Capítulo 13 Memórias da Graça
Romanos 16.1,2 Recomendo-vos, pois, Febe, nossa irmã, a
qual serve na igreja que está em Cencreia, para que a recebais no Senhor, como
convém aos santos, e a ajudeis em qualquer coisa que de vós necessitar; porque
tem hospedado a muitos, como também a mim mesmo.
Um Documento
Preciosíssimo! “Recomendo-vos, pois, Febe, nossa irmã, a qual serve na igreja que está
em Cencreia” (16.1).
Chegou o
momento especial de Paulo terminar a carta e apresentar quem a levaria até
Roma: uma cristã a quem Paulo chama apenas de Febe. Warren W. Wiersb e destaca
que essa foi a encomenda mais preciosa que Febe teve a oportunidade de levar.
Febe era de Cencreia, um porto de Corinto. Os intérpretes a creditam que Febe
se converteu durante a estadia de Paulo em Corinto, que durou dezoito meses.
Ela era uma pessoa de confiança e que ajudava na obra de Deus. Paulo diz que
ela “ servia ” à igreja de Cencreia.
A palavra grega para “ servir” é a
tradução do grego diakonos,
que tem o sentido de “ servir” .
Febe auxiliava e
ajudava a sustentar a obra ali.
“para que a recebais no
Senhor, como convém aos santos, e a ajudeis em qualquer coisa que de vós
necessitar ; porque tem hospedado a muitos, como também a mim mesmo” (16.2). Paulo destaca que Febe era uma
“protetora” de muitos e também dele. O sentido aqui, como destacamos
lexicógrafos, é de uma pessoa que não mede esforços para ajudar alguém . Febe,
portanto, foi um apoio espiritual, moral e financeiro para o apóstolo em seu
projeto missionário.
Estou convencido
, e a prática pastoral me dá esse convencimento , de que muito mais poderia ser
feito pela obra de Deus se muitas pessoas a quem Deus deu condições
privilegiadas se dispusessem a ajudar. Todavia, o que se observa é que quem de
fato mais ajuda a igreja são aqueles que pouco tem . São os aposentados, as
pensionistas, o trabalhador braçal, etc. Não é a regra, mas há grandes
empresários que não se envolvem com nada da igreja que demanda gastos. Ficam
olhando de longe. Muitos nem dizimistas conseguem ser. Andam na contramão de
Febe.
Romanos 16.3-16
Saudai a Priscila e a Áquila, meus
cooperadores em Cristo Jesus, os quais pela minha vida expuseram a sua cabeça;
o que não só eu lhes agradeço, mas também todas as igrejas dos gentios. Saudai
também a igreja que está em sua casa. Saudai a Epêneto, meu amado, que é as
primícias da Ásia em Cristo. Saudai a Maria, que trabalhou muito por nós.
Saudai a Andrônico e a Júnia, meus parentes e meus companheiros na prisão, os
quais se distinguiram entre os apóstolos e que foram antes de mim em Cristo.
Saudai a Amplíato, meu amado no Senhor. Saudai a Urbano, nosso cooperador em
Cristo, e a Estáquis, meu amado. Saudai a Apeles, aprovado em Cristo. Saudai
aos da família de A ristóbulo. Saudai a Herodião, meu parente. Saudai aos da
família de Narciso, os que estão no Senhor. Saudai a Trifena e a Trifosa, as
quais trabalham no Senhor. Saudai à amada Pérside, a qual muito trabalhou no
Senhor. Saudai a Rufo, eleito no Senhor, e a sua mãe e minha. Saudai a
Asíncrito, a Flegonte, a Hermas, a Pátrobas, a Hermes, e aos irmãos que estão
com eles. Saudai a Filólogo e a Júlia, a Nereu e a sua irmã, e a Olimpas, e a
todos os santos que com eles estão. Saudai-vos uns aos outros com santo ósculo.
As igrejas de Cristo vos saúdam. Uma Igreja sem Estrelas “Saudai... ” (16.3).
O apóstolo
estava chegando ao final de sua carta. A saudade batia no peito. Chegara o
momento de enviar congratulações às pessoas que ele tanto estimava. Eram todas
pessoas queridas, do convívio apostólico, e isso ele demonstra quando lembra nominalmente
de cada um . Eugene Peterson diz que nunca quis pastorear uma igreja que
tivesse mais do que trezentos membros porque isso o impossibilitaria de
conhecer todos os membros. Ele gosta de conhecer as ovelhas e chamá-las pelo
nome. Vemos esse mesmo princípio aplicado na vida de Paulo.
Como todas essas pessoas que Paulo conhecia
estariam naquele momento em Roma? É uma pergunta que tem intrigado os
comentaristas. Todavia, deve ser levado em conta que Roma era a capital do império
e para lá concorria gente do mundo todo, inclusive os cristãos. O edito do
imperador que mandava expulsar todos os judeus de Roma havia sido revogado e
isso permitiu o retorno de muitos cristãos de origem judaica à capital do império.
O apóstolo
já havia dito na introdução de sua carta que “ em todo o mundo é anunciada a vossa
fé” (Rm1.8). A igreja de Roma se torna uma igreja relevante, visível para o
mundo. Na sua pregação havia eco. Era uma igreja formada por judeus e gentios,
a grande maioria gentios. Havia pessoas das classes sociais mais altas, mas a
grande maioria eram pessoas simples. Não havia estrelas, mas cristãos dispostos
a se tornar mártires. Paulo lembra o nome de umas 26 pessoas, a grande maioria
permaneceu no anonimato. Era nessa igreja, formada em sua maior parte por
anônimos, que Paulo viu uma oportunidade de estabelecer ali uma base
missionária. Na nossa cultura personalista, onde se cultua a imagem , é bem
difícil encontrar espaço para os anônimos. Todavia, eles existem e estão fazendo
muito pelo Reino de Deus. Nessa palavra de saudação, o apóstolo tira alguns
deles do anonimato, mas muitos outros continuaram lá. Não há dúvidas de que a
obra de Deus é feita na sua grande maioria por cristãos que não têm o seu nome
exposto. São anônimos que estão construindo a história do Reino de Deus.
Como não me
lembrar de Antonio de Pádua Mendes Ferro Gomes? Um homem que não tem seu nome
exposto na literatura, mas que causou um enorme impacto nos primeiros anos da
minha via espiritual. Foi ele que há mais de trinta anos me introduziu na
leitura da Bíblia, da literatura evangélica e na oração. Causou um im p acto
trem e n d o em m in h a v id a espiritual. Como esquecer os jejuns,
acompanhados da leitura do livro de Provérbios, que fazíamos no sítio de sua
avó? Jamais vou me esquecer do seu zelo evangelístico que o levava a pregar nas
praças e se jogar de corpo e alma no evangelismo pessoal. Devo muito a esse
homem de Deus. Sem dúvida, ele também faz parte desse livro e de todos os outros
que escrevi. E com esse sentimento de saudade que Paulo envia suas últimas
saudações e recomendações.
“...a Priscila e a Aquila, meus cooperadores
em Cristo Jesus, os quais pela minha vida expuseram a sua cabeça; o que não só
eu lhes agradeço, mas também todas as igrejas dos gentios” (16.3,4). O apóstolo lembra primeiramente de
velhos cooperadores — Priscila e Áquila. Eles haviam trabalhado com Paulo em
Corinto (At 18 .1-3 ,18 ,19 ,26 ). Agora estavam em Roma. Paulo tem uma dívida
de gratidão com esse casal porque eles arriscaram a vida pelo apóstolo. É
interessante notar que o nome Priscila aparece sempre em primeiro lugar quando
o casal é citado. Os intérpretes acreditam que ela era a pessoa que mais se
destacava. Quem não conhece um casal em que a mulher se destaca mais do que o
homem ? Eu poderia citar muitos casos. Paulo reconhece que tem uma dívida com
esse casal — eles haviam arriscado a vida por ele (v. 5). Como naqueles dias as
igrejas eram domésticas, esse casal hospedava
uma parte da igreja na casa deles.1
“... Saudai a Epêneto,
meu amado, que é as primícias da Asia em Cristo. Saudai a Maria, que trabalhou
muito por nós. Saudai aAndrônico e a Júnia, meus parentes e meus companheiros
na prisão, os quais se distinguiram entre os apóstolos e que foram antes de mim
em Cristo” (16.5,6,7). Ao lado das saudações, o apóstolo sempre põe em destaque o que o fazia
lembrar-se desses irmãos. Um deles fora as primícias do seu labor missionário ;
outras trabalharam muito pela igreja, enquanto outros se tornaram notáveis entre
os apóstolos. Outros haviam se convertido antes de Paulo. Isso deveria servir
de exemplo para muitos novatos que querem desprezar o legado deixado pelos mais
velhos. Não adianta querer passar por cima da história quando se deu apenas os primeiros
passos. É preciso aprender com a história.
Todos esses
fatos narrados marcaram a memória do apóstolo . Elês também nos marcam . Um nom
e aqui se destacados demais, Maria , a quem Paulo acrescenta que “muito
trabalhou ” pela igreja . Expressão “ trabalhou muito ” traduz o termo grego
kopiao, que tem o sentido de “esforçar-se” , “ trabalhar duramente” . O sentido
no grego é que ela se sacrificou, derramou muito suor, gastou tudo o que tinha
para que pudesse ajudar seus irmãos na fé. E o fato é que se tratava de uma
mulher. Isso mostra como nas Escrituras as mulheres têm um papel de destaque.
Infelizmente , hoje queremos um cristianismo sem custo , sem gasto e sem
esforço. Talvez seja por isso que a fé tenha perdido aquele poder de contagiar
como fazia antes.
“Saudai aAmplíato, meu
amado no Senhor. Saudai a Urbano, nosso cooperador em Cristo, e a Estáquis, meu
amado. Saudai a Apeles, aprovado em Cristo. Saudai aos da família de
Aristóbulo. Saudai a Herodião, meu parente. Saudai aos da família de Narciso,
os que estão no Senhor” (16.8-
11). Algumas palavras usadas aqui pelo apóstolo se destacam :
“amigo ” (v.8, ARA ); “amado ” (v.9) e “aprovado ” (v. 10). Essas palavras
mostram o grau de comunhão que havia na Igreja Primitiva. Eles eram amigos,
amados e aprovados.
No livro de
minha autoria As Ovelhas Também Gemem, escrevi sobre a necessidade da koinonia
cristã. Sem dúvida, uma das doutrinas mais exaltadas nas páginas da Bíblia é a
da unidade cristã. A falta de unidade foi uma das principais razões que levou o
apóstolo Paulo a escrever a sua Primeira Carta aos Corintos. Escrevendo àquela
igreja ele disse estar informado de que havia contendas entre eles (1 Co 1.11).
A os efésios, o mesmo apóstolo aconselhou a que se esforçassem diligentemente
para “guardar a unidade do Espírito ” (Ef 4.3 ); a dois crentes filipenses o
apóstolo dos gentios recomendou: “pensem concordemente, no Senhor” (Fp 4.2 ,
ARA ). E inegável o valor da unidade cristã. Aunidade traz a comunhão. E bom
lembrar que um dos segredos do grande e explosivo crescimento da Igreja
Primitiva era justamente a comunhão existente entre os crentes. No livro da história
da igreja, Atos dos Apóstolos, lemos: “E perseveravam na doutrina dos
apóstolos, e na comunhão , e no partir do pão , e nas orações” (At 2 .42 ). A
palavra “comunhão ” traduz o termo grego koinonia. W.E. Vine observa que a
koinonia é “um ter em comum , companheirismo , comunhão ” e denota “a parte que
um tem em qualquer coisa, uma participação , um companheirismo reconhecido , e
se usa das experiências e interesses comuns dos cristãos” .2 É oportuno
observarmos o uso desse termo na literatura grega , incluindo o Novo Testamento
. William Barclay nos dá uma excelente visão panorâmica desse termo na
literatura grega, incluindo o Novo Testamento : 123456
1. N a vida cristã há
um a koinonia
que significa um “compartilhar de amizade”
e um a permanência
no convívio dos outros (At 2.42; 2 Co 6.14).
2. Na vida cristã há uma koinonia que significa uma “divisão prática”
com os que são menos
afortunados. A comunhão cristã é uma coisa prática (Rm
15.26; 2 Co 8.4; 9.13).
3. Na vida cristã há uma
koinonia que é
uma “cooperação na obra de Cristo ” (Fp 1.5).
4. Na vida cristã há um
a koinonia “na fé”. O cristão nunca é um a unidade isolada; é membro de um convívio da fé (Ef
3.9).
5. Na vida cristã há uma “ comunhão
(koinonia) no Espírito ” (2 Co 13.14; Fp 2.1).
6. Na vida cristã há um
a koinonia “com Cristo”. Os cristãos são chamados para a koinonia de Jesus Cristo , o
Filho de Deus (1 Co 1.9).
7. Na vida cristã há a
koinonia “com Deus ” (1 Jo 1.3). Mas deve ser notado que aquela comunhão tem condições
éticas, porque não é para aqueles que escolher amandar nas trevas (1Jo 1.6). A
koinonia cristã é aquele vínculo que liga os cristãos aos outros, a Cristo e a
Deus.
3 Princípios Bíblicos para um Bom
Relacionamento
Seguem
alguns princípios bíblicos que extraí do livro de Provérbios, que nos ajudarão
a nos relacionar bem uns com os outros:
1. Saiba ouvir (Pv
18.13). Um dos grandes
problemas em nos relacionar bem uns com os outros surge por conta da nossa
falha em ouvir. Ouvimos, mas ouvimos mal. Ou ainda: ouvimos mais do que foi
dito. Precisamos aprender a ouvir.
2. Não se apresse para
falar (Pv 19.2; 17.28). A precipitação em falar é outro grande problema. Jesus mesmo
condenou o juízo temerário . Isto é, falar apressadamente sem um conhecimento
total dos fatos.
3. Fale pouco (Pv
10.19; 13.3; 12.18). Aqui talvez esteja um dos maiores fatores de desajuste nos
relacionamentos. É um comentário inoportuno que fazemos. Uma palavra a mais,
que aparentemente não tem a intenção de ofender, mas que vem sublimada.
4. Fale coisas boas das
pessoas (Pv 16.24; 16.28; 20.19). A tendência de só enxergar coisas ruins nos outros é uma
herança da nossa velha natureza adâmica. Dificilmente falam os de alguém para
exaltar suas virtudes. Necessitamos enxergar algo de bom no nosso semelhante se
queremos nos relacionar bem .
5. Não atice (fomente)
conversas (Pv 30.33; 26.20,21). A credito que se não passássemos à frente as fofocas que
chegam até nós muitas intrigas seriam evitadas.
6. Fale pouco de si
mesmo (Pv 27.2).
A atitude de
falar de si mesmo , além de revelar um complexo de inferioridade, acaba também
por arranhar os relacionamentos. Isso por um a razão simples: é difícil louvar
a si mesmo sem diminuir o outro.4
Romanos 16.17-20
E rogo-vos, irmãos,
que noteis os que promovem dissensões e escândalos contra a doutrina que
aprendestes; desviai-vos deles. Porque os tais não servem a nosso Senhor Jesus
Cristo, mas ao seu ventre; e, com suaves palavras e lisonjas, enganam o coração
dos símplices. Quanto à vossa obediência, é ela conhecida de todos.
Comprazo-me, pois, em vós; e quero que sejais sábios no bem, mas símplices no
mal. E o Deus de paz esmagará em breve Satanás debaixo dos vossos pés. A graça
de nosso Senhor Jesus Cristo seja convosco. Amém!
Uma Palavra
de Advertência “E rogo-vos, irmãos, que noteis os que promovem dissensões e escândalos
contra a doutrina que aprendestes; desviai-vos deles” (16.17). O s
versículos 17 a 20 aparecem com o um a intersecção entre os versículos 16 e 21.
No meio das saudações, o apóstolo lembrou que havia aqueles que trabalhavam
contra a unidade da igreja. Era preciso alertar a igreja de Roma nesse ponto.
Depois ele voltaria às saudações. Esses “ cristãos” eram agentes de Satanás e
trabalhavam contra a paz na igreja (v. 20). Eram agentes semeadores de
contendas; por isso, a melhor forma de neutralizar suas ações era afastar-se
deles. Muitos intérpretes acreditam que o fermento gnóstico está presente na
ação dessas pessoas, pois a forma escandalosa como se portavam é aqui
denunciada por Paulo. O que eles faziam estava em desacordo como ensino que os
crentes romanos haviam recebido. A igreja possui uma padronização, e os seus membros
precisam se ajustar a ela.
Romanos 16.21-23
Saudação da minha própria mão, de Paulo. Se
alguém não ama o Senhor Jesus Cristo, seja anátema; maranata! A graça do Senhor
Jesus Cristo seja convosco.
Lembrança dos Amigos
O expositor Warren W Wiersbe comenta com
maestria essa porção das Escrituras: “ Que lista de heróis! Timóteo é men cio n
ad o co m frequência no livro de Atos e nas Epístolas. Era um dos ‘filhos na fé
’ de Paulo e trabalhou com o apóstolo em vários lugares difíceis (ver Fp
2.19-24). Lúcio era um compatriota judeu, como também o eram Jasom e Sosípatro.
Não há evidência algum a de que foi esse mesmo Jasom que protegeu Paulo em
Tessalônica (At17.19). E bem provável que esse Jasom fosse um gentio. Tércio
foi o secretário que escreveu a carta enquanto Paulo a ditava. Gaio foi o homem
que abriu a casa para hospedar Paulo, enquanto o apóstolo estava em Corinto . 1
Corintios 1 .14 relata como Paulo ganhou Gaio para Cristo e o batizou quando
fundou a igreja de Corinto. Tudo indica que havia uma congregação de cristãos
se reunindo na casa dele. Erasto ocupava um cargo importante na cidade,
provavelmente de tesoureiro . O evangelho alcançou tanto os mais altos escalões
de Corinto quanto o povo mais humilde (1 Co 1.26-31; 6.9 -11)” .
Romanos 16.24-27 A graça de nosso Senhor Jesus
Cristo seja com todos vós. Amém! Ora, àquele que é poderoso para vos confirmar
segundo o meu evangelho e a pregação de Jesus Cristo, conforme a revelação do
mistério que desde tempos eternos esteve oculto, mas que se manifestou agora e
se notificou pelas Escrituras dos profetas, segundo o mandamento do Deus
eterno, a todas as nações para obediência da fé, ao único Deus, sábio, seja
dada glória por Jesus Cristo para todo o sempre. Amém!
Graça para todos
“Ora, àquele que é poderoso para vos confirmar
segundo 0 meu evangelho e a pregação de Jesus Cristo, conforme a revelação do
mistério que desde tempos eternos esteve oculto” (16.25). Não havia um a maneia mais
adequada de terminar essa magistral carta senão comum profundo sentimento de
gratidão a Deus. Foi ele quem revelou os mistérios ocultos noutros tempos e que
agora se tornaram manifestos por meio de Jesus Cristo , nosso Senhor. Paulo já
havia dito em Romanos 11.36 que “Porque dele, e por ele, e para ele são todas
as coisas; glória, pois, a ele eternamente. Amém !” . A esse Deus, eternamente
sábio, que nos justificou pela sua infinita graça, pertence toda honra e glória
pelos séculos dos séculos. Amém !
Maravilhosa
Graça
O CULTIVO DAS RELAÇÕES
INTERPESSOAIS
A importância dos relacionamentos na
igreja
(Rm 16.1-27
Hernandes D.
Lopes
A carta de Paulo aos Romanos é singular não apenas quanto ao seu
conteúdo, mas também quanto à sua conclusão. Aqui está a mais longa lista de
saudações feita pelo apóstolo. A primeira vista este capítulo parece árido e
somos inclinados a subestimar o valor de seus ensinos. Entretanto, no epílogo
desta missiva, Paulo enfileira grandes verdades e preciosos ensinamentos acerca
dos relacionamentos pessoais de amor na igreja. Para usar uma conhecida expressão
de Crisóstomo, devemos aproximar-nos dessa introdução como garimpeiros à cata
de grandes tesouros.
Romanos 16
pode ser dividido em cinco pontos: recomendação, saudação paternal, exortação,
saudação fraternal e adoração doxológica. Warren Wiersbe sintetiza-os em três
verdades preciosas: alguns amigos para saudar (16.1-16), alguns inimigos a
evitar (16.17-20) e alguns servos a honrar (16.21-27).1195
Uma recomendação pastoral (16.1,2)
O apóstolo
escreve: “Recomendo-vos a nossa irmã Febe, que está servindo à igreja de
Cencreia, para que a recebais no Senhor como convém aos santos e a ajudeis em
tudo que de vós vier a precisar; porque tem sido protetora de muitos e de mim
inclusive” (16.1,2). As cartas de recomendação eram comuns e necessárias naquele
tempo (At 18.27; 2Co 3.1), uma vez que os crentes precisavam contar com a
hospitalidade dos irmãos quando viajavam de uma cidade para outra. Igualmente,
eram necessárias para proteger as pessoas de charlatães.1196 John Murray diz
que Febe era uma mulher que realizara eminentes serviços à igreja, e a
recomendação tinha de ser proporcional a seu caráter e devoção.
Uma carta de
apresentação daria à Febe o acesso à igreja de Roma. Ela era membro da igreja
de Cencreia, onde se localizava o porto de Corinto, quinze quilômetros a leste
da cidade (At 18.18). A igreja de Cencreia talvez fosse filha da igreja
metropolitana de Corinto.
O nome
próprio Febe significa radiante ou brilhante, título do deus Apoio, e isto pode
indicar os antecedentes gentílicos dessa cristã.1198 William Hendriksen é da
opinião de que o nome Febe deriva da mitologia pagã, sendo outra palavra para
Artemis, a brilhante e radiante deusa lua, identificada com Diana, deusa
romana."99 Febe estava viajando de Cencreia a Roma e possivelmente foi a portadora
dessa carta aos Romanos.
Paulo ensina
aqui algumas lições:
Em primeiro
lugar, o importante papel da mulher na igreja(16.1,2). Febe era uma
servidora da igreja de Cencreia. A palavra grega diakonon, usada pelo apóstolo
para descrever Febe, é o feminino do termo diaconos, “diácono”. Embora muitos
comentaristas, como F. F. Bruce, John Stott, Dale Moody, Warren Wiersbe, Franz
Leenhardt, Charles Hogde, C. H. Lenski, C. E. B. Cranfield a considerem
diaconisa, concordo com Charles Erdman em que o simples uso do termo não
significa que Febe tivesse esse ofício. O termo pode denotar simplesmente o
exercício da caridade e da hospitalidade que deveriam caracterizar a vida de
todo verdadeiro crente e que Febe parecia manifestar em assinalado grau.1200
Mesmo que as
opiniões sobre esse assunto sejam divididas, creio que William Hendriksen tem
razão quando declara não haver nenhuma menção do diaconato feminino no restante
do Novo Testamento.1201 Por conseguinte, o que se enfatiza nesta epístola é a
importância de Febe para a igreja como servidora e protetora de muitos,
inclusive do próprio apóstolo Paulo. A lição clara é que se deve evitar dois
extremos: 1) o de ordenar mulheres para um ofício eclesiástico quando não há
nas Escrituras autorização para fazê-lo; 2) o de ignorar os importantíssimos e
valiosos serviços que mulheres devotas e alertas são capazes de prestar à
igreja de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo.1202
Em
segundo lugar, o importante papel do cuidado mútuo na igreja (16.2). Febe era
protetora de muitos e inclusive do apóstolo Paulo. A palavra grega prostatis
significa “ajudadora, patronesse, benfeitora”, ou seja, prostatis era um
representante legal e um protetor rico.1203 Leenhardt diz que prostatis
designava o representante legal e protetor dos estrangeiros, uma vez que eles
eram privados de garantias jurídicas.1204 Charles Erdman acrescenta que essa
palavra tem também o sentido de patrocinadora.120,5 Isso demonstra que Febe era
uma mulher de posses que usava a sua riqueza para apoiar a igreja e também o
apóstolo.1206
Febe usou
seus recursos não apenas para seu deleite e conforto, mas para sustentar e
socorrer muitos irmãos. Era uma mulher altruísta, abnegada, desapegada das coisas materiais e
apegada às pessoas. Sua vida, sua casa e seus bens estavam a serviço da igreja.
Ela não se blindou para viver confortavelmente num castelo seguro em meio às
tempestades da vida, mas serviu de porto seguro para muitos que estavam sendo
batidos pelos vendavais furiosos das circunstâncias adversas. De acordo com
Adolf Pohl, Febe trabalhava no vasto campo da assistência e do cuidado de necessitados.
Em terceiro
lugar, o importante papel da recepção calorosa na igreja (16.2). A
igreja de Roma deveria receber Febe no Senhor como um membro da família de Deus
e ajudá-la em tudo aquilo de que precisasse. A palavra grega
parasthete,traduzida como “ajudar”, significa auxiliar, assistir, ficar atrás a
fim de empurrar, de sustentar alguém.1208 Chegara o momento de Febe colher os
frutos de sua semeadura. Ela havia cuidado de muitos e agora deveria ser alvo
do cuidado da igreja de Roma. A igreja é a comunidade da ajuda mutua.
Uma saudação paternal (16.3-16)
Paulo passa
da recomendação às saudações. Elenca 26 nomes, acrescentando na maioria dos
casos uma apreciação pessoal e uma palavra de elogio. O apóstolo é um mestre de
relacionamentos humanos. E um pastor experiente e sabe o valor de tratar as
pessoas pelo nome e de fazer-lhes elogios encorajadores. Concordo com Charles Erdman
quando ele diz que essa lista de nomes obscuros é de grande valor e verdadeira
significação. Tais saudações revelam o coração de Paulo a patentear terna
afeição, apreciação à bondade, afetuosa simpatia e o alto conceito em que tinha
as amizades humanas. Dão-nos instrutivos relances da vida da igreja primitiva,
capacitando-nos a ter ideia da íntima união, dos heroicos sofrimentos, das
generosas simpatias, da pureza, da consagração, da fé, da esperança e do amor então
reinantes.
Alguns
estudiosos atribuem essa longa saudação à igreja de Éfeso, e não à igreja de
Roma,1210 argumentando que Paulo não conhecia pessoalmente a última e seria
improvável que tivesse tantos amigos lá. Além disso, Paulo faz referência a
Priscila e Aquila, proeminente casal que fora expulso de Roma pelo edito de
Cláudio em 49 d.C. (At 18.2) e servira a Cristo na cidade de Corinto, onde
Paulo os acompanhara (At 18.1-3). Depois viajaram juntos para Éfeso (At
18.18,19; ICo 16.10), e deve ter sido ali que o casal arriscou a vida por ele
(16.4). Além do mais, Paulo envia saudações a Epêneto (16.5), primeiro
convertido da Ásia, sendo Éfeso a capital da Ásia Menor. Concordo, entretanto,
com William Barclay quando ele diz que, se Paulo tivesse enviado saudações a
tanta gente para uma igreja conhecida como Éfeso, teria provocado ciúmes nos
demais membros, mas para uma igreja que ainda não havia visitado, como a de
Roma, essa longa lista era um expediente sábio para criar a maior rede possível
de
Outro
argumento consistente para provar que essa saudação foi realmente dirigida aos
crentes de Roma, e não aos membros da igreja de Éfeso, é que Roma era a capital
do império, a maior e mais cosmopolita cidade da época, com mais de um milhão
de habitantes, e todos os caminhos levavam a Roma.1212 A essa magnífica cidade
todos os dias afluíam pessoas em busca de novas oportunidades. Havia naquele
tempo grande mobilidade e era natural que muitos crentes convertidos em igrejas
que Paulo fundara agora estivessem residindo em Roma. Concordo com John Stott quando
ele diz não ser nada improvável que, após a morte de Cláudio em 54 d.C.,
Priscila e Áquila tenham retornado a Roma, onde teriam recebido essa saudação
de Paulo.1213
Destacamos
aqui algumas preciosas lições:
Em primeiro lugar, os crentes fazem parte da fam ília de
Deus. A família de Deus tem duas marcas distintas — unidade e diversidade -,
como destaca.1214 Com respeito à diversidade, podemos notar que na lista de
Paulo há homens e mulheres, escravos e livres, pobres e ricos, gentios e
judeus, mas todos estão em Cristo, e é essa união com Cristo que fornece a base
para a unidade da igreja.A diversidade da igreja pode ser notada pelo gênero,
classe social e raça. Na igreja de Roma havia homens e mulheres servindo a
Deus. Dentre as 26 pessoas saudadas na carta de Paulo, nove são mulheres. Na
igreja de Roma pobres e ricos, escravos e livres estavam juntos nesse labor. Na
igreja de Roma judeus e gentios faziam parte da mesma família. Na igreja de
Deus há unidade na diversidade.
Os
comentaristas acham muito provável que o Aristóbulo mencionado aqui (16.10)
seja um neto de Herodes, o Grande, e amigo do imperador Cláudio, e que Narciso
(16.11) seja ninguém menos que o conhecidíssimo, rico e poderoso liberto que
exerceu grande influência em Cláudio.1215 Havia pessoas da corte imperial
convertidas a Cristo na igreja de Roma (Fp 4.22). No que concerne à unidade,
precisamos salientar que ela não é feita pelo homem, mas por Deus. Não criamos
a unidade da igreja; ela existe. Ao descrever seus amigos, Paulo destaca quatro
vezes que eles estão em Cristo (16.3,7,9,10) e cinco vezes que estão no Senhor
(16.8,11,12,13). Por duas vezes ele usa uma linguagem de conotação familiar,
referindo-se a “irmã” (16.1) e “irmãos” (16.14).1216
Em segundo lugar, os crentes devem ter mãos dispostas
para o
trabalho de Deus (16.3,6,9,12). Priscila e Aquila eram cooperadores de Paulo
(16.3), assim como Urbano (16.9). Maria muito trabalhou pela igreja de Roma
(16.6). Trifena e Trifosa trabalhavam no Senhor (16.12). Os verbos “cooperar” e
“trabalhar” destacam que essas pessoas tinham as mãos dispostas para o trabalho
de Deus.
Em terceiro lugar, os crentes devem ter a casa aberta
para a igreja de Deus (16.5). Paulo saúda os líderes dos cinco grupos em cujas
casas a igreja se reunia para a adoração (16.5,10,11,14,15). Em destaque está o
casal Priscila e Aquila. Eles tinham vocação missionária. Eram fabricadores de
tendas e deixaram Roma para habitar em Corinto, depois em Éfeso e agora estavam
de volta a Roma. O edito de Cláudio, pelo qual os judeus haviam sido expulsos,
deixara de vigorar, e Priscila e Aquila não hesitaram, como muitos outros
judeus, em voltar ao seu antigo lar e a seus antigos negócios. E, uma vez mais
descobrimos que eles são exatamente os mesmos: outra vez há uma igreja, um
grupo de cristãos que se reúnem em seu lar (16.5). Em outra ocasião, pela
última vez, eles estão novamente em Éfeso (2Tm 4.19).121 Priscila e Aquila era
um casal nômade, dois missionários itinerantes. Em todas as cidades por onde
passaram — Roma, Corinto, Éfeso, novamente Roma e outra vez Éfeso —, eles
abriram as portas da sua casa para a igreja de Deus. Naquele tempo, não havia
templos, e as igrejas se reuniam nas casas. A casa desse casal era uma igreja
na qual os crentes se reuniam para adorar a Deus e proclamar sua Palavra.
Em quarto lugar, os crentes devem ter o coração
abertopara os filhos de Deus (16.4,7,13). Priscila e Áquila não apenas abriram
a casa para abrigar a igreja de Deus, mas também estavam dispostos a correr
riscos pelos filhos de Deus. Arriscaram a vida para salvar o apóstolo Paulo. A
palavra grega upethekan significa colocar-se sob o machado do executor, sob a
lâmina do carrasco e arriscar a vida em prol de outras pessoas.1218
Possivelmente isso aconteceu em Éfeso, onde Paulo enfrentou lutas maiores que
suas forças a ponto de desesperar-se da própria vida (2Co 1.8). O casal
Andrônico e Júnias esteve com Paulo na prisão (16.7) e compartilhou de seus
sofrimentos.
Em quinto lugar, os crentes devem ter lábios abertos
para expressar amor aos filhos de Deus (16.5,7,8,9,10,12,13). Paulo era pródigo
nos elogios. Acerca de Epêneto, diz que era seu querido. Ressalta que Andrônico
e Júnias eram notáveis entre os apóstolos. Destaca que Amplíato era seu dileto
amigo. Chama Estáquis de amado. Afirma que Apeles é aprovado em Cristo. Destaca
que estima Pérside. Informa que Rufo é eleito no Senhor e destaca que sua mãe
também foi mãe para ele. O elogio sincero tem grande valor nos relacionamentos
humanos. Paulo sabia disso e não hesitava em usar esse importante recurso.
Em sexto lugar, os crentes devem ser zelosos no
serviço,mesmo que no anonimato (16.13-15). Na família de Deus há muitos heróis
anônimos. Há muitos santos cujos nomes não são destacados na terra, mas são
eminentes no céu. Rufo era possivelmente, filho de Simão Cirineu, o homem que
carregou a cruz de Cristo (Mc 15.21). Sua mãe, embora não mencionada pelo nome,
foi como uma mãe para o apóstolo Paulo. Que progenitores tinha Rufo! Um pai que
carregara a cruz do Salvador, e uma mãe que “adotara” o seu maior apóstolo.1219
O apóstolo saúda muitos irmãos e muitos santos sem declinar seus nomes, gente
desconhecida na terra, mas cujos nomes estão arrolados no céu.
Em sétimo lugar, os crentes devem ser afetuosos em
seus relacionamentos interpessoais (16.16). Na igreja primitiva, o ósculo santo
era a forma afetuosa e calorosa de cumprimento e demonstração de amizade,
especialmente antes da celebração da Ceia. Concordo, entretanto, com Calvino
quando ele diz: “Não me parece que Paulo exija a observância desta cerimônia,
senão que exorta a prática do amor fraternal para que se diferencie das
amizades profanas do mundo”.122(1 Em nossa cultura o aperto de mão e o abraço são
emblemas de efusividade no trato uns com os outros. Mesmo que o gesto seja
cultural, o princípio permanece. Devemos ser atenciosos e calorosos em nossos
relacionamentos interpessoais.
William
Hendriksen aponta três conjuntos de passagens nas quais o Novo Testamento faz
referência ao beijo.1221
a. Lucas
7.36-50, onde Jesus diz a seu hospedeiro, Simão, o fariseu: Você não me saudou
com um beijo, mas esta mulher, desde que entrei aqui, não parou de beijar meus
pés (Lc 7.45). Eis a lição: não só deve haver afeição, mas esta tem de ser
expressa. E preciso haver um sinal de afeição, por exemplo, o ósculo.
b. Lucas
22.47,48. Jesus perguntou ajudas: E com um beijo que você trai o Filho do
homem? O amor deve não apenas ser expresso, mas tem de ser real. O ósculo
precisa
c. O ósculo
trocado entre os membros da comunidade cristã, a igreja. Este é o ósculo
referido em Romanos 16.16 e em ICoríntios 16.20 e 2Coríntios 13.12. Não só
teria de ser um ósculo e um símbolo de afeição genuína, mas também deveria ser
santo. Em outros termos, jamais poderia implicar menos de três partes: Deus e
as duas pessoas que se osculam reciprocamente. O ósculo santo assim simboliza o
amor de Cristo mutuamente compartilhado.
Uma exortação apostolar (16.17-20)
Paulo teve
dificuldade em concluir a epístola aos Romanos. Mesmo após ter enviado suas
saudações, antes de terminar ele faz uma última advertência aos cristãos de
Roma.'222 O apóstolo passa da saudação a alguns crentes da igreja de Roma à
exortação à igreja de Roma. Destacamos aqui alguns pontos:
Em primeiro
lugar, os crentes precisam ter discernimento espiritual. “Rogo-vos,
irmãos, que noteis bem aqueles que provocam divisões e escândalos, em desacordo
com a doutrina que aprendestes; afastai-vos deles” (16.17). Ela via falsos
mestres infiltrando-se na igreja de Roma com o propósito de provocar divisões e
escândalos em desacordo com a doutrina. Quem eram esses falsos mestres? Em
parte alguma o apóstolo diz ou insinua que esses perturbadores fossem membros
da igreja romana. Provavelmente eram intrusos, propagandistas itinerantes de
erro. William Hendriksen diz que não é necessário crer que fossem todos de uma
só classe. Alguns poderiam ser judaizantes legalistas; outros, antinomianos
libertinos ou talvez ascetas; ou ainda defensores de uma combinação de dois ou
mais ismos destrutivos.'223 Calvino destaca o fato de que Paulo não condena
todas as dissensões indiscriminadamente, senão aquelas que destroçam a harmonia
e o assentimento da fé verdadeira.
Paulo diz que
os crentes de Roma precisam fazer duas coisas: 1) notar bem esses falsos
mestres, que são lobos querendo entrar no meio do rebanho (At 20.29,30); 2)
segundo, afastar-se deles. Nós também devemos aproximar-nos dos irmãos e
afastar-nos dos falsos mestres. Devemos fazer uma caminhada na direção da
comunhão fraternal e uma caminhada de distanciamento daqueles que provocam
divisões e escândalos na igreja. Geoffrey Wilson está correto quando diz que a
verdadeira doutrina é uma; as divisões do erro são muitas! Os crentes devem
afastar-se de tais homens, evitá-los como a uma praga. Devemos esquivar-nos
daqueles que quebram a verdadeira unidade da igreja enquanto buscam uma falsa
unidade.1225
Em segundo
lugar, os falsos mestres escondem o veneno do engano sob o manto da simpatia.
“Porque esses tais não servem a Cristo, nosso Senhor, e sim a seu próprio
ventre;e, com suaves palavras e lisonjas, enganam o coração dos incautos”
(16.18). Os falsos mestres não servem a Cristo, mas a si próprios. Em vez de
serem servos de Cristo, são escravos de seus próprios apetites e interesses
egoístas. O deus deles é o ventre. Eles fazem da igreja uma plataforma para se
locupletarem. Buscam o lucro, e não a salvação dos perdidos. Erguem monumentos
a si mesmos em vez de buscar a glória de Cristo. A língua deles é cheia de
lisonjas. Suas palavras são doces e suaves, mas carregadas de veneno. Eles são
amáveis em seus gestos e sempre agradáveis em suas atitudes, mas seu propósito
é enganar o coração dos incautos.
A palavra grega crestologia, traduzida por
“palavras suaves”, ajuda-nos a entender o caráter desses falsos mestres. Os
próprios gregos definiam crestólogo como a pessoa que fala bem e atua mal. E
aquela classe de pessoas que, por trás da fachada de palavras piedosas e
religiosas, exercem má influência; a pessoa que desencaminha os outros náo por
um ataque direto, mas sutilmente; a pessoa que finge servir a Cristo, mas na
realidade está destruindo a fé.1226
Em terceiro
lugar, a obediência e a maturidade espiritual devem ser as marcas do crente.
“Pois a vossa obediência é conhecida por todos; por isso, me alegro a vosso
respeito; e quero que sejais sábios para o bem e símplices para o mal”(16.19).
Paulo elogia a obediência da igreja de Roma e exorta os crentes a serem sábios
para o bem e símplices para o mal. A palavra grega akeraios, traduzida por
“símplices”, era aplicada ao metal sem impurezas e também ao vinho e ao leite
sem adição de água.1227 Os crentes devem ser prudentes como a serpente e
símplices como as pombas. Devem ser meninos no juízo e crianças na malícia (ICo
14.20).
Concordo com
John Stott quando ele diz que temos aqui três valiosos testes com os quais
avaliar os diferentes sistemas de doutrina e ética: o teste bíblico, o
cristológico e o moral. Esses testes podem ser expressos em forma de perguntas,
diante de qualquer tipo de ensino que nos apareça pela frente: E um ensino que
concorda com as Escrituras? para a glória do Senhor Jesus Cristo? Promove o
bem?1228
Em quarto
lugar, os crentes devem compreender a vitória que têm em Cristo. “E o
Deus da paz, em breve, esmagará debaixo dos vossos pés a Satanás. A graça de
nosso Senhor Jesus seja convosco” (16.20). Por trás da atuação dos falsos
mestres, Paulo detecta a estratégia de Satanás, o pai da mentira (Gn 3.5), a
quem Deus em breve esmagará sob os pés dos crentes que estão em Cristo (Gn
3.15). William Greathouse afirma que as divisões na igreja são obra de Satanás,
e a supressão delas pelo Deus da paz é vitória sobre Satanás.1229 Na mesma
linha de pensamento, John Murray diz que Deus é quem esmaga Satanás e
estabelece a paz, em contraste com o conflito, a discórdia e as divisões.1230Paulo
revela aqui a fonte de toda falsidade para que nenhum crente possa ser enganado
quando os instrumentos de Satanás realizarem sua obra mortal de destruir a alma
dos homens.1231 Paulo está convicto de que o diabo será destronado. O Deus da
paz não quer saber de conchavos com o diabo. Somente com a destruição do mal é
que se alcança a verdadeira paz.1232
Concordo com
William Barclay quando ele diz que a paz de Deus é a paz da ação, da conquista
e da vitória. Existe uma classe de paz que pode ser alcançada à custa de
furtar-se de questões que devem ser enfrentadas corajosamente, uma paz que
provém de uma inatividade letárgica e de uma evasão de toda ação decisiva. A
paz de Deus não se submete ao mundo, mas vence o mundo.1233 De acordo com E E
Bruce, o título “o Deus da paz” é particularmente apropriado aqui, uma vez que
Satanás é o autor da discórdia.1234 O Deus da paz é o guerreiro valente que nos
dá vitória contra Satanás. O Deus da paz é quem esmagará em breve debaixo dos
nossos pés a Satanás. Satanás já foi expulso do céu, já foi despojado na cruz e
em breve será esmagado debaixo dos nossos pés, e depois, será lançado no lago
de fogo. Somos soldados de um exército vitorioso. Seguimos o capitão invicto em
todas
William
Hendriksen sintetiza Romanos 16.20, ressaltando três itens em conexão com
aquilo que o Deus da paz
a. Deus
esmagará Satanás. Em outros termos, cumprirá a promessa de Gênesis 3.15. O
vitorioso não é Satanás, mas
b. Deus o
esmagará debaixo dos pés dos crentes. Os que são coerdeiros (8.17) são também
covencedores. Os santos participarão da vitória de Deus sobre Satanás (Ap
c. Deus fará
isso logo. Em certo sentido, é verdade que Deus já está esmagando Satanás. Uma
vitória mais decisiva foi conquistada no Calvário. Ao que a presente passagem
se refere, entrementes, é a vitória final e escatológica sobre Satanás, a qual
se concretizará em conexão com o glorioso regresso de Cristo (2Ts 2.8).
Uma saudação fraternal (16.21-24)
Paulo
escreve esta carta aos Romanos da região da Acaia, possivelmente de Corinto,
após sua última viagem missionária, de caminho a Jerusalém. Ele não apenas
envia saudação a 26 pessoas e aos demais irmãos da igreja de Roma, mas também
elenca nessa missiva as saudações dos amigos que estão com ele em Corinto, à
maneira de um post scriptum.
Paulo é um
homem muito polido para esquecer seus cooperadores. Havia uma equipe que
trabalhava a seu lado e ele sempre valorizava essas pessoas. De acordo com
William Barclay: “Nenhum grande homem pode fazer sua obra sem a ajuda que lhe
prestam humildes colaboradores”.1236
Oito irmãos
são destacados nessa saudação: “Saúda-vos, Timóteo, meu cooperador, e Lúcio,
Jasom e Sosípatro, meus parentes. Eu, Tércio, que escrevi esta epístola, vos
saúdo no Senhor. Saúda-vos Gaio, meu hospedeiro e de toda a igreja. Saúda-vos
Erasto, tesoureiro da cidade, e o irmão Quarto. [A graça de nosso Senhor Jesus
Cristo seja com todos vós. Amém]” (16.21-24).
O primeiro
nome da lista é Timóteo (16.21). Esse jovem foi um grande cooperador de Paulo.
Timóteo era de Listra. Tinha bom testemunho dos irmãos de sua cidade e de
Icônio (At 16.1,2). Era um homem singular, de caráter provado, que cuidava como
ninguém dos interesses de Cristo e da sua igreja (Fp 2.20-22). Timóteo era o
estimado cooperador de Paulo, seu filho na fé, seu companheiro de perigosas jornadas,
seu conforto em longos encarceramentos, seu enviado em missões espinhosas - um
homem que, como poucos outros, conhecia a plenitude e a alegria da estima e do
afeto do apóstolo.1237 Timóteo era o braço direito de Paulo, o homem que foi
preparado para ser o continuador de sua obra.
Paulo cita em seguida seus parentes Lúcio,
Jasom e Sosípatro (16.21). São nomes desconhecidos, mas destacados pelo
apóstolo por seu vínculo de parentesco, seja no sentido lato de nacionalidade,
seja no sentido restrito de consangüinidade. Lúcio pode ser o Lúcio de Cirene,
que era um dos profetas e mestres de Antioquia (At 13.1). Jasom pode ser o
Jasom que hospedou Paulo em Tessalônica e sofreu nas mãos da multidão
alvoroçada (At 17.5-9). Sosípatro pode ser o Sópatro de Bereia, que levou a
parte das ofertas levantadas naquela igreja para os pobres da Judeia (At 20.4).
Gaio pode ser um dos poucos crentes que Paulo batizou em Corinto (ICo
1.14).1238
Na ordem,
vem a saudação de Tércio, o amanuense desta epístola, à igreja de Roma (16.22).
Ao que parece, Paulo normalmente empregava amanuenses para redigir suas cartas,
mas este é o único cujo nome se nos tornou conhecido. Talvez fosse um amanuense
profissional, visto que Romanos é bem mais formal que a maior parte das
missivas paulinas.1239 O costume de Paulo utilizar amanuense é confirmado em
outras cartas (lCo 16.21; G16.11; Cl 4.18; 2Ts 3.17).
Em
continuação, Gaio, o hospedeiro de Paulo em Corinto (16.23), em cuja casa se
reunia uma igreja, também envia saudações à igreja de Roma.
Finalmente,
Erasto o tesoureiro da cidade, agora convertido a Cristo, endereça saudações à
igreja, sendo acompanhado pelo irmão Quarto (16.23). Este Erasto foi
identificado com o oficial civil de mesmo nome mencionado em inscrição latina
num bloco de mármore, de calçamento, descoberto em Corinto, em 1929, por
membros da Escola Norte-americana de Estudos Clássicos em Atenas.1240
William
Barclay tem razão quando diz que nessa lista de oito nomes há dois grandes sumários. Gaio é o
homem da hospitalidade; Quarto é, em uma palavra, o irmão. E uma grande coisa
entrar na História como o homem da casa aberta e o homem do coração fraternal.
Algum dia as pessoas nos definirão em uma frase. Qual será essa frase?
Uma doxologia singular (16.25-27)
Paulo
ensaiou encerrar esta carta várias vezes. Concluiu sua exposição doutrinária
com uma sublime doxologia (11.33-36). Depois invocou a bênção três vezes
(15.33; 16.20; 16.24) antes de encerrar com a doxologia final (16.2527). Essa
é a mais longa doxologia de Paulo usada em suas cartas. Charles Erdman tem
razão quando diz que Paulo nos legou outras grandiosas doxologias; contudo,
elas não estão lavradas na conclusão das epístolas, mas incrustadas no próprio
corpo da exposição. Esse magnífico jorro de louvor sintetiza os grandes
pensamentos da epístola e está em perfeita harmonia com o conteúdo geral da
carta.1242 Concordo com Leenhardt quando ele diz que a doxologia final de
Romanos se reveste de impressiva solenidade. Ela confirma a mensagem da
epístola, apresentando-a em síntese numa forma litúrgica.1243
Destacaremos
aqui quatro preciosas verdades.
Em primeiro
lugar, Paulo exalta Deus pelo seu poder.“Ora, àquele que é poderoso
para vos confirmar segundo o meu evangelho e a pregação de Jesus Cristo,
conforme a revelação do mistério guardado em silêncio nos tempos eternos”
(16.25). O Deus que elege, chama e justifica é poderoso para confirmar os
crentes. A segurança da salvação não se estriba no frágil fundamento da
confiança humana, mas na firme rocha da onipotência divina. John Stott
argumenta com exatidão: “Se o evangelho é o poder de Deus para salvar (1.16),
ele é também o poder de Deus para confirmar. O verbo grego sterizo, traduzido
como confirmar’, é quase um termo técnico cujo sentido é nutrir novos
convertidos e fortalecer igrejas jovens”.1244
Adolf Pohl
destaca o contraste entre a fragilidade da igreja e a onipotência divina, nas
seguintes palavras:
Como eram frágeis esses pequenos grupinhos de cristãos, que se
reuniam num lugar qualquer do gigantesco mar de casas de Roma. Faltava-lhes
todo status de reconhecimento social. No entanto, faltava-lhes também, como
evidencia, sobretudo, Romanos 14.15, a clareza doutrinária nas próprias fileiras,
de modo que a igreja corria perigo de se dividir. Acima de tudo acontecia em
Roma, como nas comunidades de todos os lugares e tempos, que força intelectuais
tentavam apagar novamente a fé (16.20). Em decorrência, a preocupação de firmar
na fé determina essa carta. Porém, contra a morte da igreja existe o poder de
Deus, o poder da ressurreição.1245
Em segundo
lugar, Paulo exalta Jesus Cristo como o conteúdo do evangelho. “[...] e a
pregação de Jesus Cristo, conforme a revelação do mistério guardado em silêncio
nos tempos eternos, e que, agora, se tornou manifesto e foi dado a conhecer...”
(16.25,26). O evangelho de Paulo tem como conteúdo a Pessoa e a obra de Jesus
Cristo. A oferta de Jesus Cristo como sacrifício perfeito e eficaz pelos
pecados de judeus e gentios, para formar a igreja, foi um mistério guardado em silêncio
nos tempos eternos. Recorro mais uma vez a John Stott para esclarecer esse
importante tema:
O segredo de Deus, antes oculto mas agora revelado, é
essencialmente o próprio Jesus Cristo em sua plenitude (Cl 2.2), e em
particular Cristo para os gentios e nos gentios (Cl 1.27), de forma que agora
os gentios têm a mesma participação que Israel na promessa de Deus (Ef 3.6-11).
O mistério inclui também boas-novas para os judeus e não só para os gentios, ou
seja: que um dia “todo o Israel será salvo” (11.2527). E vive na expectativa
da glória futura (lC o 2.7-9), quando Deus fará convergir em Cristo todas as
coisas (Ef 1.9,10). Assim, o mistério começa, continua e termina com Cristo.
Em terceiro
lugar, Paulo exalta as Escrituras como revelação de Deus. “[...] por
meio das Escrituras proféticas, segundo o mandamento do Deus eterno, para a
obediência por fé, entre todas as nações” (16.26). As Escrituras revelam a
Jesus Cristo, o conteúdo do evangelho de Paulo, enquanto a pregação de Jesus
Cristo, por intermédio das Escrituras é o meio de tornar esse mistério
conhecido aos homens em todo o mundo. O mistério que estivera oculto agora foi
revelado por meio da vida, morte, ressurreição e exaltação de Jesus. As
Escrituras proféticas não são uma invenção humana, mas o mandamento do Deus
eterno; seu propósito é despertar a obediência por fé entre todas as nações. A
evangelização precisa desembocar em transformação de vida. À conversão segue o
discipulado.
Em quarto
lugar,
Paulo exalta Deus por sua sabedoria.“Ao Deus único e sábio seja dada
glória, por meio de Jesus Cristo, pelo séculos dos séculos. Amém!” (16.27).
Paulo exalta a Deus, o Deus único e sábio, criador, sustentador, redentor e
galardoador. Deus é merecedor de toda a glória, pelos séculos dos séculos, pois
o glorioso evangelho apresentado nesta carta foi concebido por sua sabedoria e
por seu poder desde toda a eternidade. O mesmo Paulo que já prorrompera em
adoração e louvor: “O profundidade da riqueza, tanto da sabedoria, como do
conhecimento de Deus!” (11.33) volta a exaltar a Deus por sua sabedoria na
conclusão desta carta. Na verdade, o povo redimido de Deus passará a eternidade
atribuindo a ele “louvor, e a glória, e a sabedoria e as ações de graças, e a
honra, e o poder e a força” (Ap 7.12). Eles o adorarão por seu poder e
sabedoria manifestos na salvação.1247
Como ele fez
antes, ou seja, na conclusão da primeira parte desta carta (11.36), assim
também agora, no término da carta inteira, Paulo acrescenta a palavra de solene
e entusiástica afirmação e aprovação: Amém.1248
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