quinta-feira, 6 de outubro de 2016

LIÇÃO 02: Ira, combustível para mágoas e ódio



                                              A Ira de Deus                       

por
Arthur W. Pink


É triste ver tantos cristãos professos que parecem considerar a ira de Deus como uma coisa pela qual eles precisam pedir desculpas, ou, pelo menos, parece que gostariam que não existisse tal coisa. Conquanto alguns não fossem longe o bastante para admitir abertamente que a consideram uma mancha no caráter divino, contudo, estão longe de vê-la com bons olhos, não gostam de pensar nisso e dificilmente a ouvem mencionada sem que surja em seus corações um ressentimento contra essa idéia. Mesmo dentre os mais sóbrios em sua maneira de julgar, não poucos parecem imaginar que há na questão da ira de Deus uma severidade terrificante demais para propiciar um tema para consideração proveitosa. Outros dão abrigo ao erro de pensar que a ira de Deus não é coerente com a Sua bondade, e assim procuram bani-la dos seus pensamentos.

Sim, muitos há que fogem de visualizar a ira de Deus, como se fossem intimados a ver alguma nódoa no caráter divino, ou algum defeito no governo divino. Mas, o que dizem as Escrituras? Quando a procuramos nelas, vemos que Deus não dez tentativa alguma para ocultar a realidade da Sua ira. Ele não se envergonha de ar a conhecer que a vingança e a cólera Lhe pertencem. Eis o Seu desafio: "Vede agora que eu, eu o sou, e mais nenhum Deus comigo; eu mato, e eu faço viver; eu firo, e eu saro; e ninguém há que escape da minha mão. Porque levantei a minha mão aos céus, e direi: Eu vivo para sempre. Se eu afiar a minha espada reluzente, a travar do juízo a minha mão, farei tornar a vingança sobre os meus adversários, e recompensarei aos meus aborrecedores"(Dt.32:39-41). Um estudo na concordância mostrará que há mais referências nas Escrituras à indignação, à cólera e à ira de Deus, do que aos Seu amor e ternura. Porque Deus é santo, ele odeia todo pecado; e porque ele odeia todo pecado, a Sua ira inflama-se contra o pecador. (Sl.7:11).

Pois bem, a ira de Deus é uma perfeição divina tanto como a sua fidelidade, o Seu poder ou a Sua misericórdia. Só pode ser assim, pois não há mácula alguma, nem o mais ligeiro defeito no caráter de Deus, porém, haveria, se Nele não houvesse "ira"! A indiferença para com o pecado é uma nódoa moral, e aquele que não odeia é um leproso moral. Como poderia Aquele que é a soma de todas as excelência olhar com igual satisfação para a virtude e o vício, para a
sabedoria e a estultícia? Como poderia Aquele que é infinitamente santo ficar indiferente ao pecado e negar-Se a manifestar a Sua "severidade"(Rm.11:22) para com ele? Como poderia Aquele que só tem prazer no que é puro e nobre, deixar de detestar e de odiar o que é impuro e vil? A própria natureza de Deus faz do inferno uma necessidade tão real, um requisito tão imperativo e eterno como o céu o é. Não somente não há imperfeição nenhuma em Deus, mas também não há Nele perfeição que seja menos perfeita do que outra.

A ira de Deus é sua eterna ojeriza por toda injustiça. É o desprazer e a indignação da divina equidade contra o mal. É a santidade de Deus posta em ação contra o pecado. É a causa motora daquela sentença justa que ele lavra sobre os malfeitores. Deus está irado contra o pecado porque este é rebelião contra a Sua autoridade, um ultraje à Sua soberania inviolável. Os insurgentes contra o governo de Deus saberão um dia que Deus é o Senhor. Serão levados a sentir quão grandiosa é aquela Majestade que eles desprezaram, e como é terrível aquela ira de que foram ameaçados e a que não deram a mínima importância. Não que a ira de Deus seja uma retaliação maldosa e mal intencionada, infligindo agravo só pelo prazer de infligi-lo, ou devolver a ofensa recebida. Não; embora seja verdade que Deus vindicará o domínio como Governador do universo, ele não será revanchista.
Evidencia-se que a ira divina é uma das perfeições de Deus, não somente pelas considerações acima apresentadas, mas também fica estabelecido claramente pelas declarações expressas da Sua Palavra. "Porque do céu manifesta a ira de Deus..."(Rm.1:18). "Manifestou-se quando foi pronunciada a primeira sentença de morte, quando a terra foi amaldiçoada e o homem foi expulso do paraíso terrestre; e depois, mediante castigos exemplares como o dilúvio e a destruição das cidades da planície com fogo do céu, mas, especialmente pelo reinado da morte no mundo todo. Foi proclamada na maldição da lei para cada transgressão, e foi imposta na instituição do sacrifício. No capítulo 8 de romanos, o apóstolo Paulo chama a atenção para o fato de que a criação inteira ficou sujeita à vaidade, e geme e tem dores de parto. A mesma criação que declara que existe um Deus, e publica a 

Sua glória, também proclama que Ele é inimigo do pecado e o vingador dos crimes dos homens. Acima de tudo, porém, do céu se manifestou a ira de Deus quando o Filho de Deus veio a este mundo para revelar o caráter divino, e quando essa ira foi demostrada nos Seus sofrimentos e morte, de maneira mais terrível do que por todas as provas que Deus antes dera da Sua aversão pela pecado. Além disso, o castigo futuro e eterno dos ímpios agora é declarado em termos mais solenes e explícitos do que antes. Sob a nova dispensação há duas revelações dadas do céu, uma da ira, a outra da graça"(Robert Haldane).

Mais: que a ira de Deus é uma perfeição divina está demostrado claramente pelo que lemos nos Salmo 95:11: "Por isso jurei na minha ira que não entrarão no meu repouso". Duas sãos as ocasiões em que Deus "jura": quando faz promessas (Gn22:16), e quando faz ameaças(Dt.1:34). Na primeira, jura com misericórdia dos Seus filhos; na Segunda, jura para aterrorizar os ímpios. Um juramento é feito para confirmação: Hb.6:16. Em Gn.22:16 disse Deus: "Por mim mesmo, jurei". NO Sl.89:35 ele declara: "Uma vez jurei por minha santidade". Enquanto que no Sl.95:11 ele afirma: "Jurei na minha ira". Assim é que o grande Jeová pessoalmente recorre à Sua "ira" como a uma perfeição igual à sua "santidade": tanto jura por uma como pela outra! Ainda: como em Cristo "...habita corporalmente toda a plenitude da divindade"(Cl.2:9), e como todas as perfeições divinas são notavelmente manifestadas por Ele (Jo.1:18), por isso lemos sobre "... a ira do Cordeiro"(Ap.6:16).

A ira de Deus é uma perfeição do caráter divino sobre a qual precisamos meditar com freqüência. Primeiro, para que os nosso corações fiquem devidamente impressionados com a ojeriza de Deus pelo pecado. Estamos sempre inclinados a uma consideração superficial do pecado, a encobrir a sua fealdade, a desculpá-lo com escusas várias. Mas, quanto mais estudarmos e ponderarmos a aversão de Deus pelo pecado e a maneira terrível como se vinga dele, mais probabilidade teremos de compreender quão horrível é o pecado. Segundo, para produzir em nossas almas um verdadeiro temor de Deus: "... retenhamos a graça, pela qual sirvamos a Deus agradavelmente com reverência e piedade ("santo temos"); porque o nosso Deus é fogo consumidor"(Hb.12:2829). Não podemos serví-lO "agradavelmente" sem a devida "reverência" ante a sua tremenda Majestade e sem o devido "santo temor" de Sua ira, e promoveremos melhor estas coisas trazendo freqüentemente à memória o fato de que "o nosso Deus é um fogo consumidor". Terceiro, para induzir nossas almas a fervoroso louvor a Deus por Ter-nos livrado "... da ira futura"(I Ts.1:10).

A nossa prontidão ou a nossa relutância em meditar na ira de Deus é um teste seguro de até que ponto os nossos corações reagem à Sua influência. Se não nos regozijamos verdadeiramente em Deus, pelo que ele é em Si mesmo, e por todas as perfeições que nEle há eternamente, como poderá permanecer em nós o amor de Deus? Cada um de nós precisa vigiar o mais possível em oração contra o perigo de criar em nossa mente uma imagem de Deus segundo o modelo das nossas inclinações pecaminosas. Desde há muito o Senhor lamentou: "... pensavas que (Eu) era como tu"(Sl.50:21). Se não nos alegramos "... em memória da sua santidade"(Sl.97:12), se não nos alegramos por saber que num dia que logo vem, Deus fará uma demonstração sumamente gloriosa da Sua ira, tomando vingança em todos os que agora se opõem a Ele, é prova positiva de que os nossos corações não estão sujeitos a 

Ele, que ainda, permanecemos em nossos pecados, rumo às chamas eternas.
"Jubilai, ó nações (gentios), com o seu povo, porque vingará o sangue dos seus servos, e sobre os seus adversários fará tornar a vingança..."(Dt.32:43). E ainda lemos: "E, depois destas coisas, ouvi no céu como que uma grande voz de grande multidão, que dizia: Aleluia; Salvação, e glória, e honra, e poder pertencem ao Senhor nosso Deus; Porque verdadeiros e justos sãos os seus juízos, pois julgou a grande prostituta, que havia corrompido a terra com a sua prostituição, e das mãos dela vingou o sangue dos seus servos. E outra vez disseram: Aleluia..." (Ap.19:1-3). Grande será o regozijo dos santos naquele dia em que o Senhor irá vindicar a sua majestade, exercer o Seu domínio formidável, magnificar a Sua justiça, e derribar os orgulhosos rebeldes que ousaram desafiá-lO.
"Se tu, Senhor, observares (imputares) as iniquidades, Senhor quem subsistirá? (Sm. 130:3). Cada um de nós pode bem fazer esta pergunta, pois está escrito que "...os ímpios não subsistirão no juízo..." (Sl.1:5). Quão dolorosamente a alma de Cristo padeceu ao pensar na ação de Deus observando as iniquidades do Seu povo quando estas pesaram sobre Ele! Ele "... começou a Ter pavor, e a angustiar-se"(Mc. 14:33). Sua agonia terrível, Seu suor de sangue, Seu grande clamor e súplicas (Hb.5:7), Suas reiteradas orações: "Se é possível, passe de mim este cálice", Seu último e tremendo brado, "Deus meu, Deus meu, porque me desamparaste?"- tudo manifesta que pavorosas apreensões Ele teve quanto ao que era para Deus "observar iniquidades". Bem que nós, pobres pecadores, podemos clamar: Senhor, quem subsistirá, se o próprio Filho de Deus tremeu tanto sob o peso da Tua ira? Se tu, meu leitor, ainda não correste em busca do refúgio em Cristo, o único salvador, "... que farás na enchente do Jordão?"(Jr.12:5).

"Quando considero como a bondade de Deus sofre abusos da maior parte da humanidade, não posso senão apoiar quem disse: "O maior milagre do mundo é a paciência e generosidade de Deus para como mundo ingrato. Se um príncipe tem inimigos metidos numa de suas cidades, não lhes envia provisões, mas mantém sitiado o local e faz o que pode para vencê-los pela fome. Mas o grande Deus, que poderia levar todos os Seus inimigos à destruição num piscar de olhos, tolera-os e se empenha diariamente para sustentá-los. Aquele que faz o bem aos maus e ingratos, pode muito bem ordenar-nos que bendigamos os que nos maldizem. Não penseis, porém, que escapareis assim, pecadores; o moinho de Deus mói devagar, mas mói fino; quanto mais admirável é agora a Sua paciência e generosidade, mais terrível e insuportável será a fúria resultante dos abusos feitos à Sua bondade. Nada é mais brando do que o mar; contudo, quando se agita e forma temporal, nada se enfurece mais. Nada é tão suave como a paciência e bondade de Deus, e nada tão terrível como a sua ira quando se inflama" (William Gurnall, 1660). "Fuja", pois, meu leitor, fuja para Cristo; fuja "... da ira futura"(Mt.3:7), antes que seja tarde demais. Nós lhe rogamos com
todo o empenho, não pense que esta mensagem tem em vista outra pessoa. É para você que está lendo! Não fique satisfeito em pensar que você já fugiu para Cristo. Obtenha certeza disso! Rogue ao Senhor que sonde o teu coração e te revele o que tu és (pois o erro ou engano, será fatal e eterno).
Uma palavra aos pregadores: Irmãos, em nossos ministérios temos pregado sobre este solene assunto tanto como deveríamos? Os profetas do Velho Testamento muitas vezes diziam aos seus ouvintes que as suas vidas ímpias provocavam o Santo de Israel, e que estavam entesourando para si mesmos ira para o dia da ira. E as condições do mundo hoje não são melhores do que eram então! Nada se presta mais para despertar os indiferentes e fazer com que os crentes carnais sondem os seus corações, do que alongar-nos sobre o fato de que Deus "... se ira todos os dias" com os ímpios (Sl.7:11). O precursor de Cristo exortava os seus ouvintes a fugirem "... da ira futura"(Mt.3:7). O Salvador ordenava a quantos O ouviam: "Temei aquele que, depois de matar, tem poder para lançar no inferno, sim, vos digo, a esse temei"(Lc.12:5). O apóstolo Paulo dizia: "... sabendo o temor que se deve ao Senhor, persuadimos os homens..."(2Co.5:11). A fidelidade exige que falemos tão claramente do inferno como do céu.
Fonte: Arthur Pink, Os Atributos de Deus, Editora PES.
                                        


                                COMO LIDAR COM A RAIVA                 

A raiva constitui-se como uma emoção humana normal e habitualmente saudável. Os problemas surgem quando se torna descontrolada e destrutiva, podendo afectar o trabalho, a escola, as relações pessoais e a qualidade de vida no geral. O descontrolo leva a que te sintas “à mercê” de uma emoção imprevisível e poderosa.  

Definição de “raiva”
De um modo geral, a raiva define-se como um sentimento de protesto, insegurança, timidez ou frustração, contra alguém ou alguma coisa, que se exterioriza quando o ego se sente ferido ou ameaçado. A intensidade da raiva, ou a sua ausência, difere entre as pessoas. Alguns psicólogos apontam o desenvolvimento moral e psicológico do indivíduo como determinante na maneira como a raiva é exteriorizada.
Este sentimento pode ser despoletado por acontecimentos externos e internos. Pode ficar-se zangado/com raiva em relação a uma pessoa específica (p.e. um colega) ou acontecimento (p.e. engarrafamento no trânsito). A raiva pode ainda ser causada por preocupação excessiva ou focalização nos problemas pessoais. As memórias de acontecimentos traumáticos ou marcantes também podem desencadear esta emoção. 

Sinais de alerta
Quando as pessoas ficam com raiva, tendem a experienciar variados pensamentos, sentimentos e reacções físicas. Para alguns, os sentimentos tornam-se tão arrebatadores que parecem estar “prestes a explodir”. Outros podem não saber que estão muito zangados com a situação, mas sentem-se doentes, culpados ou reagem exageradamente a outras situações. 
Seguidamente são apresentadas algumas expressões directas e indirectas de raiva. 
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Sinais directos: elevação do volume da voz, praguejo, dores de cabeça, dores de estômago, aperto na garganta, aumento do ritmo cardíaco, aumento da pressão sanguínea, punhos cerrados, ameaças, violência, pressão, hostilidade, fúria, ressentimento.
Sinais indirectos: excesso de sono, fadiga crônica, ansiedade, entorpecimento, depressão, aborrecimento, exagero, perda de apetite, choro, crítica constante, piadas más ou hostis, abuso de álcool ou drogas. 
Muitas pessoas experienciam estes sinais gerais de raiva. Saber identificá-los constitui-se como o primeiro passo para melhor lidar com eles. Alguns sentimentos e pensamentos ocorrem quando a raiva surge; outros surgem à medida que a raiva aumenta. 
De modo a identificar de que modo os teus sintomas se desenvolvem, tenta pensar em situações passadas em que te parece que a raiva esteve presente e tenta recordar que sentimentos e pensamentos a acompanharam. Será bastante útil pensar em situações em que experientas-te diferentes níveis de raiva, de modo a melhor compreender como os teus sentimentos, pensamentos e sintomas físicos se foram modificando. 

Formas de expressar raiva

A maneira mais natural e instintiva de expressar raiva é através de respostas agressivas. A raiva é uma resposta natural, adaptativa a ameaças; desencadeia sentimentos e comportamentos poderosos, frequentemente agressivos, que te permite lutar ou defender quando és atacado/a. Uma certa quantidade de raiva é, portanto, necessária para a nossa sobrevivência. 
Por outro lado, não podes descarregar em cada pessoa ou objecto que te irrita ou chateia; as leis, normas sociais e senso comum estabelecem limites à expressão da nossa raiva. 

As pessoas servem-se de uma variedade de processos, conscientes e inconscientes, para tentar lidar com estes sentimentos de um modo eficaz e socialmente adequado. Três deles são seguidamente destacados: 
• Expressar os sentimentos de raiva de um modo assertivo (e não agressivo). Tal implica apresentares claramente as tuas necessidades e como podem ser satisfeitas, sem prejudicar os outros. O respeito do próprio e dos outros é regra de ouro!
 • Suprimir os sentimentos. Isto acontece quando reténs a raiva, deixas de pensar nela e te focalizas em coisas positivas. O objectivo é inibir a raiva e convertê-la em comportamentos mais construtivos. O perigo é que, ao não permitir a expressão externa da raiva, ela se vá expressar internamente (p.e. hipertensão, depressão).
 • Acalmar/relaxar. Isto implica, não só controlares a expressão do comportamento mas também as respostas internas. Em última instância, também os sentimentos são “amenizados”.  
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Não ser capaz de expressar adequadamente os sentimentos de raiva pode gerar outros problemas. Concretamente, pode levar a expressões patológicas da raiva, tais como comportamento             passivo-agressivo ou uma atitude perpetuamente cínica e hostil. As pessoas que rebaixam constantemente os outros, que criticam tudo e que fazem comentários cínicos, não aprenderam a expressar a sua raiva de um modo construtivo. Habitualmente, são pessoas com poucos relacionamentos satisfatórios.  

Mas atenção! Isto não se deve constituir como desculpa para “pores tudo cá para fora”. Algumas pessoas podem usar estas ideias como licença para magoar os outros e isso pode ser bastante prejudicial. Os estudos mostram que esta “explosão” pode fomentar ainda mais a agressividade e raiva, para além de não te ajudar a resolver a situação.  Deste modo, é preferível saberes o que despoleta a raiva e, posteriormente, desenvolveres estratégias que impeçam a escalada prejudicial dos sentimentos.  

Formas de lidar com a raiva eficaz e autonomamente 
Só é possível delinear e recorrer a estratégias eficazes se conhecerem em pormenor os contornos da experiência de raiva: o que penso? o que sinto?. O objetivo destas estratégias não é erradicar totalmente as manifestações de raiva do teu repertório comportamental. O que teria acontecido se os nossos antepassados não tivessem recorrido à agressividade para sobreviverem nos tempos em que vigorava a “lei do mais forte”? Assim, o que se pretende é que consigas fazer um discernimento racional das situações em que a raiva pode ser adaptativa e que mantenhas o controlo! 

Lidar com sentimentos e pensamentos  
Quando pensas em situações que te provocaram raiva, é provável que também te recordes de sentimentos intensos de raiva, tão avassaladores que te levaram a agir de modos que não melhoraram a situação.  Para melhor compreenderes e controlares estes sentimentos, é necessário analisar um outro aspecto destas situações: os teus pensamentos.  

Etapa n.º 1: Analisa. Da próxima vez que te chateares com alguma coisa ou alguém, procura reter os pensamentos que te surgiram acerca daquela situação ou pessoa. Assim que possível, aponta-os e, ao longo do tempo, faz uma listagem com vários destes pensamentos.  

Etapa n.º2: Avalia. É importante que avalies cuidadosamente os teus pensamentos. São precisos/exatos ou distorcidos? Os pensamentos distorcidos são inapropriados ou inexatos e podem assumir várias formas, nomeadamente:  • Rotulagem: atribuição de um rótulo negativo sem considerar outras hipóteses ou evidências. P.e. “Ele é um idiota”.
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• Maximização: quando se avalia alguém, maximiza-se a componente negativa e  minimiza-se a positiva. P.e. “A minha professora deu-me uma nota baixa, ela é tão injusta” (mas também te deu várias notas positivas). • Personalização: acreditar que os outros estão a reagir directamente contra ti, sem considerares quaisquer explicações mais plausíveis para o seu comportamento. P.e. “Aquele rapaz é frio porque se acha superior a mim” (se calhar, esse rapaz recebeu foi notícias negativas da sua família…).
 • Visão em túnel: apenas os aspectos negativos da situação são considerados. P.e. “O meu professor não consegue fazer nada bem. É crítico, insensível e não dá bem a matéria”.  
• Pensamento “tudo ou nada”: a situação é encarada apenas segundo duas categorias e não num contínuo. P.e. “O meu amigo não concorda comigo nesta questão por isso ele não me apoia em nada”.  
• Estar certo: tentas continuamente provar que as tuas opiniões e acções são as correctas. Estares errado/a é impensável. P.e. “Gritar para a minha colega foi totalmente justificado. Ela mereceu-o pelo que fez”.  

Etapa n.º 3: Encontra outras formas mais adaptativas de pensar sobre a situação. Para cada pensamento distorcido, tenta encontrar uma forma alternativa, mais adaptativa e que não te faça sentir tão zangado/a. Isto pode envolver a exploração dos aspectos positivos de uma pessoa ou situação, identificar outras razões possíveis para o comportamento da pessoa, ou olhar de um modo “mais abrangente” para a situação.  

Etapa n.º 4: Praticar as etapas anteriores. Esta análise deve ser praticada todos os dias de modo a ser eficaz. À medida que se torna mais fácil, ficarás mais competente na identificação dos teus pensamentos perante uma situação que te provoque raiva. Ao identificar pensamentos distorcidos e substituí-los por outros mais adaptativos, podes evitar ficar tão “imerso/a” na raiva.  

Lidar com sintomas físicos 
O conselho mais comum quando estamos perante alguém muito zangado é “Tem calma” ou “Relaxa”. Estas afirmações pretendem responder aos sintomas físicos da raiva, os quais geram tensão no corpo ao ponto de parecer prestes a explodir. Aprender como relaxar pode ajudar-te a melhor controlar os sinais físicos da raiva.  
Respiração profunda: quando te sentes enraivecido/a, é importante dispores de uma técnica de relaxamento que funcione rapidamente e em qualquer situação. A respiração profunda é exemplo disso e permite que o organismo absorva mais oxigénio, para além de diminuir o ritmo cardíaco e evitar que a adrenalina chegue tão rapidamente à corrente sanguínea. Esta respiração é profunda porque envolve a área do estômago ou diafragma, e não o peito. É rítmica e lenta. 
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Ao detectares alterações físicas indicativas de sentimentos de raiva, pára um momento e focaliza-te na tua respiração: habitualmente, será rápida e superficial. Se quebrares este ciclo e voluntariamente começares a respirar lentamente e pelo diafragma, o organismo irá responder e as alterações físicas serão amenizadas. Os músculos começam a relaxar e a sensação de tensão a diminuir.  Esta breve pausa pode também dar-te a oportunidade para te recompores, controlares os teus sentimentos, mudares os teus pensamentos e lidar com a situação de um modo mais eficaz.  
Relaxamento muscular progressivo: esta técnica envolve a contracção e relaxamento sistemático dos principais grupos musculares do corpo. Esta técnica pode ajudar-te a localizar áreas no teu corpo que estão tensas ou presas e, seguidamente, relaxá-las. Aplicada à situação que evoca raiva, pode ajudar a diminuir tais sentimentos, assim como a ficares mais relaxado/a e menos zangado/a quando a situação terminar.   No texto “Aprender a Relaxar”, também disponibilizado na secção Textos de Auto-Ajuda, poderás obter mais informações acerca desta técnica.  

Trabalho psicoterapêutico  
Se as sugestões anteriormente apresentadas não te ajudarem a lidar com a raiva de um modo mais eficaz ou se tiveres um problema de controlo sério, aconselhamos-te a procurares a ajuda de um psicólogo (o GAPsi é uma opção viável nesse sentido).  A etapa mais importante é encontrar alguém que te ajude a sentir mais controlado/a. Falar com alguém pode ajudar a prevenir que situações perigosas ou prejudiciais ocorram. A psicoterapia pode também ajudar-te a sentires-te melhor contigo e a melhorares as suas competências comunicativas e de relacionamento com os outros.                
The Student Counseling Virtual Pamphlet Collection, http://counseling.uchicago.edu/vpc/ e www.apa.org/topics/controlanger.htlm traduzidos e adaptados por Ana Martins, Psicóloga Estagiária do GAPsi – Gabinete de Apoio Psicopedagógico 2009



COMPREENDENDO A IRA
Por David Powlison Sobre Anger Uma Parte da série Journal of Biblical Counseling Tradução por Gertrudes Mendonca

Todos os seres humanos enfrentam a ira. Num mundo de desapontamentos, imperfeições, misérias e pecados (nossos e dos outros), a ira está sempre presente. Você ira-se. Eu iro-me. Aqueles a quem você aconselha ficam irados. Sem dúvida, esta a razão porque a Bíblia está cheia de histórias, ensinamentos e comentários sobre a ira. Deus quer que nós entendamos a ira e a forma de sabermos como resolver os problemas relacionados com ela.
Este artigo tem três partes. “Compreendendo a ira” irá concentrar-se naquilo que pensamos sobre a ira. A segunda e terceira partes, que irão ser publicadas em edições futuras, irão contemplar as implicações e a forma como aconselhamos pessoas iradas.
O que é a ira? Como é que nós a entendemos? Vamos começar com cinco afirmações gerais sobre algo que muitas vezes vivenciamos, mas que raramente nos detemos para entender.

1. A Bíblia ocupa-se da ira

A Bíblia ocupa-se da ira. Qual é a pessoa mais irada na Bíblia? Deus. Quando Deus observa o mal, “A Sua ira não desaparece”, conforme Isaías repetiu várias vezes. 

Em Romanos, Paulo menciona a ira de Deus e os seus efeitos mais de cinquenta vezes, começando com “A ira de Deus revela-se dos céus contra toda a impiedade e injustiça dos homens” (Romanos 1:18). João afirma que a ira de Deus “está sobre” quem quer que não crê no Filho de Deus para obter misericórdia: a ira estava, está, e ficará sobre suas cabeças. [1]

O fato de que Deus está irado, diz-nos algo muito importante. A ira pode ser absolutamente certa, boa, apropriada, bela, a única resposta justa a algo de diabólico, e a resposta amorosa em nome de vítimas da maldade. Na verdade, “seria impossível que um ser moral ficasse indiferente e insensível diante de algo errado”. [2] Não é de admirar que Jesus Cristo se tenha irado quando Ele encontrou pessoas que pervertiam a adoração de Deus e contribuíam, ou eram insensíveis, aos sofrimentos de outros. [3]
A ira de Deus nunca é caprichosa nem mal humorada. Ele responde imparcialmente ao que é errado e ofensivo. Mas Ele “não tem prazer na morte dos ímpios, desde que eles “se convertam de seus caminhos” (Ezequiel 18:23). Os seres humanos estão destinados a amar aquele que os fez e sustenta, cujas “riquezas da sua benignidade, e paciência, e longanimidade... e benignidade” todos vivenciamos (Romanos 2:4). “por causa de seu coração corrompido, que se desviou de mim, e por causa dos seus olhos , que se andaram corrompendo após os seus ídolos” (Ezequiel 6:9). Será que a ira de Deus é injusta? Quando desafiado, a resposta de Deus é directa:
“Não são os meus caminhos direitos? Não são os vossos caminhos torcidos? ... conforme os teus caminhos, e conforme os teus feitos, te julgarão”.[4]

Os crimes que provocam a ira de Deus são crimes capitais: traição, rebelião, fraude, blasfêmias. O coração humano é traiçoeiro; nós desejamos crer em qualquer coisa menos naquilo que é realmente verdadeiro sobre Deus. Os mesmos sentimentos que surgem em nós quando ouvimos alguém descrito pela palavra “traidor”, proporcionam uma razão para a ira de Deus. Os seres humanos foram destinados a ouvir a voz vivificante de Deus e a tratarem-se uns aos outros com amor. Mas nós temos corações de pedra. Somos teimosos: “eis que cada um de vós anda após o propósito do seu malvado coração para me não dar ouvidos a mim” “cada um fazia o que parecia reto aos seus olhos”.[5] Deus seria menos que bom se não odiasse essas maldades.

Deus, naturalmente, é também, a pessoa mais amorosa na Bíblia e o Filho de Deus exprime a riqueza do Seu amor. Nós muitas vezes deixamos de ver que a ira e o amor de Deus são inteiramente consistentes entre si, tal como diferentes expressões da Sua bondade e glória. Os dois sentimentos funcionam em conjunto: “Jesus ardia em ira contra os erros que Ele encontrava na Sua jornada através da vida humana, tal como Ele se enchia de piedade à vista da miséria do mundo: e era, a partir destas duas emoções, que provinha a Sua piedade verdadeira”. [6] Você não pode entender o amor de Deus se você não entender a Sua ira. Porque Ele ama, ira-se com as ofensas.
Mas repare na forma como os filhos de Deus se tornam alvo da Sua ira: A sua ira é expressa a favor deles como um amor supremamente terno! Como veremos, a Bíblia é consistente sobre esta verdade. E no entanto, a ira é, por definição, contra coisas; com intenção de destruí-las. Portanto, como é que a ira de Deus se transforma em algo que osfilhos de Deus amam e confiam, em vez de algo que eles temem ou desestimem? De que forma a ira de Deus é uma expressão de como Ele está a nosso favor, em vez de uma expressão da forma como Ele está contra nós? As Boas Novas são sempre apresentadas em termos de como o amor e a ira podem chegar a entender-se. Deus exprime o Seu amor pelo Seu povo, através de cada uma das três maneiras em que Ele exprime a 

Sua ira contra êrro. Ele promete libertar o crente de três coisas, como seguem:
Primeiro, em amor, a ira que o seu pecado merecia, caiu sobre Jesus. A ira de Deus contra o pecado foi expressa – mas para o seu bem. De uma vez por todas, no passado, Deus o libertou para jamais vivenciar outra vez a Sua ira contra os seus pecados. Com amor inabalável, Ele livremente ofereceu o Seu Filho inocente para suportar a ira merecida pelos culpados. A ira de Deus castiga e destrói, dando ao nosso pecado o que ele merece – mas o castigo foi imposto sobre Jesus, o Cordeiro Amado, o Salvador de pecadores. Como Ele nos ama, oferece-Se para suportar o furor da ira; o caminho da nossa libertação é a Sua glória e a nossa alegria. A ira amorosa de Deus se expressa de uma forma que nos traz bênçãos, é a base de revivar-nos da morte: ela garante-nos o perdão verdadeiro. A justificação pela fé e adopção como filhos de Deus repousa naquela forma de amor chamada de sacrifício substitutivo. Aquilo que merecemos, outro suportou porque decidiu amar-nos. Nesse ato supremo de um amor que se dá a si mesmo, nós vivenciamos a ira de Deus atuando a nosso favor. Em resposta, nós nos arrependemos e cremos com confiança.

Segundo, no amor, a ira de Deus funciona para desarmar o poder do nosso pecado. A Sua ira perante o pecado é, mais uma vez, expressa para o nosso bem.No presente, Ele lida continuamente com o pecado ainda remanescente em nós. [7] O Espírito Santo, que derrama o amor de Deus dentro de você, é um fogo de ira ardendo contra o mal, não para lhe destruir mas para lhe renovar. Em amor constante, Ele renova-nos não por tolerar o nosso pecado, mas por odiar o nosso pecado de uma forma que nós possamos aprender a amar! O processo nem sempre é agradável porque o sofrimento, a censura, a culpa e a confissão de culpa não são sentimentos agradáveis. Mas livramento, misericórdia, encorajamento e uma consciência limpa fazem-nos sentir bem. Deus renova-nos progressivamente em amor, alegria, paz e sabedoria – à Sua própria imagem. A ira de 

Deus soluciona e destrói o pecado em curso. Como Ele nos ama, Ele se ira com nosso pecado que nos destrói; a nossa fé crescente e nossa obediência são a Sua glória, e a nossa alegria. A ira amorosa de Deus sobre nós, alimenta e encoraja a fé: isso assegura-nos que Ele continuará a trabalhar tanto dentro de nós como ao nosso redór, para nos libertar do mal interior. [8] No novo nascimento e santificação, o poder destrutivo de Deus funciona dentro de nós contra aquilo que está errado em nós. Ele é por nós, renovando-nos, ensinando-nos a ouvir, refazendo-nos à semelhança de Seu Filho, o Senhor Jesus Cristo. No trabalho diário de amor, nós vivenciamos a ira de Deus a trabalhar em NOSSO BENEFÍCIO. Em resposta, nós, ativamente, cooperamos e obedecemos.
Terceiro, em amor, a ira de Deus irá livrá-lo da dor causada pelos pecados dos outros. A sua ira diante do pecado será expressa para o seu bem. No futuro Ele promete terminar com todo o sofrimento proveniente do pecado de outros. [9] Deus detesta a forma como pessoas ferem umas as outras. Com amor firme, Ele nos libertará dos nossos inimigos; no último dia, todas as causas de dor serão destruídas para sempre. Ao mesmo tempo, a Bíblia esclarece que aqueles que se opõem a 
Deus e ferem o Seu povo, existem com um objectivo: são agentes inconscientes na tarefa de santificação. Eles atuam pelos seus próprios motivos pecaminosos, mas também cumprem os objectivos de Deus para o bem, pois Ele prova-nos e transforma-nos através do sofrimento. Eles são agentes da amorosa disciplina de Deus para com o Seu povo a fim de aprendermos a paciência, fé, amor pelos inimigos, coragem e todos os bons frutos que apenas podem ser aprendidos em tempos difíceis. No entanto, nossos algozes estão debaixo da ira devido à malícia com que fazem o que fazem. [10] 
A ira de Deus irá punir e destruir os Seus inimigos – porque Ele ama os Seus filhos e é glorificado na nosso livramento do sofrer. Por isso gememos na dor, porque o doloroso é ainda doloroso; mas nós também gememos em esperança, porque sabemos o que virá. [11] Como Ele nos ama, Ele se ira com aqueles que procuram magoar-nos: a nossa bem-aventurança é a Sua glória, e é a nossa alegria. A ira amorosa de Deus para conosco, alimenta e encoraja a nossa fé. Os filhos amados de Deus esperam e confiam que, no regresso de Cristo, a Sua cólera irá endireitar as coisas. [12] Em antecipação, com ansiedade, gememos e esperamos.

Deus exprime o Seu amor pelo Seu povo por cada uma das três formas em que Ele exprime a Sua ira ante o êrro. A ira amorosa de Deus resolve todo o problema do mal de um modo que Lhe traz uma glória inefável e, ao mesmo tempo traz-nos bênção igualmente inefável: imparcialmente condenando o mal, quebrando o poder do mal remanescente em nós e trazendo alívio ao sofrimento. Numerosos salmos relacionam o amor resoluto e a piedade do Senhor com esta ira amorosa pela qual Ele liberta os Seus filhos, tanto dos seus próprios pecados, como daqueles que os ofendem. [13] “Se Deus é por nós, quem será contra nós?” (Romanos 8:31).
É importante fazer distinções apropriadas. A ira de Deus se torna a esperança dos Seus filhos apesar de constituir o desespero dos seus inimigos. Mas aqueles inimigos que desejem crer na gloriosa mensagem da forma como a ira de

Deus se converte em graça através de Jesus Cristo, serão transformados em amigos. A verdade é que você não pode entender o amor de Deus se você não entender a Sua ira. Esta é simplesmente a mensagem do livro dos Salmos;essa estrada real para o coração da humanidade redimida, com a sua inexplicável trama de alegria e tristeza, esperança e angústia, confiança e temor, contentamento e ira. Você poderá não entender o amor de Deus se você não entende a sua ira. Esta é simplesmente a mensagem do livro de Romanos, aquela estrada real para entender a mente de Deus: “Ó profundidade das riquezas, tanto da sabedoria, como da ciência de Deus! Quão insondáveissão os seus juizos, e quão inescrutáveis, os seus caminhos! ... glória, pois, a Ele eternamente. Amém!(Romanos 11:33, 36).

Observando, desde outro ângulo, a pergunta de abertura, quem é a pessoa mais irada na Bíblia? - Satanás. A sua ira, também, não se extingue. Ele sente “grande ira”, sendo um “assassino desde o princípio” assim como o é até hoje. [14] A ira de Satanás deriva da malícia e da vontade de ferir as pessoas. A sua ira, o paradigma de toda a ira pecaminosa e injusta, é a antítese da ira de Deus. A hostilidade de Satanás visa fazer coisas erradas, a serviço dos seus próprios desejos. Isto também nos diz algo muito importante. A ira pode ser totalmente errada, maldosa, inapropriada, feia e uma resposta completamente destrutiva. Neste tipo de ira se resume a verdadeira essência do mal: “Eu quero do meu modo e não do modo de Deus e, como não posso fazer do meu modo, sinto-me irado”.

É uma coisa curiosa e muitas vezes confusa que a mesma palavra, “ira”, exprima quer o melhor, quer o pior dos sentimentos e atos. Mantenha distinções próprias, porque aqueles que você aconselha irão usualmente ficar tão confusos sobre a ira como ficam sobre o amor. [15]
A ira pecaminosa usurpa Deus e causa dano; a ira piedosa, por outro lado, ama entronizar a Deus e fazer bem às pessoas.

A Bíblia trata da ira. Logo no primeiro intercâmbio de diálogo, depois da queda no pecado, Adão amaldiçoou a âmbos, a Eva e a Deus pelo que ele mesmo tinha feito. Lançar nossa culpa sobre outros pode ser um ato quase sem emoção, mas, nele, os temas da ira pecaminosa aparecem facilmente: acusação de outros. A postura de superioridade e de inocência presumidas. E é só um capítulo mais tarde que a ira, pela primeira vez, se rompe em emoção e violência. “E irou-se Caim fortemente, e descaiu-lhe o seu semblante”; a sua compostura tornou-se deprimente e infeliz e ele matou o seu irmão (Genesis 4:5). O resultado lógico da ira pecaminosa é registado a seguir na história de Noé: “... e encheuse a terra de violência” (Genesis 6:11).

As Escrituras retratam muitos factos sobre ira. Por exemplo, a ira pode ser estimulada falsamente. Em Genesis 39, a ira de Potifar ardeu com o pensamento de que José se estava a divertir com a sua esposa. E a ira pode mascarar-se em inocência. A esposa de Potifar também estava irada: fria, dissimulada, manipuladora, vingativa, fez o papel de vítima a fim de destruir um homem inocente que tinha rejeitado os seus desejos. A mesma pessoa pode expressar uma ira justa ou uma ira pecaminosa. Quando a ira de Moisés se levantou contra os que adoravam um bezerro de ouro, ele ardeu-se em ira à semelhança de Deus.[16] A ira deu-lhe energia para retificar o problema. Mas quando Moisés amaldiçoou as pessoas e feriu a pedra, ele gravou a fogo a imagem do pecado. A cólera o ativou para desonrar a graça de Deus.[17]

Deus fala muitas vezes dos Seus pensamentos sobre ira de forma proposicional. Ele dedica o sexto mandamento, “Não matarás”, à família de reações críticas que incluem a ira injusta. O comentário de Jesus sobre este mandamento (Mateus 5:21ss) expandiu o âmbito das suas implicações para incluir atitudes e palavras. O Senhor primeiro disse o mandamento “ama o teu próximo como a ti mesmo” num contexto (Leviticus 19:14-18) que contrasta o amor com assuntos pertinentes à ira pecaminosa: intencionalmente magoar pessoas indefesas, julgamento injusto, difamação de carácter, dano físico, ódio interior, vingança, guardar rancor. Interessantemente, a mesma passagem define positivamente o amor em termos que o relacionam com a ira justificada: claro, censura amorosa surge quando se cuida do bem-estar dos outros. A sabedoria, como dádiva pacientemente adquirida de Deus, comenta frequentemente sobre a ira: o sábio e o louco apenas se distinguem pela forma como se iram.[18] E os mensageiros de Jesus frequentemente falaram sobre a ira. Variações sobre o tema constituem metade da lista de Paulo sobre ações representativas da carne pecadora: “inimizades, conflitos, ciúme, surtos de cólera, disputas, dissensões, facções”. Todos os aspectos do fruto do Espírito são o oposto explícito da ira pecaminosa. [19]

Tanto por preceito como por exemplo, a Bíblia continuamente nos esclarece sobre ira, no propósito de mudar-nos.
As motivações para a ira pecaminosa são expostas nas Escrituras: Ansiedades específicas e incredulidade. Porque é que os Israelitas resmungavam repetidamente no deserto? A Bíblia não nos deixa em dúvida. O povo não conseguia o que queria e não cria que Deus era bom, poderoso e sábio. Aquelas passagens de reclamações no Êxodo e Números, também registam quão específicos são os motivos da ira e a forma como os motivos do coração se ligam com os detalhes da situação. 

Quando a comida era monótona, as pessoas ansiavam por pepino, melão, cebola e alho. Quando Moisés agiu como porta-voz de Deus, Miriam e Aarão ansiaram por partilhar o microfone. Quando os inimigos
ameaçavam, o povo temia a morte em vez de confiar que Deus o protegeria. Quando a água não aparecia, as pessoas ansiavam por cereais irrigados, figos, uvas, romãs e água.[20] A ira pode ser deprimente e assassina como o foi com Caim; a ira pode arder com emoção como o foi com Potifar; a ira pode planificar com malícia fria como o fez sua esposa; a ira pode rosnar e resmungar, prosseguindo com queixas, descontentamento e pelejas, tal como com o povo no deserto. Mas, em todos os casos, a causa da ira pecaminosa reduz-se às mentiras específicas e luxúrias que governam o coração humano. Você, e aqueles a quem você aconselha, não são diferentes.

A ira também provoca consequências devastadoras. Deus ira-se justamente, com a nossa ira pecaminosa. Por exemplo, a fúria de Moisés contra o povo (outro padrão típico: ficar enfurecido contra pessoas enfurecidas, resmungar sobre pessoas que resmungam) custou-lhe a terra prometida. Naturalmente as pessoas tendem a reagir da mesma forma quando diante de uma pessoa irada, o que multiplica o desagrado geral: “O homem iracundo levanta contendas” (Provérbios 29:22). As pessoas iradas são divisivas; as pessoas divisivas são pessoas iradas. Você muitas vezes observa as consequências imediatas nas vidas daqueles que você aconselha: filhos amedontrados, uma esposa amargurada, amizades desfeitas, problemas de saúde, dificuldades no local de trabalho, afastamentos da igreja. Os problemas seguem de perto a uma pessoa irada “O homem de grande ira tem de sofrer o dano; porque, se tu o livrares, virás ainda a fazê-lo novamente.” (Provérbios 19:19).

A ira alimenta-se de si própria e desenvolve-se. Saul era um homem usualmente obstinado. O seu temperamento pacato estava apenas um pouco abaixo da superfície. A doce harpa de David e os atos assombrosos de repressão piedosa acalmavam temporariamente a Saul, mas, logo iria de novo explodir. As Escrituras estão cheias de exemplos de ira, com as suas muitas formas, causas e variados efeitos. Jonas, Jezebel, Nabal e os Fariseus são apenas algumas das vidas agarradas por este mal poderoso e muito típico. Em cada lista de pecados típicos – e não existe tentação que não seja comum a todos – a ira é proeminente.

Graças a Deus que a Bíblia também trata do evangelho que perdoa e transforma as pessoas iradas. Provérbios, Efésios e Tiago, são apenas alguns dos livros que analisam a ira a fim de a redimir e transformar. Deus nunca levanta um espelho sem segurar uma luz. Ele fala completa e frequentemente sobre a Sua misericórdia para com pessoas iradas. Ele fala completa e frequentemente sobre as alternativas à ira pecaminosa: confiança, perdão, paciência, contentamento, busca por justiça, confrontação divina, todas as variadas estratégias e atitudes de estabelecer a paz, auto-controle e auto-conhecimento. A ira justificada é uma coisa excelente e construtiva. Moisés, Sansão, David e Paulo, como Jesus, em certas ocasiões arderam com esta integridade raríssima.

Deus na Sua graça derrama amabilidade sobre as pessoas que estavam “servindo a várias concupiscências e deleites, vivendo em malícia e inveja, odiosos, odiando-nos uns aos outros.” (Tito 3:3). O que pretende conseguir a graça? A graça cria pessoas sábias, auto-controladas e ternas que são capazes de se erguer e fazer algum bem neste mundo de hostilidade (Tito 2:11-3:8). Cada elemento na definição de amor em 1 Coríntios 13 é o oposto explícito de ira pecaminosa e injusta. Compreender a sua ira é compreender algo que está no âmago das trevas. Mudar, aprendendo âmbas, a misericórdia e a ira justa e piedosa, consiste em entrar no centro da luz. Nós todos somos conflituosos por natureza; bem-aventurados os pacificadores, porque eles serão chamados de filhos de Deus.

A ira fornece uma tremenda oportunidade de aconselhamento. As questões são evidentes. Quando em estado de ira, o coração humano é colocado abertamente sobre a mesa, sem lugar onde se possa esconder. Muitas vezes as vidas dos aconselhados são confusas: uma questão complica outra questão; problemas empilham-se sobre problemas. Por onde começar? Muitas vezes a ira, é um bom lugar por onde começar. Os comportamentos são muitas vezes claros para todos: o tom de voz, o tom mordaz nas palavras, o brilho nos olhos, a expressão facial de desgosto. A sua presença é fácil de ver: resmungo, lamúria, hostilidade, crítica, amargura, rancor, negativismo, ódio, conflito, mau humor, manipulação, coerção. Os motivos usualmente não são difíceis de descobrir: um mosaico de desejos muito específicos, medos, falsas crenças, exigências. Os efeitos são francamente ruins: relacionamentos acabados, problemas de saúde, miséria. A Palavra de Deus aplica-se de maneira imediata e de muitas formas: trazendo autoconhecimento, convicção, piedade, esperança, alternativas construtivas, auxílio concreto. Não admira que a Bíblia gaste tanto tempo a falar de ira e de suas alternativas!

E não admira ser tão importante que nós entendamos as mensagens da Bíblia sobre a ira. Grandes coisas estão em jogo. Por um lado, a família descontente – irada – que com ódio violento, apresenta alguns dos pecados humanos mais característicos. Todos vivenciamos raiva ímpia e todos precisamos de ajuda. Por outro lado, Deus exprime a Sua glória e piedade através de Sua ira justa. Aquilo de que precisamos, Ele dá-nos livremente ao Se revelar para o nosso próprio bem.


2. A ira é algo que você faz

A ira é algo que você, como pessoa que é, FAZ com TODO o seu ser. A aceitação deste fato, irá ajudá-lo a ver através das meias-verdades pelas quais a nossa cultura nos mente sobre a ira. [21] Todas as partes da natureza humana estão envolvidas. A ira envolve o seu corpo. Tem uma componente nitidamente fisiológica: a face corada, o aumento de adrenalina, os músculos tensos, o estômago embrulhado, a tensão dos nervos. De modo interessante, a maior parte das palavras que as Escrituras utilizam para ira são transmitidas através de metáforas vívidas e corporais. As duas palavras principais do Antigo Testamento para designar ira descrevem “narinas” e “queimar”. Se você já viu alguma vez uma pessoa realmente irada você provavelmente reparou a forma como as narinas se alargam, a respiração tornase pesada e irregular, o sangue inunda os capilares e aquece a pele. De forma semelhante, as principais palavras gregas para cólera comunicam a sensação de “fumegar ou fumar” e “inchaço”, refletindo a sensação de calor e o evidente inchaço da face e dos olhos. Não é por acaso que muitos dos nossos idiomas para ira contemplam os efeitos fisiológicos: “calor por baixo do colarinho”, “fumegante”, “respirando fogo”, “vulcânico”, “ver tudo vermelho”, “sangue a ferver”, “queimar lentamente”. Que a ira é infalivelmente fisiológica, contribui para a verosimilhança dessas teorias medicalizadas que a consideram como basicamente fisiológica, portanto como algo a ser acalmado com medicamentos. Naturalmente as nossas hormonas, fluxo sanguíneo, músculos e expressões faciais registam a ira. Mas não se trata só disso. Biblicamente, a pessoa inteira produz (ou faz) a ira.

Quando alguém diz, “Estou irado”, nós geralmente pensamos primeiro em emoções. E a ira é uma “paixão”. As pessoas sentem ira. O seu equilíbrio emocional está “transtornado”. Naturalmente que os níveis de intensidade variam tremendamente. A escala emocional de Richter pode variar desde uma ligeira irritabilidade até uma fúria cega. Você não precisa falar asneiras e vociferar para ter um problema de ira pecaminosa. O mau humor, a observação cortante, a auto-piedade amuada e a atitude crítica, todos se qualificam. Curiosamente algumas das formas mais assustadoras de ira parecem quase sempre sem emoção. Elas são geladas em vez de quentes. Nunca esquecerei uma conversa que tive há muitos anos com uma rapariga de dezesseis anos. Parecia irada com os seus pais. Quando lhe perguntei o motivo, ela olhou para mim com os olhos frios como os que você observa nas fotos de assassinos profissionais. Ela respondeu com uma voz sem expressão, “Eu não sinto ira; sinto-me nivelada” “Eu não me iro; pago com a mesma moeda”. Uma larga variedade de cores emocionais exprime o descontentamento e hostilidade e você vai encontrá-las todas no aconselhamento. Mas muitas pessoas querem pensar na ira como apenas uma emoção e talvez como uma emoção neutra dada por Deus. No entanto, por que limitar a ira à fisiologia ou ao sentimento, quando é claramente muito mais que isso?

A ira também consiste em pensamentos, palavras mentais e quadros, atitudes, julgamentos. Ela envolve razão, imaginação, memória, consciência, todas as faculdades internas. Mesmo se não aparecerem palavras nem ações, a pessoa irada pensa intensamente. “Você é estúpido. Isto não é justo. Não posso acreditar que ela me fez isto”. A câmara interna de vídeo, repassa imagens do que aconteceu, ou pode escrever o argumento ou ensaiar cenários imaginários de retribuição violenta. Todo o sistema criminal de justiça – excepto um advogado de defesa para o acusado! – se apresenta na sala do tribunal da mente: investigador, advogado de acusação, testemunhas, juiz, júri, carcereiro e carrasco. Esta atitude judicial está escrita na natureza da ira. É uma atitude de julgamento, condenação e desagrado perante pessoas ou coisas. Palavras e ações são pensadas e planificadas, quer venham (ou não venham) a ser ditas ou feitas. A ira acontece não apenas na mente, ela transforma-se em comportamento. Conheci um casal que culminou uma discussão particularmente violenta com um tiroteio, ele no cimo da escada e ela em baixo. Eu nunca fiz isso, mas já comuniquei friamente a minha irritação à minha esposa quando enterrei, o mais que pude, o nariz numa revista depois dela ter feito um comentário do qual não gostei. A ira faz coisas. Ela mostra-se em palavras acusadoras ou sarcásticas, pragas, exageros, atitudes, pancada, olhares de descontentamento, sair da sala, elevar o nível de decibéis na voz, ameaças, má cara. Você fica irado com tudo o que você é.
E a intriga complica-se. A ira, tal como outros pecados, raramente está só. Muitas vezes ela entrelaça-se profundamente noutros problemas pessoais. Muitas vezes a ira e o medo são primos próximos. Testemunhei uma mãe a gritar com raiva para o seu filho pequeno que estava no chão a chorar depois de um acidente no parque infantil. Ela estava assustada; gritava em vez de confortar. Algumas teorias da ira tentam afirmar que a ela é secundária ao medo, mas isto é seguramente errado. Quando as coisas não caminham bem, todos os pecadores se sentem como esquilos encurralados numa garagem: lutam ou voam dependendo da situação. A ira e o medo coexistem.

A ira complica muitos outros problemas. O abuso de substâncias pode relacionar-se com a ira de várias formas. Uma amiga da família disse uma vez, comentando sobre o seu marido, “Ele bebe para se controlar contra a sua ira”. Quando ele não bebia, tornava-se mais hostil para ela, para o seu chefe e para o mundo. Rancores velhos iriam assombrá-lo. Quando ele bebia tornava-se mais brando e sentia-se melhor. O álcool servia como medicamento contra a ira. Eis um padrão diferente: Uma mulher bebia para exprimir a sua ira contra os pais severamente estritos. Envergonhando a todo mundo e acabando na sarjeta, lhe servia como uma forma de vingança.

A imoralidade sexual pode ligar-se à ira. Um homem solteiro falou do seu uso de pornografia como um “acesso de ira para com Deus por Ele não me dar uma esposa”. Muitos adultérios ocorrem como uma forma de pagar na mesma moeda. O suicídio pode exprimir-se da mesma forma: “Você magoou-me tanto que eu não tinha outra forma de
retribuir, mas certamente que você se vai sentir mal se eu me matar, e você terá que viver com aquilo que me fez”. A ira contra sí mesmo é um fenómeno comum: “Eu não posso acreditar que tenha feito algo tão estúpido. Se eu fosse mais belo, rico, inteligente e tivesse uma conversa brilhante, mas sou apenas uma pessoa feia, pobre e estúpidamente tediosa”. A auto-recriminação, auto-acusação, mesmo a auto-tortura (queimaduras com cigarros, bater com a cabeça na parede, etc.) podem manifestar a falta de esperança, a raiva contra si mesmo numa demonstração de um sentimento de fracasso.

Até agora, temos principalmente descrito a ira pecaminosa como um problema pessoal. Mas a ela é geralmente um acontecimento inter-pessoal. A ira tem umobjecto, um alvo.[22] Obviamente, a ira é uma característica central de conflitos inter-pessoais onde quer que eles ocorram: casamentos, famílias, igrejas, locais de trabalho, vizinhanças, nações. É uma estratégia inter-pessoal, um evento social e político. A Guerra tem estratégias ofensivas e defensivas. Como insignificantes barões preparando-se para o combate, as pessoas lançam setas de acusações maliciosas e constroem muros acastelados de autojustificação agravada, medo e mágoa. Aqui, a ira adopta uma posição militar como, também, um papel judicial. É uma arma ideal para conseguir o que você quer. A ira força, intimida e manipula. Você irá aconselhar famílias que “caminham sobre cascas de ovos” ou “se enterram em tocas de raposas” perante o fogo que se aproxima em relação a um familiar de temperamento explosivo.

Não admira que a ira também se revele no relacionamento inter-pessoal mais básico: com Deus. 
Muitas pessoas estão iradas com Deus. Pessoas tratam a Deus da mesma forma como tratam aos outros – essa observação irá fazer com que você percorra um longo caminho no aconselhamento. Os Israelitas queixavam-se indiscriminadamente, acusando Moisés e o Senhor. As pessoas frequentemente alvejam Deus com zombaria, pragas, amargura e deturpação premeditada. Quando o Filho de Deus andava pela terra, os homens se dispunham a alvejá-lo. Você muitas vezes vai aconselhar pessoas que vêm Deus através da lente de uma ira acusadora: como se Deus fosse, na verdade, o diabo, um desmancha-prazeres cuja natureza é maliciosa, legalística, cruel, remota e incensível. Isto não é para admirar. Se eu acredito que Deus existe para dar-me o que eu quero, ficarei irado quando Ele não cumpre em dar-me. Na verdade, quando considerada do ponto de vista daquilo que motiva o coração humano, toda a ira injusta tem imediata referência com Deus. Se eu rogo pragas ao calor e umidade, eu ataco Deus de três formas. Primeiro, abandono-O, a fonte de vida, actuando como se Ele não existisse. Segundo, actuo como se eu fosse deus elevando minha vontade para o confôrto de uma condição suprema no meu universo. Terceiro, eu resmungo contra Ele, criticando implicitamente o real Autor do “mau” tempo, por me desagradar do tempo.
A ira é física, emocional, mental, comportamental. Ela entrelaça-se com muitos outros problemas. É decididamente inter-pessoal, quer no que respeita às pessoas como a Deus. Em resumo, você encoleriza-se com TUDO o que você é. Mas, qual a procedência da ira?

3. A ira é natural

A ira é algo dado por existente; ela é natural aos seres humanos de duas formas muito diferentes. É natural porque fomos criados à imagem de Deus; é natural porque caímos no pecado. Deus criou-nos, à Sua imagem, e, não menos, com a capacidade para a ira. E Ele chamou a isto de muito bom. Na verdade, Adão e Eva deveriam ter ficado mortalmente irados quando a serpente lhes mentiu sobre a vida e a morte, sobre Deus e a sabedoria. Deveriam ter reagido com fortes emoções, argumentos claros e ação violenta. Deveriam ter desafiado essas mentiras, pegarem em pedras e matarem a serpente. A ira é uma boa coisa, inerente da natureza humana.
Como seres humanos feitos e refeitos à imagem de um santo Deus, nós estamos conetados à capacidade de sentirmos a ira contra o êrro como uma expressão de amor, tanto para Deus, como para os que foram magoados pelo erro. E, como pecadores que recebemos misericórdia em vez de ira, temos a capacidade, de outra maneira inexplicável, simultaneamente odiar o êrro e expressar amor àqueles que praticam o mal: “... tendo deles misericórdia com temor, aborrecendo até a roupa manchada da carne.”(Judas 23). Quando estiver aconselhando e você encontrar adultério, ou violência contra os fracos, ou palavras cruéis, você vai sentir dor e aversão pelas acções e pelos seus efeitos sobre outros. E no entanto você vai simultaneamente sentir piedade para dar-se generosamente aos perpetradores de tais males.

Muitas outras implicações do aconselhamento, abundam. Por exemplo, precisamos de lembrar que a criação de Deus é diversa; as pessoas não são todas iguais. Nós não devemos ficar admirados pelo facto de algumas pessoas terem nascido mais harmonizadas com a justiça ou mais emocionalmente contundentes do que outras. Entre os meus três filhos, as diferenças no temperamento mostraram-se quase desde o primeiro dia de vida: diferentes capacidades para reacção emocional, para reagirem à injustiça, para raciocinarem sobre acontecimentos. As relações de Deus com a ira (e outros problemas) não eliminam a diversidade humana; Ele opera dentro deste contexto.
Por isso a ira é natural, por criação. Mas desde a Queda, a ira injusta e pecaminosa é também algo inqüestionável. Como os seres humanos se corromperam na imagem de um acusador ímpio, nós também estamos interligados por ressentimento e ódio. E num mundo caído, a ira humana é tão desordenada que Tiago pode fazer uma acusação bastante ampla: “Seja tardio para se irar, porque a ira do homem não opera a justiça de Deus.” (Tiago 1:20). Só mesmo uma pessoa estúpida não pensaria duas vezes antes de se irar-se. Mas nós desempenhamos facilmente o papel de tôlos. Mesmo a ira nascida de motivos correctos, degenera facilmente em arrogância, mexericos, autopiedade, vingança, cinismo e acusação sem clemência.

A nossa capacidade para a ira pecaminosa mostra-se muito cedo: ninguém precisa de ensinar uma criança a fazer uma birra. A primeira vez que uma das minhas filhas se atirou para o chão, deu pontapés e gritou “assassino sanguinário”, a minha esposa e eu olhámos um para o outro com espanto. A nossa filha nunca tinha visto ninguém a agir desse modo. Pelo menos que fosse do nosso conhecimento. Ela era nova e não tinha sido exposta a muitas outras crianças. Na verdade ela nunca tinha estado fora da nossa presença, com excepção de breves momentos com pessoas que olhavam por elas, nenhuma das quais pensaríamos poder ter demonstrado aquilo que estávamos agora a presenciar. Mas ali estava ela, tresloucada como uma galinha molhada porque a sua vontade tinha sido contrariada! Era um acto de iniquidade criativa não aprendido. Precisamos lembrar que a depravação total inclui a nossa ira, nada mais nada menos do que qualquer outra coisa distintivamente humana.

4. A ira é aprendida

A ira é aprendida também de duas formas diferentes. Primeiro, a ira é ensinada e modelada para nós. Nós colhemos a ira de outras pessoas, para o bem ou para o mal. Aprendemos a ficar exaltados e aprendemos a forma de mostrar o nosso desagrado. [23]
Hábitos, estilos e tendências para a ira pecaminosa são facilmente adquiridos dos outros. Muitas crianças que nunca pensaram em permitir um palavrão irado – elas nunca ouviram todas as palavras más – ficam surpresas quando alguém deixa escapar uma dessas palavras durante a primeira viagem no autocarro escolar. Conflitos entre os pais talvez desperte a formação do hábito. Mas mais tarde, quando eles vivem num dormitório de universidade ou conseguem o seu primeiro emprego numa construção, numa fábrica ou no serviço militar, a palavra de baixo calão infiltra-se como modificador para todos os fins: “Passe-me a %$#@! manteiga” não se aprende usualmente em casa.

Ao modelar, a ira e as pragas hostís tornam-se formas rotineiras de responder à menor frustração. Com bons motivos a Bíblia afirma, “Não acompanhes o iracundo, nem andes com o homem colérico, para que não aprendas as suas veredas e tomes um laço para a tua alma” (Provérbios 22:24, 25). Os aconselhadores irão analisar as companhias das quais os aconselhados irados possam ter aprendido a forma de como se irar e com o que se irar. Um pai que normalmente maldiz o tempo, o tráfego, ou a sua esposa, discipula os seus filhos a proceder do mesmo modo.
A ira construtiva e piedosa também se aprende, embora hábitos, estilos e tendências para com a ira justificada não sejam facilmente adquiridos dos outros. Não obstante, “anda com os sábios e serás sábio” (Provérbios 13:20). E se nós caminharmos com o homem mais sábio que jamais houve – Jesus - iremos aprender a “andar como Ele andou”.(1 João 2:6).

Muitos dos pormenores do estilo de ira de uma pessoa podem ser influenciados por pais, companheiros ou grupos étnicos. Diferenças culturais na expressão de emoções pecadoras, ou correctas, podem ser nítidas. A ira italiana e a ira norueguesa diferem drasticamente nas formas de expressão.[24] A ira pecaminosa procede sempre “do interior do coração do homem” (Marcos 7:20-23), mas a forma exacta assumida pela ira é uma questão de criatividade. Os conselheiros devem esperar que, tanto a ira honrada como a ira pecaminosa, irão parecer diferentes, dependendo de diferenças individuais e culturais e não devem impor o seu próprio estilo pessoal naqueles que aconselham.

A ira é aprendida de uma segunda maneira. É praticada e pode tornar-se “segunda natureza”; uma forma habitual de vida. Os nossos padrões de ira tornam-se característicos. Algumas pessoas explodem e depois se acalmam; outras se ocultam em si memos; outras se desenfream em ira durante dias. Algumas pessoas elevam as suas vozes, outras ficam caladas; algumas pessoas dão muitos sinais de estarem iradas, outras promovem ataques de guerrilhas em qualquer parte; algumas usam a ira para intimidar e controlar as outras pessoas, uns usam a ira para emburrar-se e evitar outras pessoas. O aconselhador pastoral devem familiarizar-se com a carnalidade característica das suas ovelhas.[25]

5. A ira é uma questão moral

A ira é um assunto intrinsecamente moral. Isto afirmo por duas razões. A ira avalia, e a ira é avaliada por si mesma. Isto foi implícito na discussão anterior mas vale a pena levantar novamente o ponto para análise. Primeiro, a ira avalia;
isto é, ela pondera algo ou alguém, a encontra em falta, errada ou desagradável e depois parte para a ação. A ira impulsiona-nos para atacar ou para desacreditar aquilo que achamos desagradável. A ira foi uma vez bem descrita como a “emoção moral”. É um sistema judicial auto-contido, reagindo com energia ao erro percebido.

Ao longo deste artigo tenho tipicamente alargado a nossa definição de “ira” para incluir o criticismo, a resmunguice, transferir a outro nossa culpabilidade , o ódio, a violência e outros sentimentos semelhantes. Todas estas coisas são julgamentos contra o mal percebido. Aquilo que nós pensamos tipicamente ser “ira” – uma voz elevada, palavras acusadoras, calor emocional, atitude hostil – é provavelmente melhor definido como “uma forma estimulada emocionalmente, de julgamento contra um mal percebido”.

Neste artigo estamos preocupados com a natureza essencial da ira, não em discriminar nuanças. E essa natureza essencial consiste em passar um julgamento moral contra algo que, ao mesmo tempo, pensamos ser errado e importante. Eu preocupo-me suficientemente sobre algo para ser movido: “a moção” em emoção, o “motivo” em “motivação”. Sou movido para, igualmente, sentir-me forte e para fazer alguma coisa. A ira, pela sua própria natureza, assume uma posição moral; ela julga.
Segundo, a ira é avaliada. Deus julga o nosso julgamento; Ele avalia moralmente cada simples exemplo de ira. Será que eu percebo de forma precisa o bem o o mal? Será que eu reajo a um mal percebido de uma forma piedosa? Se eu me contrarío quando o telefone toca e quebra a minha concentração, resmungando uma série de impropérios, a minha ira proclama, “Esta chamada é ruim; merece ser amaldiçoada”. Deus avalia, quer o meu critério de julgamento, quer a minha forma de reagir e considera ambos errados. Se eu xingo um adúltero e faço bisbilhotice sobre ele, a minha ira proclama, “O adultério está errado e deve encontrar a maldição e a bisbilhotice”. Deus avalia o meu critério de julgamento e considera-o correto; Ele avalia a minha forma de reagir e considera-a errada. Se eu me iro quando o meu filho troça da sua mãe, e lhe respondo com uma reprovação vigorosa e amorosa, a minha ira proclama, “O desrespeito está errado e deve ser reprimido com energia, com respeito, desafio e misericórdia”. Deus avalia a minha ira, quer o meu critério de julgamento, quer a minha forma de reagir e considera-os correctos. Essa ira exprime amor tanto pela minha esposa como pelo meu filho. A força emocional dessa ira amorosa produz coisas boas. Ela motiva-me a intervir; ela protege a minha esposa; ela proporciona ao meu filho a significância do erro; ela modela a forma correta de responder ao pecado de outro.

O cristianismo não consiste em apatia estóica, portando-se “acima” da reacção emocional.[26] Muitas pessoas, em nome de “se auto-controlarem”, na verdade provam ser descuidadas ou obtusas. Elas pecam por omissão; estão ausentes, não ajudam onde a piedade iria incomodar-se e procurar formas de causar um impacto. Mas o Cristianismo tampouco dá livre curso a emoções. “O longânimo é grande em entendimento, mas o de ânimo precipitado exalta a loucura”(Provérbios 14:29). A ira não é neutra. Uma linha entre a sabedoria e a loucura percorre o centro de cada ocasião de “ira”; ela, ou é bendita, ou diabólica.

Aqui o pensamento bíblico vai directamente contra a nossa cultura. A nossa cultura tipicamente afirma, “A ira não é boa nem má, ela apenas existe”. A teoria de que as emoções são neutras tornou-se um estribilho da cultura terapêutica. Mas não é verdade que a ira “apenas existe”. Muitas pessoas, em nome de “apenas serem honestas” ou de “tirar isso de cima de mim”, provam a elas mesmas que são irreflectidamente auto-centradas. Pecam por comissão, são impulsivas, provocando prejuízo onde a piedade deveria considerar o impacto de palavras. Aprender a discernir a diferença entre ira justa e a ira pecadora é extremamente importante e nem sempre é fácil.
Nós devemos sintonizar o nosso julgamento moral –ter “os sentidos exercitados para discernir tanto o bem como o mal.”(Hebreus 5:14) – para podermos ver a diferença entre a ira justa e a ira pecaminosa. Deus e o diabo estão ambos sempre irados; de que lado está a sua ira? A Escritura dá muitos critérios com os quais Deus nos ensina a discernir. Vamos considerar sete critérios.

A ira piedosa não precisa de “vencer”. Não precisa de sucesso em trazer malfeitores para a justiça. 
Os seus propósitos são mais modestos à superfície, mas mais extravagantes debaixo da superfície: a glória de Deus e o bem-estar eterno do povo de Deus. A ira piedosa tem bons resultados para todos os propósitos. Por isso, quando você é confrontado com um mal vindo de alguém sem arrependimento, quando os seus melhores esforços parecem não ter tido efeito bom nem duradouro, você não tem que ficar ainda mais irado. Você pode, em vez disso, tornar-se mais objectivo e concreto. No seu interior, a piedade funciona para abrandar o seu coração. Jesus faria com que você orasse pelo bem da pessoa, o que certamente inclui orar por seu arrependimento para a vida (Lucas 6:28). No exterior, você é chamado para atos persistentes, francos , de bondade imerecida: “Portanto, se o teu inimigo tiver fome, dá-lhe de comer; se tiver sede, dá-lhe de beber” (Romanos 12:20). Também no exterior, você pode ser chamado para se juntar com outros naquelas actividades corporativas que impõem consequências objectivas ao comportamento errado das pessoas: disciplina eclesiástica, recusa de ajuda financeira, rompimento de um emprego, uma notícia de despejo, chamar a polícia, processo criminal, aprovação de melhores leis, votar em novos líderes e outras coisas semelhantes. Essas boas actividades são também “julgamentos contra o mal percebido”, mas operam de um modo mais desapaixonado.
Elas são necessidades objectivas e sóbrias. Colocam limites sobre os nossos empenhos mais pessoais para ajudar as pessoas. Como tal, elas são de grande conforto e bem-estar. É muitas vezes um grande alívio para uma pessoa confrontando-se com um mal persistente, saber que outros também estão assumindo responsabilidade para tornar as coisas direitas. Isso diminui a tentação da ação de vigilância.

A ira é uma questão moral. Pela sua própria natureza ela avalia e procura destruir o erro percebido. A nossa ira está sempre a ser avaliada pela verdadeira natureza de Deus..
Estas afirmações gerais sobre a ira estabilizam o nosso pensamento. A Bíblia trata da ira com ricos pormenores através de exemplos e de proposições. A ira é física, emocional, mental e comportamental. É decididamente interpessoal, tendo sempre a ver com Deus e tendo muitas vezes a ver com outras pessoas. É, igualmente, natural e aprendida, para o bem e para o mal. É um assunto moral. Deus dá-nos uma visão ampla de onde podemos pensar sobre a ira e combater os diversos fenômenos que encontramos relacionados com a ela.
Aplicações de aconselhamento foram dispersas através das páginas anteriores e os leitores irão provavelmente retirar muitas outras aplicações. Na próxima edição iremos considerar algumas das mais importantes aplicações com mais detalhe.


 Por : Escola Bereana - ADVEC 




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