quinta-feira, 7 de março de 2024

CPAD : O CORPO DE CRISTO | Lição 10: A Ceia do Senhor – A Segunda Ordenança da Igreja

 


TEXTO AUREO

“Porque, todas as vezes que comerdes este pão e beberdes este cálice, anunciais a morte do Senhor, até que venha.”

(1 Co 11.26)

VERDADE PRÁTICA

A Ceia do Senhor, como uma ordenança, celebra a comunhão do crente com o Senhor ressuscitado.

LEITURA BÍBLICA EM CLASSE

1 Corintios 11.17-34
17- Nisto, porém, que vou dizer-vos, não vos louvo, porquanto vos ajuntais, não para melhor, senão para pior.
18- Porque, antes de tudo, ouço que, quando vos ajuntais na igreja, há entre vás dissensões: e em parte 0 creio.

19- E até importa que haja entre vós heresias, para que os que são sinceros se manifestem entre vás.
20- De sorte que, quando vos ajuntais num lugar, não é para comer a Ceia do Senhor.
21- Porque, comendo, cada um toma antecipadamente a sua própria ceia; e assim um tem fome, e outro embriaga-se.
22- Não tendes, porventura, casas para comer e para beber? Ou desprezais a igreja de Deus e envergonhais os que nada têm? Que vos direi? Louvar-vos-ei? Nisso não vos louvo

23- Porque eu recebi do Senhor o que também vos ensinei: que o Senhor Jesus, na noite em que foi traído, tomou o pão;
24- e, tendo dado graças, o partiu e disse: Tomai, comei; isto é o meu corpo que é partido por vós; fazei isto em memória de mim.
25-Semelhantemente também, depois de cear, tomou o cálice, dizendo: Este cálice é o Novo Testamento no meu sangue; fazei isto, todas as vezes que beberdes, em memória de mim.

26- Porque, todas as vezes que comerdes este pão e beberdes este cálice, anunciais a morte do Senhor, até que venha.
27- Portanto, qualquer que comer este pão ou beber o cálice do Senhor, indignamente, será culpado do corpo e do sangue do Senhor.
28- Examine-se, pois, o homem a si mesmo, e assim coma deste pão, e beba deste cálice.
29 – Porque o que come e bebe indignamente come e bebe para sua própria condenação, não discernindo o corpo do Senhor.
30- Por causa disso, há entre vós muitos fracos e doentes e muitos que dormem.

31- Porque, se nós nos julgássemos a nós mesmos, não seríamos julgados.
32- Mas, quando somos julgados, somos repreendidos pelo Senhor, para não sermos condenados com o mundo. 33- Portanto, meus irmãos, quando vos ajuntais para comer, esperai uns pelos outros.
34- Mas, se algum tiver fome, coma em casa, para que vos não ajunteis para condenação. Quanto às demais coisas, ordená-las-ei quando for ter convosco.

PLANO DE AULA

1- INTRODUÇÃO
A Ceia do Senhor é outra importante ordenança prática da Igreja de Cristo. E um rito que foi instituído pelo próprio Senhor Jesus e perpassou toda a Igreja até a atualidade. Ao longo dos séculos, essa celebração também tem sido uma identidade da Igreja. Nesta lição, procuraremos compreender o propósito bem como a forma da Ceia do Senhor de acordo com Bíblias Por isso, faremos шпа exposição da doutrina biblica da Ceia do Senhor e também consideraremos suas implicações históricas.
2- APRESENTAÇÃO DA LIÇÃO
A) Objetivos da lição:
I) Apresentar
a natureza da Ceia do Senhor na Tradição Cristã
II) Mostrar o propósito da Ceia do Senhor
III) Refletir a respeito do modo de celebração da Ceia do Senhor
B) Motivação A Cela do Senhor traz uma perspectiva passada, pois nos remete ao perdão dos pecados e à obra salvífica de Jesus Cristo: ela traz uma perspectiva presente, pois realça a nossa comunhão com Cristo com sua igreja e, finalmente, aponta para o futuro esperançosamente, pois somos lembrados da promessa da vinda de Cristo.
C) Sugestão de Método. Para introduzir o segundo tópico desta lição, sugerimos que você leia atentamente a seção Motivação e o segundo subsidio com o titulo ‘A Tríplice Lembrança da Ceia do Senhor Em seguida, antes de expor o segundo tópico, pergunte a classe a respeito do símbolo da Ceia do Senhor, o que os alunos pensam a respeito do seu significado. Após ouvir as respostas, exponha o tópico e aprofunde a perspectiva da tríplice lembrança da Ceia do Senhor de acordo com a leitura que você já fez na seção “Motivação” e o “segundo auxilio.
3- CONCLUSÃO DA LIÇÃO
A) Aplicação: Leve o (a) aluno(a) a refletir a respeito do valor do privilégio de participar da celebração da Ceia do Senhor. De acordo com a natureza, os símbolos e propósito dessa grande celebração cristã, mostre o quanto a Cela do Senhor tem um significado espiritual para a nossa fé.
4- SUBSIDIO AO PROFESSOR
A) Revista Ensinador Cristã. Vale a pena conhecer essa revista que traz reportagens, artigos, entrevistas e subsídios de apoio à Lições Bíblicas Adultos. Na edição 96, p. 41, você encontrará um subsidio especial para esta lição
B) Auxílios Especiais. Ao final do tópico, você encontrará auxílios que darão suporte na preparação de sua aula:
1) O texto “A Ordenança da Ceia do Senhor”, localizado depois do primeiro tópico, aprofunda a compreensão da Ceia do Senhor como uma ordenança de Cristo
2) O texto ” Tríplice Sentido da Ceia do Senhor”, ao final do segundo tópico, amplia a reflexão a respeito do propósito da Ceia do Senhor.

INTRODUÇÃO

Assim como a Batismo em águas, a Ceia do Senhor também é uma ordenança dada por Jesus à sua Igreja. Ao longo da história, a Igreja tem a Ceia do Senhor como uma das celebrações mais significativas. Nesse sentido, o cristão pode contemplar a Cela sob três perspectivas:
Primeira, um olhar para trás, quando contempla Cristo entregando-se em sacrifício vicário na cruz, segunda, um olhar para o presente, quando vê sua real condição diante de Deus e como foi alcançado pela graça de Deus; terceira, um olhar para o futuro, quando mantém sua expectativa e esperança na Segunda Vinda de Cristo. Nesse sentido, a Ceia do Senhor é uma cerimônia que deve ser celebrada com reverência, júbilo e expectativa.

Palavra chave:

Comunhão

AUXILIO TEOLÓGICO

A ORDENANÇA DA CEIA DO SENHOR
A segunda ordenança da Igreja é a Santa Ceia ou Santa Comunhão. Assim como o batismo, esta ordenança tem feito parte do culto cristão desde o ministério terrestre de Cristo, quando Ele próprio instituiu o rito na refeição da Páscoa, na noite em que foi traído. A Ceia do Senhor tem alguns paralelos em outras tradições religiosas (tais como a Páscoa judaica: outras religiões antigas também se valiam de refeições sacramentais para se identificar com suas deidades), mas ela vai muito além quanto ao seu significado e importância. Seguindo as instruções dadas por Jesus, os cristãos participam da Comunhão em ‘memória’ dEle (Lc 22.19,20; 1 Co 11.24,25). O termo traduzido por lembrança (gr. ananınésis) talvez não signifique exatamente o que o leitor está imaginando. Hoje, lembrar-se de alguma coisa é pensar numa ocasião passada. O modo neotestamentários de entender anamnesis é exatamente o inverso significava transportar uma ação enterrada no passado, de tal maneira que não se percam a sua potência e a vitalidade originais, mas sejam trazidas para a momento presente Semelhante conceito é refletido até mesmo no Antigo Testamento (DI 16.3; 1 Rs 17.18) (HORTON, Stanley. Teologia Sistemática: Uma Perspectiva Pentecostal 1. ed. Rio de Janeiro CPAD. 2023, pp. 573-74).

AUXÍLIO TEOLÓGICO

O TRÍPLICE SENTIDO DA LEMBRANÇA DA CEIA DO SENHOR
Na Ceia do Senhor, talvez possamos sugerir um tríplice sentido de lembrança passado, presente e futuro. A Igreja se reúne como um só corpo à mesa do Senhor, relembrando a sua morte. Os próprios elementos usados de modo simbólico па Comunhão representam o derradeiro sacrifício de Cristo, no qual Ele entregou seu corpo e sangue para redimir os pecados do mundo. Existe ainda um sentido bem presente, o convívio espiritual com Cristo à sua mesa. A Igreja vem proclamar não um herói morto, mas um Salvador ressuscitado e vencedor. A expressão “mesa do Senhor” sugere estar Ele presente como o verdadeiro anfitrião, aquele que transmite o sentido de terem os crentes, nEle, segurança e paz (ver SI 23.5). Finalmente, há um sentido futuro neste relembrar, sendo que a comunhão da qual o crente agora participa com o Senhor não é o ponto final. Neste sentido, a Ceia do Senhor tem uma dimensão escatológica. Ao participarmos dela, antecipamos a alegria pela sua segunda vinda e pela reunião da Igreja com Ele para toda a eternidade (Mc 14.25; 1 Co 11.26)” (HORTON, Stanley. Teologia Sistemática. Uma Perspectiva Pentecostal Led. Rio de Janeiro CPAD, 2023, p.573-77).

CONCLUSÃO

Nesta lição, sob diferentes perspectivas, vimos alguns aspectos que revelam o sentido e propósito da Ceia do Senhor. Não é um sacramento, que de forma mágica concede graça aos que dela participam nem tampouco uma vacina para dar comunhão a quem não tem. Na verdade, o direito de celebrar essa importante ordenança é o resultado da graça que foi concedida a cada crente. É necessário ter esse discernimento quando se participa desse rito cristão. Trata, pois, de um ato que não pode ser celebrado de qualquer jeito ou maneira, nem tampouco por quem vive deliberadamente em pecado.

  CPAD : O CORPO DE CRISTO – Origem, Natureza e Missão da Igreja no Mundo

 | Lição 10: A Ceia do Senhor – A Segunda Ordenança da Igreja

 


  Nisto, porém, que vou dizer-vos, não vos louvo, porquanto vos ajuntais, não para melhor, senão para pior. Porque, antes de tudo, ouço que, quando vos ajuntais na igreja, há entre vós dissensões; e em parte o creio. E até importa que haja entre vós heresias, para que os que são sinceros se manifestem entre vós. De sorte que, quando vos ajuntais num lugar, não é para comer a Ceia do Senhor. Porque, comendo, cada um toma antecipadamente a sua própria ceia; e assim um tem fome, e outro embriaga-se. Não tendes, porventura, casas para comer e para beber? Ou desprezais a igreja de Deus e envergonhais os que nada têm? Que vos direi? Louvar-vos-ei? Nisso não vos louvo. Porque eu recebi do Senhor o que também vos ensinei: que o Senhor Jesus, na noite em que foi traído, tomou o pão; e, tendo dado graças, o partiu e disse: Tomai, comei; isto é o meu corpo que é partido por vós; fazei isto em memória de mim. Semelhantemente também, depois de cear, tomou o cálice, dizendo: Este cálice é o Novo Testamento no meu sangue; fazei isto, todas as vezes que beberdes, em memória de mim. Porque, todas as vezes que comerdes este pão e beberdes este cálice, anunciais a morte do Senhor, até que venha. Portanto, qualquer que comer este pão ou beber o cálice do Senhor, indignamente, será culpado do corpo e do sangue do Senhor. Examine-se, pois, o homem a si mesmo, e assim coma deste pão, e beba deste cálice. Porque o que come e bebe indignamente come e bebe para sua própria condenação, não discernindo o corpo do Senhor.

   Por causa disso, há entre vós muitos fracos e doentes e muitos que dormem. Porque, se nós nos julgássemos a nós mesmos, não seria- mos julgados. Mas, quando somos julgados, somos repreendidos pelo Senhor, para não sermos condenados com o mundo. Portanto, meus irmãos, quando vos ajuntais para comer, esperai uns pelos outros. Mas, se algum tiver fome, coma em casa, para que vos não ajunteis para condenação. Quanto às demais coisas, ordená-las-ei quando for ter convosco". (1 Co 11.17-34)

   Assim como o batismo em águas, a Ceia do Senhor também é uma ordenança de Cristo à igreja. Não é um sacramento conforme entende o catolicismo e alguns segmentos do protestantismo histórico. Isso significa dizer que a Ceia do Senhor não se reveste de "poderes må- gicos capazes de conferir beneficio espiritual independentemente da condição espiritual de quem participa dela. Nesse aspecto, a Ceia não pode ser vista como uma "vacina" que o cristão toma regularmente para provar que é um membro ativo da igreja. Em outras palavras, a Ceia não é para dar comunhão a quem não está em comunhão, mas para celebrar a comunhão de quem tem comunhão. Por outro lado, ela não é um rito vazio de significado que deve ser praticado somente porque se trata de uma ordem dada à igreja por Jesus. A Ceia, assim como o batismo em águas, é um símbolo visível que ex- pressa uma realidade espiritual invisível. É, portanto, a celebração de nossa comunhão com o Cristo vivo. Dessa forma, ela não pode ser vista simplesmente como um rito opcional que pode ser praticado ou não. Nela, Cristo não se encontra fisicamente presente, contudo, espiritualmente, sim.

1. Páscoa versus Ceia

  O real sentido da última Ceia celebrada por Jesus narrada em Lucas 22.19,20 só é totalmente compreendida quando analisada à luz da Páscoa judaica (hb. Pessach). Essa festa, que era uma das mais grandiosas do antigo judaísmo, era celebrada pelos judeus como o "tempo da sua liberdade". Era, sem dúvida, o mais querido de todos os dias santificados pelos judeus. O sentido simbólico desse rito está associado com a ideia de liberdade conforme expressado no livro de Êxodo capítulo 12.

  A Páscoa judaica era apenas um tipo do qual Jesus era o antitipo. Paulo disse isso quando escreveu: "Cristo, nossa páscoa, foi sacrificado por nós" (1 Co 5.7). O escritor Gerard Van Groningen (1921-2014) destaca que:

  O cordeiro da Páscoa, em si mesmo, tem significação messiânica como tipo. Seu caráter e qualidade tinha de ser sem mancha ou defeito. Nenhuma das evidências dos efeitos ruinosos do pecado e seus resultados poderia estar presente. O próprio cordeiro tinha de ser perfeito para ser aceitável a Yahweh como um substituto para o povo oprimido a sofrer sobre o cativeiro egípcio. Ele tinha de ser completamente consumido, sem que seus ossos fossem quebrados, para indicar a extrema necessidade de uma total libertação e integral submissão a este requisito.

  Ainda de acordo com Groningen, o cordeiro da Páscoa também possuía um aspecto escatológico definido. Ele devia ser morto não somente no tempo do êxodo, mas também anualmente. Yahweh, falando por meio de Moisés, ordenou que o cordeiro da Páscoa fosse selecionado, morto e consumido a cada ano (Ex 12.14) em cada família. Assim, as familias deveriam considerar, retrospectivamente, a sua libertação. Isso, por sua vez, falava prospectivamente de uma liberta- ção plena, total, que viria por meio de um Cordeiro Pascal cuja morte sacrificial, uma vez cumprida na história, traria completa redenção e, portanto, tornaria desnecessário qualquer novo derramamento de sangue do cordeiro pascal.

  Quando Jesus pediu aos seus discípulos que preparassem a Páscoa, não há dúvida de que Ele tinha em mente esses fatos. Não devemos, contudo, confundir essas duas cerimônias como se fossem uma coisa só. Gregg Alisson chama a atenção para esse importante fato quando escreve:

  O que Jesus estava instituindo ao se reunir com seus discípulos na celebração da Páscoa na Última Ceia? A igreja a chama de "ceia do Senhor". Não é a mesma coisa que a Páscoa judaica; embora a ceia do Senhor tenha sido instituída durante uma celebração da Páscoa dos judeus, ia surpreendentemente além da Páscoa. Em contrapartida, a ceia do Senhor não é a mesma coisa que a Última Ceia.    Antes, a ceia do Senhor foi instituída por Jesus como rito contínuo que a Igreja deve observar entre a primeira e a segunda vindas de Cristo, na expectativa de sua volta. Essa celebração apresenta elementos simbólicos: o pão partido, um cálice de vinho e a distribuição de ambos os elementos para a igreja. Essas ações retratam vividamente o corpo partido de Cristo e o seu sangue derramado seu sacrificio substitutivo em favor de pecadores, por meio do qual experimentam o perdão dos pecados e a apropriação pela igreja da obra salvífica de Cristo. A Igreja observa a Ceia do Senhor em memória da morte sacrificial de Jesus na cruz do Calvário e do seu sangue que ratificou o relacionamento de nova aliança da igreja com Deus.

 2. Paulo e a Ceia do Senhor

  O propósito de Paulo quando deu instruções sobre a Ceia do Senhor à igreja de Corinto foi corrigir alguns abusos que estavam acontecendo durante a celebração. O contexto é bastante claro em dizer que havia individualismo, egoísmo e até mesmo quem se em- briagasse durante a cerimônia. Os coríntios não estavam discernindo o propósito da Ceia, pois participavam como se estivessem participando de uma refeição qualquer. O escritor Warren Wiersbe (1919-2019) observa que o cristão deve olhar em quatro direções ao participar da Ceia. Em primeiro lugar, ele deve olhar para trás. Esse olhar é o que nos fará lembrar o motivo da morte de Jesus carregar nossos pecados. Lembrará também que Ele morreu de forma voluntária, demonstrando, assim, o seu amor por nós. Em segundo lugar, o crente deve olhar para frente. Fazendo isso, ele lembrará o sacrifício do Senhor "até que ele venha". Trata-se de um olhar escatológico, rumo ao futuro da igreja. Em terceiro lugar, o crente deve olhar ao seu redor. Esse olhar fará com que ele enxergue o outro e não seja um egoista espiritual. De fato, esse é o verdadeiro propósito da Ceia, que é celebrar uma festa em família. Em quarto lugar, o cristão deve olhar para dentro. Esse olhar para dentro fará com que se examine a si mesmo: "Examine-se, pois, o homem a si mesmo" (1 Co 11.28).

  Ao fazer esse olhar introspectivo, o crente deve ter o cuidado para não se abster desnecessariamente da Ceia do Senhor. Muitos crentes deixam de participar da Ceia por motivos banais. Essa não é a atitude correta. Na verdade, o que tem levado muitos crentes a proceder dessa forma é a má interpretação feita das instruções dadas pelo apóstolo em 1 Coríntios 11.29: "Porque o que come e bebe indignamente come e bebe para sua própria condenação, não discernindo o corpo do Se- nhor". No livro de minha autoria Defendendo o Verdadeiro Evangelho, fiz uma exegese desse texto à luz do texto grego. Mostrei que a palavra grega anaksiós, traduzida em português como "indignamente", é um advérbio, e não um adjetivo. Como sabemos, os advérbios indicam "modo" ou "maneira", enquanto os adjetivos indicam "estado" ou "qualidade". Se Paulo tivesse usado o adjetivo "indigno" (anaksiós) no lugar do advérbio "indignamente" (anaksiôs), então ninguém, de fato, poderia participar da Ceia do Senhor, pois ninguém é ou será digno. A salvação é pela graça, e não por meio de nosso mérito ou dignidade. Da mesma forma, a participação da Ceia do Senhor por parte dos crentes também é uma manifestação da graça de Deus.

  Voltando ao texto, o advérbio "indignamente" (anaksiós) mostra que Paulo referia-se ao modo irreverente dos corintios ao celebrarem a Ceia do Senhor, isto é, enquanto alguns se embriagavam durante a reunião, outros comiam demais, além do fato de não esperarem uns pelos outros. Essa maneira de celebrar a Ceia do Senhor não estava correta e precisava da correção por parte do apóstolo. Os escritores Guy P. Duffield e Nathaniel M. Van Cleave dizem isso com outras palavras:

  Há necessidade de uma explicação sobre a advertência contra "comer ou beber indignamente" (1 Co 11.27-29). Muitos crentes, por não entenderem bem essas advertências, abstiveram-se desnecessariamente da Ceia do Senhor. Deve ser notado que "indignamente" é um advérbio que modifica os verbos "comer" e "beber", e está ligado à "maneira" de participar, e não à in- dignidade das pessoas. A advertência referia-se à atitude ávida e descontrolada dos coríntios, descrita em 1 Coríntios 11.20-22. Ninguém é digno, por si mesmo, de ter comunhão com Jesus, mas possuímos esse privilégio em virtude da obra expiatória que os elementos simbolizam. Todavia, os participantes precisam examinar a si mesmos com relação ao modo como tomam a ceia e à sua atitude para com os outros crentes; além disso, devem verificar se estão discernindo o corpo do Senhor, sem demonstrar irreverência ou frivolidade em suas maneiras. A participação com fé pode resultar em grandes bênçãos e até na cura espiritual e física (1 Co 11.29,30).

   Biblicamente, portanto, a Ceia do Senhor é uma cerimônia de que devemos participar com discernimento. Se, por um lado, os elementos não se convertem literalmente no corpo e no sangue de Jesus, conforme afirma o ritual católico, por outro lado, a Ceia do Senhor não pode ter o seu verdadeiro sentido esvaziado que é a presença espiritual de Jesus. Os extremos são perigosos. No século XIII, por exemplo, o ritual católico concernente à eucaristia foi alterado radicalmente quando só o pão passou a ser entregue aos leigos, mas não o vinho. Havia o medo de o vinho - no caso, o "sangue real" de Jesus - ser derramado durante a cerimônia e, dessa forma, ser profanado.

  Alisson destaca que

  A partir do século 13, a Igreja Católica começou a entregar aos leigos o pão, mas não o cálice. Essa prática era justificada teologicamente pela doutrina da concomitância, explicada por Boaventura: "Uma vez que o bendito e glorioso corpo de Cristo não pode ser dividido em suas partes e não pode ser separado da alma nem da mais sublime divindade, assim em cada ele- mento está o Cristo todo, inteiro e indivisível, a saber, o corpo, a alma e Deus. Portanto, em cada um está presente o único e mais simples sacramento que contém todo o Cristo. E, uma vez que cada parte dos elementos representa o corpo de Cristo, todo o corpo está presente em todos os elementos e está em cada parte dele, quer inteiro, quer separado" (Bonaventura, Breviloquium, 6.9 [5], in: E. E. Nemmers, Breviloquium of St. Bonaventura [St. Louis: B. Herder, 1946), p. 199-200). Portanto, se os leigos recebem somente um dos elementos, ainda assim recebem todo o Cristo. De modo prático, essa mudança foi instituída em virtude de uma preocupação com a profanação do sagrado sacramento. A igreja temia que servir o cálice repetidamente levaria parte do vinho (e da água) a serem derramados; com isso, o sangue de Cristo seria profanado. Para evitar que isso acontecesse, a igreja restringia a participação do cálice ao padre que celebrava a missa. Essa foi chamada comunhão em uma espécie, pois apenas um elemento, o pão, era dado aos leigos durante a missa.

  Por outro lado, para esse extremo ser evitado, acaba sendo criado outro o de destituir a Ceia de qualquer significado e relevância. Sobre isso, o teólogo Millard Ericson advertiu:

  Por zelo, para evitar a ideia de que Jesus está presente de algum modo mágico, alguns, por vezes, foram a extremos a ponto de dar a impressão de que o lugar em que Jesus mais certamente não está presente é na Ceia do Senhor."

Portanto, para evitar a doutrina católica da presença real de Jesus, alguns protestantes criaram a doutrina da "ausência total" de Jesus na Ceia. É um equívoco que deve ser terminantemente evitado.

  Participantes da Ceia

  Aqui cabe a pergunta: quem deve participar da Ceia do Senhor? Há três posicionamentos que resumiremos aqui.

  1. Comunhão fechada. Essa posição defende que a Ceia deve ser servida somente a membros batizados e em dia com as suas obrigações em determinada igreja local. Isso significa que des. crentes, crentes não batizados e crentes que estão cumprindo algum processo disciplinar são excluídos da Ceia.

2. Comunhão aberta. Essa posição defende que todos os cristãos autênticos, quer sejam batizados, quer não; quer sejam membros de outra igreja diferente daquela que ministra a Ceia; quer estejam em dia ou não com as suas obrigações com a igreja local podem participar da Ceia.

3. Comunhão próxima. Essa posição afirma que a Ceia deve ser ministrada a quem for batizado e está em dia com as suas obrigações na sua respectiva igreja. Contudo, contrariamente à comunhão fechada, a Ceia não é restrita apenas à igreja que a ministra. Membros de outras igrejas podem participar. Assim, não é necessário, portanto, que o que participa seja membro da igreja que está servindo a Ceia. Contudo, contrariamente à comunhão aberta, exige que o que participa da Ceia seja batizado. É, portanto, um meio-termo entre as duas primeiras posições.

  Os argumentos em favor da comunhão fechada podem ser resumidos assim:

4. Jesus mandou, em primeiro lugar, pregar o evangelho e batizar os convertidos (Mt 28.18-20).

5. No livro de Atos, os crentes eram, a princípio, batizados e, só depois disso, participavam da Ceia do Senhor.

  Ouvindo eles isto, compungiram-se em seu coração e perguntaram a Pedro e aos demais apóstolos: Que faremos, varões irmãos? E disse-lhes Pedro: Arrependei-vos, e cada um de vós seja batizado em nome de Jesus Cristo para perdão dos pecados, e recebereis o dom do Espirito Santo. Porque a promessa vos diz respeito a vós a vossos filhos e a todos os que estão longe: a tantos quantos Deus nosso Senhor, chamar. E com muitas outras palavras isto testificava e os exortava, dizendo: Salvai-vos desta geração perversa.

    De sorte que foram batizados os que de bom grado receberam a sua palavra; e, naquele dia, agregaram-se quase três mil almas. E perseveravam na doutrina dos apóstolos, e na comunhão, e no partir do pão, e nas orações. (At 2.37-42)

  Esse relato mostra sem sombras de dúvidas que as pessoas, em primeiro lugar, convertiam-se; eram batizadas em águas e depois participavam da Ceia do Senhor, denominada aqui de "partir do pão".

6. Essa é a prática seguida pela igreja também na Patristica."

Não há como minimizar o valor que a Ceia tem para a igreja. A sua importância está no fato de que foi uma das ordenanças deixadas por Jesus para a sua igreja. Contudo, como ficou demonstrado, ela não é um sacramento capaz de conferir graça a quem dela participa independentemente da sua condição espiritual. Assim, a Ceia deve ser celebrada por quem está em comunhão, e não para dar comunhão a quem não tem. Quando praticada com o devido discernimento exigido pelas Escrituras, a Ceia é uma bênção para o cristão, uma vez que ela rememora o sacrificio de Jesus.

   O CORPO DE CRISTO – Origem, Natureza e Missão da Igreja no Mundo

 


 


















Nenhum comentário:

Postar um comentário