terem pecado segundo o padrão do primeiro homem, o que contraria 5.14.

O federalismo. A teoria federal da transmissão sustenta que a corrupção e a culpa se estendem a toda a humanidade porque Adão era a cabeça da raça num sentido representativo, governamental ou federal quando pecou. Toda pessoa está sujeita à aliança entre Adão e Deus (a aliança adâmica - ou aliança das obras - por contraste à aliança da graça). Faz-se uma analogia com uma nação que declara guerra. Seus cidadãos sofrem, quer concordem com ela ou a condenem e mesmo sem terem participado da decisão. Os descendentes de Adão não estão pessoalmente culpados até realmente pecarem, mas vivem um estado de culpa e são passíveis do inferno por terlhes sido imputado - de conformidade com a aliança - o pecado de Adão. Por causa desse estado, Deus os castiga com a corrupção. Muitos federalistas, portanto, distinguem entre o pecado herdado (a corrupção) e o imputado (a culpa) da parte de Adão. A maioria dos federalistas são criacionistas no tocante à origem da alma, mas o federalismo não é incompatível com o traducianismo.34 A aliança com Adão incluía sua posição de despenseiro da criação - a base perfeita para Deus amaldiçoar a terra. Cristo, como cabeça de uma nova aliança e de uma nova raça, está isento do julgamento da corrupção sendo, portanto, impecável.

 O federalismo tem pontos fortes. A aliança, como base bíblica para a transmissão do pecado, concorda razoavelmente com Romanos 5.12-21 e fornece mecanismos para a maldição da terra e para proteger Cristo do pecado. No entanto, apresenta algumas fraquezas. Romanos 7 deve descrever somente o conhecimento que Paulo tomou de sua própria natureza pecaminosa, e não a experiência física do pecado que o matava. Mais importante que isso, a transmissão da "culpa exclusiva" de Adão é frequentemente considerada injusta. 35

Uma teoria integrada Várias das teorias acima podem ser combinadas para formar uma abordagem integrada, resultando numa teoria que faz distinção entre a pessoa individual e a natureza pecaminosa da carne. Quando Adão pecou separou-se de Deus, e isto produziu nele - como indivíduo e na sua natureza - a corrupção (inclusive a morte). Pelo fato de ele conter toda a natureza genérica, ela toda ficou corrompida. A natureza genérica é transmitida naturalmente ao aspecto individual da pessoa, o "próprio-eu" (como em Rm 7).36 A aliança adâmica é a justa base dessa transmissão e também da maldição contra a terra. O "eu" não é corrompido nem culpado por causa da natureza genérica, mas a natureza genérica o impede de agradar a Deus (Jo 14.21; 1 Jo 5.3). Ao chegar à idade da responsabilidade pessoal, o "eu", lutando contra a natureza, ou corresponde à graça preveniente de Deus na salvação ou realmente peca ao desconsiderá-la, de modo que o mesmo "eu" fica separado de Deus, tornando-se culpado e corrupto. Deus continua estendendo a mão para o "eu" mediante a graça preveniente, e o ele poderá aceitar a salvação.

Logo, Romanos 5.12 pode dizer que "todos pecaram" e que todos estão corrompidos e necessitando de salvação, mas nenhuma culpa é infligida àqueles que ainda não pecaram na realidade Isto é consistente com a luta descrita em Romanos 7. Nem todas as pessoas pecam da mesma forma que Adão (Rm 5.14), mas o pecado de um só homem realmente traz a morte e transforma todos em pecadores. E o faz mediante a aliança adâmica, um mecanismo paralelo à obra de Cristo, que é tornar justos os pecadores (Rm 5.12-21). Evita-se o semipelagianismo extremado, porque o "eu" é capaz reconhecer a sua necessidade, mas não pode agir com fé por causa da natureza humana genérica (Tg 2.26). Sendo o ficar separado de Deus a causa da corrupção, a união entre Cristo e sua parte da natureza genérica restaura-a à santidade. Por ter o Espírito Santo chegado a Maria na concepção do "eu" humano de Cristo, este era pré-responsável e, portanto, impecável. Essa disposição é justa, pois Cristo é o cabeça de uma nova aliança. Semelhantemente, a união entre o Espírito Santo e o crente na salvação é regeneradora.

Embora as Escrituras não afirmem explicitamente que a aliança é a base para a transmissão, há muitas evidências em favor dessa ideia. As alianças fazem parte fundamental do plano de Deus (Gn 6.18; 9.9-17; 15.18; 17.2-21; Êx 34.27, 28; Jr 31.31; Hb 8.6,13; 12.24). Houve uma aliança entre Deus e Adão. Oséias 6.7 - "Mas eles traspassaram o concerto, como Adão" - refere-se muito provavelmente a essa aliança, uma vez que a tradução alternativa ("homens", NIV margem) é tautológica. Hebreus 8.7, que diz ter sido a aliança com Israel a primeira, não exclui a aliança com Adão, pois o contexto indica que se trata da primeira aliança entre Deus e Israel (e não com a humanidade inteira). E há uma aliança (a Bíblia ARC emprega "pacto", "concerto" e "aliança" como sinônimos) explícita anterior, com Noé (Gn 6.18; 9.9-17). As alianças bíblicas são obrigatórias às gerações futuras, quer para o bem (Noé, Gn 6.18; 9.9-17) quer para o mal Josué e o gibeonitas, Js 9.15). As alianças são frequentemente a única base observável para o julgamento (os israelitas que morreram em Ai por causa do pecado de Acã em Jericó, Js 7; o sofrimento dos súditos de Davi porque este os numerou, 2 Sm 24). A circuncisão segundo a aliança podia até mesmo acolher crianças estrangeiras na nação de Israel (Gn 17.9-14).

Alguns estudiosos objetam que qualquer teoria que transmita a outras alguma consequências do pecado de Adão é inerentemente injusta, pois lhe imputa o pecado sem fundamento nem base. (Somente o pelagianismo evita totalmente essa objeção, ao tornar todos os seres humanos pessoalmente responsáveis. O "pecado pré-consciente" do realismo detém a maioria das dificuldades.) As alianças, no entanto, constituem base justa para esse tipo de transmissão, pelas seguintes razões: os descendentes de Adão teriam sido tão abençoados por causa do seu bom comportamento como foram amaldiçoados por suas obras más; a aliança certamente é mais justa que a mera transmissão genética; a culpa e as consequências transmitidas pelo concerto são semelhantes aos pecados da ignorância (Gn 20).

Há também o argumento de que Deuteronômio 24.16 e Ezequiel 18.20 proíbem o julgamento de uma geração para outra. Mas outros textos mencionam julgamentos assim (os primogênitos do Egito; Moabe; Ex 20.5; 34.6,7; Jr 32.18). E possível, no entanto, que os dois textos acima se refiram à chefia biológica como base insuficiente para transmissão de julgamento, ao passo que os textos mencionados entre parênteses referem-se a uma base pactuai, adequada à transmissão do julgamento. Alternativamente, segundo a teoria integrada, se a natureza corrompida não é um juízo positivo de Deus, a execução de um castigo pelo pecado do pai realmente não ocorre. Finalmente, quem, mesmo sem corrupção e dentro do Jardim perfeito, se comportaria melhor que Adão, quanto à obediência aos mandamentos de Deus? E, sem dúvida, a suposta "injustiça" do pecado imputado é mais que contrabalançada pelo dom gratuito da salvação em Jesus Cristo, oferecido a todos livremente .

 Embora seja especulativa e não sem algumas dificuldades, uma teoria integrada que utilize a aliança parece explicar boa parte dos dados bíblicos e talvez sugira uma terceira alternativa às teorias predominantes do realismo e do federalismo.

FORÇA E EXTENSÃO DO PECADO

 Conforme indicam a totalidade deste capítulo e o estudo sobre Satanás (cap. 6), uma força maligna real e pessoal está operando no Universo, contra Deus e contra o seu povo. Esse fato sugere a importância crucial do exorcismo, da guerra espiritual e de coisas semelhantes, mas sem o histerismo pouco religioso que tão frequentemente acompanha esses esforços.

O pecado não consiste apenas de ações isoladas, mas também é uma realidade, ou natureza, dentro da pessoa (ver Ef 2.3). O pecado, como natureza, indica a "sede" ou a sua "localização" no interior da pessoa, como a origem imediata dos pecados. Inversamente, é visto na necessidade do novo nascimento, de uma nova natureza a substituir à velha, pecaminosa (Jo 3.3-7; At 3.19; 1 Pe 1.23). Esse fato é revelado na ideia de que a regeneração só pode acontecer de fora para dentro da pessoa (Jr 24.7; Ez 11.19; 36.26,27; 37.1-14; 1 Pe 1.3).

 O Novo Testamento relaciona a natureza pecaminosa com sarx (a "carne"). Embora á palavra originalmente se referisse ao corpo material, Paulo (inovando) equiparou-a à natureza pecaminosa (Rm 7.5-8.13; Gl 5.13,19). Neste sentido, sarxé o centro dos desejos pecaminosos (Rm 13.14; Gl 5.16,24; Ef 2.3; 1 Pe 4.2; 2 Pe 2.10; 1 Jo 2.16). O pecado e as paixões surgem da carne (Rm 7.5; Gl 5.17-21), onde não habita nenhuma coisa boa (Rm 7.18), e os pecadores mais sórdidos dentro da igreja são entregues a Satanás, "para destruição da carne", possivelmente uma enfermidade que os leve ao arrependimento (1 Co 5.5; cf. 1 Tm 1.20). Soma ("corpo") é usado de modo semelhante apenas em algumas ocasiões (Rm 6.6; 7.24; 8.13; Cl 2.11). O corpo físico não é considerado um mal em si mesmo. 31

O hebraico lev, ou levav ("coração", "mente" ou "entendimento"), indica a essência da pessoa. O coração do homem pode ser pecaminoso (Gn 6.5; Dt 15.9; Is 29.13) acima de todas as coisas (Jr 17.9). Pois isso precisa de renovação (SI 51.10; Jr 31.33; Ez 11.19). Dele fluem as más intenções (Jr 3.17; 7.24), e todas as suas inclinações são más (Gn 6.5). O grego kardia ("coração") também indica a vida interior e o próprio-eu. Tanto o mal quanto o bem são dele provenientes (Mt 12.33-35; 15.18; Lc 6.43-45). Pode significar a pessoa essencial (Mt 15.19; At 15.9; Hb3.12). Kardia pode ser duro Mc 3.5; 6.52; 8.17; Jo 12.40; Rm 1.21; Hb 3.8). Assim como sarx, kardia pode ser a origem de desejos errados (Rm 1.24). Da mesma forma a mente (nous) pode ser má nas suas operações (Rm 1.28; Ef 4.17; Cl 2.18; 1 Tm 6.5; 2 Tm 3.8; Tt 1.15) e necessitar de renovação (Rm 12.2). O pecado luta contra o Espírito. A natureza pecaminosa está totalmente contrária ao Espírito e além do controle da pessoa (Gl 5.17; cf. Rm 7.7-25). E morte para o ser humano (Rm 8.7,8; 1 Co 15.50). Dela provém epithumia, a inteira gama de desejos malignos (Rm 1.24; 7.8; Tt 2.12; 1 Jo 2.16). O pecado até mesmo habita dentro da pessoa (Rm 7.17-24; como um princípio ou lei (Rm 7.21,23,25).

Os pecados propriamente ditos começam na natureza pecaminosa, frequentemente como resultado de tentações mundanas ou sobrenaturais (Tg 1.14,15; 1 Jo 2.16). Uma das características mais insidiosas do pecado é a de dar ainda vazão a mais pecado. O pecado, por ser crescimento maligno, avoluma-se por conta própria a proporções fatais, tanto na extensão quanto na intensidade, a não ser quando freado pela purificação no sangue de Cristo. A maneira como o pecado reproduz a si mesmo pode ser vista na Queda (Gn 3. 1-13), na maneira de Caim descer da inveja ao homicídio (Gn 4.1-15) e na concupiscência de Davi, que deu à luz o adultério, o assassínio e gerações de sofrimentos (2 Sm l 1 e 12). Romanos 1.18-32 relata a caminhada descendente da humanidade, desde a rejeição à revelação até sua reprovação por Deus e a consequente perversidade total. Semelhantemente, os "sete pecados mortais" (um catálogo antigo de vícios contrastados com virtudes paralelas) têm sido considerados não somente pecados radicais, como também uma sequência descendente de pecados. 52

O processo de pecado se alimentando de pecado é levado a efeito através de muitos mecanismos. O ambicioso autor da iniquidade, Satanás, é o antagonista principal desse drama maligno. Como governante da presente era (Jo 12.31; 14.30; 16.11; 2 Co 4.4; Ef 2.2), ele tem procurado constantemente enganar, tentar, peneirar e devorar (Lc 22.31-34; 2 Co 11.14; 1 Ts 3.5; 1 Pe 5.8), até mesmo por incitamento direto ao coração (1 Cr 21.1). A inclinação natural da carne, que ainda aguarda a redenção plena, também desempenha o seu papel. As tentações do mundo apelam ao coração (Tg 1.2-4; 1 Jo 2.16). O pecado muitas vezes requer mais pecados para alcançar o seu alvo elusivo, assim como aconteceu a Caim, que tentou esconder de Deus o seu crime (Gn 4.9). O prazer do pecado (Hb 11.25,26) pode reforçar o próprio pecado. Os pecadores provocam as suas vítimas a reagir de modo pecaminoso (observe as exortações contrárias: Pv 20.22; Mt 5.38-48; 1 Ts 5.15; 1 Pe 3.9). Os pecadores seduzem outras pessoas ao pecado (Gn 3.1-6; Ex 32.1; 1 Rs 21.25; Pv 1.10-14; Mt 4.1-11; 5.19; Mc 1.12,13; Lc 4.1-13; 2 Tm 3.6-9; 2 Pe 2.18,19; 3.17; 1 Jo 2.26).53 Os pecadores encorajam outros pecadores ao pecado (SI 64.5; Rm 1.19-32).54 Os indivíduos endurecem seus corações contra Deus, procurando evitar a aflição mental do pecado (1 Sm 6.6; SI 95.8; Pv 28.14; Rm 1.24,26,28; 2.5; Hb 3.7-19; 4.7). Finalmente, o endurecimento do coração por Deus pode facilitar esse processo.

 Nunca se deve confundir tentação com pecado. Jesus sofreu as maiores tentações (Mt 4.1-11; Mc 1.12,13; Lc 4.113; Hb 2.18; 4.15) e permaneceu sem pecado (2 Co 5.21; Hb 4.15; 7.26-28; 1 Pe 1.19; 2.22; 1 Jo 3.5; e as provas da divindade). Além disso, se a tentação fosse pecado, Deus não providenciaria socorro para ajudar a suportá-la (1 Co 10.13). Embora Deus realmente submeta a provas os que são seus (Gn 22.1-14; Jo 6.6) e obviamente permita a tentação (Gn 3), Ele mesmo não tenta (Tg 1.13). Na prática, a Bíblia admoesta a respeito do perigo da tentação e da necessidade de evitá-la e livrar-se dela (Mt 6.13; Lc 11.4; 22.46; 1 Co 10.13; 1 Tm 6.6-12; Hb 3.8; 2 Pe 2.9). A Bíblia contém abundantes descrições de atos pecaminosos e advertências contra eles, inclusive catálogos de vícios (tipicamente em Rm 1.29-31; 13.13; 1 Co 5.10,11; 6.9,10; 2 Co 12.20,21; Gl 5.19-21; Ef 4.31; 5.3-5; Cl 3.5,8; Ap 21.8; 22.15). Essas listas indicam a gravidade do pecado e demonstram sua incrível variedade. No entanto, por si só, podem incitar o desespero mórbido em razão de pecados passados ou futuros. Mais grave ainda, podem ser entendidas no sentido de reduzir o pecado a meras ações, sem se levar em conta sua profundidade como lei, natureza e força dentro da pessoa e do Universo. Nesse caso, a pessoa acabaria vendo apenas os sintomas, sem tomar consciência da própria enfermidade. As Escrituras descrevem muitas categorias de pecados. Podem ser cometidos por incrédulos ou por crentes, sendo que estes dois grupos são lesados pelos pecados e precisam da graça. Os pecados podem ser cometidos contra Deus, contra o próximo, contra o próprio-eu ou contra alguma combinação destes. Em última análise, porém, todo o pecado é contra Deus (SI 51.4; cf. Lc 15.18,21). O pecado pode ser confessado e perdoado. Não sendo perdoado, continuará exercendo o seu domínio sobre a pessoa.

A Bíblia ensina que uma atitude pode ser tão pecaminosa quanto um ato. Por exemplo, a fúria contra alguém pode ser tão pecaminosa quanto o assassinato, e um olhar de concupiscência, tão pecaminoso quanto o adultério (Mt 5.21,22,27,28; Tg 3.14-16). A atitude pecaminosa inutiliza a oração (SI 66.18). O pecado pode ser ativo ou passivo, ou seja, a prática do mal ou a negligência à prática do bem (Lc 10.30-37; Tg 4.17). Os pecados sexuais físicos são lastimáveis para os cristãos, porque abusam o corpo do Senhor na pessoa do crente e porque o corpo é o templo do Espírito Santo (1 Co 6.12- 20).

Os pecados podem ser cometidos por ignorância (Gn 20; Lv 5.17-19; Nm 35.22-24; Lc 12.47-48; 23.34).55 O salmista, com muita sabedoria, pede ajuda para discerni-los (SI 19.12). Parece que aqueles que só possuem a lei da natureza (Rm 2.13-15) cometem pecados da ignorância (At 17.30). Todas as pessoas são, até certo grau, responsáveis e sem desculpa (Rm 1.20), e a ignorância deliberada, como a de Faraó, proveniente do contínuo endurecimento do próprio coração, é condenada vigorosamente. O pecado secreto é tão iníquo quanto o praticado em público (Ef 5.11-13). Assim acontece especialmente no caso da hipocrisia, uma forma de pecado secreto no qual a aparência exterior serve de máscara à realidade interior (Mt 23.1-33; note o v. 5).

Os pecados cometidos abertamente, no entanto, tendem à presunção e à subversão da comunidade (Tt 1.9-11; 2 Pe 2.1,2). Muitos rabinos acreditavam que o pecado secreto também era, na prática, uma negação da onipresença de Deus. 56

Os pecados cometidos por fraqueza têm origem no desejo dividido, usualmente após uma luta contra a tentação (Mt 26.36-46; Mc 14.32-42; Lc22.31-34,54-62; talvez Rm 7.14-25). Os pecados presunçosos são cometidos com intenção profundamente iníqua, ou "à mão levantada" (Nm 15.30). Os pecados de fraqueza constituem menor afronta a Deus que os presunçosos. Indicam esse fato a severidade com que as Escrituras consideram os pecados presunçosos (Ex 21.12-14; SI 19.13; Is 5.18-25; 2 Pe 2.10) e a ausência de expiação para eles na lei mosaica (não no Evangelho, porém). Mesmo assim, a distinção entre fraqueza e presunção jamais deve ser usada como desculpa para tratar levianamente qualquer pecado.

 A teologia católica romana faz distinção entre pecados veniais (lat. vénia - "favor", "perdão", "bondade") e pecados mortais. Nos pecados veniais (assim como nos de fraqueza), a vontade, embora consinta ou concorde com o ato do pecado, recusa-se a alterar sua identidade piedosa fundamental. Os pecados veniais podem levar aos pecados mortais. Entretanto, estes envolvem uma reorientação radical da pessoa, que leva a um estado de rebelião contra Deus e perda da salvação, embora a possibilidade do perdão permaneça. A verdadeira distinção entre esses tipos de pecado não parece acharse na sua própria natureza, mas na natureza da salvação. O catolicismo acredita não serem os pecados inerentemente veniais, mas que se tornam em tais porque os fiéis possuem uma retidão que, em grande medida, mitiga o efeito dos pecados menores. Nessa qualidade, não são diretamente prejudiciais ao relacionamento entre o fiel e Deus e, tecnicamente, não exigem a confissão. 57 Esse conceito não é bíblico (Tg 5.16; 1 Jo 1.9)

Além de todos os demais pecados, o próprio Jesus ensinava que há um pecado sem perdão (Mt 12.22-37; Mc 3.20-30; Lc 12.1-12; cf. 11.14-26). Muito se tem debatido a respeito da natureza desse "pecado imperdoável" ou "blasfêmia contra o Espírito Santo". O texto sugere vários critérios que toda análise precisa levar em conta.

Deve ter alguma referência ao Espírito Santo (Mt 12.31; Mc 3.29; Lc 12.10). No entanto, a blasfêmia contra Deus ou contra outros membros da Trindade (Mt 12.31-32; Mc 3.28; Lc 12.10; At 26.11; Cl 3.8; 1 Tm 1.13,20) é perdoável. Não pode ser um pecado que a Bíblia aliste como alcançado com o perdão. Tais pecados incluem aqueles cometidos antes de se conhecer a Deus - a possessão demoníaca (Lc 8.2-3), a crucificação do Senhor (23.34), a impiedade de duração quase vitalícia (23.39-43), a blasfêmia (1 Tm 1.13), o compelir os crentes a blasfemar (At 26.11) - e os cometidos depois de se ter conhecimento de Deus. Além disso, o pecado imperdoável não inclui negar o Deus dos milagres (Ex 32), voltar à idolatria a despeito de grandes milagres (Ex 32), assassinato (2 Sm 11 e 12), imoralidade grosseira (1 Co 5.1-5), negar Jesus (Mt 26.69-75), ver os milagres de Jesus e considerá-lo "fora de si" (Mc 3.21, imediatamente antes do seu ensino acerca da blasfêmia) e nem a volta à Lei depois de se conhecer a graça (Gl 2.11-21).

Esse pecado deve ser forçosamente blasfêmia (gr. blasphêmia), a calúnia mais vil contra Deus. Na LXX, blasphêmia frequentemente descreve o ato de negar o poder e a glória de Deus, que é consistente com a atitude dos líderes judaicos de atribuir os milagres de Jesus ao diabo. 58 O pecado da blasfêmia deve ser comparável ao dos líderes judaicos ao acusarem Jesus de ter um espírito maligno (Mc 3.30). Não pode ser meramente negar o testemunho dos milagres, pois Pedro negou Jesus (Mt 26.69-75) e Tomé duvidou dEle (Jo 20.24-29) depois de verem muitos milagres, mas os dois foram perdoados

Devido à explícita afirmação de Jesus de que todos os demais pecados podem ser perdoados (Mt 12.31; Mc 3.28), o pecado contra o Espírito Santo precisa ser comparado com Hebreus 6.4-8; 10.26-31; 2 Pe 2.20-22; e 1 João 5.16,17 - que também descrevem o pecado imperdoável. Notavelmente, Hebreus 10.29 liga esse pecado com o ultraje ao Espírito Santo.59 Parece, também, que podem ser incluídos o endurecimento do coração e a presunção (2 Ts 2.11,12). E bom acrescentar que tal pecado não envolve necessariamente a presença do Jesus encarnado nem a dos apóstolos, pois eles não foram vistos por ninguém no Antigo Testamento nem (mais provavelmente) pelos destinatários de Hebreus, 2 Pedro e 1 João. Assim, o pecado imperdoável não pode ser a falta de correspondência às manifestações milagrosas do Jesus encarnado ou dos apóstolos. 60 Nem pode tratar-se de uma negação temporária à fé,61 que as Escrituras consideram perdoável.

O pecado imperdoável é mais bem definido como a rejeição deliberada e derradeira da obra especial do Espírito Santo (Jo 16.7-11), que testemunha diretamente ao coração a respeito de Jesus como Senhor e Salvador, resultando na recusa total de crer.62 Por isso a blasfêmia contra o Espírito Santo não é uma indiscrição momentânea, mas uma disposição definitiva da vontade, embora as declarações de Jesus sugiram que possa manifestar-se num ato específico.63 Isto concorda com a avaliação de João de que os crentes não podem continuar pecando (1 Jo 3.6,9). A preocupação sincera indica que o pecado imperdoável não ocorreu. Tal preocupação, no entanto, não é mensurada nas emoções ou na depressão suicida (Mt 27.3-5; talvez Hb 12.16,17), antes em uma renovada busca por Deus, em fé e dependência dEle. As passagens em Hebreus exemplificam este inabalável ainda que delicado equilíbrio pastoral. 64

A Bíblia admite diferentes graus de pecado. Esse fato é demonstrado em algumas das categorias de pecado (já citadas) e nos diferentes julgamentos divinos (Mt 11.24; Mc 12.3840; Lc 10.12; 12.47,48; Jo 19.11). Mas a Bíblia também ensina o mínimo pecado cometido torna a pessoa plenamente pecadora (Dt 27.26-28.1; Gl 3.10; Tg 2.10).65 A discrepância aparente é resolvida pelo fato de que tanto o pecado mais insignificante quanto o mais hediondo são suficientes para levar à condenação eterna. Mesmo assim, pecados mais graves usualmente têm implicações mais significativas, não somente para as pessoas contra quem foram cometidos, mas também para o pecador, que assim se afasta cada vez mais da presença de Deus.

A Bíblia ensina que somente Deus e os seres espirituais não-caídos (como os anjos) não possuem a mácula do pecado. A ideia de que os povos antigos viviam uma vida simples e quieta é desmentida pela antropologia, que revela um lado escuro em todas as sociedades humanas.66 Até mesmo as explicações evolucionárias que a teologia liberal oferece a respeito do pecado reconhecem a universalidade deste.

O pecado contamina o mundo dos espíritos. A depravação de Satanás (Jó 1.6-2.6), sua queda (Lc 10.18 e Ap 12.8,9, com suas interpretações), a "guerra" no céu (Dn 10.13; Ap 12.7) e referências aos espíritos maus ou impuros (2 Co 12.7; Ef 6.10-18; Tg 4.7) dão testemunho disso. O pecado tem afetado o Universo além do escopo da ciência física.

As Escrituras também ensinam que todo ser humano, individualmente, é pecaminoso em algum sentido. Desde os tempos no Eden, o pecado tem ocorrido dentro de grupos. O pecado é claramente encorajado pelas atividades em grupo. A sociedade contemporânea é uma sementeira de tendências baseadas em capacidade (desde a vida embrionária), sexo, raça, antecedentes étnicos, religião, preferência sexual67 e até mesmo em posição política.

Assim como o pecado se achava em Israel, também há pecado na Igreja. Jesus o previu (Mt 18.15-20), e as Epístolas dão testemunho de sua presença (1 Co 1.11; 5.1,2; Gl 1.6; 3.1; Jd 4-19). A Igreja sem mácula nem ruga não será uma realidade antes da segunda vinda de Jesus (Ef 5.27; Ap 21.27).

As Escrituras ensinam que os efeitos do pecado se encontram até mesmo na criação não-humana. A maldição de Gênesis 3.17,18 marca o início desse mal, e Romanos 8.19- 22 declara o estado desordenado da natureza. A criação geme, esperando a consumação.68 A palavra grega mataiotês ("frustração", "vazio", Rm 8.20) descreve a inutilidade de um objeto totalmente separado de seu propósito original e sintetiza a futilidade do estado presente do próprio Universo. O pensamento divino aqui pode abranger tudo, desde plantas e animais a quarks e galáxias.

A extensão do pecado tem limitação cronológica. Antes da criação e durante um período posterior não especificado, o pecado não existia, e tudo era bom. Entretanto, não somente a lembrança, mas também a esperança cristã conhece um futuro em que, finalmente, o pecado e a morte já não existem (Mt25.41; 1 Co 15.25,26, 51-56; Ap 20.10,14,15).

CONSEQUÊNCIAS DO PECADO

 O pecado, por sua própria natureza, é destrutivo. Já descrevemos boa parte dos seus efeitos. Mesmo assim, é necessário aqui um breve resumo.

 O estudo das consequências do pecado devem considerar a culpa e o castigo. Há vários tipos de culpa (heb. 'asham, Gn 26.10; gr. enochos, Tg 2.10). A culpa individual ou pessoal pode ser distinguida da comunitária, que pesa sobre as sociedades. A culpa objetiva refere-se à transgressão real, quer posta em prática pelo culpado, quer não. A culpa subjetiva refere-se à sensação de culpa numa pessoa, que pode ser sincera e levar ao arrependimento (SI 51; At 2.40-47; cf. Jo 16.7-11). Pode, também, ser insincera (com a aparência externa de sinceridade), mas ou desconhece a realidade do pecado (e só corresponde quando apanhada em flagrante e exposta à vergonha e castigada, etc.) ou evidencia uma mera mudança temporária e externa, sem uma reorientação real, duradoura e interna (por exemplo, Faraó). A culpa subjetiva pode ser puramente psicológica na sua origem e provocar muitas aflições sem, porém, fundamentar-se em qualquer pecado real (1 Jo 3.19,20).

A penalidade, ou castigo, é o resultado justo do pecado, infligido por uma autoridade aos pecadores e fundamentado na culpa destes. O castigo natural refere-se ao mal natural (indiretamente da parte de Deus) incorrido por atos pecaminosos (como a doença venérea provocada pelos pecados sexuais e a deterioração física e mental provocada pelo abuso de substâncias). O castigo positivo é infligido sobrenatural e diretamente por Deus. O pecador é fulminado, etc.

Os possíveis propósitos do castigo são relacionados a seguir. (1) A retribuição ou a vingança pertencem exclusivamente a Deus (SI 94.1; Rm 12.19). (2) A expiação traz a restauração do culpado (esta realizada em nosso favor pela expiação vicária oferecida por Cristo).69 (3) O julgamento leva o culpado a dispor-se a restituir o que foi tirado ou destruído, e assim pode ser comprovada a obra que Deus realizou numa vida (Ex 22.1; Lc 19.8). {4) A correção influencia o culpado a não pecar no futuro. Esta é uma expressão do amor de Deus (SI 94.12; Hb 12.5-17). (5) O castigo do culpado serve para dissuadir a outros do mesmo comportamento. A dissuasão é usada frequentemente nas advertências divinas (SI 95.8-11; 1 Co 10.11).70 Os resultados do pecado são muitos e complexos. Podem ser considerados em termos de quem e o que é afetado por ele.

O pecado tem seu efeito sobre Deus. Embora sua justiça e sua onipotência não sejam prejudicadas pelo pecado, as Escrituras dão testemunho de seu ódio por ele (SI 11.15; Rm 1.18), de sua paciência para com os pecadores (Ex 34.6; 2 Pe 3.9), de sua busca pela humanidade perdida (Is 1.18; 1 Jo 4.9-10,19), de sua mágoa por causa do pecado (Os 11.8), de sua lamentação pelos perdidos (Mt 23.37; Lc 13.34) e de seu sacrifício em favor da salvação da humanidade (Rm 5.8; 1 Jo 4.14; Ap 13.8).

De todas as revelações bíblicas á respeito do pecado, estas talvez sejam as mais humilhantes. Todas as interações de uma sociedade humana outrora pura estão pervertidas pelo pecado. As Escrituras protestam, repetidas vezes, contra as injustiças praticadas pelos pecadores contra os "inocentes" (Pv 4.16; sociais, Tg 2.9; econômicas, Tg 5.1-4; físicas, SI 11.5; etc).

O mundo físico também sofre os efeitos do pecado. A decadência natural do pecado contribui para os problemas da saúde e do meio ambiente.

Os efeitos mais variados do pecado podem ser notados na mais complexa criação de Deus: a pessoa humana. Ironicamente, o pecado traz benefícios (segundo as aparências). O pecado pode até mesmo produzir uma alegria transitória (SI 10.1-11; Hb 11.25,26). O pecado também produz pensamentos enganosos, segundo os quais o mal parece bem. Como consequência, as pessoas mentem e distorcem a verdade (Gn 4.9; Is 5.20; Mt 7.3-5), negando o pecado pessoal (Is 29.13; Lc 39-52) e até mesmo a Deus (Rm 1.20; Tt 1.16). Em última análise, o engano do que parece ser bom revela-se como mau. A culpa, a insegurança, o tumulto, o medo do juízo e coisas semelhantes acompanham a iniquidade (SI 38.3,4; Is 57.20,21; Rm 2.8,9; 8.15; Hb 2.15; 10.27).

O pecado é futilidade. A palavra hebraica 'awen ("dano", "aflição", "engano", "nulidade") evoca a imagem da infrutuosidade do pecado. E o mal angustioso ceifado por quem semeia iniquidade (Pv 22.8) e é a inutilidade prevalecente em Betei (chamada com desprezo: Beth'Awen - "casa de nulidade") apesar da grande tradição de que antes desfrutava (Os 4.15; 5.8; 10.5, 8; Am 5.5; cf. Gn 28.10-22). Hevel ("nada", "vazio") é a repetida "vaidade" - ou "irrelevância" -de Eclesiastes e do frio consolo dos ídolos (Zc 10.2). Seu equivalente em grego, mataiotês, retrata o vazio ou a futilidade da criação amaldiçoada pelo pecado (Rm 8.20) e as palavras enfatuadas dos falsos mestres (2 Pe 2.18). Em Efésios 4.17, os incrédulos são apanhados "na vaidade do seu sentido" por causa do seu entendimento entenebrecido e da separação de Deus causada peia dureza de coração.

O pecado envolve o pecador numa dependência cada vez mais exigente (J° 8.34; Rm 6.12-23; 2 Pe 2.12-19), tornando-se uma lei ímpia no íntimo (Rm 7.23,25; 8.2). Desde Adão até ao Anticristo, o pecado é caracterizado pela rebelião, que pode assumir a forma de "tentar a Deus" (1 Co 10.9) ou de hostilidade contra Ele (Rm 8.7; Tg 4-4). O pecado nos separa de Deus (Gn 2.17, cf. 3.22-24; SI 78.58-60; Mt 7.21-23; 25.31-46; Ef 2.12-19; 4.18). O resultado pode ser não somente a ira de Deus, mas também o seu silêncio (SI 66.18; Pv 1.28; Mq 3.4-7; Jo 9.31).

A morte (heb. maweth, gr. thanatos) teve sua origem no pecado, e é o resultado final do pecado (Gn 2.17; Rm 5.12-21; 6.16,23; 1 Co 15.21,22,56; Tg 1.15). É possível distinguir entre a morte física e a espiritual (Mt 10.28; Lc 12.4).71 A morte física é uma penalidade ao pecado (Gn 2.17; 3.19; Ez 18.4,20; Rm 5.12-17; 1 Co 15.21,22) e pode vir como um juízo específico (Gn 6.7,11-13; 1 Cr 10.13,14; At 12.23). Entretanto, para os crentes (que estão mortos para o pecado, Rm 6.2; Cl 3.3; em Cristo, Rm 6.3,4; 2 Tm 2.11) significa uma restauração mediante o sangue de Cristo (Jó 19.25-27; 1 Co 15.21,22) porque Deus tem triunfado sobre a morte (Is 25.8; 1 Co 15.26,55-57; 2 Tm 1.10; Hb 2.14,15; Ap 20.14).

Os não-salvos vivem na morte espiritual (Jo 6.50-53; Rm 7.11; Ef 2.1-6; 5.14; Cl 2.13; 1 Tm 5.6; Tg 5.20; 1 Pe 2.24; 1 Jo 5.12), que é a derradeira expressão da alienação entre a alma e Deus. Até mesmo os crentes, quando pecam, experimentam uma separação parcial de Deus (SI 66.18), mas Ele está sempre disposto a perdoar (SI 32.1-6; Tg 5.16; 1 Jo 1.8,9).

A morte espiritual e a morte física estão associadas e serão plenamente realizadas após o Juízo Final (Ap 20.12-14).72 Embora Deus tenha ordenado o triste fim dos pecadores (Gn 2.17; Mt 10.28; Lc 12.4), este fim não lhe dá prazer (Ez 18.23; 33.11; 1 Tm 2.4; 2 Pe 3.9).

A única maneira de se lidar com o pecado é amando a Deus em primeiro lugar, e então passar a ser um canal para levar ao próximo o seu amor, mediante a graça divina. Somente o amor é capaz de opor-se ao pecado, que se opõe a tudo (Rm 13.10; 1 Jo 4.7- 8). Somente o amor pode cobrir o pecado (Pv 10.12; 1 Pe 4.8) e, em último lugar, ser o remédio contra ele (1 Jo 4.10). E somente "Deus é amor" (1 Jo 4.8). No que diz respeito ao pecado, o amor pode expressar-se de maneiras específicas.

 O conhecimento do pecado deve gerar santidade na vida do indivíduo e uma ênfase à mesma santidade, na pregação e no ensino à igreja.

A Igreja deve reafirmar a sua identidade, a de uma comunidade de pecadores salvos por Deus, ministrando na confissão, no perdão e na cura. A humildade deve caracterizar todos os relacionamentos cristãos, à medida que os crentes tomam consciência, não somente da vida e morte terríveis das quais foram salvos, mas também do preço ainda mais terrível daquela salvação. Quando uma pessoa é salva da mesma natureza pecaminosa, nenhuma quantidade de dons espirituais, ministérios ou autoridade pode justificar a elevação de uma pessoa acima de outra. Pelo contrário, cada pessoa deve preferir e honrar as outras mais que a si mesma (Fp 2.3).

A amplidão universal e a profundidade sobrenatural do pecado devem levar a Igreja a corresponder, com a dedicação de todos os membros e o revestimento do poder milagroso do Espírito Santo, ao imperativo da Grande Comissão (Mt 28.18-20).

 A compreensão da natureza do pecado deve renovar a nossa sensibilidade diante das questões do meio ambiente e levar-nos a retomar a comissão original de cuidar do mundo de Deus, o qual não devemos deixar nas mãos daqueles que preferem adorar a criação ao invés de ao Criador.

Questões de justiça social e necessidade humana devem ser advogadas pela Igreja como testemunho da veracidade do amor, em contraste à mentira que é o pecado. Mesmo assim, semelhante testemunho deve apontar sempre para o Deus da justiça e do amor, que enviou o seu Filho a morrer por nós. Somente a salvação, e não a legislação ou um evangelho social que desconsidera a cruz ou ainda a ação violenta ou militar, pode curar o problema e seus sintomas.

Finalmente, a vida deve ser vivida na esperança certa de um futuro além do pecado e da morte (Ap 21 e 22). Então, purificados e regenerados, os crentes verão a face daquEle que já não lembra mais do seu pecado (Jr 31.34; Hb 10.17).

                                                                                    Bruce R. Marino
                                                                  Stanley-Horton-Teologia-Sistematica



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