Conhecendo as Doutrinas da
Bíblia
IV. A vida futura.
1. Ensino do Antigo Testamento.
Ao estudar-se o ensino do
Antigo Testamento concernente à vida futura, deve-se ter em mente que a
obra redentora de Cristo tem exercido grande efeito sobre a nossa relação
com a morte e a vida.
Cristo "aboliu a morte,
e trouxe à luz a vida e a incorrupção pelo Evangelho" (2Tim. 1:10). Cristo
trouxe plenitude de luz e absoluta confiança quanto à vida vindoura. Ele também
efetuou uma grande libertação dos santos do tempo do Antigo Testamento, que
estavam guardados no estado intermediário, libertação que lhes
proporcionou muito mais felicidade. Muito embora a revelação
vétero-testamentária não seja tão ampla quanto a do Novo Testamento,
concernente à vida apos a morte, encontramos ali a referida doutrina. A
doutrina do Antigo Testamento sobre a imortalidade baseia-se na relação entre o
homem e Deus. O homem, criado à imagem de Deus, é dotado de capacidade
para conhecer a Deus e com ele ter comunhão. Isso significa que o homem é mais
do que animal, e que sua existência ultrapassa os limites do tempo. Foi criado
para viver e não para morrer. Mas o pecado trouxe a morte ao mundo e,
assim, ao homem. A morte, no seu aspecto físico, é a separação do corpo da
alma. A morte, entretanto, não implica extinção da alma. O Antigo Testamento
consistentemente ensina que a personalidade do homem sobrevive a morte. O
corpo do homem era depositado na sepultura enquanto a alma ia para o lugar
denominado "Seol" (traduzido "inferno", "o poço",
e "a sepultura") a morada dos espíritos dos finados. Prova-se que
o "Seol" não era o céu pelo fato de ser descrito como estando
"em baixo" (Prov. 15:24), terra mais baixa (Ezeq. 32:18), e o
meio do inferno (desceram) (Ezeq. 32:21). Que não era um lugar de felicidade
suprema, prova-se pelas seguintes descrições: um lugar sem lembrança de
Deus (Sal. 6:5), de crueldade (Cant. de Salomão 8:6, Versão Brasileira),
lugar de dor (Jo 24:19 Versão Brasileira), lugar de tristeza (Sal. 18:5
Versão Brasileira), e era um lugar do qual aparentemente
ninguém voltava. Jo 7:9 (Versão Brasileira).*
O Seol, não desfrutando do brilho da pessoa de Cristo ressuscitado, é um
lugar sombrio que inspira receio, e, por conseguinte, alguns dos santos do
Antigo Testamento receavam ir para esse lugar como a criança receia entrar
num quarto escuro. (Vide o Sal. 88 e Isa. 38.) Seol era habitado tanto pelos
justos (Jo 14:13; Sal. 88:3; Gên. 37:34,35) como pelos ímpios (Prov. 5:3-5;
7:27; Jo 24:19; Sal. 31:17). Do caso do rico e Lázaro concluímos que havia duas
seções no Seol um lugar de sofrimento para os ímpios (Luc. 16:23,24) e outro
para os justos, um lugar de descanso e conforto (Luc. 16:25). Contudo, os
santos do Antigo Testamento não estavam sem esperança. O Santo de Deus, o
Messias, desceria ao Seol; o povo de Deus seria redimido do Seol. (Sal.
16:10; 49:15; Versão Brasileira.)
Essa profecia cumpriu-se
quando Cristo, após sua morte, desceu ao mundo inferior dos espíritos dos
finados (Mat 12:40; Luc. 23:42,43), e libertou do Seol os santos do Antigo
Testamento, levando-os consigo para o Paraíso celestial. (Efés. 4:8-10.)
Essa passagem parece indicar que houve uma mudança nesse mundo
dos espíritos, e que o lugar ocupado pelos justos que aguardam
a ressurreição foi trasladado para as regiões celestiais. (Efés. 4:8;
2Cor. 12:2.) Desde então, os espíritos dos justos sobem para o céu e os
espíritos dos ímpios descem para a condenação. (Apo. 20:13,14.) Outras
evidências do ensino do Antigo Testamento sobre a vida futura são as seguintes:
1) A frase "congregado
ao seu povo" (Gên. 25:8) ou "aos pais", usada por Abraão,
Moisés, Arão e Davi, deve referir-se à existência consciente após a morte
e ao sepultamento, pois esses homens não foram enterrados nos
túmulos ancestrais.
2) As trasladações de Enoque e
Elias provam com certeza a existência duma vida futura de felicidade na
presença de Deus.
3) As palavras de Cristo em
Mat. 22:32 representam meramente uma forte expressão da própria crença dos
judeus. De outra forma nenhuma influência teriam sobre os ouvintes.
4) A doutrina da
ressurreição dentre os mortos é claramente exposta no Antigo Testamento.
(Jo 19:26; Dan. 12:1,2.) 5) Quando Jacó disse: "Com choro hei de
descer ao meu filho até a sepultura" (literalmente "Seol", e assim
traduzida na Versão Brasileira) (Gên. 37:35), de maneira nenhuma ele se referia
à sepultura literal, pois ele supunha que o corpo de José fora devorado por
uma fera.
2. Ensino do Novo Testamento.
O Novo Testamento reconhece a
existência no além túmulo, na qual a vida espiritual continua sob novas e
melhores condições. Entrar nessa vida é o supremo alvo do homem. (Mar. 9:43.)
Aceitando o próprio Cristo, o crente já na vida presente passou da morte
para a vida. (João 3;36.) Isso, entretanto, é somente o princípio; sua plenitude
pertence à existência que começa com a "ressurreição da vida".
(João 5:29.) Existe uma vida vindoura (1Tim. 4:8); agora está oculta, mas se
manifestará quando Cristo, que é nossa vida, aparecer (Col. 3:4). Cristo
dará a coroa da vida prometida àqueles que o amam (Tia. 1:12). Mesmo o
estado dos que faleceram em Cristo é algo melhor do que a presente
vida nele (Fil. 1:21). Mas a plenitude de vida, qual terra da Promissão, e
o seu direito de primogenitura como filhos de Deus, serão revelados na vinda de
Cristo. (Rom. 8:17; Gál. 4:7.) A morte física não pode interromper a comunhão
entre o cristão e seu Senhor. "Eu sou a ressurreição e a vida; quem
crê em mim, ainda que esteja morto, viverá; e todo aquele que vive, e crê
em mim, nunca morrerá (João 11:25,26). Com essas palavras
Jesus assegurou a Marta e Maria que seu irmão não havia perecido,
mas estava seguro. Com efeito, Jesus dizia o seguinte: "Eu amava
vosso irmão e com ele tive doce comunhão. Compreendendo quem eu
sou, lembrando o meu poder, pensais que eu permitiria à
morte interromper essa comunhão, que para nós ambos era uma
grande delicia?" Existem muitos argumentos formais a favor da
imortalidade. Mais do que a lógica fria o que mais satisfaz é justamente saber
que estamos em comunhão com Deus e com o seu Cristo.
Vamos imaginar o caso dum
crente fiel que durante muitos anos gozou de preciosa comunhão com o Filho de
Deus, ouviu sua voz e sentiu sua presença. Agora que ele está prostrado no
leito de morte ouviremos então o Filho de Deus dizer-lhe: "Andamos
juntos, gozamos de doce comunhão, mas chegou a hora do eterno adeus"? Não,
assim não aconteceria! Aqueles que estão "em Cristo" (1Tess. 4:14-17)
não podem ser separados dele nem pela vida e nem pela morte (Rom. 8:38).
Para aquele que viveu conscientemente na presença de Cristo, ser separado
de Cristo pela morte é coisa impossível. Para aqueles que estão unidos ao
amor de Deus, é inconcebível separar-se desse amor para entrar num estado
do nada e desolação. Cristo diz a todos os crentes: "Está Lázaro, está
alguém, unido a mim? Ele confia em minha pessoa? Tudo que sou e todo o
poder que em mim reside operarão em sua vida. Teu irmão está unido a
mim pelos laços da confiança e do amor, e visto que eu sou a Ressurreição
e a Vida, esse poder operará nele."
V. O destino dos justos.
1. Natureza do céu.
Os justos são destinados à
vida eterna na presença de Deus. Deus criou o homem para ser ele conhecido
pelo homem, amado e servido por ele no presente mundo, como também gozar
eternamente de sua presença no mundo vindouro.
O cristão durante a sua vida
terrestre experimenta pela fé a presença do Deus invisível, mas na vida
vindoura essa experiência da fé tornar-se-á um fato consumado. Ele verá a Deus
face a face, terá a experiência que alguns teólogos chamam a "Visão
Beatifica".
O céu descreve-se por vários
títulos:
1) Paraíso
(literalmente, jardim), lembrando-nos a felicidade e o contentamento dos
nossos primeiros pais ao participarem de comunhão e conversação com
o Senhor Deus. (Apo. 2:7; 2Cor. 12:4)
2) "Casa de meu
Pai", com suas muitas mansões (João 14:2) expondo o conforto, descanso e
comunhão do lar.
3) O país celestial, a
caminho do qual estamos viajando, como Israel naquele tempo se destinava a
Canaã, a Terra da Promissão. (Heb. 11:13-16.)
4) Uma cidade, sugerindo a
idéia duma sociedade organizada. (Heb. 11:10; Apo. 21:2.) Devemos distinguir as
seguintes três fases na condição dos cristãos que partiram desta vida:
primeira, existe um estado intermediário de descanso enquanto aguardam a
ressurreição; segunda, depois da ressurreição segue-se o juízo sobre as
obras (2Cor. 5:10; 1Cor. 3:10-15); terceira, ao fim do Milênio descerá do
céu a Nova Jerusalém, o lar final dos remidos (Apoc. 21). A Nova Jerusalém
descerá do céu, faz parte do céu, e, portanto, é o céu no pleno sentido da
palavra. Sempre que Deus se revela pela sua presença pessoal e glória
celeste, ai é céu, e dessa maneira podemos descrever a Nova Jerusalém.
(Apo. 22:3,4.) Por que desce essa cidade do céu? O propósito final de Deus
é trazer o céu à terra. (Vide Deut. 11:21.) Ele tornará "a
congregar em Cristo todas as coisas, na dispensação da plenitude
dos tempos, tanto as que estão nos céus como as que estão na terra"
(Efés. 1:10); então Deus será "tudo em todos" (1Cor. 15:28).
Embora a Nova Jerusalém não
chegue até a terra, ela será visível aos moradores terrestres, pois
"as nações andarão à sua luz" (Apo. 21:24).
2. Necessidade do céu.
O estudo das religiões revela
o fato de que a alma humana instintivamente crê que existe céu. Esse instinto
foi implantado no coração do homem pelo próprio Deus, o Criador dos
instintos humanos. Os argumentos que provam a existência da vida futura
não são formulados principalmente para que os homens acreditem nessa vida,
mas porque os homens já acreditam, e desejam trazer a inteligência sujeita às
mais profundas instituições do coração.
Também o céu é essencial às
exigências da justiça. Os sofrimentos dos justos sobre a terra e a
prosperidade dos ímpios exigem um estado futuro no qual se faça plena
justiça. A Bíblia ensina que tal lugar existe. Platão, o mais sábio dos
gregos, opinou que a vida futura era uma probabilidade, e aconselhou
os homens a colherem as melhores opiniões a respeito, e a
embarcar nelas como que numa balsa, e navegar perigosamente os mares
da vida, "a não ser que com mais segurança pudesse achar um
navio melhor, ou uma palavra divina". Essa palavra divina que os
sábios desejaram são as Escrituras Sagradas, nas quais se ensina a existência
da vida futura, não como opinião ou teoria, mas como fato absoluto.
3. As bênçãos do céu.
(a) Luz e beleza. (Apo.
21:23; 2:5.) A melhor linguagem humana é inadequada para descrever as
gloriosas realidades da vida futura. Nos caps. 21 e 22 do Apocalipse o Espírito
emprega linguagem que nos ajuda a compreender algo das belezas do outro mundo.
A toupeira que vive no buraco na terra não pode compreender como é a vida
da águia que se eleva acima das altas montanhas. Vamos imaginar um mineiro
que nascesse em uma mina 500 metros abaixo da superfície e que ai passasse
todos os seus dias, sem nunca ter visto a superfície da terra. Como seria
difícil tentar descrever-lhe as delicias visuais de verdes árvores, campos
floridos, rios, pomares, picos de montanhas, e o céu estrelado. Ele nada
disso apreciaria, pois seus olhos não viram, seus ouvidos não
ouviram e não entrou em seu coração o conhecimento dessas coisas.
(b) Plenitude de
conhecimento, (1Cor. 13:12.) O sentimento expresso pelo sábio Sócrates ao
dizer: "Uma coisa sei, é que nada sei", tem sido repetido pelos
sábios daquele tempo. O homem está rodeado dos mistérios e anseia pela
sabedoria. No céu esse anseio será satisfeito absolutamente; os mistérios
do universo serão desvendados; problemas teológicos
difíceis desvanecerão. Então gozaremos de melhor qualidade de conhecimento,
o conhecimento de Deus.
(c) Descanso. (Apo. 14:13;
21:4.) Pode-se formar certa concepção do céu contrastando-o com as desvantagens
da vida presente. Pense em tudo que neste mundo provoca: fadiga, dor, luta
e tristeza, e considere que no céu essas coisas não nos perturbarão.
(d) Servir. Existem pessoas
acostumadas a uma vida muito ativa que não se interessam pelo céu,
pensando que o céu seja lugar de inatividade, onde seres etéreos passem o
tempo tocando harpa. Essa, porém, não é uma concepção exata. É verdade que os redimidos
tocarão harpas, pois o céu é lugar de música. "Haverá trabalho a fazer
também. "... Estão diante do trono de Deus, e o servem de dia e de
noite no seu templo." "(Apo. 7:15); "... e os seus servos o
servirão"... (Apo. 22:3). Aquele que colocou o homem no primeiro
paraíso, com instruções sobre como cuidar dele, certamente não deixará o
homem sem ter o que fazer no segundo paraíso.
(e) Gozo. (Apo. 21:4.) O
maior prazer experimentado neste mundo, mesmo que ampliado um milhão de vezes,
ainda não expressaria o gozo que espera os filhos de Deus nesse reino. Se
um poderoso rei, possuidor de ilimitadas riquezas, quisesse construir
um palácio para sua noiva, esse palácio seria tudo quanto a arte e os
recursos pudessem prover. Deus ama seus filhos infinitamente mais que
qualquer ser humano. Possuindo recursos inexauríveis, ele pode fazer um lar
cuja beleza ultrapasse tudo quanto a arte e imaginação humanas
poderiam conceber. "Vou preparar-vos lugar."
(f) Estabilidade. O gozo do
céu será eterno. De fato, a permanência é uma das necessidades para que a
felicidade seja perfeita. Por muito gloriosas que sejam a beleza e a
felicidade celestiais, saber que essas coisas acabariam já é suficiente
para que o gozo perca sua perfeição. Lembrar-se de que inevitavelmente
tudo findará , seria um empecilho ao gozo perfeito. Todos desejam o estado
permanente: saúde permanente, paz permanente e prosperidade permanente. A
instabilidade e insegurança são temidas por todos. Mas a felicidade no céu
é justamente a divina promessa de que o seu gozo nunca há de terminar
nem diminuir de intensidade.
(g) Gozos Sociais. (Heb.
12:22, 23; 1Tess. 4:13-18) Por natureza, o homem é um ser social. O homem
solitário é anormal. Se na vida presente os gozos sociais proporcionam tanta
felicidade, como não será muito mais gloriosa a amável comunhão social
no céu. Nas relações humanas, mesmo as pessoas mais chegadas a nós têm
suas faltas e características que destroem a sua personalidade. No céu os
amigos e parentes não terão faltas. Os gozos sociais nesta vida fazem-se
acompanhar de desapontamento. Muitas vezes os próprios familiares nos causam
grandes tristezas; as amizades acabam e o amor desvanece. Mas no céu
não haverá os mal-entendidos e nenhuma rixa; tudo será bom e belo,
sem sombra e sem defeito, cheio de sabedoria celestial e resplandecente
com a glória de Deus.
(h) Comunhão com Cristo.
(João 14:3; 2Cor. 5:8; Fil. 1:23.) "Ao qual, não o havendo visto, amais;
no qual, não o vendo agora, mas crendo, vos alegrais com gozo inefável e
glorioso" (1Ped. 1:8). Naquele dia seremos como ele é; os nossos corpos
serão como o seu glorioso corpo; nós o veremos face a face; aquele que
pastoreou o seu povo no vale das lágrimas, no céu conduzirá esse povo de
gozo em gozo, de glória em glória, e de revelação em revelação.
* Em todas essas referências,
deve o leitor fazer o confronto das versões de Almeida e Brasileira. (Nota
do Tradutor).
Myer Pearlman
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