Agradecimentos
Sou grato
a Deus que, em Cristo Jesus, meu Senhor, deu-me o privilégio de escrever mais
este livro. Sem a sua rica e abundante graça, eu não o faria. Sou grato a minha
esposa, Maria Regina, pelo amor, sugestões e apoio no processo de produção
deste livro. Sou grato à Casa Publicadora das Assembleias de Deus (CPAD) por
abrir-me as portas para a produção literária. Já são mais de 20 anos de
parceria desde meu primeiro texto escrito. Sou grato à Assembleia de Deus de
Água Branca, que pastoreio desde 2012, pelo apoio dado. A Deus toda honra e glória.
Prefácio
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T |
oda instituição tem um começo e uma história, e com a Igreja de Jesus não foi diferente. Após o seu sacrificio, ressurreição e retorno aos céus, Ele enviou o seu Santo Espírito para edificar a sua Igreja, formada pelos seus apóstolos, juntamente com um grupo de irmãos e irmãs que Ele mesmo salvou mediante o seu sacrificio na cruz do calvário, derramando o seu sangue. A estes Ele deixou uma primordial tarefa: testemunhar a todos os povos, línguas e nações da poderosa salvação que Ele consumou.
Esses
primeiros judeus, que creram em Jesus como o seu Messias, o Ungido de Deus,
após terem recebido de Jesus a ordem para que permanecessem em Jerusalém até
que fossem revestidos de poder, receberam o batismo no Espírito Santo e
originaram a Igreja como uma instituição física, visível e desafiada em
diversos momentos.
A Igreja
em Jerusalém mostra a origem do corpo de Cristo, o seu desenvolvimento e as
perseguições que tentaram silenciar o plano de Deus, mas também revela uma
igreja cheia do Espírito, que vivia em constante oração, perseverava na
doutrina da Palavra de Deus, vivia em unidade de propósitos, testemunhava com
poder acerca de Jesus e presenciou milagres feitos para glorificar o nome do
Senhor. Este livro, fruto do trabalho do Pastor José Gonçalves, mestre e
conhecedor profundo das Sagradas Escrituras e que tem-se dedicado a conhecer a
história do Movimento Pentecostal desde o seu nascedouro, é um presente ao
público que deseja conhecer mais sobre a Igreja de Jesus Cristo na cidade de
Jerusalém. O escritor mostra os desafios com que nossos primeiros irmãos
depararam-se, como também a forma como a presença constante do Jesus entre o
seu povo fez a diferença para que pudéssemos chegar até aqui. Diversos desses
desafios são semelhantes aos que enfrentamos em nossos dias, e os
acontecimentos relatados por Lucas apresentam--nos princípios que precisamos
obedecer para, a exemplo da Igreja Primitiva, sermos vitoriosos em Cristo e
vivenciarmos as promessas que Ele fez a nós.
"Jesus
Cristo é o mesmo ontem, e hoje, e eternamente" (Hb 13.8).
Este livro
de apoio foi preparado para auxiliar os professores das Lições Bíblicas, que
serão estudadas por toda a Igreja ao longo de todo um trimestre. Certamente, é
o que esperamos e oramos, pois essas lições trarão despertamento e renovação
espiritual e de propósito ao povo de Deus, ensinando-nos, vinte séculos depois,
acerca do modelo de Igreja que se deixa ser usada pelo Espírito Santo.
Que Deus o abençoe grandemente por meio dessa
leitura.
No amor de Jesus.
Ronaldo
Rodrigues de Souza
Diretor
Executivo da CPAD
Sumário
Agradecimentos
5 Prefácio
7 Introdução 11 ...
Capítulo 1
A Igreja que Nasceu no Pentecostes.
Capítulo 2
A Igreja de Jerusalém: Um Modelo a Ser
Seguido...........29
Capítulo 3
Uma Igreja Fiel à Pregação do Evangelho... ....41...
Capítulo 4
Uma Igreja Cheia do Espírito Santo
Capítulo 5
Uma Igreja Cheia de Amor .67
Capítulo 6
Uma Igreja não Conivente com a Mentira .77
Capítulo 7
Uma Igreja que não Teme a Perseguição...87
Capítulo 8
Uma Igreja que Enfrenta os seus Problemas
Capítulo 9
Uma Igreja que se Arrisca..109
Capítulo 10
A Expansão da Igreja 119
Capítulo 11
Uma Igreja Hebreia na Casa de um Estrangeiro 127
Capítulo 12
O Caráter Missionário da Igreja de Jerusalém
.............139
Capítulo 13
Assembleia de Jerusalém..153
Referências 158
Introdução
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E |
ste é um
livro de apoio às Lições Bíblicas de Adultos da Escola Dominical produzidas
pela Casa Publicadora da Assembleia de Deus (CPAD). Esse fato faz com que esta
obra tenha as suas características próprias. Em primeiro lugar, é um livro que
tem o propósito de discipular, isto é, de ajudar na formação do caráter
cristão. Em segundo lugar, é um livro que serve de manual para o professor da
EBD, fornecendo-lhe um conteúdo mais robusto, de forma que ele possa ter maior
subsídio no preparo das suas aulas. Em terceiro lugar, é um livro que serve de
introdução à eclesiologia no livro de Atos dos Apóstolos, sendo que o seu campo
de pesquisa ficou restrito à Igreja de Jerusalém. Dessa forma, esse comentário
está limitado aos quinze primeiros capítulos do livro de Atos, que é o espaço
dedicado à igreja de Jerusalém na narrativa lucana. Portanto, para aqueles que
querem maior aprofundamento, outros comentários sobre o livro de Atos dos
Apóstolos devem ser consultados.
Antes de
tratar especificamente sobre o conteúdo deste livro, torna-se necessário fazer
referência ao comentário das lições bíblicas às quais este livro serve de
apoio. A metodologia usada nas lições bíblicas foi a expositiva, isto é, todas
as ideias foram extraídas do texto bíblico de Atos dos Apóstolos e do seu
contexto. Acredito ser essa metodologia a mais adequada para o entendimento do
sentido e significado tencionados pelo autor sagrado. Dessa forma, a exposição
do texto foi feita a partir de uma análise indutiva do texto, isto é, partindo
do particular para o geral. Assim, portanto, a estrutura dos comentários
adotados nas lições bíblicas assemelha-se com as adotadas num sermão
expositivo. Não há dúvida, portanto, que essa metodologia reflete com mais
precisão o pensamento do autor bíblico, além do fato de trazer maior edificação
à Igreja do Senhor.
Pois bem,
tendo feito esses esclarecimentos, o comentário adotado neste livro de apoio
parte do tema proposto em cada lição bíblica, tendo, contudo, a sua exposição e
conteúdo próprios. Assim, por exemplo, o capítulo 1 traz como subsídio a
análise de vários comentaristas bíblicos que põem em relevo o aspecto teofanico
do Pentecostes como sendo relevante para uma correta compreensão do que ocorreu
naquele dia em que o Espírito de Deus foi derramado de forma copiosa. O
capítulo 3, que trata da pregação, foi subsidiado com uma longa reflexão sobre
o papel da pregação pentecostal no atual contexto da igreja. Com respeito ao
capítulo 5, agreguei a contribuição não só da teologia, mas também da filosofia
a fim de que a questão moral envolvendo a mentira fosse mais bem compreendida.
Nos capítulos 7 e 12, que tratam respectivamente das questões relacionadas à
perseguição e missão da igreja, achei apropriado transcrever algumas cartas dos
missionários Gunnar Vingren e Daniel Berg que retratam de forma dramática o
sofrimento, a fé e a coragem desses pioneiros pentecostais na implantação da
Ass. De Deus no Brasil.
Tenho,
ainda, uma palavra final sobre o conteúdo e contexto da escrita deste livro.
Procurei escrever com rigor exegético e precisão acadêmica, mantendo, contudo,
uma linguagem simples e acessível, de forma que, mesmo aqueles que não tiveram
acesso a uma educação formal possam assimilar o texto e o seu conteúdo sem
prejuízos de entendimento.
Boa leitura.
Água Branca,
Piauí, 28 fevereiro de 2025.
José
Gonçalves
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A |
Igreja
nasce no dia de Pentecostes e na cidade de Jerusalém. Quando, portanto,
tratamos do nascimento da Igreja no dia de Pentecostes, há ao menos três fatos
a serem levados em conta. Um é de natureza geográfica, outro é de natureza
histórica e, por último, temos um de natureza teológica. Geograficamente, a
Igreja nasceu na histórica cidade de Jerusalém. Foi na antiga cidade de Davi,
durante os primeiros anos do primeiro século, que Deus derramou o seu Espírito
de forma copiosa no dia de Pentecostes. Podemos dizer, então, que a cidade de
Jerusalém foi historicamente o berço da primeira Igreja. Jerusalém, portanto, é
o local de origem da Igreja-mãe de todas as outras igrejas cristās.
Nosso
estudo neste capítulo privilegiará o aspecto teológico do nascimento da Igreja
no dia de Pentecostes. Partindo do capítulo 2 do livro de Atos dos Apóstolos,
faremos uma análise expositiva do texto bíblico a fim de que possamos assimilar
melhor as suas verdades teológicas. Destacaremos que o Pentecostes bíblico foi
um evento de natureza teofanica, isto é, visível e audível, demonstrando, dessa
forma, a presença de Deus no meio do seu povo. Isso está demonstrado pelo
barulho do som como de um vento impetuoso e da manifestação das línguas como de
fogo. Por outro lado, também destacaremos tanto o propósito como as
características do Pentecostes bíblico. Assim, o testemunho cristão aparece
como um dos principais propósitos do Pentecostes, enquanto a presença de uma
experiência específica e definida aparece como uma das suas principais
características e marcas.
O PENTECOSTES E AS LÍNGUAS DE FOGO COMO MANIFESTAÇÃO TEOFANICA
"Cumprindo-se o dia de Pentecostes
[...]" (At 2.1). O Pentecostes era uma das principais festas judaicas e
era comemorado cinquenta dias depois da Páscoa. A palavra grega pentekosté
(Pentecostes), também conhecida como Festa das Semanas ou Festa da Colheita, é
uma referência ao quinquagésimo dia depois da Páscoa (cf. Éx 34.22; Dt 16.10).
No contexto do antigo pacto, o livro de Deuteronômio 16.9-12 destaca que, durante
essa festa, o povo de Deus deveria apresentar ofertas voluntárias (v. 10),
expressar alegria (v. 11) e demonstrar gratidão (v. 12). No contexto do novo
pacto, foi esse dia que Deus escolheu para derramar o seu Espírito.
"[...]
e, de repente, veio do céu um som, como de um vento veemente e impetuoso, e
encheu toda a casa em que estavam assentados. E foram vistas por eles linguas
repartidas, como que de fogo, as quais pousaram sobre cada um deles" (vu.
2,3). Os fenômenos destacados aqui como "um som, como de um vento veemente
e impetuoso" e as "línguas repartidas, como que de fogo", devem
ser vistos como sendo de natureza teofānica. J. C. Moyer observa que uma
"teofania" diz respeito a uma manifestação visivel ou audivel de
Deus. É, portanto, uma demonstração de que o Senhor está presente. Nesse
aspecto, ele destaca que as teofanias no Antigo Testamento incluem o
"aparecimento de um anjo em forma humana (Jz 13); uma chama na sarça
ardente (Ex 3.2-6); ou fogo, fumaça e trovões no monte Sinai (Ex 19.18-20)".
O teólogo Alessandro Barreto observa que:
A conexão
entre o Sinai e o Pentecoste ressalta a continuidade da revelação divina e a
progressão do plano redentor de Deus. No Sinai, Deus deu a Lei a Moisés,
estabelecendo a aliança com Israel. No Pentecoste, Deus derramou o Espírito
Santo sobre os crentes, inaugurando a nova aliança e capacitando a Igreja para
sua missão global. Assim, as manifestações de fogo e som em Atos 2 não apenas
ecoam as teofanias do Antigo Testamento, mas também simbolizam a nova era do
Espírito, onde a presença de Deus habita em todos os crentes, guiando-os e
fortalecendo-os para viverem de acordo com Sua vontade.
Da mesma
forma, I. Howard Marshal, quando trata da ocorrência desses fenômenos como
manifestações teofanicas no contexto do livro de Atos dos Apóstolos, destaca
que Lucas descreve o som como de um vento "enchendo toda a casa" como
algo quase que palpável. Ele observa que fica em relevo o aspecto sobrenatural
da teofania, o que relembra, sem sombra de dúvidas, as manifestações de
natureza teofânica no Antigo Testamento (2 Sm 22.16; Jó 37.10; Ez 13.13). Nesse
aspecto, Marshal ainda observa que o vento é visto como um sinal da presença de
Deus como Espírito. Assim, os fenômenos das línguas como de fogo põem em relevo
o peso dessa analogia, mostrando mais uma vez que esse "fenômeno relembra
as teofanias do Antigo Testamento, especialmente aquela do Sinai (Ex
19.18)"
A HABITAÇÃO DE DEUS NA IGREJA COMO SEU NOVO
TEMPLO
Essa
relação existente entre o Cenáculo e o Sinai também é explorada de forma mais
exaustiva pelo expositor bíblico G. K. Beale. No entendimento de Beale, é
possível perceber-se com clareza as semelhanças entre a teofania do Sinai e os
fenômenos do Pentecostes. Beale destaca, por exemplo, que o entendimento que
via os fenômenos ocorridos no Sinai como sendo de natureza teofānica era compartilhado
tanto por Filo de Alexandria, um judeu contemporâneo de Jesus e de Paulo, como
pelos Manuscritos do Mar Morto.
Dessa
forma, Beale observa que
A aparição de "línguas como de fogo"
em Atos 2 ao que parece é uma manifestação do Espírito que reflete uma teofania
associada ao templo celestial. Várias considerações indicam isso. Em primeiro
lugar, a menção de que "veio do céu um som, como de um vento
impetuoso" e de que apareceram "linguas como de fogo" traz à
lembrança as teofanias típicas do AT. Deus aparecia nessas teofanias com som de
trovão e na forma de fogo. A primeira grande teofania do AT foi no Sinai, onde
Deus apareceu em meio a um estrondo de "vozes e relâmpagos",
"fogo", "fumaça" e uma "nuvem espessa" (Éx
19.16-20; 20.18). Esse era o modelo de teofania da maior parte das aparições
divinas semelhantes que ocorreram depois no AT. De certa forma, a aparição de
Deus no Sinai funciona como pano de fundo quando o Espírito desce no
Pentecostes. O Pentecostes comemorava não só as primícias da colheita, mas
também, a partir do segundo século a.C., a entrega da Lei por Deus a Moisés no
Sinai, o que indica além disso a presença desse pano de fundo em Atos 2 [...].
Se nossa análise estiver correta até aqui, segue que a teofania do Pentecostes
também pode ser compreendida como a irrupção de um novo Templo que acaba de
surgir no meio do antigo Templo de Jerusalém, que estava sendo superado."
Assim, a
teofania do Pentecostes, como foi aquela do Sinai, a partir da qual a presença
de Deus certamente se faria real no Tabernáculo, está diretamente associada com
a experiência de Deus habitando na Igreja, que é o seu novo templo. A Igreja,
portanto, formada por todos os crentes salvos em Cristo e cheios do Espírito, é
a nova habitação de Deus, e não mais o antigo templo judaico. Beale pontua que
essa compreensão que associa as "línguas como de fogo" com a presença
de Deus na parte mais interior do Tabernáculo, o Santo dos Santos, pode ser
encontrada nos Manuscritos do Mar Morto da comunidade de Qumran.
Beale destaca que:
O fato mais surpreendente ainda nesse
documento de Qumran é que as "línguas" são uma ocorrência não apenas
da presença reveladora de Deus, mas também de sua communicação profética.
Certamente, é isso que acontece no Pentecostes: não apenas as "línguas de
fogo" são uma manifestação da presença de Deus em Espírito, mas essa
presença também leva as pessoas a "profetizarem" (como está claro em
At 2.17,18). O local de onde desce o Espírito de Deus no Pentecostes não apenas
parece que é "do céu", de modo genérico, mas também do Santo dos
Santos ou templo celestial."
Como
destacou Beale, a presença de Deus em Espírito entre o seu povo trouxe consigo
manifestações teofanicas do som como de um vento impetuoso e veemente e as
línguas como que de fogo. Contudo, não foi apenas isso; essa mesma presença
também trouxe consigo o dom profético (At 2.17,18). Dessa forma, fica em evidência
o aspecto carismático do Pentecostes. A presença de Deus em Espírito enche o
seu povo.
UMA COMUNIDADE DE PROFETAS
O teólogo
pentecostal Roger Stronstad tem chamado a aten-ção para o significado dessa
teofania do Pentecostes em contraste com a do Sinai. Assim como no antigo
pacto, na aliança do Sinai, quando o povo de Deus foi feito um "reino de
sacerdotes" (Ex 19.6), assim também o povo de Deus debaixo do novo pacto,
no Pentecostes, é transformado em uma comunidade de profetas. Dessa forma,
destaca Stronstad:
enquanto a teofania no Monte Sinai
estabeleceu Israel como um reino de sacerdotes, a do Pentecostes estabelece os
discí-pulos como uma comunidade de profetas. Por conseguinte, a teofania no dia
de Pentecostes combina os sinais dessas teofanias anteriores: o barulho do
vento forte e violento ecoa o vento violento da experiência de Elias; o fogo
ecoa o fogo das duas teofanias anteriores; a fumaça ecoa a fumaça de quando
Deus apareceu no Monte Sinai diante de Israel na entrega da Lei. Esses
prodigios e sinais da teofania do Pentecostes que ecoam a teofania do recebimento
da Lei no Monte Sinai somente podem indicar que o que está acontecendo no
Pentecostes não é apenas tão dramático, mas também tão significativo como o que
ocorreu no Monte Sinai. Em outras palavras, a criação dos discípulos como uma
comunidade de profetas é tão memorável como a criação anterior de Israel na
condição de um reino de sacerdotes. Ou seja, no dia de Pentecostes, e pela
segunda vez na história de seu povo, Deus o está visitando em sua montanha
sagrada e mediando uma nova vocação para ele a profecia, em vez do sacerdócio
real."
A
experiência do Pentecostes, portanto, marca o nascimento da Igreja como uma
comunidade de profetas assim como a teofania do Sinai assinalou o início do
povo sacerdotal! Isso significa dizer que, no novo pacto, Deus, pelo seu
Espírito, veio habitar na sua Igreja (o seu novo templo), fazendo dela uma
comunidade de profetas. Esse entendimento reflete o que haviam dito os antigos
profetas que viveram debaixo da antiga aliança: "E porei dentro de vós o
meu espírito e farei que andeis nos meus estatutos, e guardeis os meus juízos,
e os observeis" (Ez 36.27); "Mas este é o concerto que farei com a
casa de Israel depois daqueles dias, diz o SENHOR: porei a minha lei no seu
interior e a escreverei no seu coração; e eu serei o seu Deus, e eles serão o
meu povo" (Jr 31.33), e mostra também que o anseio de Moisés de que todo o
povo de Deus fosse profeta tornara-se uma realidade (Nm 11.29).
O PROPÓSITO DO BATISMO PENTECOSTAL
O que foi
dito até aqui revela que os eventos ocorridos no dia de Pentecostes,
notadamente marcado por manifestações teofānicas, destacam a realidade da
presença de Deus no meio do seu povo. Lucas não tenciona na sua narrativa
apresentar um Deus teórico, mas vivo e real. Deus estava ali. Quem se encontrava
ali, por exemplo, podia até não compreender o que estava acontecendo (At 2.12),
mas também não podia duvidar de que Deus estava lá (At 2.11). O Senhor era um
Deus ouvido e visto. Tudo isso demonstra que havia um propósito sublime na
presença divina no Pentecostes.
"E
todos foram cheios do Espírito Santo e começaram a falar em outras linguas,
conforme o Espírito Santo Thes concedia que falassem" (At 2.4). Esse é,
sem dúvidas, um dos fenômenos mais extraordinários manifestado no Pentecostes.
De fato, a sua ocorrência deixou os presentes atordoados (At 2.6). A pergunta
feita por aqueles que não pertenciam à comunidade crista foi: "Que quer
isto dizer" (At 2.12). Pedro traz uma resposta contundente a essa pergunta
a partir da exposição das Escrituras do Antigo Testamento. Citando o profeta Joel,
Pedro demonstra como essa profecia teve o seu real cumprimento no Pentecostes
(At 2.17; Jl 2.28).
Por outro
lado, convém dizer que os cristãos ali reunidos, embora não haja indicação de
que tivessem conhecimento prévio dos fenômenos que ocorreriam por ocasião da vinda
do Espírito, já aguardavam com expectativa o cumprimento da promessa do
Espírito feita a eles por Jesus (Lc 24.49; At 1.5,8). Quando, portanto,
perceberam que, inspirados pelo Espírito, estavam falando em outras línguas
totalmente desconhecidas para eles, tiveram a certeza de que a promessa feita a
eles por Jesus estava tendo o seu real cumprimento. Pedro confirma esse
entendimento quando associa essa fala inspirada no Pentecostes, expressa no
falar em outras línguas, com a fala profética predita pelo profeta Joel (At
2.17,18; cf. Jl 2.28). Não resta dúvida, portanto, de que o falar em línguas no
dia de Pentecostes foi percebido pelos discípulos como uma evidência fisica de
que eles haviam recebido o batismo pentecostal predito por Jesus.
Stanley Horton destaca que:
Assim, com todo o ser rendido ao poder e à
pessoa do Espírito de tal forma que os efeitos do Seu grande poder pudessem ser
vistos, as línguas tornaram-se a evidência convincente de que Jesus estava à
direita do Pai, que a profecia estava sendo cumprida e que o Espírito Santo
havia realmente enchido os crentes de uma nova maneira. A multidão não tinha
dúvidas sobre o que Pedro quis dizer quando disse: "Isto é aquilo!".
Essa mesma evidência de línguas também convenceu Pedro, as testemunhas que ele
levou consigo e os cristãos judeus em Jerusalém de que os gentios deveriam ser
admitidos na comunhão da igreja. Aqui estava um lugar onde uma evidência convincente
era realmente necessária, e a que o Senhor escolheu dar foi línguas. Nada mais
poderia ter superado o preconceito dos crentes judeus, a não ser essa prova de
que os gentios haviam recebido o dom semelhante (literalmente, o dom idêntico).
Atos 11.17,18. Paulo em Éfeso encontrou crentes (cristãos de acordo com o uso
do termo por Lucas) aparentemente convertidos de Apolo, que não tinham ouvido
falar do Espírito. Eles receberam uma experiência que removeu todas as dúvidas,
pois eles também falaram em línguas e profetizaram. Atos 19.6.10
Esse
entendimento de que o livro de Atos dos Apóstolos demonstra que o batismo no
Espírito é acompanhado ou evidenciado por sinais exteriores, em que o falar em
línguas pode ser visto como um padrão, possui forte fundamentação bíblica e
exegética. Em Atos 11.15-17, por exemplo, Pedro recorre à experiência dos gentios
na casa de Cornélio, onde o falar em línguas aparece como evidência
inconfundível desse batismo pentecostal (At 10.44-46) para convencer os seus
colegas da aceitação da fe gentilica. Em Atos 19.1-6, a narrativa lucana mostra
que o fenômeno glossolálico entre os cristãos de Éfeso é a evidência de que o
Espírito, que eles nem mesmo sabiam que existia, agora está sobre eles.
Myer Pearlman observa que:
Acompanhando o cumprimento desta promessa
(Atos 1:8) estavam manifestações sobrenaturais (Atos 2:1-4), a mais importante
e comum das quais foi a declaração milagrosa em outras línguas. Que esta
declaração sobrenatural foi um acompanhamento do recebimento de poder
espiritual, confor-me declarado em dois outros casos (At 10.44-46; 19.1-6) e
implícito em outro (At 8.14-19)."
A
expectativa de que os apóstolos esperavam a presença de sinais externos por
ocasião da recepção do Espírito é claramente mostrada em Atos 8.14-20. Embora
não haja menção aqui ao fenômeno do falar em línguas, a presença de sinais
externos fez-se presente (At 8.18). Mas que sinais? Muitos intérpretes,
incluin-do metodistas e reformados, que viveram antes do advento do
pentecostalismo, como Adam Clark, Matthew Henry e Jonh Gill, defendiam a
glossolalia como sendo esse sinal. 12
Assim, o teólogo britânico James D. Dunn
destacou que:
Neste século a questão [do falar em línguas]
ressurgiu de forma mais incisiva no pentecostalismo. Sua resposta foi simples e
direta: a glossolalia é o sinal peculiar da presença do Espírito que inicia uma
vida de poder apostólico. "Nos tempos apostólicos, falar em línguas era
considerado a prova física inicial de que uma pessoa havia recebido o batismo
no Espírito Santo... Foi essa determinação que fundou o Movimento Pentecostal
do século XX". A resposta pentecostal é o que motivou nossa pergunta. Em
favor da tese pentecostal, deve-se dizer basicamente que sua resposta está
enraizada no Novo Testamento mais firmemente do que muitas vezes se pensa. É
certamente verdade que Lucas considera a glossolalia do Pentecostes como um
sinal exterior do derramamento do Espírito. 13
"[...]
temos ouvido em nossas próprias línguas falar das grandezas de Deus" (At
2.11). O Pentecostes, aqui entendido como o batismo no Espírito Santo, está
associado diretamente ao recebimento de poder para testemunhar. Está, portanto,
associado ao serviço cristão. Há duas esferas desse serviço cristão que
precisamos levar em conta. Uma está relacionada ao testemunho cristão lá fora;
outra, com a vida privada do cristão. Têm, portanto, relação com o testemunho
público e a vida privada do crente.
Lucas diz
que, por ocasião da experiência pentecostal, quando os crentes falaram em
outras línguas, eles estavam com esse ato proclamando as grandezas de Deus (At
2.11). Havia, portanto, uma expressão de louvor na experiência de Pentecostes.
Posteriormente, na casa de Cornélio, quando os crentes foram cheios do
Espírito, falaram em línguas e magnificavam a Deus (At 10.46). Não há dúvida,
portanto, de que um dos propósitos do batismo pentecostal é levar o cristão a
uma profunda adoração a Deus.
Sobre o
lugar das línguas na adoração, Herald Bredsen, antigo pastor da North County
Center, São Marcos, California, EUA, disse:
1. As
línguas capacitam nosso espírito a se comunicar diretamente com Deus acima e
além da capacidade de compreensão de nossa mente.
2. As
línguas liberam o Espírito de Deus em nós.
3. As
línguas possibilitam nosso espírito de assumir ascendência sobre a alma e o
corpo.
4. As
línguas são uma provisão de Deus para fazermos catarse, pelo que são importantes
para nossa saúde espiritual.
5. As
línguas satisfazem nossa necessidade de toda uma nova linguagem de adoração,
oração e louvor.14
Essas
afirmações são bem claras. Não há como duvidar de que refletem a autopercepção
de alguém que possui e usa o dom de línguas na adoração a Deus. Paulo, quando
regulamentou o uso dos dons na igreja de Corinto, destacou esse lado devocional
do uso das línguas. Ele deixou claro o propósito da adoração a Deus por meio da
oração em outras línguas (1 Co 14.14-17).
Quando o
crente expressa-se em adoração em outras línguas, ele está falando consigo
mesmo e com Deus (1 Co 14.2; 14.28). Através da oração em línguas, o crente
edifica a sua fé (1 Co 14.4). Nesse texto, fica claro o uso privativo do falar
em línguas. Assim, as Escrituras mostram que a igreja que dava testemunho
público com poder lá fora (At 4.33; 6.3,8; 8.5) era a mesma igreja que antes se
edificava a si mesma na adoração privada. Não existe testemunho público sem
adoração privada. 15
Convém
destacar aqui que a experiência pentecostal é específica, definida e contínua.
Muitos autores gastaram muita tinta na tentativa de negar a separabilidade do
batismo pentecostal. Em outras palavras, contrariamente aquilo que é
meridianamente claro em Atos dos Apóstolos, eles negam que o batismo no
Espírito Santo seja uma experiência separada da conversão. No entendimento
desses autores, o batismo no Espírito é recebido no momento da regeneração.
Assim, quando alguém é salvo, também é batizado no Espírito. Nesse aspecto, o
batismo no Espírito é visto pela perspectiva da iniciação cristă, e não de uma
capacitação cristă, como defendem os pentecostais. Embora a experiência
pentecostal possa acontecer concomitantemente com a regeneração (At 10.44-46),
são, contudo, experiências distintas.
R. A. Torrey (1856-1928), ministro batista e autor
prolífico, escreveu
O Batismo com o Espírito Santo é uma obra do
Espírito Santo separada e distinta de Sua obra regeneradora. Ser regenerado
pelo Espírito Santo é uma coisa, ser batizado com o Espírito Santo é algo
diferente, algo adicional. Isso é evidente em Atos
1:5. Ali Jesus disse: "Sereis batizados
com o Espírito Santo, não muitos dias depois." Eles ainda não estavam
"batizados com o Espírito Santo." Mas eles já estavam regenerados. O
próprio Jesus já os havia pronunciado assim. Em João 15:3, Ele havia dito aos
mesmos homens: "Agora estais limpos pela Palavra." (Comp. Tg 1:18; 1
Pe 1:23) e em Jo 13:10: "Vós estais limpos, mas não todos", exceto,
pelo "mas não todos", o único homem não regenerado na companhia
apostólica, Judas Iscariotes, da declaração "Vós estais limpos".
(Veja Jo. 13:11.) Os apóstolos, exceto Judas Iscariotes, já eram homens
regenerados, mas ainda não eram "batizados com o Espírito Santo". Disto
fica evidente que a regeneração é uma coisa, e que o batismo com o Espírito
Santo é algo diferente, algo adicional. Alguém pode ser regenerado e ainda não
ter sido batizado com o Espírito Santo. 16
Torrey,
cuja teologia teve enorme efeito sobre o movimento pentecostal, destacava a
separação entre a regeneração e a capacita-ção do Espírito. Assim, o batismo no
Espírito era por ele considerado uma obra distinta da salvação e que tinha como
propósito capacitar o cristão para o serviço. Sem dúvidas, essa interpretação
ajusta-se ao contexto bíblico de Atos dos Apóstolos. Através do batismo no
Espírito, o crente é capacitado por Deus para viver poderosamente tanto na
esfera pública como na privada. Não devemos contentar-nos com nada menos do que
isso.
A Igreja que Nasceu no Pentecostes
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