A Ira de Deus
por
Arthur W. Pink
É triste ver tantos cristãos professos que parecem
considerar a ira de Deus como uma coisa pela qual eles precisam pedir
desculpas, ou, pelo menos, parece que gostariam que não existisse tal coisa.
Conquanto alguns não fossem longe o bastante para admitir abertamente que a
consideram uma mancha no caráter divino, contudo, estão longe de vê-la com bons
olhos, não gostam de pensar nisso e dificilmente a ouvem mencionada sem que
surja em seus corações um ressentimento contra essa idéia. Mesmo dentre os mais
sóbrios em sua maneira de julgar, não poucos parecem imaginar que há na questão
da ira de Deus uma severidade terrificante demais para propiciar um tema para
consideração proveitosa. Outros dão abrigo ao erro de pensar que a ira de Deus
não é coerente com a Sua bondade, e assim procuram bani-la dos seus
pensamentos.
Sim, muitos há que fogem de visualizar a ira de Deus, como
se fossem intimados a ver alguma nódoa no caráter divino, ou algum defeito no
governo divino. Mas, o que dizem as Escrituras? Quando a procuramos nelas,
vemos que Deus não dez tentativa alguma para ocultar a realidade da Sua ira.
Ele não se envergonha de ar a conhecer que a vingança e a cólera Lhe pertencem.
Eis o Seu desafio: "Vede agora que eu, eu o sou, e mais nenhum Deus
comigo; eu mato, e eu faço viver; eu firo, e eu saro; e ninguém há que escape
da minha mão. Porque levantei a minha mão aos céus, e direi: Eu vivo para
sempre. Se eu afiar a minha espada reluzente, a travar do juízo a minha mão,
farei tornar a vingança sobre os meus adversários, e recompensarei aos meus
aborrecedores"(Dt.32:39-41). Um estudo na concordância mostrará que há
mais referências nas Escrituras à indignação, à cólera e à ira de Deus, do que
aos Seu amor e ternura. Porque Deus é santo, ele odeia todo pecado; e porque
ele odeia todo pecado, a Sua ira inflama-se contra o pecador. (Sl.7:11).
Pois bem, a ira de Deus é uma perfeição divina tanto como a
sua fidelidade, o Seu poder ou a Sua misericórdia. Só pode ser assim, pois não
há mácula alguma, nem o mais ligeiro defeito no caráter de Deus, porém,
haveria, se Nele não houvesse "ira"! A indiferença para com o pecado
é uma nódoa moral, e aquele que não odeia é um leproso moral. Como poderia
Aquele que é a soma de todas as excelência olhar com igual satisfação para a virtude
e o vício, para a
sabedoria e a estultícia? Como poderia Aquele que é
infinitamente santo ficar indiferente ao pecado e negar-Se a manifestar a Sua
"severidade"(Rm.11:22) para com ele? Como poderia Aquele que só tem
prazer no que é puro e nobre, deixar de detestar e de odiar o que é impuro e
vil? A própria natureza de Deus faz do inferno uma necessidade tão real, um
requisito tão imperativo e eterno como o céu o é. Não somente não há
imperfeição nenhuma em Deus, mas também não há Nele perfeição que seja menos
perfeita do que outra.
A ira de Deus é sua eterna ojeriza por toda injustiça. É o
desprazer e a indignação da divina equidade contra o mal. É a santidade de Deus
posta em ação contra o pecado. É a causa motora daquela sentença justa que ele
lavra sobre os malfeitores. Deus está irado contra o pecado porque este é
rebelião contra a Sua autoridade, um ultraje à Sua soberania inviolável. Os
insurgentes contra o governo de Deus saberão um dia que Deus é o Senhor. Serão
levados a sentir quão grandiosa é aquela Majestade que eles desprezaram, e como
é terrível aquela ira de que foram ameaçados e a que não deram a mínima
importância. Não que a ira de Deus seja uma retaliação maldosa e mal
intencionada, infligindo agravo só pelo prazer de infligi-lo, ou devolver a
ofensa recebida. Não; embora seja verdade que Deus vindicará o domínio como
Governador do universo, ele não será revanchista.
Evidencia-se que a ira divina é uma das perfeições de Deus,
não somente pelas considerações acima apresentadas, mas também fica
estabelecido claramente pelas declarações expressas da Sua Palavra.
"Porque do céu manifesta a ira de Deus..."(Rm.1:18).
"Manifestou-se quando foi pronunciada a primeira sentença de morte, quando
a terra foi amaldiçoada e o homem foi expulso do paraíso terrestre; e depois,
mediante castigos exemplares como o dilúvio e a destruição das cidades da
planície com fogo do céu, mas, especialmente pelo reinado da morte no mundo
todo. Foi proclamada na maldição da lei para cada transgressão, e foi imposta na
instituição do sacrifício. No capítulo 8 de romanos, o apóstolo Paulo chama a
atenção para o fato de que a criação inteira ficou sujeita à vaidade, e geme e
tem dores de parto. A mesma criação que declara que existe um Deus, e publica a
Sua glória, também proclama que Ele é inimigo do pecado e o vingador dos crimes
dos homens. Acima de tudo, porém, do céu se manifestou a ira de Deus quando o
Filho de Deus veio a este mundo para revelar o caráter divino, e quando essa
ira foi demostrada nos Seus sofrimentos e morte, de maneira mais terrível do
que por todas as provas que Deus antes dera da Sua aversão pela pecado. Além
disso, o castigo futuro e eterno dos ímpios agora é declarado em termos mais
solenes e explícitos do que antes. Sob a nova dispensação há duas revelações
dadas do céu, uma da ira, a outra da graça"(Robert Haldane).
Mais: que a ira de Deus é uma perfeição divina está
demostrado claramente pelo que lemos nos Salmo 95:11: "Por isso jurei na
minha ira que não entrarão no meu repouso". Duas sãos as ocasiões em que
Deus "jura": quando faz promessas (Gn22:16), e quando faz
ameaças(Dt.1:34). Na primeira, jura com misericórdia dos Seus filhos; na
Segunda, jura para aterrorizar os ímpios. Um juramento é feito para
confirmação: Hb.6:16. Em Gn.22:16 disse Deus: "Por mim mesmo, jurei".
NO Sl.89:35 ele declara: "Uma vez jurei por minha santidade".
Enquanto que no Sl.95:11 ele afirma: "Jurei na minha ira". Assim é
que o grande Jeová pessoalmente recorre à Sua "ira" como a uma
perfeição igual à sua "santidade": tanto jura por uma como pela
outra! Ainda: como em Cristo "...habita corporalmente toda a plenitude da
divindade"(Cl.2:9), e como todas as perfeições divinas são notavelmente
manifestadas por Ele (Jo.1:18), por isso lemos sobre "... a ira do
Cordeiro"(Ap.6:16).
A ira de Deus é uma perfeição do caráter divino sobre a qual
precisamos meditar com freqüência. Primeiro, para que os nosso corações fiquem
devidamente impressionados com a ojeriza de Deus pelo pecado. Estamos sempre
inclinados a uma consideração superficial do pecado, a encobrir a sua fealdade,
a desculpá-lo com escusas várias. Mas, quanto mais estudarmos e ponderarmos a
aversão de Deus pelo pecado e a maneira terrível como se vinga dele, mais
probabilidade teremos de compreender quão horrível é o pecado. Segundo, para
produzir em nossas almas um verdadeiro temor de Deus: "... retenhamos a
graça, pela qual sirvamos a Deus agradavelmente com reverência e piedade
("santo temos"); porque o nosso Deus é fogo
consumidor"(Hb.12:2829). Não podemos serví-lO "agradavelmente"
sem a devida "reverência" ante a sua tremenda Majestade e sem o
devido "santo temor" de Sua ira, e promoveremos melhor estas coisas
trazendo freqüentemente à memória o fato de que "o nosso Deus é um fogo
consumidor". Terceiro, para induzir nossas almas a fervoroso louvor a Deus
por Ter-nos livrado "... da ira futura"(I Ts.1:10).
A nossa prontidão ou a nossa relutância em meditar na ira de
Deus é um teste seguro de até que ponto os nossos corações reagem à Sua
influência. Se não nos regozijamos verdadeiramente em Deus, pelo que ele é em
Si mesmo, e por todas as perfeições que nEle há eternamente, como poderá
permanecer em nós o amor de Deus? Cada um de nós precisa vigiar o mais possível
em oração contra o perigo de criar em nossa mente uma imagem de Deus segundo o
modelo das nossas inclinações pecaminosas. Desde há muito o Senhor lamentou:
"... pensavas que (Eu) era como tu"(Sl.50:21). Se não nos alegramos
"... em memória da sua santidade"(Sl.97:12), se não nos alegramos por
saber que num dia que logo vem, Deus fará uma demonstração sumamente gloriosa
da Sua ira, tomando vingança em todos os que agora se opõem a Ele, é prova
positiva de que os nossos corações não estão sujeitos a
Ele, que ainda,
permanecemos em nossos pecados, rumo às chamas eternas.
"Jubilai, ó nações (gentios), com o seu povo, porque
vingará o sangue dos seus servos, e sobre os seus adversários fará tornar a
vingança..."(Dt.32:43). E ainda lemos: "E, depois destas coisas, ouvi
no céu como que uma grande voz de grande multidão, que dizia: Aleluia;
Salvação, e glória, e honra, e poder pertencem ao Senhor nosso Deus; Porque
verdadeiros e justos sãos os seus juízos, pois julgou a grande prostituta, que
havia corrompido a terra com a sua prostituição, e das mãos dela vingou o
sangue dos seus servos. E outra vez disseram: Aleluia..." (Ap.19:1-3).
Grande será o regozijo dos santos naquele dia em que o Senhor irá vindicar a
sua majestade, exercer o Seu domínio formidável, magnificar a Sua justiça, e
derribar os orgulhosos rebeldes que ousaram desafiá-lO.
"Se tu, Senhor, observares (imputares) as iniquidades,
Senhor quem subsistirá? (Sm. 130:3). Cada um de nós pode bem fazer esta
pergunta, pois está escrito que "...os ímpios não subsistirão no
juízo..." (Sl.1:5). Quão dolorosamente a alma de Cristo padeceu ao pensar
na ação de Deus observando as iniquidades do Seu povo quando estas pesaram
sobre Ele! Ele "... começou a Ter pavor, e a angustiar-se"(Mc.
14:33). Sua agonia terrível, Seu suor de sangue, Seu grande clamor e súplicas (Hb.5:7),
Suas reiteradas orações: "Se é possível, passe de mim este cálice",
Seu último e tremendo brado, "Deus meu, Deus meu, porque me
desamparaste?"- tudo manifesta que pavorosas apreensões Ele teve quanto ao
que era para Deus "observar iniquidades". Bem que nós, pobres
pecadores, podemos clamar: Senhor, quem subsistirá, se o próprio Filho de Deus
tremeu tanto sob o peso da Tua ira? Se tu, meu leitor, ainda não correste em
busca do refúgio em Cristo, o único salvador, "... que farás na enchente
do Jordão?"(Jr.12:5).
"Quando considero como a bondade de Deus sofre abusos
da maior parte da humanidade, não posso senão apoiar quem disse: "O maior
milagre do mundo é a paciência e generosidade de Deus para como mundo ingrato.
Se um príncipe tem inimigos metidos numa de suas cidades, não lhes envia
provisões, mas mantém sitiado o local e faz o que pode para vencê-los pela
fome. Mas o grande Deus, que poderia levar todos os Seus inimigos à destruição
num piscar de olhos, tolera-os e se empenha diariamente para sustentá-los. Aquele
que faz o bem aos maus e ingratos, pode muito bem ordenar-nos que bendigamos os
que nos maldizem. Não penseis, porém, que escapareis assim, pecadores; o moinho
de Deus mói devagar, mas mói fino; quanto mais admirável é agora a Sua
paciência e generosidade, mais terrível e insuportável será a fúria resultante
dos abusos feitos à Sua bondade. Nada é mais brando do que o mar; contudo,
quando se agita e forma temporal, nada se enfurece mais. Nada é tão suave como
a paciência e bondade de Deus, e nada tão terrível como a sua ira quando se
inflama" (William Gurnall, 1660). "Fuja", pois, meu leitor, fuja
para Cristo; fuja "... da ira futura"(Mt.3:7), antes que seja tarde
demais. Nós lhe rogamos com
todo o empenho, não pense que esta mensagem tem em vista
outra pessoa. É para você que está lendo! Não fique satisfeito em pensar que
você já fugiu para Cristo. Obtenha certeza disso! Rogue ao Senhor que sonde o
teu coração e te revele o que tu és (pois o erro ou engano, será fatal e
eterno).
Uma palavra aos pregadores: Irmãos, em nossos ministérios
temos pregado sobre este solene assunto tanto como deveríamos? Os profetas do
Velho Testamento muitas vezes diziam aos seus ouvintes que as suas vidas ímpias
provocavam o Santo de Israel, e que estavam entesourando para si mesmos ira
para o dia da ira. E as condições do mundo hoje não são melhores do que eram
então! Nada se presta mais para despertar os indiferentes e fazer com que os
crentes carnais sondem os seus corações, do que alongar-nos sobre o fato de que
Deus "... se ira todos os dias" com os ímpios (Sl.7:11). O precursor
de Cristo exortava os seus ouvintes a fugirem "... da ira
futura"(Mt.3:7). O Salvador ordenava a quantos O ouviam: "Temei
aquele que, depois de matar, tem poder para lançar no inferno, sim, vos digo, a
esse temei"(Lc.12:5). O apóstolo Paulo dizia: "... sabendo o temor
que se deve ao Senhor, persuadimos os homens..."(2Co.5:11). A fidelidade
exige que falemos tão claramente do inferno como do céu.
Fonte: Arthur Pink, Os Atributos de Deus, Editora PES.
COMO LIDAR COM A RAIVA
A raiva constitui-se como uma emoção humana normal e
habitualmente saudável. Os problemas surgem quando se torna descontrolada e
destrutiva, podendo afectar o trabalho, a escola, as relações pessoais e a
qualidade de vida no geral. O descontrolo leva a que te sintas “à mercê” de uma
emoção imprevisível e poderosa.
Definição
de “raiva”
De um modo geral, a raiva define-se como um sentimento de
protesto, insegurança, timidez ou frustração, contra alguém ou alguma coisa,
que se exterioriza quando o ego se sente ferido ou ameaçado. A intensidade da
raiva, ou a sua ausência, difere entre as pessoas. Alguns psicólogos apontam o
desenvolvimento moral e psicológico do indivíduo como determinante na maneira
como a raiva é exteriorizada.
Este sentimento pode ser despoletado por acontecimentos externos
e internos. Pode ficar-se zangado/com raiva em relação a uma pessoa específica
(p.e. um colega) ou acontecimento (p.e. engarrafamento no trânsito). A raiva
pode ainda ser causada por preocupação excessiva ou focalização nos problemas
pessoais. As memórias de acontecimentos traumáticos ou marcantes também podem
desencadear esta emoção.
Sinais de
alerta
Quando as pessoas ficam com raiva, tendem a experienciar
variados pensamentos, sentimentos e reacções físicas. Para alguns, os
sentimentos tornam-se tão arrebatadores que parecem estar “prestes a explodir”.
Outros podem não saber que estão muito zangados com a situação, mas sentem-se
doentes, culpados ou reagem exageradamente a outras situações.
Seguidamente são apresentadas algumas expressões directas e
indirectas de raiva.
GAPsi-FCUL
Sinais directos: elevação do volume da voz, praguejo, dores
de cabeça, dores de estômago, aperto na garganta, aumento do ritmo cardíaco,
aumento da pressão sanguínea, punhos cerrados, ameaças, violência, pressão,
hostilidade, fúria, ressentimento.
Sinais indirectos: excesso de sono, fadiga crônica,
ansiedade, entorpecimento, depressão, aborrecimento, exagero, perda de apetite,
choro, crítica constante, piadas más ou hostis, abuso de álcool ou drogas.
Muitas pessoas experienciam estes sinais gerais de raiva.
Saber identificá-los constitui-se como o primeiro passo para melhor lidar com
eles. Alguns sentimentos e pensamentos ocorrem quando a raiva surge; outros
surgem à medida que a raiva aumenta.
De modo a identificar de que modo os teus sintomas se
desenvolvem, tenta pensar em situações passadas em que te parece que a raiva
esteve presente e tenta recordar que sentimentos e pensamentos a acompanharam.
Será bastante útil pensar em situações em que experientas-te diferentes níveis
de raiva, de modo a melhor compreender como os teus sentimentos, pensamentos e
sintomas físicos se foram modificando.
Formas de
expressar raiva
A maneira mais natural e instintiva de expressar raiva é
através de respostas agressivas. A raiva é uma resposta natural, adaptativa a
ameaças; desencadeia sentimentos e comportamentos poderosos, frequentemente
agressivos, que te permite lutar ou defender quando és atacado/a. Uma certa
quantidade de raiva é, portanto, necessária para a nossa sobrevivência.
Por outro lado, não podes descarregar em cada pessoa ou
objecto que te irrita ou chateia; as leis, normas sociais e senso comum
estabelecem limites à expressão da nossa raiva.
As pessoas servem-se de uma
variedade de processos, conscientes e inconscientes, para tentar lidar com
estes sentimentos de um modo eficaz e socialmente adequado. Três deles são
seguidamente destacados:
• Expressar os sentimentos de raiva
de um modo assertivo (e não agressivo). Tal implica apresentares claramente as
tuas necessidades e como podem ser satisfeitas, sem prejudicar os outros. O
respeito do próprio e dos outros é regra de ouro!
• Suprimir os sentimentos. Isto acontece
quando reténs a raiva, deixas de pensar nela e te focalizas em coisas
positivas. O objectivo é inibir a raiva e convertê-la em comportamentos mais
construtivos. O perigo é que, ao não permitir a expressão externa da raiva, ela
se vá expressar internamente (p.e. hipertensão, depressão).
• Acalmar/relaxar. Isto implica, não só
controlares a expressão do comportamento mas também as respostas internas. Em
última instância, também os sentimentos são “amenizados”.
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Não ser capaz de expressar adequadamente os sentimentos de
raiva pode gerar outros problemas. Concretamente, pode levar a expressões
patológicas da raiva, tais como comportamento passivo-agressivo ou uma atitude
perpetuamente cínica e hostil. As pessoas que rebaixam constantemente os
outros, que criticam tudo e que fazem comentários cínicos, não aprenderam a
expressar a sua raiva de um modo construtivo. Habitualmente, são pessoas com
poucos relacionamentos satisfatórios.
Mas atenção! Isto não se deve constituir como desculpa para
“pores tudo cá para fora”. Algumas pessoas podem usar estas ideias como licença
para magoar os outros e isso pode ser bastante prejudicial. Os estudos mostram
que esta “explosão” pode fomentar ainda mais a agressividade e raiva, para além
de não te ajudar a resolver a situação.
Deste modo, é preferível saberes o que despoleta a raiva e,
posteriormente, desenvolveres estratégias que impeçam a escalada prejudicial
dos sentimentos.
Formas de
lidar com a raiva eficaz e autonomamente
Só é possível delinear e recorrer a estratégias eficazes se
conhecerem em pormenor os contornos da experiência de raiva: o que penso? o que
sinto?. O objetivo destas estratégias não é erradicar totalmente as
manifestações de raiva do teu repertório comportamental. O que teria acontecido
se os nossos antepassados não tivessem recorrido à agressividade para
sobreviverem nos tempos em que vigorava a “lei do mais forte”? Assim, o que se
pretende é que consigas fazer um discernimento racional das situações em que a
raiva pode ser adaptativa e que mantenhas o controlo!
Lidar com
sentimentos e pensamentos
Quando pensas em situações que te provocaram raiva, é
provável que também te recordes de sentimentos intensos de raiva, tão
avassaladores que te levaram a agir de modos que não melhoraram a
situação. Para melhor compreenderes e
controlares estes sentimentos, é necessário analisar um outro aspecto destas
situações: os teus pensamentos.
Etapa n.º 1: Analisa. Da próxima vez que te chateares com
alguma coisa ou alguém, procura reter os pensamentos que te surgiram acerca
daquela situação ou pessoa. Assim que possível, aponta-os e, ao longo do tempo,
faz uma listagem com vários destes pensamentos.
Etapa n.º2: Avalia. É importante que avalies cuidadosamente
os teus pensamentos. São precisos/exatos ou distorcidos? Os pensamentos
distorcidos são inapropriados ou inexatos e podem assumir várias formas,
nomeadamente: • Rotulagem: atribuição de
um rótulo negativo sem considerar outras hipóteses ou evidências. P.e. “Ele é
um idiota”.
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• Maximização: quando se avalia alguém, maximiza-se a
componente negativa e minimiza-se a
positiva. P.e. “A minha professora deu-me uma nota baixa, ela é tão injusta”
(mas também te deu várias notas positivas). • Personalização: acreditar que os
outros estão a reagir directamente contra ti, sem considerares quaisquer
explicações mais plausíveis para o seu comportamento. P.e. “Aquele rapaz é frio
porque se acha superior a mim” (se calhar, esse rapaz recebeu foi notícias
negativas da sua família…).
• Visão em túnel: apenas os aspectos negativos da
situação são considerados. P.e. “O meu professor não consegue fazer nada bem. É
crítico, insensível e não dá bem a matéria”.
• Pensamento “tudo ou nada”: a situação é encarada apenas segundo duas
categorias e não num contínuo. P.e. “O meu amigo não concorda comigo nesta
questão por isso ele não me apoia em nada”.
• Estar certo: tentas continuamente provar que as tuas opiniões e acções
são as correctas. Estares errado/a é impensável. P.e. “Gritar para a minha
colega foi totalmente justificado. Ela mereceu-o pelo que fez”.
Etapa n.º 3: Encontra outras formas mais adaptativas de
pensar sobre a situação. Para cada pensamento distorcido, tenta encontrar uma
forma alternativa, mais adaptativa e que não te faça sentir tão zangado/a. Isto
pode envolver a exploração dos aspectos positivos de uma pessoa ou situação,
identificar outras razões possíveis para o comportamento da pessoa, ou olhar de
um modo “mais abrangente” para a situação.
Etapa n.º 4: Praticar as etapas anteriores. Esta análise
deve ser praticada todos os dias de modo a ser eficaz. À medida que se torna
mais fácil, ficarás mais competente na identificação dos teus pensamentos
perante uma situação que te provoque raiva. Ao identificar pensamentos
distorcidos e substituí-los por outros mais adaptativos, podes evitar ficar tão
“imerso/a” na raiva.
Lidar com
sintomas físicos
O conselho mais comum quando estamos perante alguém muito
zangado é “Tem calma” ou “Relaxa”. Estas afirmações pretendem responder aos sintomas
físicos da raiva, os quais geram tensão no corpo ao ponto de parecer prestes a
explodir. Aprender como relaxar pode ajudar-te a melhor controlar os sinais
físicos da raiva.
Respiração profunda: quando te sentes enraivecido/a, é
importante dispores de uma técnica de relaxamento que funcione rapidamente e em
qualquer situação. A respiração profunda é exemplo disso e permite que o
organismo absorva mais oxigénio, para além de diminuir o ritmo cardíaco e
evitar que a adrenalina chegue tão rapidamente à corrente sanguínea. Esta
respiração é profunda porque envolve a área do estômago ou diafragma, e não o
peito. É rítmica e lenta.
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Ao detectares alterações físicas indicativas de sentimentos
de raiva, pára um momento e focaliza-te na tua respiração: habitualmente, será
rápida e superficial. Se quebrares este ciclo e voluntariamente começares a
respirar lentamente e pelo diafragma, o organismo irá responder e as alterações
físicas serão amenizadas. Os músculos começam a relaxar e a sensação de tensão
a diminuir. Esta breve pausa pode também
dar-te a oportunidade para te recompores, controlares os teus sentimentos,
mudares os teus pensamentos e lidar com a situação de um modo mais eficaz.
Relaxamento muscular progressivo: esta técnica envolve a
contracção e relaxamento sistemático dos principais grupos musculares do corpo.
Esta técnica pode ajudar-te a localizar áreas no teu corpo que estão tensas ou
presas e, seguidamente, relaxá-las. Aplicada à situação que evoca raiva, pode
ajudar a diminuir tais sentimentos, assim como a ficares mais relaxado/a e
menos zangado/a quando a situação terminar.
No texto “Aprender a Relaxar”, também disponibilizado na secção Textos
de Auto-Ajuda, poderás obter mais informações acerca desta técnica.
Trabalho
psicoterapêutico
Se as sugestões anteriormente apresentadas não te ajudarem a
lidar com a raiva de um modo mais eficaz ou se tiveres um problema de controlo
sério, aconselhamos-te a procurares a ajuda de um psicólogo (o GAPsi é uma
opção viável nesse sentido). A etapa
mais importante é encontrar alguém que te ajude a sentir mais controlado/a.
Falar com alguém pode ajudar a prevenir que situações perigosas ou prejudiciais
ocorram. A psicoterapia pode também ajudar-te a sentires-te melhor contigo e a
melhorares as suas competências comunicativas e de relacionamento com os
outros.
The Student Counseling Virtual
Pamphlet Collection, http://counseling.uchicago.edu/vpc/ e
www.apa.org/topics/controlanger.htlm traduzidos e adaptados por Ana Martins,
Psicóloga Estagiária do GAPsi – Gabinete de Apoio Psicopedagógico 2009
COMPREENDENDO A IRA
Por David Powlison Sobre Anger
Uma Parte da série Journal of Biblical Counseling Tradução por Gertrudes
Mendonca
Todos os seres humanos enfrentam
a ira. Num mundo de desapontamentos, imperfeições, misérias e pecados (nossos e
dos outros), a ira está sempre presente. Você ira-se. Eu iro-me. Aqueles a quem
você aconselha ficam irados. Sem dúvida, esta a razão porque a Bíblia está
cheia de histórias, ensinamentos e comentários sobre a ira. Deus quer que nós
entendamos a ira e a forma de sabermos como resolver os problemas relacionados
com ela.
Este artigo tem três partes.
“Compreendendo a ira” irá concentrar-se naquilo que pensamos sobre a ira. A
segunda e terceira partes, que irão ser publicadas em edições futuras, irão
contemplar as implicações e a forma como aconselhamos pessoas iradas.
O que é a ira? Como é que nós a
entendemos? Vamos começar com cinco afirmações gerais sobre algo que muitas
vezes vivenciamos, mas que raramente nos detemos para entender.
1. A Bíblia ocupa-se da ira
A Bíblia ocupa-se da ira. Qual é
a pessoa mais irada na Bíblia? Deus. Quando Deus observa o mal, “A Sua ira não
desaparece”, conforme Isaías repetiu várias vezes.
Em Romanos, Paulo menciona a
ira de Deus e os seus efeitos mais de cinquenta vezes, começando com “A ira de
Deus revela-se dos céus contra toda a impiedade e injustiça dos homens”
(Romanos 1:18). João afirma que a ira de Deus “está sobre” quem quer que não
crê no Filho de Deus para obter misericórdia: a ira estava, está, e ficará
sobre suas cabeças. [1]
O fato de que Deus está irado,
diz-nos algo muito importante. A ira pode ser absolutamente certa, boa,
apropriada, bela, a única resposta justa a algo de diabólico, e a resposta
amorosa em nome de vítimas da maldade. Na verdade, “seria impossível que um ser
moral ficasse indiferente e insensível diante de algo errado”. [2] Não é de
admirar que Jesus Cristo se tenha irado quando Ele encontrou pessoas que
pervertiam a adoração de Deus e contribuíam, ou eram insensíveis, aos
sofrimentos de outros. [3]
A ira de Deus nunca é caprichosa
nem mal humorada. Ele responde imparcialmente ao que é errado e ofensivo. Mas
Ele “não tem prazer na morte dos ímpios, desde que eles “se convertam de seus
caminhos” (Ezequiel 18:23). Os seres humanos estão destinados a amar aquele que
os fez e sustenta, cujas “riquezas da sua benignidade, e paciência, e
longanimidade... e benignidade” todos vivenciamos (Romanos 2:4). “por causa de
seu coração corrompido, que se desviou de mim, e por causa dos seus olhos , que
se andaram corrompendo após os seus ídolos” (Ezequiel 6:9). Será que a ira de
Deus é injusta? Quando desafiado, a resposta de Deus é directa:
“Não são os meus caminhos
direitos? Não são os vossos caminhos torcidos? ... conforme os teus caminhos, e
conforme os teus feitos, te julgarão”.[4]
Os crimes que provocam a ira de
Deus são crimes capitais: traição, rebelião, fraude, blasfêmias. O coração
humano é traiçoeiro; nós desejamos crer em qualquer coisa menos naquilo que é
realmente verdadeiro sobre Deus. Os mesmos sentimentos que surgem em nós quando
ouvimos alguém descrito pela palavra “traidor”, proporcionam uma razão para a
ira de Deus. Os seres humanos foram destinados a ouvir a voz vivificante de
Deus e a tratarem-se uns aos outros com amor. Mas nós temos corações de pedra.
Somos teimosos: “eis que cada um de vós anda após o propósito do seu malvado
coração para me não dar ouvidos a mim” “cada um fazia o que parecia reto aos
seus olhos”.[5] Deus seria menos que bom se não odiasse essas maldades.
Deus, naturalmente, é também, a
pessoa mais amorosa na Bíblia e o Filho de Deus exprime a riqueza do Seu amor.
Nós muitas vezes deixamos de ver que a ira e o amor de Deus são inteiramente
consistentes entre si, tal como diferentes expressões da Sua bondade e glória.
Os dois sentimentos funcionam em conjunto: “Jesus ardia em ira contra os erros
que Ele encontrava na Sua jornada através da vida humana, tal como Ele se
enchia de piedade à vista da miséria do mundo: e era, a partir destas duas
emoções, que provinha a Sua piedade verdadeira”. [6] Você não pode entender o
amor de Deus se você não entender a Sua ira. Porque Ele ama, ira-se com as
ofensas.
Mas repare na forma como os
filhos de Deus se tornam alvo da Sua ira: A sua ira é expressa a favor deles
como um amor supremamente terno! Como veremos, a Bíblia é consistente sobre
esta verdade. E no entanto, a ira é, por definição, contra coisas; com intenção
de destruí-las. Portanto, como é que a ira de Deus se transforma em algo que
osfilhos de Deus amam e confiam, em vez de algo que eles temem ou desestimem?
De que forma a ira de Deus é uma expressão de como Ele está a nosso favor, em
vez de uma expressão da forma como Ele está contra nós? As Boas Novas são
sempre apresentadas em termos de como o amor e a ira podem chegar a
entender-se. Deus exprime o Seu amor pelo Seu povo, através de cada uma das
três maneiras em que Ele exprime a
Sua ira contra êrro. Ele promete libertar o
crente de três coisas, como seguem:
Primeiro, em amor, a ira que o
seu pecado merecia, caiu sobre Jesus. A ira de Deus contra o pecado foi
expressa – mas para o seu bem. De uma vez por todas, no passado, Deus o
libertou para jamais vivenciar outra vez a Sua ira contra os seus pecados. Com
amor inabalável, Ele livremente ofereceu o Seu Filho inocente para suportar a
ira merecida pelos culpados. A ira de Deus castiga e destrói, dando ao nosso
pecado o que ele merece – mas o castigo foi imposto sobre Jesus, o Cordeiro
Amado, o Salvador de pecadores. Como Ele nos ama, oferece-Se para suportar o
furor da ira; o caminho da nossa libertação é a Sua glória e a nossa alegria. A
ira amorosa de Deus se expressa de uma forma que nos traz bênçãos, é a base de
revivar-nos da morte: ela garante-nos o perdão verdadeiro. A justificação pela
fé e adopção como filhos de Deus repousa naquela forma de amor chamada de
sacrifício substitutivo. Aquilo que merecemos, outro suportou porque decidiu
amar-nos. Nesse ato supremo de um amor que se dá a si mesmo, nós vivenciamos a
ira de Deus atuando a nosso favor. Em resposta, nós nos arrependemos e cremos
com confiança.
Segundo, no amor, a ira de Deus
funciona para desarmar o poder do nosso pecado. A Sua ira perante o pecado é,
mais uma vez, expressa para o nosso bem.No presente, Ele lida continuamente com
o pecado ainda remanescente em nós. [7] O Espírito Santo, que derrama o amor de
Deus dentro de você, é um fogo de ira ardendo contra o mal, não para lhe
destruir mas para lhe renovar. Em amor constante, Ele renova-nos não por
tolerar o nosso pecado, mas por odiar o nosso pecado de uma forma que nós
possamos aprender a amar! O processo nem sempre é agradável porque o
sofrimento, a censura, a culpa e a confissão de culpa não são sentimentos
agradáveis. Mas livramento, misericórdia, encorajamento e uma consciência limpa
fazem-nos sentir bem. Deus renova-nos progressivamente em amor, alegria, paz e
sabedoria – à Sua própria imagem. A ira de
Deus soluciona e destrói o pecado em
curso. Como Ele nos ama, Ele se ira com nosso pecado que nos destrói; a nossa
fé crescente e nossa obediência são a Sua glória, e a nossa alegria. A ira
amorosa de Deus sobre nós, alimenta e encoraja a fé: isso assegura-nos que Ele
continuará a trabalhar tanto dentro de nós como ao nosso redór, para nos
libertar do mal interior. [8] No novo nascimento e santificação, o poder
destrutivo de Deus funciona dentro de nós contra aquilo que está errado em nós.
Ele é por nós, renovando-nos, ensinando-nos a ouvir, refazendo-nos à semelhança
de Seu Filho, o Senhor Jesus Cristo. No trabalho diário de amor, nós
vivenciamos a ira de Deus a trabalhar em NOSSO BENEFÍCIO. Em resposta, nós, ativamente,
cooperamos e obedecemos.
Terceiro, em amor, a ira de Deus
irá livrá-lo da dor causada pelos pecados dos outros. A sua ira diante do
pecado será expressa para o seu bem. No futuro Ele promete terminar com todo o
sofrimento proveniente do pecado de outros. [9] Deus detesta a forma como
pessoas ferem umas as outras. Com amor firme, Ele nos libertará dos nossos
inimigos; no último dia, todas as causas de dor serão destruídas para sempre.
Ao mesmo tempo, a Bíblia esclarece que aqueles que se opõem a
Deus e ferem o
Seu povo, existem com um objectivo: são agentes inconscientes na tarefa de
santificação. Eles atuam pelos seus próprios motivos pecaminosos, mas também
cumprem os objectivos de Deus para o bem, pois Ele prova-nos e transforma-nos
através do sofrimento. Eles são agentes da amorosa disciplina de Deus para com
o Seu povo a fim de aprendermos a paciência, fé, amor pelos inimigos, coragem e
todos os bons frutos que apenas podem ser aprendidos em tempos difíceis. No
entanto, nossos algozes estão debaixo da ira devido à malícia com que fazem o
que fazem. [10]
A ira de Deus irá punir e destruir os Seus inimigos – porque
Ele ama os Seus filhos e é glorificado na nosso livramento do sofrer. Por isso
gememos na dor, porque o doloroso é ainda doloroso; mas nós também gememos em
esperança, porque sabemos o que virá. [11] Como Ele nos ama, Ele se ira com
aqueles que procuram magoar-nos: a nossa bem-aventurança é a Sua glória, e é a
nossa alegria. A ira amorosa de Deus para conosco, alimenta e encoraja a nossa
fé. Os filhos amados de Deus esperam e confiam que, no regresso de Cristo, a
Sua cólera irá endireitar as coisas. [12] Em antecipação, com ansiedade,
gememos e esperamos.
Deus exprime o Seu amor pelo Seu
povo por cada uma das três formas em que Ele exprime a Sua ira ante o êrro. A
ira amorosa de Deus resolve todo o problema do mal de um modo que Lhe traz uma
glória inefável e, ao mesmo tempo traz-nos bênção igualmente inefável:
imparcialmente condenando o mal, quebrando o poder do mal remanescente em nós e
trazendo alívio ao sofrimento. Numerosos salmos relacionam o amor resoluto e a
piedade do Senhor com esta ira amorosa pela qual Ele liberta os Seus filhos,
tanto dos seus próprios pecados, como daqueles que os ofendem. [13] “Se Deus é
por nós, quem será contra nós?” (Romanos 8:31).
É importante fazer distinções
apropriadas. A ira de Deus se torna a esperança dos Seus filhos apesar de
constituir o desespero dos seus inimigos. Mas aqueles inimigos que desejem crer
na gloriosa mensagem da forma como a ira de
Deus se converte em graça através
de Jesus Cristo, serão transformados em amigos. A verdade é que você não pode
entender o amor de Deus se você não entender a Sua ira. Esta é simplesmente a
mensagem do livro dos Salmos;essa estrada real para o coração da humanidade
redimida, com a sua inexplicável trama de alegria e tristeza, esperança e
angústia, confiança e temor, contentamento e ira. Você poderá não entender o
amor de Deus se você não entende a sua ira. Esta é simplesmente a mensagem do
livro de Romanos, aquela estrada real para entender a mente de Deus: “Ó
profundidade das riquezas, tanto da sabedoria, como da ciência de Deus! Quão
insondáveissão os seus juizos, e quão inescrutáveis, os seus caminhos! ...
glória, pois, a Ele eternamente. Amém!(Romanos 11:33, 36).
Observando, desde outro ângulo, a
pergunta de abertura, quem é a pessoa mais irada na Bíblia? - Satanás. A sua
ira, também, não se extingue. Ele sente “grande ira”, sendo um “assassino desde
o princípio” assim como o é até hoje. [14] A ira de Satanás deriva da malícia e
da vontade de ferir as pessoas. A sua ira, o paradigma de toda a ira pecaminosa
e injusta, é a antítese da ira de Deus. A hostilidade de Satanás visa fazer
coisas erradas, a serviço dos seus próprios desejos. Isto também nos diz algo
muito importante. A ira pode ser totalmente errada, maldosa, inapropriada, feia
e uma resposta completamente destrutiva. Neste tipo de ira se resume a
verdadeira essência do mal: “Eu quero do meu modo e não do modo de Deus e, como
não posso fazer do meu modo, sinto-me irado”.
É uma coisa curiosa e muitas
vezes confusa que a mesma palavra, “ira”, exprima quer o melhor, quer o pior
dos sentimentos e atos. Mantenha distinções próprias, porque aqueles que você
aconselha irão usualmente ficar tão confusos sobre a ira como ficam sobre o
amor. [15]
A ira pecaminosa usurpa Deus e
causa dano; a ira piedosa, por outro lado, ama entronizar a Deus e fazer bem às
pessoas.
A Bíblia trata da ira. Logo no
primeiro intercâmbio de diálogo, depois da queda no pecado, Adão amaldiçoou a
âmbos, a Eva e a Deus pelo que ele mesmo tinha feito. Lançar nossa culpa sobre
outros pode ser um ato quase sem emoção, mas, nele, os temas da ira pecaminosa
aparecem facilmente: acusação de outros. A postura de superioridade e de
inocência presumidas. E é só um capítulo mais tarde que a ira, pela primeira
vez, se rompe em emoção e violência. “E irou-se Caim fortemente, e descaiu-lhe
o seu semblante”; a sua compostura tornou-se deprimente e infeliz e ele matou o
seu irmão (Genesis 4:5). O resultado lógico da ira pecaminosa é registado a
seguir na história de Noé: “... e encheuse a terra de violência” (Genesis
6:11).
As Escrituras retratam muitos
factos sobre ira. Por exemplo, a ira pode ser estimulada falsamente. Em Genesis
39, a ira de Potifar ardeu com o pensamento de que José se estava a divertir
com a sua esposa. E a ira pode mascarar-se em inocência. A esposa de Potifar
também estava irada: fria, dissimulada, manipuladora, vingativa, fez o papel de
vítima a fim de destruir um homem inocente que tinha rejeitado os seus desejos.
A mesma pessoa pode expressar uma ira justa ou uma ira pecaminosa. Quando a ira
de Moisés se levantou contra os que adoravam um bezerro de ouro, ele ardeu-se
em ira à semelhança de Deus.[16] A ira deu-lhe energia para retificar o
problema. Mas quando Moisés amaldiçoou as pessoas e feriu a pedra, ele gravou a
fogo a imagem do pecado. A cólera o ativou para desonrar a graça de Deus.[17]
Deus fala muitas vezes dos Seus
pensamentos sobre ira de forma proposicional. Ele dedica o sexto mandamento,
“Não matarás”, à família de reações críticas que incluem a ira injusta. O
comentário de Jesus sobre este mandamento (Mateus 5:21ss) expandiu o âmbito das
suas implicações para incluir atitudes e palavras. O Senhor primeiro disse o
mandamento “ama o teu próximo como a ti mesmo” num contexto (Leviticus
19:14-18) que contrasta o amor com assuntos pertinentes à ira pecaminosa:
intencionalmente magoar pessoas indefesas, julgamento injusto, difamação de
carácter, dano físico, ódio interior, vingança, guardar rancor. Interessantemente,
a mesma passagem define positivamente o amor em termos que o relacionam com a
ira justificada: claro, censura amorosa surge quando se cuida do bem-estar dos
outros. A sabedoria, como dádiva pacientemente adquirida de Deus, comenta
frequentemente sobre a ira: o sábio e o louco apenas se distinguem pela forma
como se iram.[18] E os mensageiros de Jesus frequentemente falaram sobre a ira.
Variações sobre o tema constituem metade da lista de Paulo sobre ações
representativas da carne pecadora: “inimizades, conflitos, ciúme, surtos de
cólera, disputas, dissensões, facções”. Todos os aspectos do fruto do Espírito
são o oposto explícito da ira pecaminosa. [19]
Tanto por preceito como por
exemplo, a Bíblia continuamente nos esclarece sobre ira, no propósito de
mudar-nos.
As motivações para a ira
pecaminosa são expostas nas Escrituras: Ansiedades específicas e incredulidade.
Porque é que os Israelitas resmungavam repetidamente no deserto? A Bíblia não
nos deixa em dúvida. O povo não conseguia o que queria e não cria que Deus era
bom, poderoso e sábio. Aquelas passagens de reclamações no Êxodo e Números,
também registam quão específicos são os motivos da ira e a forma como os
motivos do coração se ligam com os detalhes da situação.
Quando a comida era monótona,
as pessoas ansiavam por pepino, melão, cebola e alho. Quando Moisés agiu como
porta-voz de Deus, Miriam e Aarão ansiaram por partilhar o microfone. Quando os
inimigos
ameaçavam, o povo temia a morte
em vez de confiar que Deus o protegeria. Quando a água não aparecia, as pessoas
ansiavam por cereais irrigados, figos, uvas, romãs e água.[20] A ira pode ser
deprimente e assassina como o foi com Caim; a ira pode arder com emoção como o
foi com Potifar; a ira pode planificar com malícia fria como o fez sua esposa;
a ira pode rosnar e resmungar, prosseguindo com queixas, descontentamento e
pelejas, tal como com o povo no deserto. Mas, em todos os casos, a causa da ira
pecaminosa reduz-se às mentiras específicas e luxúrias que governam o coração
humano. Você, e aqueles a quem você aconselha, não são diferentes.
A ira também provoca
consequências devastadoras. Deus ira-se justamente, com a nossa ira pecaminosa.
Por exemplo, a fúria de Moisés contra o povo (outro padrão típico: ficar
enfurecido contra pessoas enfurecidas, resmungar sobre pessoas que resmungam)
custou-lhe a terra prometida. Naturalmente as pessoas tendem a reagir da mesma
forma quando diante de uma pessoa irada, o que multiplica o desagrado geral: “O
homem iracundo levanta contendas” (Provérbios 29:22). As pessoas iradas são
divisivas; as pessoas divisivas são pessoas iradas. Você muitas vezes observa
as consequências imediatas nas vidas daqueles que você aconselha: filhos
amedontrados, uma esposa amargurada, amizades desfeitas, problemas de saúde,
dificuldades no local de trabalho, afastamentos da igreja. Os problemas seguem
de perto a uma pessoa irada “O homem de grande ira tem de sofrer o dano;
porque, se tu o livrares, virás ainda a fazê-lo novamente.” (Provérbios 19:19).
A ira alimenta-se de si própria e
desenvolve-se. Saul era um homem usualmente obstinado. O seu temperamento
pacato estava apenas um pouco abaixo da superfície. A doce harpa de David e os
atos assombrosos de repressão piedosa acalmavam temporariamente a Saul, mas,
logo iria de novo explodir. As Escrituras estão cheias de exemplos de ira, com
as suas muitas formas, causas e variados efeitos. Jonas, Jezebel, Nabal e os
Fariseus são apenas algumas das vidas agarradas por este mal poderoso e muito
típico. Em cada lista de pecados típicos – e não existe tentação que não seja
comum a todos – a ira é proeminente.
Graças a Deus que a Bíblia também
trata do evangelho que perdoa e transforma as pessoas iradas. Provérbios,
Efésios e Tiago, são apenas alguns dos livros que analisam a ira a fim de a
redimir e transformar. Deus nunca levanta um espelho sem segurar uma luz. Ele
fala completa e frequentemente sobre a Sua misericórdia para com pessoas
iradas. Ele fala completa e frequentemente sobre as alternativas à ira
pecaminosa: confiança, perdão, paciência, contentamento, busca por justiça,
confrontação divina, todas as variadas estratégias e atitudes de estabelecer a
paz, auto-controle e auto-conhecimento. A ira justificada é uma coisa excelente
e construtiva. Moisés, Sansão, David e Paulo, como Jesus, em certas ocasiões
arderam com esta integridade raríssima.
Deus na Sua graça derrama
amabilidade sobre as pessoas que estavam “servindo a várias concupiscências e
deleites, vivendo em malícia e inveja, odiosos, odiando-nos uns aos outros.”
(Tito 3:3). O que pretende conseguir a graça? A graça cria pessoas sábias,
auto-controladas e ternas que são capazes de se erguer e fazer algum bem neste
mundo de hostilidade (Tito 2:11-3:8). Cada elemento na definição de amor em 1
Coríntios 13 é o oposto explícito de ira pecaminosa e injusta. Compreender a
sua ira é compreender algo que está no âmago das trevas. Mudar, aprendendo
âmbas, a misericórdia e a ira justa e piedosa, consiste em entrar no centro da
luz. Nós todos somos conflituosos por natureza; bem-aventurados os
pacificadores, porque eles serão chamados de filhos de Deus.
A ira fornece uma tremenda
oportunidade de aconselhamento. As questões são evidentes. Quando em estado de
ira, o coração humano é colocado abertamente sobre a mesa, sem lugar onde se
possa esconder. Muitas vezes as vidas dos aconselhados são confusas: uma
questão complica outra questão; problemas empilham-se sobre problemas. Por onde
começar? Muitas vezes a ira, é um bom lugar por onde começar. Os comportamentos
são muitas vezes claros para todos: o tom de voz, o tom mordaz nas palavras, o
brilho nos olhos, a expressão facial de desgosto. A sua presença é fácil de
ver: resmungo, lamúria, hostilidade, crítica, amargura, rancor, negativismo,
ódio, conflito, mau humor, manipulação, coerção. Os motivos usualmente não são
difíceis de descobrir: um mosaico de desejos muito específicos, medos, falsas
crenças, exigências. Os efeitos são francamente ruins: relacionamentos
acabados, problemas de saúde, miséria. A Palavra de Deus aplica-se de maneira
imediata e de muitas formas: trazendo autoconhecimento, convicção, piedade,
esperança, alternativas construtivas, auxílio concreto. Não admira que a Bíblia
gaste tanto tempo a falar de ira e de suas alternativas!
E não admira ser tão importante
que nós entendamos as mensagens da Bíblia sobre a ira. Grandes coisas estão em
jogo. Por um lado, a família descontente – irada – que com ódio violento,
apresenta alguns dos pecados humanos mais característicos. Todos vivenciamos
raiva ímpia e todos precisamos de ajuda. Por outro lado, Deus exprime a Sua
glória e piedade através de Sua ira justa. Aquilo de que precisamos, Ele dá-nos
livremente ao Se revelar para o nosso próprio bem.
2. A ira é algo que você faz
A ira é algo que você, como
pessoa que é, FAZ com TODO o seu ser. A aceitação deste fato, irá ajudá-lo a
ver através das meias-verdades pelas quais a nossa cultura nos mente sobre a
ira. [21] Todas as partes da natureza humana estão envolvidas. A ira envolve o
seu corpo. Tem uma componente nitidamente fisiológica: a face corada, o aumento
de adrenalina, os músculos tensos, o estômago embrulhado, a tensão dos nervos.
De modo interessante, a maior parte das palavras que as Escrituras utilizam
para ira são transmitidas através de metáforas vívidas e corporais. As duas
palavras principais do Antigo Testamento para designar ira descrevem “narinas”
e “queimar”. Se você já viu alguma vez uma pessoa realmente irada você
provavelmente reparou a forma como as narinas se alargam, a respiração tornase
pesada e irregular, o sangue inunda os capilares e aquece a pele. De forma
semelhante, as principais palavras gregas para cólera comunicam a sensação de
“fumegar ou fumar” e “inchaço”, refletindo a sensação de calor e o evidente
inchaço da face e dos olhos. Não é por acaso que muitos dos nossos idiomas para
ira contemplam os efeitos fisiológicos: “calor por baixo do colarinho”,
“fumegante”, “respirando fogo”, “vulcânico”, “ver tudo vermelho”, “sangue a
ferver”, “queimar lentamente”. Que a ira é infalivelmente fisiológica, contribui
para a verosimilhança dessas teorias medicalizadas que a consideram como
basicamente fisiológica, portanto como algo a ser acalmado com medicamentos.
Naturalmente as nossas hormonas, fluxo sanguíneo, músculos e expressões faciais
registam a ira. Mas não se trata só disso. Biblicamente, a pessoa inteira
produz (ou faz) a ira.
Quando alguém diz, “Estou irado”,
nós geralmente pensamos primeiro em emoções. E a ira é uma “paixão”. As pessoas
sentem ira. O seu equilíbrio emocional está “transtornado”. Naturalmente que os
níveis de intensidade variam tremendamente. A escala emocional de Richter pode
variar desde uma ligeira irritabilidade até uma fúria cega. Você não precisa
falar asneiras e vociferar para ter um problema de ira pecaminosa. O mau humor,
a observação cortante, a auto-piedade amuada e a atitude crítica, todos se
qualificam. Curiosamente algumas das formas mais assustadoras de ira parecem
quase sempre sem emoção. Elas são geladas em vez de quentes. Nunca esquecerei
uma conversa que tive há muitos anos com uma rapariga de dezesseis anos.
Parecia irada com os seus pais. Quando lhe perguntei o motivo, ela olhou para
mim com os olhos frios como os que você observa nas fotos de assassinos
profissionais. Ela respondeu com uma voz sem expressão, “Eu não sinto ira;
sinto-me nivelada” “Eu não me iro; pago com a mesma moeda”. Uma larga variedade
de cores emocionais exprime o descontentamento e hostilidade e você vai
encontrá-las todas no aconselhamento. Mas muitas pessoas querem pensar na ira
como apenas uma emoção e talvez como uma emoção neutra dada por Deus. No
entanto, por que limitar a ira à fisiologia ou ao sentimento, quando é
claramente muito mais que isso?
A ira também consiste em
pensamentos, palavras mentais e quadros, atitudes, julgamentos. Ela envolve
razão, imaginação, memória, consciência, todas as faculdades internas. Mesmo se
não aparecerem palavras nem ações, a pessoa irada pensa intensamente. “Você é
estúpido. Isto não é justo. Não posso acreditar que ela me fez isto”. A câmara
interna de vídeo, repassa imagens do que aconteceu, ou pode escrever o
argumento ou ensaiar cenários imaginários de retribuição violenta. Todo o
sistema criminal de justiça – excepto um advogado de defesa para o acusado! –
se apresenta na sala do tribunal da mente: investigador, advogado de acusação,
testemunhas, juiz, júri, carcereiro e carrasco. Esta atitude judicial está
escrita na natureza da ira. É uma atitude de julgamento, condenação e desagrado
perante pessoas ou coisas. Palavras e ações são pensadas e planificadas, quer
venham (ou não venham) a ser ditas ou feitas. A ira acontece não apenas na
mente, ela transforma-se em comportamento. Conheci um casal que culminou uma
discussão particularmente violenta com um tiroteio, ele no cimo da escada e ela
em baixo. Eu nunca fiz isso, mas já comuniquei friamente a minha irritação à
minha esposa quando enterrei, o mais que pude, o nariz numa revista depois dela
ter feito um comentário do qual não gostei. A ira faz coisas. Ela mostra-se em
palavras acusadoras ou sarcásticas, pragas, exageros, atitudes, pancada,
olhares de descontentamento, sair da sala, elevar o nível de decibéis na voz,
ameaças, má cara. Você fica irado com tudo o que você é.
E a intriga complica-se. A ira,
tal como outros pecados, raramente está só. Muitas vezes ela entrelaça-se
profundamente noutros problemas pessoais. Muitas vezes a ira e o medo são
primos próximos. Testemunhei uma mãe a gritar com raiva para o seu filho
pequeno que estava no chão a chorar depois de um acidente no parque infantil.
Ela estava assustada; gritava em vez de confortar. Algumas teorias da ira
tentam afirmar que a ela é secundária ao medo, mas isto é seguramente errado.
Quando as coisas não caminham bem, todos os pecadores se sentem como esquilos
encurralados numa garagem: lutam ou voam dependendo da situação. A ira e o medo
coexistem.
A ira complica muitos outros
problemas. O abuso de substâncias pode relacionar-se com a ira de várias
formas. Uma amiga da família disse uma vez, comentando sobre o seu marido, “Ele
bebe para se controlar contra a sua ira”. Quando ele não bebia, tornava-se mais
hostil para ela, para o seu chefe e para o mundo. Rancores velhos iriam
assombrá-lo. Quando ele bebia tornava-se mais brando e sentia-se melhor. O
álcool servia como medicamento contra a ira. Eis um padrão diferente: Uma
mulher bebia para exprimir a sua ira contra os pais severamente estritos.
Envergonhando a todo mundo e acabando na sarjeta, lhe servia como uma forma de
vingança.
A imoralidade sexual pode
ligar-se à ira. Um homem solteiro falou do seu uso de pornografia como um
“acesso de ira para com Deus por Ele não me dar uma esposa”. Muitos adultérios
ocorrem como uma forma de pagar na mesma moeda. O suicídio pode exprimir-se da
mesma forma: “Você magoou-me tanto que eu não tinha outra forma de
retribuir, mas certamente que
você se vai sentir mal se eu me matar, e você terá que viver com aquilo que me
fez”. A ira contra sí mesmo é um fenómeno comum: “Eu não posso acreditar que
tenha feito algo tão estúpido. Se eu fosse mais belo, rico, inteligente e
tivesse uma conversa brilhante, mas sou apenas uma pessoa feia, pobre e
estúpidamente tediosa”. A auto-recriminação, auto-acusação, mesmo a
auto-tortura (queimaduras com cigarros, bater com a cabeça na parede, etc.)
podem manifestar a falta de esperança, a raiva contra si mesmo numa
demonstração de um sentimento de fracasso.
Até agora, temos principalmente
descrito a ira pecaminosa como um problema pessoal. Mas a ela é geralmente um
acontecimento inter-pessoal. A ira tem umobjecto, um alvo.[22] Obviamente, a
ira é uma característica central de conflitos inter-pessoais onde quer que eles
ocorram: casamentos, famílias, igrejas, locais de trabalho, vizinhanças,
nações. É uma estratégia inter-pessoal, um evento social e político. A Guerra
tem estratégias ofensivas e defensivas. Como insignificantes barões
preparando-se para o combate, as pessoas lançam setas de acusações maliciosas e
constroem muros acastelados de autojustificação agravada, medo e mágoa. Aqui, a
ira adopta uma posição militar como, também, um papel judicial. É uma arma
ideal para conseguir o que você quer. A ira força, intimida e manipula. Você
irá aconselhar famílias que “caminham sobre cascas de ovos” ou “se enterram em
tocas de raposas” perante o fogo que se aproxima em relação a um familiar de
temperamento explosivo.
Não admira que a ira também se
revele no relacionamento inter-pessoal mais básico: com Deus.
Muitas pessoas
estão iradas com Deus. Pessoas tratam a Deus da mesma forma como tratam aos
outros – essa observação irá fazer com que você percorra um longo caminho no
aconselhamento. Os Israelitas queixavam-se indiscriminadamente, acusando Moisés
e o Senhor. As pessoas frequentemente alvejam Deus com zombaria, pragas,
amargura e deturpação premeditada. Quando o Filho de Deus andava pela terra, os
homens se dispunham a alvejá-lo. Você muitas vezes vai aconselhar pessoas que
vêm Deus através da lente de uma ira acusadora: como se Deus fosse, na verdade,
o diabo, um desmancha-prazeres cuja natureza é maliciosa, legalística, cruel, remota
e incensível. Isto não é para admirar. Se eu acredito que Deus existe para
dar-me o que eu quero, ficarei irado quando Ele não cumpre em dar-me. Na
verdade, quando considerada do ponto de vista daquilo que motiva o coração
humano, toda a ira injusta tem imediata referência com Deus. Se eu rogo pragas
ao calor e umidade, eu ataco Deus de três formas. Primeiro, abandono-O, a fonte
de vida, actuando como se Ele não existisse. Segundo, actuo como se eu fosse
deus elevando minha vontade para o confôrto de uma condição suprema no meu
universo. Terceiro, eu resmungo contra Ele, criticando implicitamente o real
Autor do “mau” tempo, por me desagradar do tempo.
A ira é física, emocional,
mental, comportamental. Ela entrelaça-se com muitos outros problemas. É decididamente
inter-pessoal, quer no que respeita às pessoas como a Deus. Em resumo, você
encoleriza-se com TUDO o que você é. Mas, qual a procedência da ira?
3. A ira é natural
A ira é algo dado por existente;
ela é natural aos seres humanos de duas formas muito diferentes. É natural
porque fomos criados à imagem de Deus; é natural porque caímos no pecado. Deus
criou-nos, à Sua imagem, e, não menos, com a capacidade para a ira. E Ele
chamou a isto de muito bom. Na verdade, Adão e Eva deveriam ter ficado
mortalmente irados quando a serpente lhes mentiu sobre a vida e a morte, sobre
Deus e a sabedoria. Deveriam ter reagido com fortes emoções, argumentos claros
e ação violenta. Deveriam ter desafiado essas mentiras, pegarem em pedras e
matarem a serpente. A ira é uma boa coisa, inerente da natureza humana.
Como seres humanos feitos e
refeitos à imagem de um santo Deus, nós estamos conetados à capacidade de
sentirmos a ira contra o êrro como uma expressão de amor, tanto para Deus, como
para os que foram magoados pelo erro. E, como pecadores que recebemos
misericórdia em vez de ira, temos a capacidade, de outra maneira inexplicável,
simultaneamente odiar o êrro e expressar amor àqueles que praticam o mal: “...
tendo deles misericórdia com temor, aborrecendo até a roupa manchada da
carne.”(Judas 23). Quando estiver aconselhando e você encontrar adultério, ou
violência contra os fracos, ou palavras cruéis, você vai sentir dor e aversão
pelas acções e pelos seus efeitos sobre outros. E no entanto você vai
simultaneamente sentir piedade para dar-se generosamente aos perpetradores de
tais males.
Muitas outras implicações do
aconselhamento, abundam. Por exemplo, precisamos de lembrar que a criação de
Deus é diversa; as pessoas não são todas iguais. Nós não devemos ficar
admirados pelo facto de algumas pessoas terem nascido mais harmonizadas com a
justiça ou mais emocionalmente contundentes do que outras. Entre os meus três
filhos, as diferenças no temperamento mostraram-se quase desde o primeiro dia
de vida: diferentes capacidades para reacção emocional, para reagirem à
injustiça, para raciocinarem sobre acontecimentos. As relações de Deus com a
ira (e outros problemas) não eliminam a diversidade humana; Ele opera dentro
deste contexto.
Por isso a ira é natural, por
criação. Mas desde a Queda, a ira injusta e pecaminosa é também algo
inqüestionável. Como os seres humanos se corromperam na imagem de um acusador
ímpio, nós também estamos interligados por ressentimento e ódio. E num mundo
caído, a ira humana é tão desordenada que Tiago pode fazer uma acusação
bastante ampla: “Seja tardio para se irar, porque a ira do homem não opera a
justiça de Deus.” (Tiago 1:20). Só mesmo uma pessoa estúpida não pensaria duas
vezes antes de se irar-se. Mas nós desempenhamos facilmente o papel de tôlos.
Mesmo a ira nascida de motivos correctos, degenera facilmente em arrogância,
mexericos, autopiedade, vingança, cinismo e acusação sem clemência.
A nossa capacidade para a ira
pecaminosa mostra-se muito cedo: ninguém precisa de ensinar uma criança a fazer
uma birra. A primeira vez que uma das minhas filhas se atirou para o chão, deu
pontapés e gritou “assassino sanguinário”, a minha esposa e eu olhámos um para
o outro com espanto. A nossa filha nunca tinha visto ninguém a agir desse modo.
Pelo menos que fosse do nosso conhecimento. Ela era nova e não tinha sido
exposta a muitas outras crianças. Na verdade ela nunca tinha estado fora da
nossa presença, com excepção de breves momentos com pessoas que olhavam por
elas, nenhuma das quais pensaríamos poder ter demonstrado aquilo que estávamos
agora a presenciar. Mas ali estava ela, tresloucada como uma galinha molhada
porque a sua vontade tinha sido contrariada! Era um acto de iniquidade criativa
não aprendido. Precisamos lembrar que a depravação total inclui a nossa ira,
nada mais nada menos do que qualquer outra coisa distintivamente humana.
4. A ira é aprendida
A ira é aprendida também de duas
formas diferentes. Primeiro, a ira é ensinada e modelada para nós. Nós colhemos
a ira de outras pessoas, para o bem ou para o mal. Aprendemos a ficar exaltados
e aprendemos a forma de mostrar o nosso desagrado. [23]
Hábitos, estilos e tendências
para a ira pecaminosa são facilmente adquiridos dos outros. Muitas crianças que
nunca pensaram em permitir um palavrão irado – elas nunca ouviram todas as
palavras más – ficam surpresas quando alguém deixa escapar uma dessas palavras
durante a primeira viagem no autocarro escolar. Conflitos entre os pais talvez
desperte a formação do hábito. Mas mais tarde, quando eles vivem num dormitório
de universidade ou conseguem o seu primeiro emprego numa construção, numa
fábrica ou no serviço militar, a palavra de baixo calão infiltra-se como
modificador para todos os fins: “Passe-me a %$#@! manteiga” não se aprende
usualmente em casa.
Ao modelar, a ira e as pragas
hostís tornam-se formas rotineiras de responder à menor frustração. Com bons
motivos a Bíblia afirma, “Não acompanhes o iracundo, nem andes com o homem
colérico, para que não aprendas as suas veredas e tomes um laço para a tua
alma” (Provérbios 22:24, 25). Os aconselhadores irão analisar as companhias das
quais os aconselhados irados possam ter aprendido a forma de como se irar e com
o que se irar. Um pai que normalmente maldiz o tempo, o tráfego, ou a sua
esposa, discipula os seus filhos a proceder do mesmo modo.
A ira construtiva e piedosa
também se aprende, embora hábitos, estilos e tendências para com a ira
justificada não sejam facilmente adquiridos dos outros. Não obstante, “anda com
os sábios e serás sábio” (Provérbios 13:20). E se nós caminharmos com o homem
mais sábio que jamais houve – Jesus - iremos aprender a “andar como Ele
andou”.(1 João 2:6).
Muitos dos pormenores do estilo
de ira de uma pessoa podem ser influenciados por pais, companheiros ou grupos
étnicos. Diferenças culturais na expressão de emoções pecadoras, ou correctas,
podem ser nítidas. A ira italiana e a ira norueguesa diferem drasticamente nas
formas de expressão.[24] A ira pecaminosa procede sempre “do interior do
coração do homem” (Marcos 7:20-23), mas a forma exacta assumida pela ira é uma
questão de criatividade. Os conselheiros devem esperar que, tanto a ira honrada
como a ira pecaminosa, irão parecer diferentes, dependendo de diferenças
individuais e culturais e não devem impor o seu próprio estilo pessoal naqueles
que aconselham.
A ira é aprendida de uma segunda
maneira. É praticada e pode tornar-se “segunda natureza”; uma forma habitual de
vida. Os nossos padrões de ira tornam-se característicos. Algumas pessoas
explodem e depois se acalmam; outras se ocultam em si memos; outras se
desenfream em ira durante dias. Algumas pessoas elevam as suas vozes, outras
ficam caladas; algumas pessoas dão muitos sinais de estarem iradas, outras
promovem ataques de guerrilhas em qualquer parte; algumas usam a ira para
intimidar e controlar as outras pessoas, uns usam a ira para emburrar-se e
evitar outras pessoas. O aconselhador pastoral devem familiarizar-se com a
carnalidade característica das suas ovelhas.[25]
5. A ira é uma questão moral
A ira é um assunto
intrinsecamente moral. Isto afirmo por duas razões. A ira avalia, e a ira é
avaliada por si mesma. Isto foi implícito na discussão anterior mas vale a pena
levantar novamente o ponto para análise. Primeiro, a ira avalia;
isto é, ela pondera algo ou
alguém, a encontra em falta, errada ou desagradável e depois parte para a ação.
A ira impulsiona-nos para atacar ou para desacreditar aquilo que achamos
desagradável. A ira foi uma vez bem descrita como a “emoção moral”. É um
sistema judicial auto-contido, reagindo com energia ao erro percebido.
Ao longo deste artigo tenho
tipicamente alargado a nossa definição de “ira” para incluir o criticismo, a
resmunguice, transferir a outro nossa culpabilidade , o ódio, a violência e
outros sentimentos semelhantes. Todas estas coisas são julgamentos contra o mal
percebido. Aquilo que nós pensamos tipicamente ser “ira” – uma voz elevada,
palavras acusadoras, calor emocional, atitude hostil – é provavelmente melhor
definido como “uma forma estimulada emocionalmente, de julgamento contra um mal
percebido”.
Neste artigo estamos preocupados
com a natureza essencial da ira, não em discriminar nuanças. E essa natureza
essencial consiste em passar um julgamento moral contra algo que, ao mesmo
tempo, pensamos ser errado e importante. Eu preocupo-me suficientemente sobre
algo para ser movido: “a moção” em emoção, o “motivo” em “motivação”. Sou
movido para, igualmente, sentir-me forte e para fazer alguma coisa. A ira, pela
sua própria natureza, assume uma posição moral; ela julga.
Segundo, a ira é avaliada. Deus
julga o nosso julgamento; Ele avalia moralmente cada simples exemplo de ira.
Será que eu percebo de forma precisa o bem o o mal? Será que eu reajo a um mal
percebido de uma forma piedosa? Se eu me contrarío quando o telefone toca e
quebra a minha concentração, resmungando uma série de impropérios, a minha ira
proclama, “Esta chamada é ruim; merece ser amaldiçoada”. Deus avalia, quer o
meu critério de julgamento, quer a minha forma de reagir e considera ambos
errados. Se eu xingo um adúltero e faço bisbilhotice sobre ele, a minha ira
proclama, “O adultério está errado e deve encontrar a maldição e a
bisbilhotice”. Deus avalia o meu critério de julgamento e considera-o correto;
Ele avalia a minha forma de reagir e considera-a errada. Se eu me iro quando o
meu filho troça da sua mãe, e lhe respondo com uma reprovação vigorosa e
amorosa, a minha ira proclama, “O desrespeito está errado e deve ser reprimido
com energia, com respeito, desafio e misericórdia”. Deus avalia a minha ira,
quer o meu critério de julgamento, quer a minha forma de reagir e considera-os
correctos. Essa ira exprime amor tanto pela minha esposa como pelo meu filho. A
força emocional dessa ira amorosa produz coisas boas. Ela motiva-me a intervir;
ela protege a minha esposa; ela proporciona ao meu filho a significância do
erro; ela modela a forma correta de responder ao pecado de outro.
O cristianismo não consiste em
apatia estóica, portando-se “acima” da reacção emocional.[26] Muitas pessoas,
em nome de “se auto-controlarem”, na verdade provam ser descuidadas ou obtusas.
Elas pecam por omissão; estão ausentes, não ajudam onde a piedade iria
incomodar-se e procurar formas de causar um impacto. Mas o Cristianismo
tampouco dá livre curso a emoções. “O longânimo é grande em entendimento, mas o
de ânimo precipitado exalta a loucura”(Provérbios 14:29). A ira não é neutra.
Uma linha entre a sabedoria e a loucura percorre o centro de cada ocasião de “ira”;
ela, ou é bendita, ou diabólica.
Aqui o pensamento bíblico vai
directamente contra a nossa cultura. A nossa cultura tipicamente afirma, “A ira
não é boa nem má, ela apenas existe”. A teoria de que as emoções são neutras
tornou-se um estribilho da cultura terapêutica. Mas não é verdade que a ira
“apenas existe”. Muitas pessoas, em nome de “apenas serem honestas” ou de
“tirar isso de cima de mim”, provam a elas mesmas que são irreflectidamente
auto-centradas. Pecam por comissão, são impulsivas, provocando prejuízo onde a
piedade deveria considerar o impacto de palavras. Aprender a discernir a
diferença entre ira justa e a ira pecadora é extremamente importante e nem
sempre é fácil.
Nós devemos sintonizar o nosso
julgamento moral –ter “os sentidos exercitados para discernir tanto o bem como
o mal.”(Hebreus 5:14) – para podermos ver a diferença entre a ira justa e a ira
pecaminosa. Deus e o diabo estão ambos sempre irados; de que lado está a sua
ira? A Escritura dá muitos critérios com os quais Deus nos ensina a discernir.
Vamos considerar sete critérios.
A ira piedosa não precisa de
“vencer”. Não precisa de sucesso em trazer malfeitores para a justiça.
Os seus
propósitos são mais modestos à superfície, mas mais extravagantes debaixo da
superfície: a glória de Deus e o bem-estar eterno do povo de Deus. A ira
piedosa tem bons resultados para todos os propósitos. Por isso, quando você é
confrontado com um mal vindo de alguém sem arrependimento, quando os seus
melhores esforços parecem não ter tido efeito bom nem duradouro, você não tem
que ficar ainda mais irado. Você pode, em vez disso, tornar-se mais objectivo e
concreto. No seu interior, a piedade funciona para abrandar o seu coração.
Jesus faria com que você orasse pelo bem da pessoa, o que certamente inclui orar
por seu arrependimento para a vida (Lucas 6:28). No exterior, você é chamado
para atos persistentes, francos , de bondade imerecida: “Portanto, se o teu
inimigo tiver fome, dá-lhe de comer; se tiver sede, dá-lhe de beber” (Romanos
12:20). Também no exterior, você pode ser chamado para se juntar com outros
naquelas actividades corporativas que impõem consequências objectivas ao
comportamento errado das pessoas: disciplina eclesiástica, recusa de ajuda
financeira, rompimento de um emprego, uma notícia de despejo, chamar a polícia,
processo criminal, aprovação de melhores leis, votar em novos líderes e outras
coisas semelhantes. Essas boas actividades são também “julgamentos contra o mal
percebido”, mas operam de um modo mais desapaixonado.
Elas são necessidades objectivas
e sóbrias. Colocam limites sobre os nossos empenhos mais pessoais para ajudar
as pessoas. Como tal, elas são de grande conforto e bem-estar. É muitas vezes
um grande alívio para uma pessoa confrontando-se com um mal persistente, saber
que outros também estão assumindo responsabilidade para tornar as coisas
direitas. Isso diminui a tentação da ação de vigilância.
A ira é uma questão moral. Pela
sua própria natureza ela avalia e procura destruir o erro percebido. A nossa
ira está sempre a ser avaliada pela verdadeira natureza de Deus..
Estas afirmações gerais sobre a
ira estabilizam o nosso pensamento. A Bíblia trata da ira com ricos pormenores
através de exemplos e de proposições. A ira é física, emocional, mental e
comportamental. É decididamente interpessoal, tendo sempre a ver com Deus e
tendo muitas vezes a ver com outras pessoas. É, igualmente, natural e
aprendida, para o bem e para o mal. É um assunto moral. Deus dá-nos uma visão
ampla de onde podemos pensar sobre a ira e combater os diversos fenômenos que encontramos relacionados com a ela.
Aplicações de aconselhamento
foram dispersas através das páginas anteriores e os leitores irão provavelmente
retirar muitas outras aplicações. Na próxima edição iremos considerar algumas
das mais importantes aplicações com mais detalhe.
Por : Escola Bereana - ADVEC
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