terça-feira, 21 de junho de 2016

LIÇÃO 13: O CULTIVO DAS RELAÇÕES INTERPESSOAIS


Capítulo 13 Memórias da Graça
                         Romanos 16.1,2 Recomendo-vos, pois, Febe, nossa irmã, a qual serve na igreja que está em Cencreia, para que a recebais no Senhor, como convém aos santos, e a ajudeis em qualquer coisa que de vós necessitar; porque tem hospedado a muitos, como também a mim mesmo.

Um Documento Preciosíssimo! “Recomendo-vos, pois, Febe, nossa irmã, a qual serve na igreja que está em Cencreia” (16.1).

Chegou o momento especial de Paulo terminar a carta e apresentar quem a levaria até Roma: uma cristã a quem Paulo chama apenas de Febe. Warren W. Wiersb e destaca que essa foi a encomenda mais preciosa que Febe teve a oportunidade de levar. Febe era de Cencreia, um porto de Corinto. Os intérpretes a creditam que Febe se converteu durante a estadia de Paulo em Corinto, que durou dezoito meses. Ela era uma pessoa de confiança e que ajudava na obra de Deus. Paulo diz que ela “ servia ” à igreja de Cencreia. 
A palavra grega para “ servir” é a tradução do grego diakonos, 
que tem o sentido de “ servir” .
 Febe auxiliava e ajudava a sustentar a obra ali.

“para que a recebais no Senhor, como convém aos santos, e a ajudeis em qualquer coisa que de vós necessitar ; porque tem hospedado a muitos, como também a mim mesmo” (16.2). Paulo destaca que Febe era uma “protetora” de muitos e também dele. O sentido aqui, como destacamos lexicógrafos, é de uma pessoa que não mede esforços para ajudar alguém . Febe, portanto, foi um apoio espiritual, moral e financeiro para o apóstolo em seu projeto missionário.
Estou convencido , e a prática pastoral me dá esse convencimento , de que muito mais poderia ser feito pela obra de Deus se muitas pessoas a quem Deus deu condições privilegiadas se dispusessem a ajudar. Todavia, o que se observa é que quem de fato mais ajuda a igreja são aqueles que pouco tem . São os aposentados, as pensionistas, o trabalhador braçal, etc. Não é a regra, mas há grandes empresários que não se envolvem com nada da igreja que demanda gastos. Ficam olhando de longe. Muitos nem dizimistas conseguem ser. Andam na contramão de Febe.

Romanos 16.3-16 
Saudai a Priscila e a Áquila, meus cooperadores em Cristo Jesus, os quais pela minha vida expuseram a sua cabeça; o que não só eu lhes agradeço, mas também todas as igrejas dos gentios. Saudai também a igreja que está em sua casa. Saudai a Epêneto, meu amado, que é as primícias da Ásia em Cristo. Saudai a Maria, que trabalhou muito por nós. Saudai a Andrônico e a Júnia, meus parentes e meus companheiros na prisão, os quais se distinguiram entre os apóstolos e que foram antes de mim em Cristo. Saudai a Amplíato, meu amado no Senhor. Saudai a Urbano, nosso cooperador em Cristo, e a Estáquis, meu amado. Saudai a Apeles, aprovado em Cristo. Saudai aos da família de A ristóbulo. Saudai a Herodião, meu parente. Saudai aos da família de Narciso, os que estão no Senhor. Saudai a Trifena e a Trifosa, as quais trabalham no Senhor. Saudai à amada Pérside, a qual muito trabalhou no Senhor. Saudai a Rufo, eleito no Senhor, e a sua mãe e minha. Saudai a Asíncrito, a Flegonte, a Hermas, a Pátrobas, a Hermes, e aos irmãos que estão com eles. Saudai a Filólogo e a Júlia, a Nereu e a sua irmã, e a Olimpas, e a todos os santos que com eles estão. Saudai-vos uns aos outros com santo ósculo. As igrejas de Cristo vos saúdam. Uma Igreja sem Estrelas “Saudai... ” (16.3).

O apóstolo estava chegando ao final de sua carta. A saudade batia no peito. Chegara o momento de enviar congratulações às pessoas que ele tanto estimava. Eram todas pessoas queridas, do convívio apostólico, e isso ele demonstra quando lembra nominalmente de cada um . Eugene Peterson diz que nunca quis pastorear uma igreja que tivesse mais do que trezentos membros porque isso o impossibilitaria de conhecer todos os membros. Ele gosta de conhecer as ovelhas e chamá-las pelo nome. Vemos esse mesmo princípio aplicado na vida de Paulo.

 Como todas essas pessoas que Paulo conhecia estariam naquele momento em Roma? É uma pergunta que tem intrigado os comentaristas. Todavia, deve ser levado em conta que Roma era a capital do império e para lá concorria gente do mundo todo, inclusive os cristãos. O edito do imperador que mandava expulsar todos os judeus de Roma havia sido revogado e isso permitiu o retorno de muitos cristãos de origem judaica à capital do império.

O apóstolo já havia dito na introdução de sua carta que “ em todo o mundo é anunciada a vossa fé” (Rm1.8). A igreja de Roma se torna uma igreja relevante, visível para o mundo. Na sua pregação havia eco. Era uma igreja formada por judeus e gentios, a grande maioria gentios. Havia pessoas das classes sociais mais altas, mas a grande maioria eram pessoas simples. Não havia estrelas, mas cristãos dispostos a se tornar mártires. Paulo lembra o nome de umas 26 pessoas, a grande maioria permaneceu no anonimato. Era nessa igreja, formada em sua maior parte por anônimos, que Paulo viu uma oportunidade de estabelecer ali uma base missionária. Na nossa cultura personalista, onde se cultua a imagem , é bem difícil encontrar espaço para os anônimos. Todavia, eles existem e estão fazendo muito pelo Reino de Deus. Nessa palavra de saudação, o apóstolo tira alguns deles do anonimato, mas muitos outros continuaram lá. Não há dúvidas de que a obra de Deus é feita na sua grande maioria por cristãos que não têm o seu nome exposto. São anônimos que estão construindo a história do Reino de Deus.

Como não me lembrar de Antonio de Pádua Mendes Ferro Gomes? Um homem que não tem seu nome exposto na literatura, mas que causou um enorme impacto nos primeiros anos da minha via espiritual. Foi ele que há mais de trinta anos me introduziu na leitura da Bíblia, da literatura evangélica e na oração. Causou um im p acto trem e n d o em m in h a v id a espiritual. Como esquecer os jejuns, acompanhados da leitura do livro de Provérbios, que fazíamos no sítio de sua avó? Jamais vou me esquecer do seu zelo evangelístico que o levava a pregar nas praças e se jogar de corpo e alma no evangelismo pessoal. Devo muito a esse homem de Deus. Sem dúvida, ele também faz parte desse livro e de todos os outros que escrevi. E com esse sentimento de saudade que Paulo envia suas últimas saudações e recomendações.

 “...a Priscila e a Aquila, meus cooperadores em Cristo Jesus, os quais pela minha vida expuseram a sua cabeça; o que não só eu lhes agradeço, mas também todas as igrejas dos gentios” (16.3,4). O apóstolo lembra primeiramente de velhos cooperadores — Priscila e Áquila. Eles haviam trabalhado com Paulo em Corinto (At 18 .1-3 ,18 ,19 ,26 ). Agora estavam em Roma. Paulo tem uma dívida de gratidão com esse casal porque eles arriscaram a vida pelo apóstolo. É interessante notar que o nome Priscila aparece sempre em primeiro lugar quando o casal é citado. Os intérpretes acreditam que ela era a pessoa que mais se destacava. Quem não conhece um casal em que a mulher se destaca mais do que o homem ? Eu poderia citar muitos casos. Paulo reconhece que tem uma dívida com esse casal — eles haviam arriscado a vida por ele (v. 5). Como naqueles dias as igrejas eram  domésticas, esse casal hospedava uma parte da igreja na casa deles.1

“... Saudai a Epêneto, meu amado, que é as primícias da Asia em Cristo. Saudai a Maria, que trabalhou muito por nós. Saudai aAndrônico e a Júnia, meus parentes e meus companheiros na prisão, os quais se distinguiram entre os apóstolos e que foram antes de mim em Cristo” (16.5,6,7). Ao lado das saudações, o apóstolo sempre põe em destaque o que o fazia lembrar-se desses irmãos. Um deles fora as primícias do seu labor missionário ; outras trabalharam muito pela igreja, enquanto outros se tornaram notáveis entre os apóstolos. Outros haviam se convertido antes de Paulo. Isso deveria servir de exemplo para muitos novatos que querem desprezar o legado deixado pelos mais velhos. Não adianta querer passar por cima da história quando se deu apenas os primeiros passos. É preciso aprender com a história.
Todos esses fatos narrados marcaram a memória do apóstolo . Elês também nos marcam . Um nom e aqui se destacados demais, Maria , a quem Paulo acrescenta que “muito trabalhou ” pela igreja . Expressão “ trabalhou muito ” traduz o termo grego kopiao, que tem o sentido de “esforçar-se” , “ trabalhar duramente” . O sentido no grego é que ela se sacrificou, derramou muito suor, gastou tudo o que tinha para que pudesse ajudar seus irmãos na fé. E o fato é que se tratava de uma mulher. Isso mostra como nas Escrituras as mulheres têm um papel de destaque. Infelizmente , hoje queremos um cristianismo sem custo , sem gasto e sem esforço. Talvez seja por isso que a fé tenha perdido aquele poder de contagiar como fazia antes.

“Saudai aAmplíato, meu amado no Senhor. Saudai a Urbano, nosso cooperador em Cristo, e a Estáquis, meu amado. Saudai a Apeles, aprovado em Cristo. Saudai aos da família de Aristóbulo. Saudai a Herodião, meu parente. Saudai aos da família de Narciso, os que estão no Senhor” (16.8-
11). Algumas palavras usadas aqui pelo apóstolo se destacam : “amigo ” (v.8, ARA ); “amado ” (v.9) e “aprovado ” (v. 10). Essas palavras mostram o grau de comunhão que havia na Igreja Primitiva. Eles eram amigos, amados e aprovados.
No livro de minha autoria As Ovelhas Também Gemem, escrevi sobre a necessidade da koinonia cristã. Sem dúvida, uma das doutrinas mais exaltadas nas páginas da Bíblia é a da unidade cristã. A falta de unidade foi uma das principais razões que levou o apóstolo Paulo a escrever a sua Primeira Carta aos Corintos. Escrevendo àquela igreja ele disse estar informado de que havia contendas entre eles (1 Co 1.11). A os efésios, o mesmo apóstolo aconselhou a que se esforçassem diligentemente para “guardar a unidade do Espírito ” (Ef 4.3 ); a dois crentes filipenses o apóstolo dos gentios recomendou: “pensem concordemente, no Senhor” (Fp 4.2 , ARA ). E inegável o valor da unidade cristã. Aunidade traz a comunhão. E bom lembrar que um dos segredos do grande e explosivo crescimento da Igreja Primitiva era justamente a comunhão existente entre os crentes. No livro da história da igreja, Atos dos Apóstolos, lemos: “E perseveravam na doutrina dos apóstolos, e na comunhão , e no partir do pão , e nas orações” (At 2 .42 ). A palavra “comunhão ” traduz o termo grego koinonia. W.E. Vine observa que a koinonia é “um ter em comum , companheirismo , comunhão ” e denota “a parte que um tem em qualquer coisa, uma participação , um companheirismo reconhecido , e se usa das experiências e interesses comuns dos cristãos” .2 É oportuno observarmos o uso desse termo na literatura grega , incluindo o Novo Testamento . William Barclay nos dá uma excelente visão panorâmica desse termo na literatura grega, incluindo o Novo Testamento : 123456

1. N a vida cristã há um a koinonia que significa um “compartilhar de amizade”
e um a permanência no convívio dos outros (At 2.42; 2 Co 6.14).

 2. Na vida cristã há uma koinonia que significa uma “divisão prática” com os que são menos 
afortunados. A comunhão cristã é uma coisa prática (Rm 15.26; 2 Co 8.4; 9.13).

3. Na vida cristã há uma koinonia que é uma “cooperação na obra de Cristo ” (Fp 1.5).

4. Na vida cristã há um a koinonia “na fé”. O cristão nunca é um a unidade isolada; é membro de um convívio da fé (Ef 3.9).

 5. Na vida cristã há uma “ comunhão (koinonia) no Espírito ” (2 Co 13.14; Fp 2.1).

6. Na vida cristã há um a koinonia “com Cristo”. Os cristãos são chamados para a koinonia de Jesus Cristo , o Filho de Deus (1 Co 1.9).

7. Na vida cristã há a koinonia “com Deus ” (1 Jo 1.3). Mas deve ser notado que aquela comunhão tem condições éticas, porque não é para aqueles que escolher amandar nas trevas (1Jo 1.6). A koinonia cristã é aquele vínculo que liga os cristãos aos outros, a Cristo e a Deus.

3 Princípios Bíblicos para um Bom Relacionamento
Seguem alguns princípios bíblicos que extraí do livro de Provérbios, que nos ajudarão a nos relacionar bem uns com os outros:

1. Saiba ouvir (Pv 18.13). Um dos grandes problemas em nos relacionar bem uns com os outros surge por conta da nossa falha em ouvir. Ouvimos, mas ouvimos mal. Ou ainda: ouvimos mais do que foi dito. Precisamos aprender a ouvir.

2. Não se apresse para falar (Pv 19.2; 17.28). A precipitação em falar é outro grande problema. Jesus mesmo condenou o juízo temerário . Isto é, falar apressadamente sem um conhecimento total dos fatos.

3. Fale pouco (Pv 10.19; 13.3; 12.18). Aqui talvez esteja um dos maiores fatores de desajuste nos relacionamentos. É um comentário inoportuno que fazemos. Uma palavra a mais, que aparentemente não tem a intenção de ofender, mas que vem sublimada.

4. Fale coisas boas das pessoas (Pv 16.24; 16.28; 20.19). A tendência de só enxergar coisas ruins nos outros é uma herança da nossa velha natureza adâmica. Dificilmente falam os de alguém para exaltar suas virtudes. Necessitamos enxergar algo de bom no nosso semelhante se queremos nos relacionar bem .

5. Não atice (fomente) conversas (Pv 30.33; 26.20,21). A credito que se não passássemos à frente as fofocas que chegam até nós muitas intrigas seriam evitadas.

6. Fale pouco de si mesmo (Pv 27.2).
A atitude de falar de si mesmo , além de revelar um complexo de inferioridade, acaba também por arranhar os relacionamentos. Isso por um a razão simples: é difícil louvar a si mesmo sem diminuir o outro.4

Romanos 16.17-20

 E rogo-vos, irmãos, que noteis os que promovem dissensões e escândalos contra a doutrina que aprendestes; desviai-vos deles. Porque os tais não servem a nosso Senhor Jesus Cristo, mas ao seu ventre; e, com suaves palavras e lisonjas, enganam o coração dos símplices. Quanto à vossa obediência, é ela conhecida de todos. Comprazo-me, pois, em vós; e quero que sejais sábios no bem, mas símplices no mal. E o Deus de paz esmagará em breve Satanás debaixo dos vossos pés. A graça de nosso Senhor Jesus Cristo seja convosco. Amém!

Uma Palavra de Advertência “E rogo-vos, irmãos, que noteis os que promovem dissensões e escândalos contra a doutrina que aprendestes; desviai-vos deles” (16.17). O s versículos 17 a 20 aparecem com o um a intersecção entre os versículos 16 e 21. No meio das saudações, o apóstolo lembrou que havia aqueles que trabalhavam contra a unidade da igreja. Era preciso alertar a igreja de Roma nesse ponto. Depois ele voltaria às saudações. Esses “ cristãos” eram agentes de Satanás e trabalhavam contra a paz na igreja (v. 20). Eram agentes semeadores de contendas; por isso, a melhor forma de neutralizar suas ações era afastar-se deles. Muitos intérpretes acreditam que o fermento gnóstico está presente na ação dessas pessoas, pois a forma escandalosa como se portavam é aqui denunciada por Paulo. O que eles faziam estava em desacordo como ensino que os crentes romanos haviam recebido. A igreja possui uma padronização, e os seus membros precisam se ajustar a ela.

Romanos 16.21-23
 Saudação da minha própria mão, de Paulo. Se alguém não ama o Senhor Jesus Cristo, seja anátema; maranata! A graça do Senhor Jesus Cristo seja convosco.
Lembrança dos Amigos

 O expositor Warren W Wiersbe comenta com maestria essa porção das Escrituras: “ Que lista de heróis! Timóteo é men cio n ad o co m frequência no livro de Atos e nas Epístolas. Era um dos ‘filhos na fé ’ de Paulo e trabalhou com o apóstolo em vários lugares difíceis (ver Fp 2.19-24). Lúcio era um compatriota judeu, como também o eram Jasom e Sosípatro. Não há evidência algum a de que foi esse mesmo Jasom que protegeu Paulo em Tessalônica (At17.19). E bem provável que esse Jasom fosse um gentio. Tércio foi o secretário que escreveu a carta enquanto Paulo a ditava. Gaio foi o homem que abriu a casa para hospedar Paulo, enquanto o apóstolo estava em Corinto . 1 Corintios 1 .14 relata como Paulo ganhou Gaio para Cristo e o batizou quando fundou a igreja de Corinto. Tudo indica que havia uma congregação de cristãos se reunindo na casa dele. Erasto ocupava um cargo importante na cidade, provavelmente de tesoureiro . O evangelho alcançou tanto os mais altos escalões de Corinto quanto o povo mais humilde (1 Co 1.26-31; 6.9 -11)” .

 Romanos 16.24-27 A graça de nosso Senhor Jesus Cristo seja com todos vós. Amém! Ora, àquele que é poderoso para vos confirmar segundo o meu evangelho e a pregação de Jesus Cristo, conforme a revelação do mistério que desde tempos eternos esteve oculto, mas que se manifestou agora e se notificou pelas Escrituras dos profetas, segundo o mandamento do Deus eterno, a todas as nações para obediência da fé, ao único Deus, sábio, seja dada glória por Jesus Cristo para todo o sempre. Amém!
Graça para todos

 “Ora, àquele que é poderoso para vos confirmar segundo 0 meu evangelho e a pregação de Jesus Cristo, conforme a revelação do mistério que desde tempos eternos esteve oculto” (16.25). Não havia um a maneia mais adequada de terminar essa magistral carta senão comum profundo sentimento de gratidão a Deus. Foi ele quem revelou os mistérios ocultos noutros tempos e que agora se tornaram manifestos por meio de Jesus Cristo , nosso Senhor. Paulo já havia dito em Romanos 11.36 que “Porque dele, e por ele, e para ele são todas as coisas; glória, pois, a ele eternamente. Amém !” . A esse Deus, eternamente sábio, que nos justificou pela sua infinita graça, pertence toda honra e glória pelos séculos dos séculos. Amém !
Maravilhosa Graça
O CULTIVO DAS RELAÇÕES INTERPESSOAIS

A importância dos relacionamentos na igreja
(Rm 16.1-27

Hernandes D. Lopes

A carta de Paulo aos Romanos é singular não apenas quanto ao seu conteúdo, mas também quanto à sua conclusão. Aqui está a mais longa lista de saudações feita pelo apóstolo. A primeira vista este capítulo parece árido e somos inclinados a subestimar o valor de seus ensinos. Entretanto, no epílogo desta missiva, Paulo enfileira grandes verdades e preciosos ensinamentos acerca dos relacionamentos pessoais de amor na igreja. Para usar uma conhecida expressão de Crisóstomo, devemos aproximar-nos dessa introdução como garimpeiros à cata de grandes tesouros.
Romanos 16 pode ser dividido em cinco pontos: recomendação, saudação paternal, exortação, saudação fraternal e adoração doxológica. Warren Wiersbe sintetiza-os em três verdades preciosas: alguns amigos para saudar (16.1-16), alguns inimigos a evitar (16.17-20) e alguns servos a honrar (16.21-27).1195

Uma recomendação pastoral (16.1,2)

O apóstolo escreve: “Recomendo-vos a nossa irmã Febe, que está servindo à igreja de Cencreia, para que a recebais no Senhor como convém aos santos e a ajudeis em tudo que de vós vier a precisar; porque tem sido protetora de muitos e de mim inclusive” (16.1,2). As cartas de recomendação eram comuns e necessárias naquele tempo (At 18.27; 2Co 3.1), uma vez que os crentes precisavam contar com a hospitalidade dos irmãos quando viajavam de uma cidade para outra. Igualmente, eram necessárias para proteger as pessoas de charlatães.1196 John Murray diz que Febe era uma mulher que realizara eminentes serviços à igreja, e a recomendação tinha de ser proporcional a seu caráter e devoção.

Uma carta de apresentação daria à Febe o acesso à igreja de Roma. Ela era membro da igreja de Cencreia, onde se localizava o porto de Corinto, quinze quilômetros a leste da cidade (At 18.18). A igreja de Cencreia talvez fosse filha da igreja metropolitana de Corinto.
O nome próprio Febe significa radiante ou brilhante, título do deus Apoio, e isto pode indicar os antecedentes gentílicos dessa cristã.1198 William Hendriksen é da opinião de que o nome Febe deriva da mitologia pagã, sendo outra palavra para Artemis, a brilhante e radiante deusa lua, identificada com Diana, deusa romana."99 Febe estava viajando de Cencreia a Roma e possivelmente foi a portadora dessa carta aos Romanos.
Paulo ensina aqui algumas lições:

Em primeiro lugar, o importante papel da mulher na igreja(16.1,2). Febe era uma servidora da igreja de Cencreia. A palavra grega diakonon, usada pelo apóstolo para descrever Febe, é o feminino do termo diaconos, “diácono”. Embora muitos comentaristas, como F. F. Bruce, John Stott, Dale Moody, Warren Wiersbe, Franz Leenhardt, Charles Hogde, C. H. Lenski, C. E. B. Cranfield a considerem diaconisa, concordo com Charles Erdman em que o simples uso do termo não significa que Febe tivesse esse ofício. O termo pode denotar simplesmente o exercício da caridade e da hospitalidade que deveriam caracterizar a vida de todo verdadeiro crente e que Febe parecia manifestar em assinalado grau.1200

Mesmo que as opiniões sobre esse assunto sejam divididas, creio que William Hendriksen tem razão quando declara não haver nenhuma menção do diaconato feminino no restante do Novo Testamento.1201 Por conseguinte, o que se enfatiza nesta epístola é a importância de Febe para a igreja como servidora e protetora de muitos, inclusive do próprio apóstolo Paulo. A lição clara é que se deve evitar dois extremos: 1) o de ordenar mulheres para um ofício eclesiástico quando não há nas Escrituras autorização para fazê-lo; 2) o de ignorar os importantíssimos e valiosos serviços que mulheres devotas e alertas são capazes de prestar à igreja de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo.1202

Em segundo lugar, o importante papel do cuidado mútuo na igreja (16.2). Febe era protetora de muitos e inclusive do apóstolo Paulo. A palavra grega prostatis significa “ajudadora, patronesse, benfeitora”, ou seja, prostatis era um representante legal e um protetor rico.1203 Leenhardt diz que prostatis designava o representante legal e protetor dos estrangeiros, uma vez que eles eram privados de garantias jurídicas.1204 Charles Erdman acrescenta que essa palavra tem também o sentido de patrocinadora.120,5 Isso demonstra que Febe era uma mulher de posses que usava a sua riqueza para apoiar a igreja e também o apóstolo.1206
Febe usou seus recursos não apenas para seu deleite e conforto, mas para sustentar e socorrer muitos irmãos. Era uma mulher altruísta, abnegada, desapegada das coisas materiais e apegada às pessoas. Sua vida, sua casa e seus bens estavam a serviço da igreja. Ela não se blindou para viver confortavelmente num castelo seguro em meio às tempestades da vida, mas serviu de porto seguro para muitos que estavam sendo batidos pelos vendavais furiosos das circunstâncias adversas. De acordo com Adolf Pohl, Febe trabalhava no vasto campo da assistência e do cuidado de necessitados.

Em terceiro lugar, o importante papel da recepção calorosa na igreja (16.2). A igreja de Roma deveria receber Febe no Senhor como um membro da família de Deus e ajudá-la em tudo aquilo de que precisasse. A palavra grega parasthete,traduzida como “ajudar”, significa auxiliar, assistir, ficar atrás a fim de empurrar, de sustentar alguém.1208 Chegara o momento de Febe colher os frutos de sua semeadura. Ela havia cuidado de muitos e agora deveria ser alvo do cuidado da igreja de Roma. A igreja é a comunidade da ajuda mutua.

 Uma saudação paternal (16.3-16)

Paulo passa da recomendação às saudações. Elenca 26 nomes, acrescentando na maioria dos casos uma apreciação pessoal e uma palavra de elogio. O apóstolo é um mestre de relacionamentos humanos. E um pastor experiente e sabe o valor de tratar as pessoas pelo nome e de fazer-lhes elogios encorajadores. Concordo com Charles Erdman quando ele diz que essa lista de nomes obscuros é de grande valor e verdadeira significação. Tais saudações revelam o coração de Paulo a patentear terna afeição, apreciação à bondade, afetuosa simpatia e o alto conceito em que tinha as amizades humanas. Dão-nos instrutivos relances da vida da igreja primitiva, capacitando-nos a ter ideia da íntima união, dos heroicos sofrimentos, das generosas simpatias, da pureza, da consagração, da fé, da esperança e do amor então reinantes.

Alguns estudiosos atribuem essa longa saudação à igreja de Éfeso, e não à igreja de Roma,1210 argumentando que Paulo não conhecia pessoalmente a última e seria improvável que tivesse tantos amigos lá. Além disso, Paulo faz referência a Priscila e Aquila, proeminente casal que fora expulso de Roma pelo edito de Cláudio em 49 d.C. (At 18.2) e servira a Cristo na cidade de Corinto, onde Paulo os acompanhara (At 18.1-3). Depois viajaram juntos para Éfeso (At 18.18,19; ICo 16.10), e deve ter sido ali que o casal arriscou a vida por ele (16.4). Além do mais, Paulo envia saudações a Epêneto (16.5), primeiro convertido da Ásia, sendo Éfeso a capital da Ásia Menor. Concordo, entretanto, com William Barclay quando ele diz que, se Paulo tivesse enviado saudações a tanta gente para uma igreja conhecida como Éfeso, teria provocado ciúmes nos demais membros, mas para uma igreja que ainda não havia visitado, como a de Roma, essa longa lista era um expediente sábio para criar a maior rede possível de

Outro argumento consistente para provar que essa saudação foi realmente dirigida aos crentes de Roma, e não aos membros da igreja de Éfeso, é que Roma era a capital do império, a maior e mais cosmopolita cidade da época, com mais de um milhão de habitantes, e todos os caminhos levavam a Roma.1212 A essa magnífica cidade todos os dias afluíam pessoas em busca de novas oportunidades. Havia naquele tempo grande mobilidade e era natural que muitos crentes convertidos em igrejas que Paulo fundara agora estivessem residindo em Roma. Concordo com John Stott quando ele diz não ser nada improvável que, após a morte de Cláudio em 54 d.C., Priscila e Áquila tenham retornado a Roma, onde teriam recebido essa saudação de Paulo.1213
Destacamos aqui algumas preciosas lições:

Em primeiro lugar, os crentes fazem parte da fam ília de Deus. A família de Deus tem duas marcas distintas — unidade e diversidade -, como destaca.1214 Com respeito à diversidade, podemos notar que na lista de Paulo há homens e mulheres, escravos e livres, pobres e ricos, gentios e judeus, mas todos estão em Cristo, e é essa união com Cristo que fornece a base para a unidade da igreja.A diversidade da igreja pode ser notada pelo gênero, classe social e raça. Na igreja de Roma havia homens e mulheres servindo a Deus. Dentre as 26 pessoas saudadas na carta de Paulo, nove são mulheres. Na igreja de Roma pobres e ricos, escravos e livres estavam juntos nesse labor. Na igreja de Roma judeus e gentios faziam parte da mesma família. Na igreja de Deus há unidade na diversidade.

Os comentaristas acham muito provável que o Aristóbulo mencionado aqui (16.10) seja um neto de Herodes, o Grande, e amigo do imperador Cláudio, e que Narciso (16.11) seja ninguém menos que o conhecidíssimo, rico e poderoso liberto que exerceu grande influência em Cláudio.1215 Havia pessoas da corte imperial convertidas a Cristo na igreja de Roma (Fp 4.22). No que concerne à unidade, precisamos salientar que ela não é feita pelo homem, mas por Deus. Não criamos a unidade da igreja; ela existe. Ao descrever seus amigos, Paulo destaca quatro vezes que eles estão em Cristo (16.3,7,9,10) e cinco vezes que estão no Senhor (16.8,11,12,13). Por duas vezes ele usa uma linguagem de conotação familiar, referindo-se a “irmã” (16.1) e “irmãos” (16.14).1216

Em segundo lugar, os crentes devem ter mãos dispostas
para o trabalho de Deus (16.3,6,9,12). Priscila e Aquila eram cooperadores de Paulo (16.3), assim como Urbano (16.9). Maria muito trabalhou pela igreja de Roma (16.6). Trifena e Trifosa trabalhavam no Senhor (16.12). Os verbos “cooperar” e “trabalhar” destacam que essas pessoas tinham as mãos dispostas para o trabalho de Deus.

Em terceiro lugar, os crentes devem ter a casa aberta para a igreja de Deus (16.5). Paulo saúda os líderes dos cinco grupos em cujas casas a igreja se reunia para a adoração (16.5,10,11,14,15). Em destaque está o casal Priscila e Aquila. Eles tinham vocação missionária. Eram fabricadores de tendas e deixaram Roma para habitar em Corinto, depois em Éfeso e agora estavam de volta a Roma. O edito de Cláudio, pelo qual os judeus haviam sido expulsos, deixara de vigorar, e Priscila e Aquila não hesitaram, como muitos outros judeus, em voltar ao seu antigo lar e a seus antigos negócios. E, uma vez mais descobrimos que eles são exatamente os mesmos: outra vez há uma igreja, um grupo de cristãos que se reúnem em seu lar (16.5). Em outra ocasião, pela última vez, eles estão novamente em Éfeso (2Tm 4.19).121 Priscila e Aquila era um casal nômade, dois missionários itinerantes. Em todas as cidades por onde passaram — Roma, Corinto, Éfeso, novamente Roma e outra vez Éfeso —, eles abriram as portas da sua casa para a igreja de Deus. Naquele tempo, não havia templos, e as igrejas se reuniam nas casas. A casa desse casal era uma igreja na qual os crentes se reuniam para adorar a Deus e proclamar sua Palavra.

Em quarto lugar, os crentes devem ter o coração abertopara os filhos de Deus (16.4,7,13). Priscila e Áquila não apenas abriram a casa para abrigar a igreja de Deus, mas também estavam dispostos a correr riscos pelos filhos de Deus. Arriscaram a vida para salvar o apóstolo Paulo. A palavra grega upethekan significa colocar-se sob o machado do executor, sob a lâmina do carrasco e arriscar a vida em prol de outras pessoas.1218 Possivelmente isso aconteceu em Éfeso, onde Paulo enfrentou lutas maiores que suas forças a ponto de desesperar-se da própria vida (2Co 1.8). O casal Andrônico e Júnias esteve com Paulo na prisão (16.7) e compartilhou de seus sofrimentos.

Em quinto lugar, os crentes devem ter lábios abertos para expressar amor aos filhos de Deus (16.5,7,8,9,10,12,13). Paulo era pródigo nos elogios. Acerca de Epêneto, diz que era seu querido. Ressalta que Andrônico e Júnias eram notáveis entre os apóstolos. Destaca que Amplíato era seu dileto amigo. Chama Estáquis de amado. Afirma que Apeles é aprovado em Cristo. Destaca que estima Pérside. Informa que Rufo é eleito no Senhor e destaca que sua mãe também foi mãe para ele. O elogio sincero tem grande valor nos relacionamentos humanos. Paulo sabia disso e não hesitava em usar esse importante recurso.

Em sexto lugar, os crentes devem ser zelosos no serviço,mesmo que no anonimato (16.13-15). Na família de Deus há muitos heróis anônimos. Há muitos santos cujos nomes não são destacados na terra, mas são eminentes no céu. Rufo era possivelmente, filho de Simão Cirineu, o homem que carregou a cruz de Cristo (Mc 15.21). Sua mãe, embora não mencionada pelo nome, foi como uma mãe para o apóstolo Paulo. Que progenitores tinha Rufo! Um pai que carregara a cruz do Salvador, e uma mãe que “adotara” o seu maior apóstolo.1219 O apóstolo saúda muitos irmãos e muitos santos sem declinar seus nomes, gente desconhecida na terra, mas cujos nomes estão arrolados no céu.

Em sétimo lugar, os crentes devem ser afetuosos em seus relacionamentos interpessoais (16.16). Na igreja primitiva, o ósculo santo era a forma afetuosa e calorosa de cumprimento e demonstração de amizade, especialmente antes da celebração da Ceia. Concordo, entretanto, com Calvino quando ele diz: “Não me parece que Paulo exija a observância desta cerimônia, senão que exorta a prática do amor fraternal para que se diferencie das amizades profanas do mundo”.122(1 Em nossa cultura o aperto de mão e o abraço são emblemas de efusividade no trato uns com os outros. Mesmo que o gesto seja cultural, o princípio permanece. Devemos ser atenciosos e calorosos em nossos relacionamentos interpessoais.

William Hendriksen aponta três conjuntos de passagens nas quais o Novo Testamento faz referência ao beijo.1221

a. Lucas 7.36-50, onde Jesus diz a seu hospedeiro, Simão, o fariseu: Você não me saudou com um beijo, mas esta mulher, desde que entrei aqui, não parou de beijar meus pés (Lc 7.45). Eis a lição: não só deve haver afeição, mas esta tem de ser expressa. E preciso haver um sinal de afeição, por exemplo, o ósculo.

b. Lucas 22.47,48. Jesus perguntou ajudas: E com um beijo que você trai o Filho do homem? O amor deve não apenas ser expresso, mas tem de ser real. O ósculo precisa

c. O ósculo trocado entre os membros da comunidade cristã, a igreja. Este é o ósculo referido em Romanos 16.16 e em ICoríntios 16.20 e 2Coríntios 13.12. Não só teria de ser um ósculo e um símbolo de afeição genuína, mas também deveria ser santo. Em outros termos, jamais poderia implicar menos de três partes: Deus e as duas pessoas que se osculam reciprocamente. O ósculo santo assim simboliza o amor de Cristo mutuamente compartilhado.

Uma exortação apostolar (16.17-20)

Paulo teve dificuldade em concluir a epístola aos Romanos. Mesmo após ter enviado suas saudações, antes de terminar ele faz uma última advertência aos cristãos de Roma.'222 O apóstolo passa da saudação a alguns crentes da igreja de Roma à exortação à igreja de Roma. Destacamos aqui alguns pontos:

Em primeiro lugar, os crentes precisam ter discernimento espiritual. “Rogo-vos, irmãos, que noteis bem aqueles que provocam divisões e escândalos, em desacordo com a doutrina que aprendestes; afastai-vos deles” (16.17). Ela via falsos mestres infiltrando-se na igreja de Roma com o propósito de provocar divisões e escândalos em desacordo com a doutrina. Quem eram esses falsos mestres? Em parte alguma o apóstolo diz ou insinua que esses perturbadores fossem membros da igreja romana. Provavelmente eram intrusos, propagandistas itinerantes de erro. William Hendriksen diz que não é necessário crer que fossem todos de uma só classe. Alguns poderiam ser judaizantes legalistas; outros, antinomianos libertinos ou talvez ascetas; ou ainda defensores de uma combinação de dois ou mais ismos destrutivos.'223 Calvino destaca o fato de que Paulo não condena todas as dissensões indiscriminadamente, senão aquelas que destroçam a harmonia e o assentimento da fé verdadeira.

Paulo diz que os crentes de Roma precisam fazer duas coisas: 1) notar bem esses falsos mestres, que são lobos querendo entrar no meio do rebanho (At 20.29,30); 2) segundo, afastar-se deles. Nós também devemos aproximar-nos dos irmãos e afastar-nos dos falsos mestres. Devemos fazer uma caminhada na direção da comunhão fraternal e uma caminhada de distanciamento daqueles que provocam divisões e escândalos na igreja. Geoffrey Wilson está correto quando diz que a verdadeira doutrina é uma; as divisões do erro são muitas! Os crentes devem afastar-se de tais homens, evitá-los como a uma praga. Devemos esquivar-nos daqueles que quebram a verdadeira unidade da igreja enquanto buscam uma falsa unidade.1225

Em segundo lugar, os falsos mestres escondem o veneno do engano sob o manto da simpatia. “Porque esses tais não servem a Cristo, nosso Senhor, e sim a seu próprio ventre;e, com suaves palavras e lisonjas, enganam o coração dos incautos” (16.18). Os falsos mestres não servem a Cristo, mas a si próprios. Em vez de serem servos de Cristo, são escravos de seus próprios apetites e interesses egoístas. O deus deles é o ventre. Eles fazem da igreja uma plataforma para se locupletarem. Buscam o lucro, e não a salvação dos perdidos. Erguem monumentos a si mesmos em vez de buscar a glória de Cristo. A língua deles é cheia de lisonjas. Suas palavras são doces e suaves, mas carregadas de veneno. Eles são amáveis em seus gestos e sempre agradáveis em suas atitudes, mas seu propósito é enganar o coração dos incautos.

 A palavra grega crestologia, traduzida por “palavras suaves”, ajuda-nos a entender o caráter desses falsos mestres. Os próprios gregos definiam crestólogo como a pessoa que fala bem e atua mal. E aquela classe de pessoas que, por trás da fachada de palavras piedosas e religiosas, exercem má influência; a pessoa que desencaminha os outros náo por um ataque direto, mas sutilmente; a pessoa que finge servir a Cristo, mas na realidade está destruindo a fé.1226
Em terceiro lugar, a obediência e a maturidade espiritual devem ser as marcas do crente. “Pois a vossa obediência é conhecida por todos; por isso, me alegro a vosso respeito; e quero que sejais sábios para o bem e símplices para o mal”(16.19). Paulo elogia a obediência da igreja de Roma e exorta os crentes a serem sábios para o bem e símplices para o mal. A palavra grega akeraios, traduzida por “símplices”, era aplicada ao metal sem impurezas e também ao vinho e ao leite sem adição de água.1227 Os crentes devem ser prudentes como a serpente e símplices como as pombas. Devem ser meninos no juízo e crianças na malícia (ICo 14.20).
Concordo com John Stott quando ele diz que temos aqui três valiosos testes com os quais avaliar os diferentes sistemas de doutrina e ética: o teste bíblico, o cristológico e o moral. Esses testes podem ser expressos em forma de perguntas, diante de qualquer tipo de ensino que nos apareça pela frente: E um ensino que concorda com as Escrituras? para a glória do Senhor Jesus Cristo? Promove o bem?1228

Em quarto lugar, os crentes devem compreender a vitória que têm em Cristo. “E o Deus da paz, em breve, esmagará debaixo dos vossos pés a Satanás. A graça de nosso Senhor Jesus seja convosco” (16.20). Por trás da atuação dos falsos mestres, Paulo detecta a estratégia de Satanás, o pai da mentira (Gn 3.5), a quem Deus em breve esmagará sob os pés dos crentes que estão em Cristo (Gn 3.15). William Greathouse afirma que as divisões na igreja são obra de Satanás, e a supressão delas pelo Deus da paz é vitória sobre Satanás.1229 Na mesma linha de pensamento, John Murray diz que Deus é quem esmaga Satanás e estabelece a paz, em contraste com o conflito, a discórdia e as divisões.1230Paulo revela aqui a fonte de toda falsidade para que nenhum crente possa ser enganado quando os instrumentos de Satanás realizarem sua obra mortal de destruir a alma dos homens.1231 Paulo está convicto de que o diabo será destronado. O Deus da paz não quer saber de conchavos com o diabo. Somente com a destruição do mal é que se alcança a verdadeira paz.1232

Concordo com William Barclay quando ele diz que a paz de Deus é a paz da ação, da conquista e da vitória. Existe uma classe de paz que pode ser alcançada à custa de furtar-se de questões que devem ser enfrentadas corajosamente, uma paz que provém de uma inatividade letárgica e de uma evasão de toda ação decisiva. A paz de Deus não se submete ao mundo, mas vence o mundo.1233 De acordo com E E Bruce, o título “o Deus da paz” é particularmente apropriado aqui, uma vez que Satanás é o autor da discórdia.1234 O Deus da paz é o guerreiro valente que nos dá vitória contra Satanás. O Deus da paz é quem esmagará em breve debaixo dos nossos pés a Satanás. Satanás já foi expulso do céu, já foi despojado na cruz e em breve será esmagado debaixo dos nossos pés, e depois, será lançado no lago de fogo. Somos soldados de um exército vitorioso. Seguimos o capitão invicto em todas

William Hendriksen sintetiza Romanos 16.20, ressaltando três itens em conexão com aquilo que o Deus da paz

a. Deus esmagará Satanás. Em outros termos, cumprirá a promessa de Gênesis 3.15. O vitorioso não é Satanás, mas

b. Deus o esmagará debaixo dos pés dos crentes. Os que são coerdeiros (8.17) são também covencedores. Os santos participarão da vitória de Deus sobre Satanás (Ap
c. Deus fará isso logo. Em certo sentido, é verdade que Deus já está esmagando Satanás. Uma vitória mais decisiva foi conquistada no Calvário. Ao que a presente passagem se refere, entrementes, é a vitória final e escatológica sobre Satanás, a qual se concretizará em conexão com o glorioso regresso de Cristo (2Ts 2.8).

Uma saudação fraternal (16.21-24)

Paulo escreve esta carta aos Romanos da região da Acaia, possivelmente de Corinto, após sua última viagem missionária, de caminho a Jerusalém. Ele não apenas envia saudação a 26 pessoas e aos demais irmãos da igreja de Roma, mas também elenca nessa missiva as saudações dos amigos que estão com ele em Corinto, à maneira de um post scriptum.
Paulo é um homem muito polido para esquecer seus cooperadores. Havia uma equipe que trabalhava a seu lado e ele sempre valorizava essas pessoas. De acordo com William Barclay: “Nenhum grande homem pode fazer sua obra sem a ajuda que lhe prestam humildes colaboradores”.1236
Oito irmãos são destacados nessa saudação: “Saúda-vos, Timóteo, meu cooperador, e Lúcio, Jasom e Sosípatro, meus parentes. Eu, Tércio, que escrevi esta epístola, vos saúdo no Senhor. Saúda-vos Gaio, meu hospedeiro e de toda a igreja. Saúda-vos Erasto, tesoureiro da cidade, e o irmão Quarto. [A graça de nosso Senhor Jesus Cristo seja com todos vós. Amém]” (16.21-24).

O primeiro nome da lista é Timóteo (16.21). Esse jovem foi um grande cooperador de Paulo. Timóteo era de Listra. Tinha bom testemunho dos irmãos de sua cidade e de Icônio (At 16.1,2). Era um homem singular, de caráter provado, que cuidava como ninguém dos interesses de Cristo e da sua igreja (Fp 2.20-22). Timóteo era o estimado cooperador de Paulo, seu filho na fé, seu companheiro de perigosas jornadas, seu conforto em longos encarceramentos, seu enviado em missões espinhosas - um homem que, como poucos outros, conhecia a plenitude e a alegria da estima e do afeto do apóstolo.1237 Timóteo era o braço direito de Paulo, o homem que foi preparado para ser o continuador de sua obra.

 Paulo cita em seguida seus parentes Lúcio, Jasom e Sosípatro (16.21). São nomes desconhecidos, mas destacados pelo apóstolo por seu vínculo de parentesco, seja no sentido lato de nacionalidade, seja no sentido restrito de consangüinidade. Lúcio pode ser o Lúcio de Cirene, que era um dos profetas e mestres de Antioquia (At 13.1). Jasom pode ser o Jasom que hospedou Paulo em Tessalônica e sofreu nas mãos da multidão alvoroçada (At 17.5-9). Sosípatro pode ser o Sópatro de Bereia, que levou a parte das ofertas levantadas naquela igreja para os pobres da Judeia (At 20.4). Gaio pode ser um dos poucos crentes que Paulo batizou em Corinto (ICo 1.14).1238
Na ordem, vem a saudação de Tércio, o amanuense desta epístola, à igreja de Roma (16.22). Ao que parece, Paulo normalmente empregava amanuenses para redigir suas cartas, mas este é o único cujo nome se nos tornou conhecido. Talvez fosse um amanuense profissional, visto que Romanos é bem mais formal que a maior parte das missivas paulinas.1239 O costume de Paulo utilizar amanuense é confirmado em outras cartas (lCo 16.21; G16.11; Cl 4.18; 2Ts 3.17).
Em continuação, Gaio, o hospedeiro de Paulo em Corinto (16.23), em cuja casa se reunia uma igreja, também envia saudações à igreja de Roma.

Finalmente, Erasto o tesoureiro da cidade, agora convertido a Cristo, endereça saudações à igreja, sendo acompanhado pelo irmão Quarto (16.23). Este Erasto foi identificado com o oficial civil de mesmo nome mencionado em inscrição latina num bloco de mármore, de calçamento, descoberto em Corinto, em 1929, por membros da Escola Norte-americana de Estudos Clássicos em Atenas.1240
William Barclay tem razão quando diz que nessa lista de   oito nomes há dois grandes sumários. Gaio é o homem da hospitalidade; Quarto é, em uma palavra, o irmão. E uma grande coisa entrar na História como o homem da casa aberta e o homem do coração fraternal. Algum dia as pessoas nos definirão em uma frase. Qual será essa frase?

Uma doxologia singular (16.25-27)

Paulo ensaiou encerrar esta carta várias vezes. Concluiu sua exposição doutrinária com uma sublime doxologia (11.33-36). Depois invocou a bênção três vezes (15.33; 16.20; 16.24) antes de encerrar com a doxologia final (16.25­27). Essa é a mais longa doxologia de Paulo usada em suas cartas. Charles Erdman tem razão quando diz que Paulo nos legou outras grandiosas doxologias; contudo, elas não estão lavradas na conclusão das epístolas, mas incrustadas no próprio corpo da exposição. Esse magnífico jorro de louvor sintetiza os grandes pensamentos da epístola e está em perfeita harmonia com o conteúdo geral da carta.1242 Concordo com Leenhardt quando ele diz que a doxologia final de Romanos se reveste de impressiva solenidade. Ela confirma a mensagem da epístola, apresentando-a em síntese numa forma litúrgica.1243

Destacaremos aqui quatro preciosas verdades.

Em primeiro lugar, Paulo exalta Deus pelo seu poder.“Ora, àquele que é poderoso para vos confirmar segundo o meu evangelho e a pregação de Jesus Cristo, conforme a revelação do mistério guardado em silêncio nos tempos eternos” (16.25). O Deus que elege, chama e justifica é poderoso para confirmar os crentes. A segurança da salvação não se estriba no frágil fundamento da confiança humana, mas na firme rocha da onipotência divina. John Stott argumenta com exatidão: “Se o evangelho é o poder de Deus para salvar (1.16), ele é também o poder de Deus para confirmar. O verbo grego sterizo, traduzido como confirmar’, é quase um termo técnico cujo sentido é nutrir novos convertidos e fortalecer igrejas jovens”.1244
Adolf Pohl destaca o contraste entre a fragilidade da igreja e a onipotência divina, nas seguintes palavras:
Como eram frágeis esses pequenos grupinhos de cristãos, que se reuniam num lugar qualquer do gigantesco mar de casas de Roma. Faltava-lhes todo status de reconhecimento social. No entanto, faltava-lhes também, como evidencia, sobretudo, Romanos 14.15, a clareza doutrinária nas próprias fileiras, de modo que a igreja corria perigo de se dividir. Acima de tudo acontecia em Roma, como nas comunidades de todos os lugares e tempos, que força intelectuais tentavam apagar novamente a fé (16.20). Em decorrência, a preocupação de firmar na fé determina essa carta. Porém, contra a morte da igreja existe o poder de Deus, o poder da ressurreição.1245

Em segundo lugar, Paulo exalta Jesus Cristo como o conteúdo do evangelho. “[...] e a pregação de Jesus Cristo, conforme a revelação do mistério guardado em silêncio nos tempos eternos, e que, agora, se tornou manifesto e foi dado a conhecer...” (16.25,26). O evangelho de Paulo tem como conteúdo a Pessoa e a obra de Jesus Cristo. A oferta de Jesus Cristo como sacrifício perfeito e eficaz pelos pecados de judeus e gentios, para formar a igreja, foi um mistério guardado em silêncio nos tempos eternos. Recorro mais uma vez a John Stott para esclarecer esse importante tema:
O segredo de Deus, antes oculto mas agora revelado, é essencialmente o próprio Jesus Cristo em sua plenitude (Cl 2.2), e em particular Cristo para os gentios e nos gentios (Cl 1.27), de forma que agora os gentios têm a mesma participação que Israel na promessa de Deus (Ef 3.6-11). O mistério inclui também boas-novas para os judeus e não só para os gentios, ou seja: que um dia “todo o Israel será salvo” (11.25­27). E vive na expectativa da glória futura (lC o 2.7-9), quando Deus fará convergir em Cristo todas as coisas (Ef 1.9,10). Assim, o mistério começa, continua e termina com Cristo.

Em terceiro lugar, Paulo exalta as Escrituras como revelação de Deus. “[...] por meio das Escrituras proféticas, segundo o mandamento do Deus eterno, para a obediência por fé, entre todas as nações” (16.26). As Escrituras revelam a Jesus Cristo, o conteúdo do evangelho de Paulo, enquanto a pregação de Jesus Cristo, por intermédio das Escrituras é o meio de tornar esse mistério conhecido aos homens em todo o mundo. O mistério que estivera oculto agora foi revelado por meio da vida, morte, ressurreição e exaltação de Jesus. As Escrituras proféticas não são uma invenção humana, mas o mandamento do Deus eterno; seu propósito é despertar a obediência por fé entre todas as nações. A evangelização precisa desembocar em transformação de vida. À conversão segue o discipulado.

Em quarto lugar, Paulo exalta Deus por sua sabedoria.“Ao Deus único e sábio seja dada glória, por meio de Jesus Cristo, pelo séculos dos séculos. Amém!” (16.27). Paulo exalta a Deus, o Deus único e sábio, criador, sustentador, redentor e galardoador. Deus é merecedor de toda a glória, pelos séculos dos séculos, pois o glorioso evangelho apresentado nesta carta foi concebido por sua sabedoria e por seu poder desde toda a eternidade. O mesmo Paulo que já prorrompera em adoração e louvor: “O profundidade da riqueza, tanto da sabedoria, como do conhecimento de Deus!” (11.33) volta a exaltar a Deus por sua sabedoria na conclusão desta carta. Na verdade, o povo redimido de Deus passará a eternidade atribuindo a ele “louvor, e a glória, e a sabedoria e as ações de graças, e a honra, e o poder e a força” (Ap 7.12). Eles o adorarão por seu poder e sabedoria manifestos na salvação.1247
Como ele fez antes, ou seja, na conclusão da primeira parte desta carta (11.36), assim também agora, no término da carta inteira, Paulo acrescenta a palavra de solene e entusiástica afirmação e aprovação: Amém.1248


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