Lição 5 : Central Gospel Exegese Bíblica
ESBOÇO
DA LIÇÃO
1- A ÁRDUA TAREFA DA INTERPRETAÇÃO
1.1. O propósito da exegese
1.2. A finalidade da exegese
1.3. Barreiras ao uso da exegese
1.3.1. As maneiras fixas e as limitações do pensamento
1.3.2. A falta de desejo de encontrar o verdadeiro
sentido das Escrituras
2-
REGRAS DE INTERPRETAÇÃO BÍBLICA
2.1. A Escritura deve ser interpretada, em primeiro
lugar, em seu sentido literal
2.2. A Bíblia deve ser interpretada à luz do seu próprio
contexto
2.3. O texto bíblico não deve ser interpretado de forma
isolada
3.
ORIENTAÇÕES EXEGÉTICAS
3.1. A exegese na prática
3.2. Particularidades a serem observadas no processo
exegético
3.2.1. A direção do ESPÍRITO SANTO
3.2.2. O lugar estratégico da exegese
3.2.3. A inversão de valores
TEXTO
BÍBLICO BÁSICO
- 2 Timóteo 2.14-19
14 – Traze estas coisas à memória,
ordenando-lhes diante do Senhor que não tenham contendas de palavras, que para
nada aproveitam e são para perversão dos ouvintes.
15 - Procura apresentar-te a DEUS aprovado,
como obreiro que não tem de que se envergonhar, que maneja bem a palavra da
verdade.
16 - Mas evita os falatórios profanos, porque
produzirão maior impiedade.
17 - E a palavra desses roerá como gangrena;
entre os quais são Himeneu e Fileto;
18 - os quais se desviaram da verdade, dizendo
que a ressurreição era já feita, e perverteram a fé de alguns. 19 - Todavia, o
fundamento de DEUS fica firme, tendo este selo: O Senhor conhece os que são
seus, e qualquer que profere o nome de CRISTO aparte-se da iniquidade.
TEXTO
ÁUREO
Oh! Quanto amo a tua lei!
É a minha meditação
em todo o dia!
Salmo 119.97
OBJETIVOS
Ao término do
estudo bíblico, o aluno deverá ser capaz de:
- entender a importância da exegese bíblica para a igreja
e para cada pessoa individualmente;
- explicar o sentido e a finalidade da exegese bíblica;
- - compreender os princípios e regras
para a interpretação correta das Escrituras.
ORIENTAÇÕES
PEDAGÓGICAS
Prezado
professor, Martinho Lutero, personagem central da Reforma Protestante, declarou
que toda pessoa justificada pela fé em CRISTO é também um intérprete das
Escrituras. Esta frase ratifica um dos maiores legados reformistas, que é a
devolução das Escrituras à igreja e ao povo de DEUS — uma vez que a Bíblia
estava trancafiada nos porões do catolicismo da época. No entanto, nos dias
atuais, a Palavra de DEUS também pode estar trancafiada nos porões da
superficialidade e dos grosseiros erros de interpretação, que distanciam as
pessoas do real sentido dos textos sagrados. Excelente aula!
COMENTÁRIO
Palavra
introdutória
A exegese bíblica
é uma das principais disciplinas nos currículos de seminários e faculdades de
Teologia. Embora o termo pareça distante do grande público, de fato, ele está
mais próximo do que se imagina, porque tem relação com a tarefa da
interpretação das Escrituras. Etimologicamente, o vocábulo exegese origina-se
do termo grego exégèsis e tem o sentido de “extrair o significado, explicar,
expor os fatos com precisão, conduzir o sentido para fora”
Subsídio 1
A
exegese ocupa-se do estudo gramatical do texto bíblico e auxilia o leitor do
texto sagrado em sua compreensão útil das Escrituras, visando ao testemunho, à
pregação e ao ensino na igreja.
1- A
ÁRDUA TAREFA DA INTERPRETAÇÃO
É necessário
considerar que a tarefa de interpretação bíblica, por inúmeras vezes, não é tão
simples. O leitor do texto sagrado precisa ter em mente algumas variáveis muito
importantes: ele foi produzido entre os anos 1600a.C—99d.C.; portanto, está
separado historicamente do mundo atual por milênios; ele foi escrito em idiomas
geralmente desconhecidos do grande público da atualidade: o Antigo Testamento
foi escrito na língua hebraica, com pequenas inserções em aramaico; o Novo
Testamento, no grego koiné; há uma distância entre os primeiros destinatários
do texto bíblico e os destinatários de hoje — as distâncias culturais entre as
pessoas do mundo em que a Bíblia foi escrita e os leitores da atualidade só
pode ser minorada com o uso da exegese.
1.1. O
propósito da exegese
Considerando que
os escritores sagrados dirigiram suas mensagens aos seus contemporâneos — sem
imaginar que esses escritos alcançariam pessoas de todos os povos, línguas e
épocas —, a exegese bíblica propõe-se a responder, basicamente, às seguintes
questões: Qual era o significado que o autor bíblico queria comunicar
originalmente? O que o autor inspirado desejava que seus leitores originais
compreendessem? A partir do momento que as respostas a essas questões são
obtidas, as distâncias temporais e culturais são atenuadas. Uma ressalva: as
distâncias do contexto histórico-cultural- -político dos primeiros
destinatários da mensagem bíblica, assim como as diferenças quanto aos idiomas,
não podem servir de pretexto para que as pessoas interpretem a Bíblia de modo
particular, ao seu bel-prazer. É nesse sentido que a exegese ganha campo e se
torna uma disciplina altamente necessária.
Subsídio 2
Sendo
a Bíblia um livro de todos os povos e épocas, há nela um modo significativo,
atual e relevante de aplicar sua mensagem à vida das pessoas, independentemente
do tempo histórico em que vivem. Esse fato a torna um livro maravilhoso,
espetacular e incomparável!
1.2. A
finalidade da exegese
A exegese
ocupa-se do exame particular de um determinado texto das Escrituras,
objetivando sua interpretação de forma apropriada. A disciplina tem como
finalidade a análise sistemática do sentido gramatical do texto e, assim, pelo
estudo do significado das palavras nos originais, lançar luzes sobre o que o
texto significou aos seus primeiros destinatários. Enquanto a exegese busca o
significado do texto para o público a quem ele foi endereçado originalmente, a
hermenêutica ocupa-se de como aplicar esse texto, de maneira prática, à vida do
leitor atual das Escrituras, dando-lhe, assim, significância.
1.3.
Barreiras ao uso da exegese
A desinformação,
o descaso ou comodismo — o jeito de fazer as coisas sempre da mesma forma —,
transformam-se em grandes empecilhos e barreiras ao entendimento mais amplo das
Escrituras.
1.3.1.
As maneiras fixas e as limitações do pensamento
Os preconceitos e
as verdades aceitas como tais, de maneira inquestionável, sem os métodos e
procedimentos oriundos da exegese bíblica, afastam as pessoas dos grandes e
verdadeiros tesouros da Bíblia Sagrada. O fato é que se pode ir muito além no
conhecimento da Palavra, e a exegese existe com esta finalidade.
1.3.2.
A falta de desejo de encontrar o verdadeiro sentido das Escrituras
O caminho do
conhecimento mais profundo da Bíblia exige um coração aberto e uma mente pronta
para adquirir um novo saber. Nesse caso, as pressuposições e achismos precisam
ser modificados a partir de um entendimento mais consistente e amplo do texto.
Não são os pré-entendimentos que governam a ação, mas o desejo de ver no texto
aquilo que ele realmente quer dizer. O sentido real e verdadeiro do significado
do texto deve sempre ter a primazia. O intérprete deve ser um servo do texto,
nunca o contrário.
2-
REGRAS DE INTERPRETAÇÃO BÍBLICA
É preciso
sinceridade e franqueza para reconhecer que se pode pregar, ensinar,
aconselhar, anunciar, exortar, evangelizar, sem conhecer profundamente os
princípios de exegese e hermenêutica bíblicas. As pessoas do passado nem mesmo
sabiam da existência dessas disciplinas, e isso não as impediu de realizar a
obra de DEUS com dedicação e amor. No entanto, sem os princípios da
interpretação, o relacionamento com as Escrituras e o entendimento das verdades
ali reveladas serão sempre feitos no nível da superficialidade em termos da
compreensão. Há, também, o grande risco de cometerem- -se equívocos e
distorções na interpretação da mensagem do evangelho, o que não é algo raro nos
dias atuais. No caso particular das Escrituras Sagradas, alguns princípios e regras
de exegese precisam ser aplicados, como os descritos nos subtópicos seguintes.
2.1. A
Escritura deve ser interpretada, em primeiro lugar, em seu sentido literal
É notório que a
Bíblia é rica em figuras de linguagem, alegorias e simbolismos. Porém, o primeiro
olhar que deve ser lançado é ao seu sentido literal, não figurado, ou seja, “ao
pé da letra”.
2.2. A
Bíblia deve ser interpretada à luz do seu próprio contexto
Esta é a regra
básica e áurea de interpretação das Escrituras: cada texto deve ser comparado
com os textos que vêm antes e depois da passagem que está em estudo, pois a
Bíblia interpreta a própria Bíblia.
2.3. O
texto bíblico não deve ser interpretado de forma isolada
Um único verso ou
passagem da Bíblia não pode ser utilizado isoladamente, pois pode levar o
leitor a conclusões precipitadas, equívocos e erros de interpretação. Não
raramente, partes isoladas do texto bíblico tornam-se pretextos que podem afastar
o leitor do contexto original, distanciando-o, por conseguinte, do conhecimento
das verdades contidas nas Sagradas Escrituras.
3.
ORIENTAÇÕES EXEGÉTICAS
Como dito até
este ponto, o termo exegese refere-se à iniciativa de, pela análise gramatical
das palavras, buscar o sentido original, mais profundo e verdadeiro de uma
passagem bíblica.
3.1. A
exegese na prática
O trabalho de
exposição da Bíblia deve ser, por via de regra, antecedido pela tarefa
exegética. Se todo expositor da mensagem bíblica pensasse a partir desse
raciocínio, evitar-se-iam muitos erros e distorções teológicas. Seguem algumas
sugestões — entre outras — para a prática exegética:
- jamais negligencie o contexto — é impossível entender
o significado de um texto separado do seu contexto;
- construa uma paráfrase do texto, ou seja, reproduza o
texto com suas próprias palavras;
- observe a narrativa da passagem — ela pode ser
histórica; pode conter poesia, parábolas, alegorias, profecia, doutrina etc.;
- esclareça o significado das palavras do texto — com a
evolução dos idiomas, é preciso entender o que cada palavra significava na
época em que foi escrita e o que significa hoje;
- faça anotações — nenhuma pessoa tem uma mente tão
prodigiosa; as informações que se apresentam como inéditas precisam ser
anotadas e utilizadas quando houver oportunidade;
- estude com atenção o contexto, definindo datas,
locais, costumes, tradições etc.;
- dirija ao texto indagações que possam elucidá-lo, tais
como: Onde aconteceu? Quem participa da narrativa? O que aconteceu? Por que
aconteceu?;
- organize o texto em seções principais e secundárias; -
defina o tema central e os objetivos de cada livro ou passagem bíblica.
3.2.
Particularidades a serem observadas no processo exegético
Embora a
decoração dos textos bíblicos seja um hábito extremamente saudável — e as
pessoas devam ser encorajadas a praticá-la —, a tarefa mais importante quanto
ao conhecimento da Bíblia é a sua correta interpretação. A partir desse
raciocínio, nos subtópicos seguintes, serão apontadas algumas particularidades
relacionadas a esta nobre tarefa.
3.2.1.
A direção do ESPÍRITO SANTO
O trabalho
exegético exige pesquisa e trabalho árduo; no entanto, ele não pode ficar
limitado à atividade intelectual. O estudante da Bíblia deve ter o seu coração
aberto para a inspiração, unção e direção do ESPÍRITO SANTO (Jo 14.26).
3.2.2.
O lugar estratégico da exegese
A tarefa de
pregar e ensinar deve sempre ser precedida pelo trabalho exegético. Ao
decidir-se sobre o uso de um de terminado texto bíblico, o pregador (ou
ensinador) deve ter o cuidado de saber, com segurança, se o interpretou
corretamente (Mt 28.19).
3.2.3.
A inversão de valores
Atualmente, a
igreja vive um momento em que o ensino das Escrituras está deixando de ser
prioridade. Os eventos, com resultados quantitativos e instantâneos, superaram
o desejo de conhecer mais profundamente a natureza de DEUS, de Seu Filho
unigênito e dos Seus propósitos. De muitas maneiras, a pregação da Palavra está
sendo limitada a mensagens sem vida; reduzida a chavões, clichês, repetições,
plágios e lugares comuns. Por todo lado, é possível identificar as marcas da
superficialidade e, não raro, de erros grosseiros de interpretação do texto
bíblico, em que prevalecem a violação aos princípios da exegese e da boa e
correta interpretação. É urgente que se resgate a importância do conhecimento
das Escrituras, do seu sentido mais amplo, profundo e verdadeiro.
CONCLUSÃO
Como dito na
introdução, após a Reforma Protestante, toda pessoa poderia interpretar
livremente as Escrituras Sagradas. O clero católico romano deixou de ter
exclusividade sobre esta nobre tarefa. Em resumo: a Bíblia foi devolvida à
igreja e aos seus membros. Que grande legado, que imenso privilégio e
responsabilidade! No entanto, embora seja livre para interpretar as Escrituras,
nenhuma pessoa pode fazê-lo a seu bel-prazer. Ninguém possui isenção para virar
as costas aos princípios e regras que regem a tarefa da interpretação. Toda
pessoa tem a liberdade de ler e interpretar as Escrituras, mas, na mesma
medida, ninguém pode ir além dos limites da mensagem sagrada. O intérprete deve
ser um servo do que nela está registrado. Ninguém tem o direito de atribuir
suas próprias conclusões aos autores inspirados. A liberdade de quem interpreta
a Bíblia deve permanecer dentro dos limites do fato de ser ela a Palavra que
revela o caráter de DEUS e os Seus propósitos para a humanidade e para cada
pessoa individualmente.
ATIVIDADE
PARA FIXAÇÃO
1. O que é exegese?
R.: É uma disciplina que auxilia na interpretação dos
textos da Bíblia.
Lições Palavra de Deus nº 70 - Editora Central
Gospel PILARES DA TEOLOGIA PRÁTICA.
Lição 5 : Central Gospel Exegese Bíblica
O Método Teológico
Visto
ser importante que a teologia sistemática se baseie na Bíblia, nesta seção
lidaremos com o método teológico, especialmente na sua interação com a exegese
e a teologia bíblica.
A
Exegese e a Teologia Bíblica como Matriz
Várias
etapas de desenvolvimento existem nesse processo teológico, onde a pessoa
passa da Bíblia à teologia sistemática: (1) a exegese e a interpretação dos
textos individuais; (2) a síntese dessas interpretações de conformidade com
algum sistema de teologia bíblica;28 e (3) a apresentação desses ensinos na
linguagem do próprio teólogo sistemático, visando suas próprias necessidades e
as do seu povo.29
Na
teologia ocidental, é comum utilizar-se de algum princípio organizador,
empregado na formulação de um conjunto coerente de doutrinas. Em seguida, a
teologia bíblica é apresentada (sem nenhuma alteração de seu significado) numa
linguagem clara a fim de comunicar a mensagem de DEUS, ajudando os fiéis a
solucionar os seus problemas.
Para
manter o nível da autoridade bíblica no decurso da elaboração da teologia
sistemática, é necessário que a pessoa que elabora tais estudos evite a
dedução. Com isso, queremos dizer que o teólogo não deve começar com uma
declaração teológica geral, tentando impô-la ao texto bíblico para obrigar a
Bíblia a dizer o que ele quer, torcendo o significado real do texto. Pelo
contrário: o estudo exegético cuidadoso do texto bíblico deve levar
(indutivamente) a uma declaração teológica.
A
Natureza e a Função da Exegese
O alvo
da exegese é deixar as Escrituras dizerem o que o ESPÍRITO SANTO pretendia que
se dissesse no seu contexto original. No caso de cada texto, portanto, o
intérprete deve analisar o contexto social e histórico, o gênero literário e
outros fatores afins, e a luz lançada pelos idiomas originais. Faremos algumas
observações a respeito de cada um desses fatores, nesta mesma ordem.
Quanto
ao contexto social e histórico, o escritor bíblico pressupunha que seus
ouvintes possuíam certa base cultural e histórica comum a todos. Boa parte
desta era tomada por certa mais que declarada. Devemos tomar o cuidado de não
supor ingenuamente ser a base cultural e histórica do escritor bíblico a mesma
de nossos dias. Não é a mesma. Entre o intérprete e qualquer texto bíblico há
vastas diferenças culturais e históricas.
Howard
C. Kee explica que o significado de uma palavra pode ser determinado somente
pelo exame do contexto social em que é usada. Por exemplo: tendo consciência
dos fatores sociais e culturais, podemos ver que Mateus emprega o termo
"justiça" como "uma qualidade de comportamento... exigida por
DEUS, e que deve ser posta em prática pelos seus servos fiéis", ao passo
que Paulo, num contexto diferente, emprega-o no sentido de uma "ação
mediante a qual DEUS endireita as coisas”. 30
Além
disso, devemos tomar consciência do gênero literário, do tipo específico de
documento ou forma literária que estamos examinando. Ter consciência da
natureza de um documento é um dos princípios fundamentais da interpretação.31 A
não ser que saibamos como um texto foi composto, e o motivo pelo qual o foi,
não perceberemos o seu sentido.
A
Bíblia é composta por diferentes gêneros literários: narrativa histórica
(Gênesis, Rute, Crônicas e Atos dos Apóstolos),32 poesia (Salmos, Jó
eProvérbios), evangelho (narrativa episódica com sermões, dirigida a públicos
específicos), epístolas (cartas), apocalipse e profecia (o livro do
Apocalipse). Ao estudarmos o gênero literário que o escritor bíblico emprega,
e por que ele o emprega, poderemos interpretá-lo mais facilmente.
O
gênero literário muito interessa ao pentecostal em virtude da teologia da
evidência inicial, interpretação esta que depende parcialmente do gênero de
Atos. Os pentecostais e os evangélicos têm debatido o seu gênero literário,
sendo que estes últimos, muitas vezes, tratam Atos como mera história. Os
pentecostais, por outro lado, argumentam que Atos é de natureza teológica, 33
muito semelhante ao Evangelho de Lucas, posto que Lucas haja escrito ambos os
livros. Podemos, portanto, usar Atos como fonte originária de doutrina. 34
Outro
campo de interesse é o significado das palavras bíblicas. Nesse assunto,
devemos evitar a falácia da raiz. Esta, em termos simples, ocorre quando a
etimologia de uma palavra (significado de sua raiz) é aplicada a esta todas as
vezes que aquela aparece. Ou, conforme às vezes se observa, a etimologia é
aplicada a alguns casos escolhidos em que a palavra surge a fim de apoiar o
ponto de vista do intérprete. E, porém, o uso, e não a derivação, que determina
o significado. (Por exemplo, praevenire [em latim "ir adiante de"] e
prevent, em inglês, tinham o mesmo significado, mas hoje prevent significa
"impedir"). O contexto, portanto, é da máxima importância.
Determinada palavra pode possuir grande variedade de significados, mas, num
contexto específico, somente um deles será válido.
Crítica,
Interpretação e Teologia da Bíblia
A
crítica bíblica35 foi desenvolvida depois da Reforma. As duas divisões
principais da crítica bíblica, anteriormente denominadas de alta e baixa
crítica, agora são usualmente chamadas crítica histórica e crítica textual,
respectivamente. Os conservadores e os liberais igualmente trabalham em ambas
as áreas, posto serem necessárias na exegese. Além disso, oferecem grande ajuda
na compreensão da Bíblia. A crítica histórica ajuda-nos a conhecer com mais
exatidão o contexto social e cultural de um texto ou livro da Bíblia,
levando-nos a interpretá-lo com mais exatidão. As fontes primárias das
informações históricas incluem a própria Bíblia, as obras dos historiadores
seculares e as descobertas arqueológicas. Os documentos secundários incluem as
obras dos vários intérpretes, tanto antigos quanto modernos.
A
crítica textual é a ciência que examina as cópias feitas à mão (manuscritos) da
Bíblia em hebraico, aramaico e grego, e que procura recuperar o que os
escritores inspirados realmente escreveram. 36 Existem milhares de manuscritos
antigos da Bíblia, e todos eles têm diferenças esparsas na linguagem, na ordem
das palavras, e na omissão ou acréscimo de palavras. 37 Tratam-se, muitas
vezes, dos erros cometi- , dos pelos copistas. Outras mudanças podem ter sido deliberadas,
inclusive na atualização da linguagem. A crítica textual emprega métodos
objetivos e científicos para comparar os vários textos, e descobrir qual o mais
correto. 38
Por um
lado, alguns intérpretes têm aplicado ao texto bíblico hipóteses imaginárias,
influenciados pelas modernas teorias sobre a História (que usualmente envolve a
negação do aspecto sobrenatural). Por outro lado, reconhecemos ser a
interpretação mais acertada a que considera ter sido a totalidade das
Escrituras inspirada por DEUS, possuindo, por conseguinte, uma natureza
especial que merece respeito. Quando nos ocupamos da crítica bíblica, o ideal é
não atacarmos a Bíblia (embora muitos o façam). Pelo contrário: atacamos o
nosso próprio modo de entender a Bíblia a fim de harmonizar nossa interpretação
com o significado original das Escrituras. 39
Por
exemplo: os intérpretes pentecostais vêm, já algum tempo, empregando o que
podemos chamar "crítica narrativa" na sua forma mais simples. Os
defensores do batismo no ESPÍRITO SANTO argumentam em favor de uma teologia de
evidência inicial em Atos dos Apóstolos, crendo que o falar noutras línguas é
normativa. Pois a narrativa menciona frequentemente que o fenômeno ocorre
quando o ESPÍRITO Santo enche alguém com sua plenitude. As repetições na narrativa
fornecem paradigmas de comportamento, dando força e expressão à teologia.40 Ou
seja: o que Lucas registrou em Atos foi com a intenção de demonstrar-nos que o
falar noutras línguas não é somente a evidência inicial e física como também a evidência
convincente que nos deixa saber quando uma pessoa foi realmente batizada no
ESPÍRITO Santo.
O
teólogo conservador crê estar a narrativa arraigada à história (a história é o
meio pelo qual teria sido efetivada a revelação).41 Ao proceder a narrativa, o
autor sagrado foi orientado pelo ESPÍRITO SANTO na seleção daquilo que serviria
ao seu propósito, omitindo o restante.
Tomemos
como exemplo o capítulo 2 de Atos para demonstrar o que estamos dizendo. Este
texto é um dos relatos mais amplos do livro de Atos dos Apóstolos. Determinamos
B ser uma narrativa específica por levar-nos a distinguir seus limites dentro
dos quais é possível divisar os personagens, o enredo e o ponto culminante. O
capítulo tem três partes: a vinda do ESPÍRITO SANTO, a atitude do povo e o
sermão de Pedro.42
O âmago
da narrativa (a mensagem de Pedro) explica a função teológica das línguas e da
vinda do ESPÍRITO SANTO. As línguas são o sinal de que a prometida era da
salvação e do ESPÍRITO SANTO já havia chegado; as línguas evidenciam que o
ESPÍRITO SANTO já revestiu a Igreja de poder para testemunhar de JESUS. Além
disso, o propósito primário das línguas é testificar que as escrituras do
Antigo Testamento profetizaram a respeito da presente era do ESPÍRITO. Ou
seja: todo o povo de DEUS receberia o ESPÍRITO e falaria noutras línguas, e que
as línguas seriam a evidência de que DEUS ressuscitara a JESUS dentre os mortos
e o exaltara, ascendendo-o ao céu. Aí está Ele, agora, derramando o ESPÍRITO.
Além disso, os que falam em línguas dão testemunho da salvação e do evangelho
de JESUS (cf. 1.8), da vinda do Reino de DEUS que, agora mesmo, está
confrontando com sinais e prodígios as potências das trevas. Lucas, inspirado
pelo ESPÍRITO SANTO, selecionou os elementos principais do Dia de Pentecostes,
e os descreveu nessa breve narrativa a fim de convencer seus leitores a buscar
o batismo no ESPÍRITO SANTO.
A
ênfase na vinda do ESPÍRITO com poder é o tema principal no Evangelho de Lucas
e em Atos dos Apóstolos. O fato dá a entender que os leitores de Lucas não
haviam recebido o batismo no ESPÍRITO SANTO, sendo este mui comum na Igreja
Primitiva. Seus leitores, portanto, devem receber o batismo com o sinal do
falar em línguas. Esse revestimento de poder impulsioná-los-ia a se lançarem no
mundo como uma comunidade poderosa de testemunho.
A
narrativa era comum na antiguidade, e ainda o é em muitos lugares,
especialmente nos países do chamado Terceiro Mundo. Além disso, está em franca
ascensão no Ocidente. Ela comunica de modo indireto: o narrador expõe os seus
argumentos através de elementos tais como o diálogo e o comportamento. Assim, o
comportamento torna-se paradigma daquilo que os leitores devem valorizar e
seguir (em Atos 2, receber o ESPÍRITO com o falar em outras línguas fez-se normativo).
A
narrativa e o estilo indireto são contrastados com os tipos de literatura que
comunicam de modo direto. Na comunicação direta, o autor ensina na primeira
pessoa de maneira proposicional. Um exemplo de orientação na Bíblia é a forma
epistolar. A Bíblia contém teologia, tanto narrativa quanto proposicional.
Pressuposições
do Intérprete e do Teólogo
Finalmente,
é importante examinarmos o que nós, intérpretes, trazemos de nosso mundo, e
acrescentamos ao texto (pressuposições). Primeiro: tenhamos um compromisso com
a inspiração verbal e plenária.43 Os métodos supra delineados devem afirmar
esse ponto de vista. Prestemos atenção a todo o conselho de DEUS, e evitemos a
ênfase exagerada num só tema ou texto. Doutra forma, surge um cânon dentro de
um cânon, que é outro erro grave. E que, na prática, traçamos um círculo dentro
do círculo maior (a Bíblia), e dizemos, na prática, que essa parte assim
delineada é mais inspirada do que o resto. Se derivarmos a teologia só de uma
parte selecionada da Bíblia, acontecerá a mesma coisa.
E
importante, portanto, que o pentecostal tenha uma base e um ponto de referência
realmente bíblicos e pentecostais. Primeiro: deve crer no mundo sobrenatural,
especialmente em DEUS, que opera de forma poderosa e revela-se na história. Os
milagres, no sentido bíblico, são ocorrências comuns. Na Bíblia,
"milagre" refere-se a qualquer manifestação do poder de DEUS, e não
necessariamente a um evento raro ou incomum.44 Além disso, outros poderes no
mundo sobrenatural, quer angelicais (bons), quer demoníacos (maus), penetram em
nosso mundo e aqui operam. O pentecostal não é materialista nem racionalista,
mas reconhece a realidade da dimensão sobrenatural.
Em
segundo lugar, o ponto de referência "do pentecostal deve ser a revelação
que DEUS fez de si mesmo.45 O pentecostal acredita ser a Bíblia a forma
autorizada de revelação que, devidamente interpretada, afirma, confirma,
orienta e dá testemunho da atividade de DEUS neste mundo. Mas o conhecimento
racional das Escrituras, que não é o simples fato de se decoradas, não
substitui a experiência pessoal da regeneração e o batismo no ESPÍRITO SANTO,
com todas as atividades de testemunho e de edificação que o ESPÍRITO coloca
diante de nós.
Os
pentecostais acreditam que minimizar o valor dessas experiências é
contraproducente. O Evangelho de João, de modo claro, deliberado e poderoso,
afirma ser o novo nascimento no ESPÍRITO SANTO a maneira de se desvendar o
conhecimento divino. Sem essa experiência não se pode conhecer a DEUS. Outra
maneira de se perceber tal fato é aplicar o termo "cognitivo" ao
conhecimento que provém do estudo das Escrituras (ou teologia) e o termo
"afetivo" ao conhecimento que provém da experiência pessoal. Não
devemos jogar um contra o outro, pois essenciais. Mas a experiência pessoal é
importante. Como são maravilhosos a regeneração e o batismo no ESPÍRITO! Depois
de havermos recebido a ambos, passamos a ter um conhecimento mais pleno de DEUS
e, sem dúvida, mais pessoal.
Além
disso, o pentecostal crê que DEUS fala à sua igreja através dos dons do
ESPÍRITO SANTO a fim de corrigir, edificar e consolar. Embora os dons sejam
subordinados às Escrituras e discerníveis à luz destas, devem ser encorajados.
Tendo
em mente tais fatos, a teologia (e a cultura) não precisam inibir o fervor
espiritual. Na realidade, não é a teologia nem a cultura que inibe a obra do
ESPÍRITO SANTO, mas o ponto de referência-teológica e educacional. E importante,
portanto, interpretar a Bíblia dentro de suas próprias condições através de um
ponto de referência apropriado. Dessa forma, teremos uma teologia corroborada
pela experiência. Teologia esta que, mediante a fé e a obediência, passa a ser
uma "realidade da experiência"46 baseada na Bíblia, com eficácia na
vida diária, ao invés de uma teologia que não passa de mero motivo de
discussão.
TEOLOGIA SISTEMÁTICA STANLEY M. HORTON
Exegese Bíblica: Vantagens,
Desvantagens Limites e Contribuições na Interpretação Moderna da Bíblia
O estudo da Bíblia (Antigo Testamento, ou
Bíblia Hebraica, e Novo Testamento) possui longa tradição, tanto nas
denominações cristãs, como judaicas. Na Antiguidade, Filo de Alexandria (25
a.C. - 50 d.C.) representa bem uma vertente judaica de interpretação, ancorada
na Filosofia grega. Os comentários em hebraico ou aramaico constituíram o
midrash composto pela Mishná, pelos Talmudes de Jerusalém e da Babilônia e o
Midrash Aggadá, todos de época clássica, complementados pelos escritos pós-clássicos
e tardios. O Midrash, enquanto categoria propriamente judaica de interpretação,
pode ser definido como um “exame, interrogação” (derivado da raiz daroch). O
Midrash é, pois, uma exploração da letra do texto, a buscar um pretexto para a
reflexão, uma leitura infinita. As modalidades de procedimentos metodológicos
são a mahloquete (diálogo entre mestres, a intersubjetividade) e a guezerá
chava (analogia semântica ou intertextualidade). A exegese retorna ao texto,
dando ao texto bíblico sua própria autonomia ao livrá-lo de seu contexto
histórico original. A partir das alusões (remazim) visa a prescrição (halakha).
A aggada, produto da Palestina (eretz Israel) baseia-se na petiha (abertura) e
utiliza-se, amplamente, do jogo de palavras entre o hebraico da Bíblia e o
aramaico, como no caso do Bereshit (Gênesis), palavra inicial que significa “no
início”, interpretada como “bara chit”, “criou seis”, em aramaico (FUNARI,
1999).
Também os cristãos, já no início do segundo
século d.C., começaram a estudar os textos do que viria a ser o Antigo
Testamento e, aos poucos, também do Novo Testamento. Este movimento tomou corpo
e, no século IV, quando do fim da perseguição aos cristãos, multiplicaram-se os
estudos exegéticos e as interpretações, tanto a partir dos idiomas originais,
como, principalmente, a partir das versões, primeiro em grego, depois em latim.
Agostinho de Hipona foi um dos mais influentes comentadores cristãos. Pelos
séculos posteriores, tanto os cristãos a ocidente, em latim, como a oriente, em
grego, assim como os judeus, continuaram a produzir comentários, sempre a
partir de perspectiva teológica e mesmo apologética.
Foi apenas com o Iluminismo, no século XVIII,
que começaram a surgir perspectivas diversas, menos centradas na correta
interpretação, de acordo com o dogma, e isso se deu em um contexto de mudanças
sociais, econômicas e culturais que estão conosco até hoje. Por um lado, a
industrialização levou à urbanização e a uma preocupação com a explicação
racional do mundo e com a experiência empírica. Por outro, a estrutura social
fundada na ordem cósmica de fundo religioso foi questionada. As monarquias de
direito divino e as ordens sociais estamentais (nobres e plebeus) fundadas na
ordem religiosa do mundo foram colocadas em cheque, com o surgimento do estado
nacional moderno, baseado na cidadania e no compartilhamento de valores. O
estado nacional moderno burguês dependeu, assim, de uma nova compreensão do
mundo: racional, experimental, laica. O Iluminismo esteve na raiz do estudo da
Filologia, o conhecimento racional dos idiomas, com a busca das origens das
palavras e estruturas, assim como das inter-relações entre línguas vivas e
mortas. Surgia o conceito de ramos linguísticos, com a definição dos idiomas
indo-europeus, que incluem o latim e o grego, e os semitas, que abrangem o
hebraico e aramaico.
Esta visão iluminista viria a difundir-se no
século XIX e atingir, de forma contundente, o estudo dos textos religiosos, em
geral, e bíblicos, em particular. Na raiz da moderna exegese bíblica está,
portanto, um distanciamento da leitura crente da Bíblia, uma perspectiva
racional do texto bíblico, como já estava em Spinoza (1632-1677). Por isso
mesmo, houve e há teólogos católicos, protestantes e judeus que a criticaram
por essa abordagem despreocupada com crença. Contudo, muitos estudiosos
rejeitaram essa dicotomia, proveniente do embate, à época iluminista, entre fé
e razão e consideram que uma exegese bíblica fundada na razão não invalida a
crença, posição que adotamos por dois motivos. Em primeiro lugar, do ponto de
vista antropológico, a contraposição entre razão e fé é enganosa. O simbolismo
está presente no ser humano desde seus primórdios nas cavernas e continua a
estar na raiz do mundo atual. Alguns dirão que o humano define-se pela memória
dos antepassados, representada nos enterramentos, rituais funerários e na
rememoração dos falecidos. Mesmo os sistemas sociais fundados no ateísmo
perpetuaram a memória de líderes falecidos, em alguns casos, como na Coreia do
Norte, até mesmo com a consideração que os mortos estão vivos. Em seguida, e
não menos importante, a presença do sagrado no mundo contemporâneo, em diversas
formas, continua intensa, ainda mais no Brasil e uma perspectiva humanista e
simbólica, fundada na exegese moderna, permite uma vivência mais rica e aberta
à diversidade de comportamento do que uma abordagem pouco atenta ao estudo do
texto bíblico.
EXEGESE
E HERMENÊUTICA
A exegese é um conjunto de procedimentos
destinados a estabelecer o sentido de um texto sob vários ângulos (textual,
literário, dos motivos/temas, do processo de composição e outros) a fim de
extrair dele suas mensagens. Têm[1]se necessidade dela cada
vez que um texto suscita um interesse durável, ou é sempre considerado
importante (LACOSTE, 2004, p. 698). Em termos etimológicos, exegese vem do
grego e significa conduzir, guiar, dirigir, governar, explicar
pormenorizadamente, interpretar, ordenar, prescrever, aconselhar, arrancar para
fora do texto. A Eisegesis consiste em introduzir em um texto alguma coisa que
alguém deseja que esteja ali, mas que na verdade não faz parte do mesmo.
Importante é a distinção entre exegese (condução para fora) e eisegese
(condução para dentro) o que significa, portanto, guiar para fora dos
pensamentos o que o escritor tinha quando escreveu um dado documento, isto é,
literalmente “tirar de dentro para fora” (ex-ago), extrair o significado,
interpretar (FREEDMAN, 1992, p. 682-3). Demanda a utilização de método
científico, além de precisar contar com o auxílio de várias ciências humanas (história,
geografia, arqueologia, paleografia, história das religiões comparadas, entre
outras), visto que há uma enorme distância temporal (em alguns casos, também
espacial) e, sobretudo cultural entre os textos e nós, pessoas de outra época e
cultura.
A hermenêutica muitas vezes, é
usada como sinônimo de exegese. Etimologicamente, hermenêutica vem do grego
hermeneuein e significa traduzir, interpretar. Atualmente, se convencionou
chamar de exegese a busca do sentido que o autor quer exprimir a seus contemporâneos
e de hermenêutica o sentido que um texto pode adquirir hoje. O termo
hermenêutica provém do nome do deus Hermes da mitologia grega (HEIDEGGER, 2003,
p. 73). Em si mesmas, nem a hermenêutica, nem a exegese são próprias da Bíblia.
Elas se aplicam a qualquer tipo de texto e, de um modo especial, aos textos
mais antigos. Texto dos filósofos antigos também é objeto de estudos exegéticos
e hermenêuticos, além de textos literários, e outros. Enfim, qualquer tipo de
texto pode ser objeto de estudo exegético.
A exegese e a hermenêutica aplicada aos
estudos da Bíblia Hebraica e ao Novo Testamento costuma ser denominada “Exegese
Bíblica” (VIRKLER, 1987, p. 9-33). Segundo Uwe Wegner (2001), quando se fala de
exegese Bíblica, entende-se o termo sempre no sentido de explicação e
interpretação. É a prática da hermenêutica sagrada que busca a real
interpretação dos textos que formam o Antigo Testameno, ou Bíblia Hebraica, e o
Novo Testamento. Vale-se, pois, do conhecimento das línguas originais
(hebraico, aramaico e grego), da confrontação dos diversos textos bíblicos e
das técnicas aplicadas na linguística e na filosofia (WEGNER, 2001, p. 11).
Metodologia da Exegese Bíblica, portanto, é a organização e análise sistemática
dos processos que devem orientar a investigação científica da Bíblia. Consiste
na aplicação dos princípios racionais de investigação usados em documentos
plurisseculares com o propósito de apreender o estilo literário de cada autor,
a estrutura da obra, as formas literárias do conjunto, entre outros. É o
conjunto de procedimentos científicos empregados com o propósito de explicar o
texto em sua diversidade.
O uso de uma metodologia na exegese do texto
bíblico não é fortuito, mas cumpre duas funções específicas: viabilizar a
obtenção do conhecimento científico da Bíblia e possibilitar a sistematização
lógica desse saber. O método em exegese, por conseguinte, requer o emprego de
uma ordenação dos diferentes processos que serão empregados para alcançar
determinados resultados. Entende-se por processo, a forma como determinada
técnica é aplicada, isto é, o modo específico de executar o método (EGGER,
1994, p. 48).
ESCRITA
E ORALIDADE
Antes de serem escritos, muitos relatos
pertenciam à tradição oral. A fixação por escrito é apenas parte de um processo
mais amplo, pois um novo contexto é sempre ocasião para a releitura e a
reelaboração de um texto do passado. Muitas vezes, o próprio texto oferece
indícios que permitem reconstruir as etapas da redação que hoje possuímos. A
ciência bíblica desenvolveu certos critérios, a fim de refazer o caminho que o
texto percorreu até chegar às nossas mãos. O resultado desse trabalho de
reconstrução é encontrado nas chamadas “edições críticas”. São edições dos
textos do Antigo e do Novo Testamento (em hebraico, em grego, em aramaico e,
ainda, em latim) que trazem, no rodapé, o “aparato crítico”. Nas margens
laterais, encontram-se outras observações e anotações a respeito do texto. Para
economizar espaço, quase todas as informações do aparato crítico e das margens
estão abreviadas ou codificadas em símbolos, cuja decodificação encontra-se nas
introduções e nos apêndices de cada edição crítica (WEGNER, 2001, p. 48).
A Bíblia é um livro de difícil compreensão.
Para um mesmo texto, surgem muitas interpretações, algumas legítimas, outras
questionáveis, outras descartáveis. Tudo depende do modo, ou melhor, do método
com que se lê a Bíblia. Com efeito, não basta um único método de leitura para
esgotá-la. Ela nos reserva sempre uma novidade, uma surpresa, um horizonte
novo. A importância da exegese bíblica, para não dizer de sua necessidade,
reside no fato de que ela possibilita uma compreensão mais precisa do sentido
de um texto bíblico, e, por conseguinte, fornece bases para uma construção
teológica e histórica melhor fundamentada.
Um texto tem longa e complexa história de
transmissão: cópias, versões, citações, edições que envolvem inúmeros problemas
(mudanças intencionais e não-intencionais, adaptações culturais e releituras,
imprecisões, decisões editoriais). Daí a importância e a necessidade da atitude
crítica diante do texto.
A EXEGESE MODERNA E A SUPERAÇÃO DAS BARREIRAS DE LEITURA DO TEXTO
BÍBLICO
O início da exegese moderna se deu a partir do
século XVII. Mas foi na virada do século XIX para o século XX com a filosofia
hermenêutica de Wilhelm Dilthey, Martin Heidegger e Hans-Georg Gadamer que
provocaram mudanças na exegese, de modo especial, pela nova maneira de se
compreender a relação entre o autor, o texto e o leitor. Na sequência, vieram
os trabalhos exegéticos de Karl Barth e de Rudolf Karl Bultmann. Ambos
recolocaram a questão hermenêutica, mas cada um a seu modo. Barth se perguntava
sobre o significado do texto bíblico para o homem moderno. Já Bultmann dizia
que a linguagem dos autores bíblicos tinha deixado de ser compreensível. Era
uma linguagem mítica e o homem moderno tinha adquirido uma visão científica do
mundo. Era, pois, preciso retraduzir aquela linguagem nesta outra para que o
texto bíblico voltasse a ter sentido. Pela mesma via, mas em sentido contrário,
foram os trabalhos de Paul Ricoeur, para quem a linguagem simbólica da Sagrada
Escritura precisava ser reinterpretada, não, porém, substituída (GRECH, 2005,
p. 48-9).
O século XX foi profundamente frutuoso e
questionador no que se refere à interpretação bíblica: muitos métodos surgiram,
firmaram-se, foram superados e/ou redefiniram seus pressupostos e seus
objetivos com muitos manuais publicados na Europa e na América do Norte
(FITZMYER, 1994, p. 23-5). Na América Latina e Caribe a leitura da Bíblia está
vivendo um colorido de perspectivas (REIMER, 2006, p. 20). Durante as últimas
décadas, a leitura popular da Bíblia tem destacado a importância central dos
pobres dentro deste conjunto de textos, as preocupações emergentes como
pobreza, desemprego, desigualdades sociais, bem como as situações e os desafios
de ordem mundial (nova situação da mulher, novas tecnologias, busca da
superação de preconceitos raciais e religiosos), acabaram também condicionando
nova postura diante do texto bíblico, que é visto, cada vez mais, como
paradigma para a caminhada do povo de Deus. A leitura da Bíblia a partir dos
pobres e marginalizados, a leitura orante, eclesial, pastoral ecumênica e
também certa reserva em relação aos métodos que se preocupam com o texto
bíblico enquanto texto fez surgirem “novas formas de interpretar a Bíblia e
novas teologias” (BIBLIOGRAFIA BÍBLICA LATINO-AMERICANA, Vl 8, 1988-1995).
Podem-se destacar algumas barreiras para a
interpretação bíblica, contudo, estas são suficientes ao menos para demonstrar
o problema da sua interpretação e a consequente necessidade de uma Metodologia
de interpretação que ajude a transpor cada um destes obstáculos. Pois parece,
pela natureza intrínseca da própria Escritura, que sem a aquisição de
pré-requisitos históricos e literários, relacionados à formação da bíblia, não
será possível uma interpretação mais bem fundamentada. E é para a “solução”
desse problema hermenêutico que surge a Exegese como uma ferramenta
indispensável para uma melhor interpretação do texto bíblico.
A primeira barreira com a qual se depara
quando se pretende interpretar a Bíblia é a barreira histórica. Ou seja, a
Bíblia foi escrita ou formada em circunstâncias e épocas totalmente distantes e
diferentes da nossa realidade. A Bíblia é um livro histórico, nascido e configurado
dentro de matizes históricas específicas. Seu contexto histórico e
destinatários originais são muitas vezes desconhecidos quanto a sua natureza e
problemáticas peculiares. Em outras palavras, a Bíblia não foi do ponto de
vista histórico, escrita para nós hoje do século XXI. Há um grande abismo
histórico e cronológico entre nós e os antigos autores bíblicos. A Bíblia é
histórica, nasceu na história, pela história e para a história. Portanto, toda
leitura bíblica precisa ser uma leitura histórica. Se não se apreende a
cosmovisão, Weltanschauung, do período histórico em que a Bíblia nasceu e se
formou corre-se o risco de não compreendê-la de maneira refletida.
A segunda barreira que se depara é o que se
pode chamar de barreira sócio-cultural. Esta diz respeito ao mundo social,
econômico, político e religioso em que se formou a Bíblia. É sabido que a
Bíblia se originou na estrutura sócio[1]cultural do Antigo Oriente
Próximo, mais em particular na Sírio-Palestina, mas também nas regiões
circunstantes, como a Mesopotâmia e o Egito, como seu cenário geográfico
principal. As diferenças culturais entre Ocidente e Oriente são gigantescas.
Estando diante de uma literatura antiga emoldurada dentro de um contexto
judaico-helenista com suas mais ricas peculiaridades. A ignorância quanto às
estruturas sociais e culturais da época e ambiente onde nasceu a Bíblia torna
totalmente inviável qualquer aproximação à sua interpretação.
Tem-se ainda uma terceira barreira quando se
pretende interpretar a Bíblia. Trata-se da barreira linguística, ou seja, o
problema da linguagem peculiar da Bíblia. A Bíblia não foi escrita em nosso
idioma, mas em três línguas antigas, a saber, o Hebraico, o Aramaico, línguas
semitas, e o Grego, de outro ramo, o indo-europeu. Fato este que dificulta a
tradução, pois muitas vezes não há em nossa língua, palavras adequadas para
traduzir expressões específicas.
Para sanar essas barreiras, muitos métodos
surgiram e têm sido usados como ferramentas de interpretação de um texto
bíblico. Os mais importantes historicamente são o alegórico e o
histórico-gramatical, conhecido como método de análise literária (PENTECOST,
1998, p. 22-23). Esses dois podem ser utilizados mais facilmente, mas também
podem se tornar extremamente complexos e especializados. (continua…)
Almeida, Maria Aparecida de A., Funari, Pedro
Paulo A. Exegese Bíblica: Vantagens, Desvantagens Limites e Contribuições na
Interpretação Moderna da Bíblia.
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